sexta-feira, 7 de agosto de 2020

DISPARADA FULMINANTE

Antonio Félix da Costa iniciou a rodada sêxtupla da F-E com duas vitórias impecáveis, e deixando os rivais comendo poeira no campeonato. 
 

           A Formula-E retomou o seu campeonato, que havia sido interrompido pela pandemia da Covid-19, iniciando seu plano de uma megarrodada de seis provas em Berlim, no circuito montado no antigo aeroporto de Tempelhof, única alternativa viável de se poder disputar uma corrida sem recorrer a circuitos de rua onde poderia haver aglomerações de pessoas e de pessoal na montagem do circuito. A iniciativa, inédita, já previa que poderíamos ter algumas surpresas, diante da maratona que equipes e pilotos poderiam enfrentar para realizar, em pouco menos de duas semanas, nada menos do que seis corridas, colocando todo mundo à prova.

            Tudo bem que, normalmente, as corridas do certame de carros monopostos totalmente elétricos já eram realizadas em apenas um dia, com dois treinos livres, um treino de classificação, e a corrida propriamente, E, em certos momentos, já tínhamos rodadas duplas, com o roteiro de atividades da primeira prova se repetindo na segunda. Mas, e quando temos três rodadas duplas em sequência? Só não são em dias totalmente consecutivos porque a direção da categoria encontrou um meio de diferenciar as rodadas. Na primeira, disputada nesta quarta e quinta-feira, a pista de Tempelhof já mostrou uma novidade para todos, pela prova ser disputada no sentido contrário da pista, obrigando equipes e pilotos a terem de achar os acertos para esta configuração do traçado. Por mais simples que possa parecer, inverter o sentido da pista traz desafios bem particulares, e os setups dos carros precisam ser revistos. E temos outro problema: todos os times estão com staffs reduzidos ao mínimo, para se cumprir os procedimentos de segurança sanitária exigidos diante deste momento da pandemia, que embora esteja mais controlada na Europa, ainda inspira muitos cuidados. Uso de máscaras, testes para todos, e distanciamento social, tudo isso é necessário para se evitar o pior. Com tudo em ordem, hora das corridas serem realizadas.

            E o que vimos nesta primeira rodada dupla em Berlim foi uma disparada fulminante de Antonio Félix da Costa. O piloto português da equipe Techeetah venceu praticamente as duas corridas de ponta a ponta, demonstrando um domínio que, se não foi arrasador como o que vemos da Mercedes na F-1, foi certamente desconcertante. Antonio fez um “score” perfeito na primeira prova, vencendo a corrida, marcando a pole, e ainda fazendo a volta mais rápida, totalizando 30 pontos. Na segunda corrida, nova vitória e nova pole, mas deixando de marcar a volta mais rápida, o que lhe valeu 28 pontos. Esses resultados, por si só, já seriam desencorajadores para os rivais do português na luta pelo título da temporada, mas o panorama para eles nestas primeiras duas corridas foi mais arrasador do que poderiam esperar...

            E isso porque os rivais até então mais diretos que Da Costa tinha na classificação do campeonato acabaram indo muito mal neste início de disputas em Tempelhof. Alexander Sims, da equipe Andretti, por exemplo, marcou apenas um 9º lugar na primeira corrida, e ficou fora dos pontos na segunda prova, marcando até aqui apenas 2 pontos. Mith Evans, da Jaguar, que parecia vir numa tocada forte, ficou zerado nas duas corridas. Jean-Éric Vergne, bicampeão da categoria, e companheiro de Da Costa na Techeetah, então, teve um início horroroso, com apenas um 10º lugar na segunda prova, e apenas 1 ponto conquistado. André Lotterer, da Porsche, foi 2º colocado na primeira prova, e apenas 9º na segunda corrida. Sam Bird foi 3º colocado na primeira prova, e 6º na segunda. Lucas Di Grassi terminou a primeira corrida em 8º, e foi 3º na segunda prova. Sebastien Buemi, por sua vez, foi 7º colocado na primeira corrida, e 2º na outra prova. Ninguém conseguiu manter uma constância de resultados que permitisse minimizar o prejuízo com a arrancada do português nesta primeira rodada.

Lucas Di Grassi (acima) subiu ao pódio na segunda corrida e assumiu a vice-liderança na competição. Sebastien Buemi (abaixo) também foi ao pódio, mas não tem como reagir na luta contra o piloto português da Techeetah.
 

            Tudo bem que a F-E, em maior ou menor grau, apresenta certa variação de resultados, o que dá à categoria um ar de imprevisibilidade que é agradável a quem quer ver surpresas, além de boas corridas, e não resultados previsíveis. Mas Antonio Félix da Costa foi o ponto completamente fora da curva nestas primeiras duas provas em Berlim. Enquanto todo mundo tinha seus altos e baixos, o português à beira de conquistar todos os pontos possíveis em duas provas. O resultado não poderia ser pior para quem ainda tinha esperanças de tentar disputar o título. Antonio tem agora nada menos do que 125 pontos, enquanto seus mais diretos perseguidores na tabela, o brasileiro Lucas Di Grassi e o belga Stoffel Vandoorne, estão empatados com 57 pontos, ou seja, 68 pontos atrás. Mesmo que um deles marcasse todos os pontos possíveis nas próximas duas provas, e da Costa abandonasse as corridas ou não marcasse pontos, ainda assim o português não perderia a liderança do campeonato. Só que isso não deve acontecer.

            Di Grassi é o primeiro a admitir que não tem como deter Da Costa. A Audi não está no mesmo nível da rival Techeetah, e mesmo que consiga reagir, só um completo desastre tornaria possível ao brasileiro alcançar o português, que além de um carro muito bem acertado, está pilotando muito bem, e sem cometer erros. A Mercedes até parece estar com um carro mais desenvolvido que a Audi neste momento, mas assim como Lucas, Vandoorne tem seus altos e baixos na competição, ficando a dever na constância necessária para tentar uma reação. Mith Evans, o 4º colocado na disputa, tem 56 pontos, 69 de desvantagem, e apesar de também possuir um carro potencialmente mais competitivo, teve um início desastroso em Berlim, deixando Antonio escapar completamente, e dificilmente terá condições de reagir. Basicamente, todo mundo concorda que, se nada de anormal acontecer, Antonio Félix da Costa é o campeão da atual temporada da F-E. Fica a dúvida de em qual corrida ele fecha matematicamente a conquista, se na prova de sábado, ou mais provavelmente na de domingo, com duas corridas ainda a serem realizadas na próxima semana.

            O que promete pegar fogo é a luta para ver quem será o vice-campeão, e nesta parada, estão todos os demais pilotos. É o que sobrou para o campeonato. E todo mundo vai querer, pelo menos, tentar terminar o ano como o “melhor” do resto, com a moral um pouco em alta, e esperar por melhor chance na próxima temporada. E no festival de altos e baixos que vimos nesta quarta e quinta-feira em Tempelhof, vai ser uma disputa acirrada. Não há favoritos, e ninguém pode garantir nada nem a si mesmo. Do vice-líder, Lucas Di Grassi, até o 13º colocado na tabela, Nick de Vries, temos uma diferença de apenas 27 pontos, e todos eles podem engrossar esta luta pelo vice-campeonato. Todo mundo contra todo mundo, sem voleios. Ainda temos 120 pontos em disputa nas quatro corridas ainda a serem disputadas, e muita coisa pode acontecer na pista, já que o desempenho dos times mostrou oscilações, com raras exceções, algumas delas já conhecidas.

As duas corridas disputadas em Berlim deixaram os pilotos quase sem energia em seus carros, deixando os competidores em dificuldades para conseguir completar as provas, que tiveram várias disputas entre vários pilotos.
 

           A Andretti venceu corrida com seus dois pilotos, mas Berlim não foi muito agradável ao time oficial da BMW na competição, e tanto Maxx Guenther quando Alex Sims negaram fogo nas corridas Max ainda acabou sendo desclassificado na primeira prova por uso excessivo de energia, fora o abandono na segunda corrida. A Virgin venceu a primeira corrida, mas desde então não consegue repetir a mesma performance. O mesmo valendo para a Jaguar, que conseguiu uma vitória com Mith Evans, mas também não se entendeu em Berlim até o presente momento. Mercedes e Porsche volta e meia parecem ter carros rápidos, mas não conseguiram traduzir isso em resultados mais constantes. O mesmo vale para a Audi. A e.dams parece estar se aprumando, mas também tem seus altos e baixos. E não podemos descartar uma reação de Jean-Éric Vergne, ainda mais por contar com o carro da Techeetah, onde foi campeão nos últimos dois anos. O francês tem tido alguns azares que o deixaram praticamente de fora da luta pelo título contra seu companheiro de equipe, mas não pode ser descartado da luta pelo vice-campeonato. E se o carro se acertar, ele vai querer essa posição, até para não passar tanta vergonha de ver Da Costa ser campeão com tamanha facilidade como vem acontecendo até aqui.

            Nos demais times, até pode surgir um ou outro bom resultado, mas pelo que vimos na atual temporada, não se pode esperar muito deles, ao menos em tentar entrar na briga pelo vice. A Venturi não vem tendo uma boa temporada, com mais baixos que altos, assim como a Mahindra, que vem perdendo espaço desde a temporada passada, e não conseguiu se ajeitar nesta última. A Nio não consegue sair do fim do grid, no máximo conquistando um ponto aqui ou ali, e só. E a Dragon, por sua vez, também não vai muito mais longe do que isso.

            E temos alguns pilotos que já não estão mais participando da competição. Pascal Wehrlein, por exemplo, deixou a Mahindra, sendo substituído por Alex Lynn. Brendon Hartley também deixou a categoria, e seu lugar na Dragon foi ocupado pelo brasileiro Sérgio Sette Camara. O chinês Ma Qinhua acabou substituído na Nio por Daniel Abt, que foi demitido da Audi, que chamou René Rast para o lugar do alemão no time.

Ainda teremos mais quatro provas em Tempelhof, e a briga pelo vice-campeonato promete ser das mais acirradas.
 

            A F-E foi mais um campeonato cujo andamento acabou comprometido pela pandemia do coronavírus, e o desempenho de alguns times e pilotos infelizmente não pode ser desenvolvido da maneira como eles esperavam. Na correria que virou essa rodada de seis provas em tão pouco tempo, nem todos conseguiram se preparar ou irão aguentar o tranco como gostariam. Mas podemos ter a expectativa de algumas boas corridas, com algumas boas disputas e pegas. Antonio Félix da Costa fez um excelente trabalho não apenas nas duas primeiras provas de Berlim, mas nas corridas anteriores, como a vitória na etapa de Marrakesh, e os pódios em Santiago e na Cidade do México, onde já mostrava vir forte na disputa pelo título da temporada. Não é culpa dele se os demais rivais não conseguiram se mostrar à altura da disputa no campeonato, algo que acabou exacerbado com paralisação das atividades diante da pandemia da Covid-19. A bem ou mal, a F-E conseguirá dar um final satisfatório à atual temporada, elegendo seu campeão, e podendo mostrar corridas bem disputadas entre vários pilotos e times. Encerrada a competição, o certame ganhará seu tempo habitual de preparação para o próximo campeonato, em 2021, onde esperemos poder voltar à normalidade, e vermos novamente a competição dos carros elétricos monopostos brilhar em todo o seu esplendor.

            E voltemos então à pista, afinal, ainda temos quatro provas, e muita briga para vermos na etapa de Berlim. Nas corridas de sábado e domingo, o sentido da pista será o normal dos últimos anos, e isso pode provocar algumas mudanças no desempenho dos times. E, para as corridas da semana que vem, algumas curvas a mais, e um traçado um pouco maior, que deve significar mais desafio para pilotos e equipes. Não vamos nos esquecer também que todo mundo terminou estas primeiras duas provas literalmente com as baterias de seus carros raspando o tacho, sendo que alguns pilotos nem conseguiram finalizar a prova por ficarem completamente sem energia. Mais do que nunca, não basta apenas acelerar o bólido, mas também saber conservar sua carga de energia, a fim de conseguir chegar ao final na melhor condição possível. Isso vai dar dor de cabeça para times e pilotos, mas é um desafio que todos precisam encarar. E a habilidade dos times e pilotos será posta à prova mais do que nunca. E o próprio Antonio Félix da Costa, mesmo tendo vencido as duas corridas disputadas até agora, também chegou com suas baterias praticamente no fim em ambas as provas, mostrando que seus triunfos não foram tão fáceis como podem parecer, e que ele também por pouco quase não chegou ao fim das corridas.

            Em resumo, teremos bons motivos para nos animar neste encerramento de temporada da F-E. E que possamos ver quem será o vice-campeão, afinal...

Lewis Hamilton passou por um susto quando viu um de seus pneus furar na volta final da corrida de domingo passado em Silverstone, e conseguiu levar o carro até a bandeirada. Mais do que capacidade, o inglês também teve sorte de isso ter acontecido na última volta, o que não ocorreu com seu companheiro de equipe Valtteri Bottas, que até conseguiu chegar ao box e trocar os pneus, mas perdeu as chances de pontuar. Por outro lado, ainda mais sorte de Hamilton que Max Verstappen acabou sendo chamado pela Red Bull para uma troca de pneus visando marcar a melhor volta da corrida, e pelo menos, ganhar mais um ponto. Segundo o time rubrotaurino, os compostos do holandês também corriam riscos, e Verstappen também poderia sofrer um estouro, a exemplo do que ocorreu com Bottas, e também com Carlos Sainz Jr. da McLaren, outro piloto que viu sua excelente corrida ir para o vinagre nas voltas finais da corrida. A troca de Verstappen acabou dando a Lewis a vantagem que ele precisava para chegar ao fim da prova ainda em primeiro, e com isso carimbar sua 87ª vitória na F-1. Por mais fácil que seja falar isso agora, até mesmo Max Verstappen admitiu que Hamilton foi tremendamente sortudo nessa. Apesar da Pirelli ter anunciado investigação para verificar o estouro dos pneus, não há muito mistério nisso: a própria fornecedora dos compostos estipulava a corrida como sendo de apenas um pit stop, que deveria ser feito a partir da 22ª volta, de acordo com as estratégias de cada equipe. Ocorre que houve um Safety Car provocado pela batida de Danill Kvyat por volta da 12ª volta, e todo mundo resolveu aproveitar para fazer sua troca de pneus neste momento, o que fez com que os compostos, mesmo os mais duros, tivessem que aguentar pelo menos mais 10 voltas do que o previsto inicialmente. Lógico que a durabilidade dos pneus estaria no limite, como acabou ocorrendo, e a própria Pirelli anunciou depois, além de declarar a alta geração de downforce dos carros atuais, segundo eles, muito mais desgastante para os pneus do que os bólidos anteriores. Para a segunda prova, neste final de semana, muito provavelmente a maioria dos times e pilotos deverá adotar a tática de duas paradas, uma vez que a Pirelli escolheu pneus menos duros para esta segunda corrida, a fim de diferenciar as possibilidades de disputa na prova.

E uma vaga a menos na F-1 de 2021. Confirmando o que já se esperava, a Mercedes renovou o contrato de Valtteri Bottas para a próxima temporada no time alemão. Resta agora a renovação do contrato de Lewis Hamilton, o que deve ocorrer em breve, tão logo acertem os detalhes finais. Com a confirmação de George Russel na Williams, anunciado há pouco tempo, já se imaginava que Bottas ganharia mais uma temporada em Brackley. O finlandês não tumultua o ambiente na equipe, e isso tem sido muito valorizado por Toto Wolf. Mas Bottas precisa mostrar também que pode andar no ritmo de Hamilton, ainda mais com o carro que possui este ano. E precisa de um pouco de sorte também, como vimos domingo passado, onde ele sempre esteve perto do inglês, e seria um tranquilo segundo lugar, se não tivesse o pneu furado nas voltas finais...

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