sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

CANCELAR OU NÃO CANCELAR?

O GP da China de F-1 (acima) deve ser cancelado em definitivo este ano, devido ao surto do coronavírus no país asiático, que já provocou o cancelamento da etapa da F-E em Sanya (abaixo) pelo mesmo motivo.

            E o mundo do automobilismo também está sentindo os efeitos da crise do Coronavírus, um dos assuntos do momento a nível mundial, e que coloca a China no centro das atenções pela propagação do que pode vir a ser uma epidemia tendo se originado de uma de suas cidades. A Fórmula 1 e a Formula-E são as categorias afetadas, no mundo do automobilismo. A China decretou a suspensão de todos os eventos esportivos até abril, e se a etapa da categoria de carros monopostos elétricos foi atingida em cheio, a etapa da F-1 ainda tinha uma certa esperança de ainda se realizar na data marcada, mas que foi logo descartada. E a questão que sempre surge nestes momentos: cancelar ou não cancelar a etapa?
            Não há muito o que se discutir. Mesmo que o novo vírus não seja tão letal quanto o da Sars, que na primeira década deste século também causou pânico e muitas mortes naquela parte do mundo, não é bom brincar com fogo. Apesar dos sinais promissores de se encontrar uma vacina, não se deve menosprezar a situação. A China, aliás, está fazendo um tremendo esforço para tentar resolver e normalizar a situação, temendo os grandes estragos que isso pode desencadear em sua economia, ainda mais quando ficamos sabendo que um médico que havia relatado entre seus colegas os sinais de que o novo vírus poderia ser grave acabou sendo censurado pela polícia chinesa para “parar de tentar criar agitação”, atitude típica de um governo que parece retroceder cada vez mais para seu lado autoritário, lembrando que a China é uma ditadura de partido único, e que não admite ser desafiada, e por isso mesmo, tenta controlar a vida de seus cidadãos a todo momento, para que eles não tenham “idéias erradas”.
            Se o mundo se tornou muito dependente da China hoje na economia global (e só por isso tolera sua ditadura), a China também não pode se dar ao luxo de perder sua posição econômica. E sentindo que a situação pode escapar de controle, apesar de seus grandes esforços, tratou de mostrar serviço, declarando uma quarentena como jamais se viu, com cidades inteiras ficando praticamente sem movimentação de pessoas, como em Wuhan, nas imagens veiculadas. E cancelar os eventos esportivos marcados para os próximos meses é uma atitude que, embora indesejável, é a mais correta a ser tomada.
            A F-E, como categoria de vida recente, e de menor prestígio e importância econômica, certamente sentirá a ausência de realizar a prova de Sanya, marcada para 14 de março, mas ela tem condições de substituir essa ausência, e as opções mais viáveis seriam transformar as etapas de Berlim ou Nova Iorque em rodadas duplas. Por estarmos a pouco mais de um mês, o cancelamento do ePrix em solo chinês era a única opção a ser tomada mesmo. E mesmo que a situação acabe se normalizando até lá, a categoria tem sua logística de transporte, que envolve datas de vários dias antes da corrida. E sendo uma viagem longa da Europa até o extremo oriente, sairia ainda mais dispendioso fazer o transporte dos equipamentos e não poder fazer a corrida.
Com novos casos, e mais mortes ocorrendo a cada dia, os chineses cancelaram os eventos esportivos no país até abril, para tentar evitar a propagação do coronavírus, além de impor uma grande quarentena aos habitantes de várias cidades.
            Cancelar um evento, aliás, ainda mais nos dias de hoje, é sempre complicado, mais pelo lado financeiro do que por qualquer outra coisa. E no caso da F-1, o gigantismo que ela atingiu, em termos estruturais e financeiros, fazem a tomada de decisão quase sempre ser difícil, mesmo quando a decisão a ser tomada é extremamente óbvia. E se a F-E ainda pode recompor o seu calendário, a categoria máxima do automobilismo não terá a mesma sorte.
            E neste ponto, o gigantismo da F-1 joga contra ela própria: com um calendário de 22 corridas marcado para este ano, a categoria fica praticamente “sem folga” para remanejar alguma etapa, em caso de necessidade. Iniciado o calendário, no meio de março, e até sua conclusão, em fins de novembro, são poucos os fins de semana livres que poderiam, em tese, sediar uma prova. Mas a logística de transporte da F-1, que tem de transportar todos os seus equipamentos em pelo menos três aeronaves de grande porte, praticamente impossibilita tal remanejamento. Uma solução seria fazer uma troca de datas, e se tentou fazer isso, mudando a corrida da Rússia, em Sochi, com a da China, mas os russos não aceitaram a mudança. E pelas dificuldades da logística, não se conseguiria fazer de modo ideal um reencaixe da prova chinesa na segunda metade do ano.
            O melhor a fazer neste caso seria mesmo cancelar em definitivo o GP da China, que voltaria somente em 2021. A F-1 até poderia seguir em frente, e tentar realizar a corrida assim mesmo, mas valeria o risco? Mesmo que a situação esteja normalizada até lá, os ânimos com relação à segurança, por grande parte da população, ainda estarão à flor da pela, e ao manter a realização da prova, a F-1 poderia passar uma imagem de arrogância e prepotência perante uma emergência de saúde grave, ignorando os riscos potenciais da empreitada. Isso para não dizer que a corrida como evento poderia ser um verdadeiro fiasco, pois o público poderia não comparecer, temendo ainda as possibilidades de contaminação do coronavírus. E aí a F-1 sofreria dois baques fortíssimos, que arranharia sua imagem tanto no mundo todo, como dentro da China, ao tentar realizar um evento logo após este momento de emergência sanitária. E ninguém também poderia garantir não se infectar, e já imaginou o pessoal da F-1, multinacional que são, se tornarem um possível vetor de transmissão da doença quando voltassem para seus países na Europa? Se todo mundo tiver de ficar em quarentena, o estrago na programação do calendário seria tremendo, com as provas da Holanda até Mônaco ficando comprometidas por causa disso.
            Claro que haverá prejuízo com o cancelamento do GP, mas convenhamos, dos males, o menor, e situações excepcionais, como é o caso desta emergência médica, mais do que justificam o cancelamento da corrida, pura e simplesmente. Evitaria o trabalho de ter de procurar uma nova data para o GP, ou até de criar uma corrida substituta. E, no caso deste ano, teria um motivo a mais para se ficar sem uma corrida: com o calendário programado para ter 22 corridas, número que muitos times da categoria consideram o limite máximo aceitável, ficar com um GP a menos daria um alívio na rotina puxada das escuderias viajando pelo mundo afora. Todo mundo sairia ganhando (ou perdendo menos) com isso: a F-1 se mostraria alinhada com as preocupações globais, se mostrando menos gananciosa por perder uma etapa, e os times teriam um pequeno momento de descanso adicional e sua programação para a temporada. E para a imensa maioria dos fãs, ter 21 ou 22 corridas não faria tanta diferença assim, sem mencionar que a etapa da China nunca foi lá muito empolgante, se bem que também nunca foi tão enfadonha como Abu Dhabi...
O GP do Bahrein acabou cancelado em 2011 devido às ondas de protestos da "Primavera Árabe", que abalou vários países no Oriente Médio, inclusive o país barenita.
            A última vez que a F-1 cancelou uma etapa foi em 2011, quando estava em curso no Oriente Médio as revoltas do que foi chamado de “Primavera Árabe”, que conturbaram a vida de várias nações. O GP do Bahrein, que deveria abrir a temporada daquele ano, apesar das garantias da família real barenita quanto à segurança, acabou cancelado, num raro gesto de bom senso da FIA e da FOM, que acharam por bem não correr o risco de o evento acabar desencadeando mais protestos no pequeno país. O GP do Bahrein não acabou por causa disso, e em 2012 ele estava de volta ao calendário, onde permanece até hoje. Assim, ficarmos sem o GP da China não será nenhuma tragédia: os motivos são mais do que válidos, e a corrida certamente estará de volta ao calendário no ano que vem, se nada mais acontecer até lá.
            Já quanto a realocar a data de um GP, a última vez que a F-1 fez algo assim foi em 1995, quando um grande terremoto ocorreu no Japão, provocando estragos em muitas cidades, no primeiro semestre daquele do ano. O Grande Prêmio do Pacífico, marcado para abril, precisou ser remarcado, devido aos problemas de recuperação das cidades afetadas pelo terremoto (o circuito da corrida, em Aida, não sofreu danos com o evento), e não seria viável realizar o GP naqueles dias. A corrida foi remarcada para o segundo semestre, sendo realizada então na semana anterior ao Grande Prêmio do Japão, de modo que a Terra do Sol Nascente teve o privilégio de ter duas provas de F-1 realizadas em duas semanas, fato que nunca mais se repetiu, uma vez que o GP do Pacífico saiu do calendário, e a empolgação dos japoneses e suas empresas com a F-1 também esmoreceu desde então.
            Mas a prova foi realocada naquele época, e porque não fazer o mesmo nos dias de hoje? Sim, é verdade, mas a corrida foi feita no final de semana anterior ao GP do Japão, de modo que as equipes da F-1 fizeram uma única viagem para duas provas em um mesmo país. O calendário naqueles tempos era muito menor do que atualmente, de forma que era bem mais possível mudar datas de alguma corrida devido a motivos excepcionais, para não mencionar que a estrutura que a F-1 movimentava naqueles tempos para viajar para o mundo afora era menor que a movimentada nos dias de hoje. Foram 17 provas naquele ano, 5 a menos que as programadas para esta temporada, e se levarmos em conta que um mês sedia em média 2,5 provas, isso dava um campeonato com cerca de dois meses de duração a menos, algo que faz muita, muita diferença, daí os problemas hoje em dia serem bem mais complicados para se contornar uma remarcação de um Grande Prêmio de F-1.
            Um problema que a F-E não terá, devido à sua sistemática ser diferente, e utilizar uma estrutura de competição bem menor, mas também pela concepção de suas pistas de competição. Tornar a etapa de Berlim um rodada dupla será muito simples, pois a prova é feita em uma pista montada dentro do antigo aeroporto da capital alemã, Tempelhoff, de modo que adicionar um dia a mais de competições no domingo demandará esforços bem pequenos. E por ser uma pista bem concebida dentro do antigo espaço dos aviões do velho aeroporto, os pilotos e equipes certamente não teriam empecilhos em disputar duas corridas em Berlim ao invés de uma. Há também a opção de transformar a etapa de Nova Iorque em rodada dupla, o que já foi feito algumas vezes. Mas embora a opção também seja simples, sua execução é um pouco mais complicada do que a de Berlim pela prova nova-iorquina ser disputada em uma pista de rua no bairro do Brooklyn, e geralmente pistas de rua costuma provocar celeumas entre os moradores locais, que poderiam protestar e dificultar a realização de uma rodada dupla decorrente de uma mudança de última hora, apesar de que isso poderia ser resolvido com mais negociações. A F-1 infelizmente terá como melhor opção mesmo o cancelamento da corrida.
            Nestes momentos, as grandes categorias esportivas precisam esquecer momentaneamente seus ímpetos capitalistas e pensar no bem maior que farão a si mesmas e ao mundo tomando a decisão de cancelar sem maiores traumas uma de suas etapas. Mesmo que não haja todo o perigo real de uma grande epidemia, e que o vírus não seja mais mortal que várias outras doenças já conhecidas, enquanto não se conseguir ter um melhor controle da situação, e tratamento da doença, é preciso minimizar os riscos potenciais. A última coisa que precisamos é de algum tipo de atitude irresponsável que acabe por complicar as coisas, e jogar por terra o esforço realizado por muitos para conseguir termos segurança sobre como lidar e tratar a doença causada por esse novo coronavírus. E vamos lembrar que todos os eventos esportivos foram suspensos ou cancelados pelo governo chinês, de modo que o automobilismo não é o único esporte a ser afetado. O objetivo é evitar aglomerações, e potenciais transmissões do vírus a centenas, talvez milhares de pessoas.
            Dizem que o ser humano é um animal racional e inteligente... Está mais do que na hora de fazer juz a esta afirmação, em que pese sabermos que, pelos mais diversos motivos, ele costuma fazer as maiores idiotices e barbáries sem sentido. Que não façam besteira desta vez...


Luto na família Andretti: John Andretti, sobrinho de Mario Andretti, e primo de Michael Andretti, faleceu no último dia 30 de janeiro, aos 56 anos, em decorrência de um câncer no cólon, doença com a qual lutava nos últimos três anos. John era filho de Aldo Andretti, irmão gêmeo de Mario, e seguindo a tradição do pai e do tio, também fez carreira no mundo do automobilismo. Ele estreou na antiga F-Indy em 1987, defendendo a Curb Racing, permanecendo na categoria até 1994, com um total de 73 provas, onde venceu apenas uma corrida, a primeira edição do GP da Austrália, em Surfer’s Paradise, com a equipe Hall/VDS. Ainda em 1994, ele começou a disputar a divisão principal da Nascar, onde competiu por 17 anos, vencendo duas provas em 393 participações. Competiu também na Nascar XInfinity Series, e na Indy Racing League, mostrando ser um piloto extremamente versátil. Disputou 12 edições das 500 Milhas de Indianápolis, e venceu as 24 Horas de Daytona de 1989. Desde que fora diagnosticado com o câncer, o piloto passou por algumas cirurgias e tratamentos onde se esperava ter extirpado a doença, que infelizmente se mostrou bem mais resistente do que se esperava, tendo retornado e complicado a situação de John. Todos na família Andretti lamentaram sua morte, comunicada em nota oficial pela equipe Andretti da Indycar. Em seu desejo, o carro funerário com seu corpo percorreu o circuito oval do Indianapolis Motor Speedway, antes de ser levado para o velório.


Fernando Alonso estava em negociação com o time de Michael Andretti para poder disputar as 500 Milhas de Indianápolis deste ano, mas ao ser consultada, a Honda, fornecedora de motores do time na Indycar, teria vetado a participação do piloto espanhol, que durante a associação da marca nipônica com a McLaren na F-1 entre 2015 e 2017, fez inúmeras críticas ao equipamento desenvolvido pelos japoneses, que não apresentava nem performance e nem confiabilidade. Por mais que digam que Alonso pagou pela língua, a verdade é que, mesmo levando em consideração possíveis erros no projeto do carro, os japoneses apresentaram uma unidade de potência sofrível, que merecia de fato as críticas recebidas. A Honda, infelizmente, pecou pela teimosia na época, recusando-se até a receber consultoria externa para melhorar o seu projeto, o que só aceitou, e ainda assim depois de muita insistência, por parte da Ilmor. E infelizmente, tiveram que rever o seu projeto, o que elevou ainda mais o desgaste entre a fábrica japonesa e a escuderia inglesa, e Alonso também. Somente em 2018, passando a equipar a Toro Rosso, a Honda começou a acertar a mão em seu projeto, que no ano passado passou a equipar também os carros da Red Bull, conseguindo enfim algum destaque no seu retorno à F-1 na atual era híbrida. Alonso ainda procura alguma alternativa para conseguir competir na Indy500 este ano. Resta saber se irá conseguir...

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