sexta-feira, 3 de maio de 2019

SENNA, 25 ANOS

Fãs visitaram o circuito de Ímola na última quarta-feira, quando diversos atividades foram promovidas na pista onde 25 anos atrás Ayrton Senna morreu (acima). E em Interlagos, no mesmo dia, ocorreu o Senna Day, com diversas atividades lembrando do piloto, entre elas exposição de seus macacões (abaixo).

            Completou-se nesta última quarta-feira, dia 1º de maio, nada menos do que 25 anos que o mundo da Fórmula 1 perdeu um de seus maiores nomes, Ayrton Senna. Duas décadas e meia atrás, no circuito Enzo e Dino Ferrari, em Ímola, durante a disputa do Grande Prêmio de San Marino, pequeno principado encravado no meio da Itália, o piloto brasileiro liderava a corrida, quando acertou o muro externo da curva Tamburello, sofrendo graves lesões que o levaram à morte, algumas horas depois, no hospital para onde fora levado, em Bolonha.
            Foi o fim de semana mais negro da história da categoria máxima do automobilismo. Um fim de semana ruim que começou já na sexta-feira, com o violento acidente de Rubens Barrichello, da Jordan, que acabou levando o piloto para o hospital. Rubinho, apesar da violência da batida, sofreu poucos ferimentos, mas acabaria vetado para correr o GP. No sábado, ele ainda participou da transmissão do treino de classificação junto com Reginaldo Leme e Galvão Bueno, e no domingo de manhã voltaria para a Inglaterra, para descansar e se recuperar do acidente sofrido. E, curiosamente, Barrichello foi o mais sortudo dentre os pilotos acidentados naquele final de semana. No sábado mesmo, o novato Roland Ratzemberger, da igualmente novata equipe Simtek, acertou o muro de proteção da curva Villeneuve, sofrendo ferimentos que o levaram à morte. Aquilo, por si só, já era traumático: desde 1982 que a Fórmula 1 não via a morte de um piloto em atividades de fim de semana de corridas. A morte do piloto austríaco só não ganhou maior repercussão por se tratar de um novato praticamente desconhecido. Impactou, mas a vida segue. Para muitos que assistiam pela TV, foi sensação parecida. Mas, no domingo, tudo iria pelos ares, com a perda de Senna. Uma corrida que começou com confusão, com um dos carros no grid não conseguindo arrancar na largada, e sendo atingido por outro carro que veio de trás, despedaçando partes de ambos os carros, e fazendo voar pedaços deles para todos os lados, com os estilhaços a causarem ferimentos em várias pessoas próximas. Foi preciso a intervenção do Safety Car para limpar a pista, e quanto a corrida foi recomeçada, tudo parecia mais ou menos bem, até a Williams de Ayrton, liderando a prova, seguir reto na Tamburello. E aí, o mundo desabou para muita gente.
            Desnecessário repetir o ocorrido no autódromo e mundo afora naquele momento, e nas horas que se seguiram. Para os fãs do esporte, uma perda monumental. Para os brasileiros, era quase a razão de viver, torcer por um brasileiro que mostrava ao mundo que nós podíamos ser vencedores também, em um mundo no qual nosso país nunca era visto como uma nação séria. Pior que não haviam motivos injustificados para isso. Éramos descrentes de nossos políticos, de nossa economia, e quase nada nos dava algum alento frente às desilusões e más notícias vividas dia após dia. Ver Senna vencendo num esporte elitista mundial como a Fórmula 1 fazia muitos esquecerem essa realidade que vivíamos. Não que vencer na F-1 fosse algo estranho ou anormal. Émerson Fittipaldi e Nélson Piquet já haviam dado muitas alegrias ao povo torcedor com seus triunfos e títulos, mas ninguém soube projetar uma imagem tão “patriótica” e fixada ao Brasil como Senna. Seu gesto de erguer a bandeira nacional em várias de suas vitórias ajudou muito nisso, assim como a fixação da sua imagem de vencedor pela TV Globo nas transmissões, com seu principal narrador, Galvão Bueno, chegando a torcer descaradamente pelo piloto em muitas oportunidades.
Em 1994, Senna realizou o sonho de correr pela Williams, mas que acabou se tornando um pesadelo para o piloto e para seus fãs.
            Morrer liderando uma corrida, no auge da carreira, também ajudou a transformar Senna, que já era um fenômeno da velocidade e do esporte, reconhecido no mundo todo, em um mito, quase um santo, e isso teve suas boas e más consequências. Diria que a má é principalmente o sentimento de muitos torcedores, para os quais a F-1 passou a não ser mais boa como era, e do sentimento de orfandade que se abateu sobre estas pessoas. Algumas vezes, dá a impressão de que para estas pessoas Senna, se estivesse vivo, ainda estaria correndo e vencendo GPs e conquistando títulos... Mesmo que ele tenha partido agora há 25 anos atrás. E a TV Globo, por vezes, parece a maior órfã a exibir este sentimento, com muitas referências e citações a Senna durante todo este tempo, numa demonstração inequívoca de saudade daqueles tempos. Tempos que foram bons para muitos torcedores nacionais, e claro, também estrangeiros, que puderam ver um dos maiores gênios do mundo do automobilismo pilotar. Mas tempos que já ficaram no passado, e assim deveriam ser tratados. Não esquecidos, claro. Mas lembrados e recordados nos devidos momentos. E tratados com respeito e consideração, mas também com sobriedade. Como em momentos como agora. Afinal, Ayrton nos deixou há um quarto de século. Nem parece que foi há tanto tempo, mas foi. Vinte e cinco anos não é uma data corriqueira. E este tipo de data merece sim suas considerações e lembranças, como as que houve na quarta-feira, em Interlagos, e ao mesmo tempo, na Itália, em Ímola, onde o autódromo onde Senna correu pela última vez esteve com uma programação especial em memória ao piloto brasileiro, com suas portas abertas a todos que lá estiveram. Em ambos os lugares, muitas pessoas estiveram presentes, para honrar a memória do piloto, o que ele significou para seus torcedores, e chorar sua perda, como se fosse um ente querido da família que todos perderam ao mesmo tempo, naquele fatídico momento do choque na curva Tamburello.
A rivalidade com Alain Prost na McLaren ganhou ares de guerra declarada. E o piloto francês viraria o "inimigo público Nº 1" dos torcedores brasileiros.
            Uma data que também não passou esquecida para muitos daqueles que conviveram com Senna, dando suas declarações nas redes sociais sobre sua convivência com o piloto brasileiro, como jornalistas, profissionais das equipes da época, além de comentários também daqueles que nunca conheceram ou viram Ayrton ao vivo e em vida, mas o reverenciam pelo que ele foi nas pistas, como o atual campeão Lewis Hamilton, que tem em Senna seu grande ídolo e inspirador. E nenhum deles está indiferente ou desrespeitoso para com a vivência que tiveram com o tricampeão mundial de F-1, ou sua memória. Igualmente, vários sites especializados, brasileiros e internacionais, dedicaram matérias à esta data, recordando em maior ou menor grau o que foi Ayrton Senna no automobilismo mundial, com inúmeros destes profissionais do meio dissertando seus pontos de vista sobre o piloto.
            A morte de Senna e Ratzemberger, este quase esquecido pelo azar de ter falecido no dia anterior ao brasileiro, ao menos gerou um grande legado, que foi o aumento das condições de segurança da F-1, com novos padrões e exigências que se estenderam a inúmeras outras categorias, ajudando a tornar pistas e bólidos muito mais seguros. Desde o falecimento de Ayrton, a F-1 perdeu apenas um piloto nestes últimos 25 anos: Jules Bianchi, devido a um acidente sofrido em Suzuka, quando seu carro atingiu um trator de serviço que retirava um carro parado próximo à pista. Mais do que uma fatalidade, pelo azar que o piloto da equipe Marussia teve, foi uma recordação de que o automobilismo é ainda um esporte perigoso. Como era também na época de Senna. Mas os acidentes que os pilotos sofriam tinham tido uma sorte tremenda de não gerar falecimentos, por mais violentos que fossem. Os carros não eram inseguros, mas precisavam de aperfeiçoamentos em vários pontos, para serem muito mais eficazes na proteção dos pilotos. Esta priorização da segurança segue firme até hoje, ainda que em nome deste objetivo a F-1 exagere em certos momentos além do que precisaria ser feito, como se todos na pista parecessem um bando de incapazes, deixando muitos torcedores desapontados pelo excesso de zelo demonstrado.
Apesar de conquistando suas primeiras poles e vitórias com a lendário Lotus preta e dourada (acima), foi com a McLaren e seu icônico visual vermelho e branco que Senna atingiu o cume de sua carreira, onde conquistou seus três títulos, além de dois vice-campeonatos (abaixo).
            Para o Brasil, ter de encarar a realidade, sem ter mais o alento de ver um compatriota vencendo mundo afora, foi muito duro. A única compensação foi o futebol, onde depois de 24 anos, voltávamos a ser campeões mundiais, na Copa dos Estados Unidos, naquele mesmo ano, e chegando ao pentacampeonato em 2002. Tivemos algumas alegrias no automobilismo nesse período também, com as vitórias de nossos pilotos na antiga F-Indy, onde nosso pioneiro campeão, Émerson Fittipaldi, abriu as portas para uma nova geração de pilotos que, sem conseguir chegar à F-1, foi exibir seu talento nas terras do Tio Sam. Mas a mentalidade da grande maioria, em parte moldada pela Globo, só enxergava a F-1, e lá, a mudança foi brutal: de protagonistas, viramos apenas coadjuvantes. Para alguns pilotos, ficou tudo pior do que já era naturalmente, com todos exigindo o surgimento de um “novo” Senna para nos fazer ficar novamente no topo da ribalta, algo que nunca mais aconteceu. Rubens Barrichello e Felipe Massa eram apenas bons, e mesmo vencendo algumas corridas, e chegando a dar algumas alegrias momentâneas, nunca foram “novos” Sennas para a maioria, que exigia vitória e títulos, por vezes mesmo quando eles não tinham condições técnicas para tanto. Pior: eles passaram a ser tratados como “vendidos” por cumprirem ordens de equipe destinadas a favorecer seus parceiros quando estavam na Ferrari, o que só aumentou a desilusão para com eles. Sempre vinha a discussão sobre isso: “Senna jamais aceitaria ordens de equipe!”, bradavam.
            Outra coisa que nunca arrefeceu foi a rivalidade Senna X Piquet, com muitos torcedores de ambos os pilotos a defenestrar uns aos outros, nas inúmeras discussões sobre quem foi maior ou melhor entre eles. Infelizmente, por ambos terem personalidades fortes, nunca foram amigos, como muitos desejavam. E até o contrário: para apimentar ainda mais a situação, era preciso haver rivalidade, e não apenas com Alain Prost, que se tornaria o “inimigo nacional público Nº 1” do Brasil a partir de 1989. E Nélson Piquet, que não ligava a mínima para marketing, também ajudou a incendiar essa disputa pela preferência do público. Seu estilo franco e sincero, e por vezes polêmico, ao passo que Senna era um pouco mais preocupado com sua imagem, sabendo ter um pouco mais de charme junto ao público, era um grande revés para nosso primeiro tricampeão. Não era difícil o público passar a amar mais Ayrton, cuja carreira a bordo da McLaren atingia as alturas na F-1. Já Piquet, com um carro muito ruim em 1988 e 1989, perdeu qualquer chance de igualar a disputa pela preferência da torcida, que até 1987 pendia a seu favor, pela conquista do tricampeonato. Piquet só voltaria a vencer corridas no fim de 1990, mas sem conseguir recuperar seu prestígio junto à imensa maioria da torcida, para a qual só existia Senna e nada mais, contra o “inimigo declarado” Prost, e qualquer um que se colocasse no seu caminho, embora Nigel Mansell, que superou o brasileiro em 1992, nunca tenha sido eleito um adversário com tanto entusiasmo (ou poderia se dizer “ódio” dos torcedores). Talvez o fato de saberem que a Williams tinha um carro imbatível ajudasse o inglês a não ser tão visado, mas bastou Alain Prost ser confirmado em 1993, e ainda por cima, vetado a contratação de Senna, para o francês ser candidato a ser queimado na fogueira em praça pública pelos torcedores, que esqueciam que seu ídolo já tinha também vetado a contratação de piloto quando estava na Lotus.
            Isso acende a preocupação de Senna ser visto quase como um super-homem, um santo, um ser perfeito, sem defeitos, o que não é verdade. O brasileiro era por vezes arrogante e prepotente, e seus chiliques em 1992, quando exigia para si ter o direito de pilotar o melhor carro da categoria, como se fosse uma afronta guiar um carro menos competitivo, nada ficava a dever às queixas ouvidas em tempos recentes por Fernando Alonso, em situação similar, sem conseguir disputar títulos. E Senna também cometia erros, mesmo que com o passar do tempo fosse ficando cada vez mais afiado na pilotagem, como em 1993. É preciso descer um pouco para a realidade do que foi realmente Ayrton Senna: um piloto fantástico, e um dos maiores nomes da F-1 em todos os tempos. Um grande ídolo nacional, e que conseguiu fãs e respeito no mundo inteiro. Que infelizmente teve um destino trágico. E que, em vida, teve seu lado gentil e carinhoso, e solidário, tendo ajudado várias instituições, algo que mantinha com total discrição, para não gerar picuinhas e fofocas sobre seus gestos, no que tinha muita razão de fazer. O Instituto Ayrton Senna, desde sua criação, até os dias atuais, procura tentar seguir os seus preceitos, usando os direitos de sua imagem para diversos fins, algo que deve ser visto com o devido respeito, mas sem endeusar a memória de Senna, como muitos fazem.
Ídolo também no Japão, Ayrton ganhou até uma série de mangá sobre a temporada de 1991.
            E é preciso, sobretudo, deixar Senna descansar também. Há menções até demasiadas sobre ele, especialmente por parte da Globo, que parece teimar em querer manter sempre seu nome em evidência. Há razões para isso, a maior parte delas comercial, já que sem um brasileiro cativando os torcedores, a audiência das corridas estancou, nunca mais atingindo os índices que se via quando Ayrton disputava vitórias e o título. Mas é uma história que já passou. Algo que deve ser recordado e lembrado, sim, mas não com exagero, e aquele estilo típico de ufanismo que a emissora já fez virar praxe em suas transmissões esportivas, e não apenas me referindo ao automobilismo. A imagem de Ayrton Senna deve ser vista à luz da realidade, com seus bons e maus momentos, em um relato objetivo e imparcial, que mostre tudo o que ele realizou, bem como os períodos que possam ser questionáveis em sua conduta e feitos. Não se trata de demonizar o piloto, como alguns alegam, nem de diminui-lo, mas apenas de apresentar os fatos reais ocorridos. Senna foi um ser humano como todos nós, com suas virtudes e defeitos, que devem ser devidamente relatados.
            Algo que parece ser meio complicado atualmente, em especial pelo exponencial alcance da internet e redes sociais, onde certas discussões facilmente descambam para guerras verbais e brigas virtuais que não ajudam nem um pouco a manter um saudável debate sobre os mais variados assuntos. E nisso também se enquadra a memória de Ayrton Senna, que para alguns deve ser glorificada e santificada até, mesmo partindo de pessoas que nunca o viram pilotar, ou nasceram após sua morte. As chamadas “viúvas” de Ayrton Senna muitas vezes transformam simples e racionais questionamentos sobre alguns atos não tão virtuosos a respeito do piloto em linchamentos virtuais, numa defesa que em certos momentos parece beirar o fanatismo. Não é algo generalizado, felizmente. Mas é tremendamente dispensável, por que tal atitude apenas vilipendia a memória de Ayrton, que não merece este tipo de torcida ardorosa, e certamente não a aceitaria, ainda estivesse entre nós.
            Ayrton continua vivo na memória de todos. E assim deve ficar. Sem exageros ou glorificações demasiadas. Apenas lembrado, e respeitado. É o que melhor podemos fazer para honrar sua memória, e todo o legado que seu falecimento gerou de positivo para o mundo do esporte a motor.


Não há muito o que se dizer a respeito da corrida em Baku este ano da Fórmula 1. Apenas resumindo o básico: a Mercedes fez mais uma dobradinha, agora com Valtteri Bottas à frente de Lewis Hamilton; e a Ferrari acabou decepcionando novamente. Para alguns, o time vermelho já jogou 2019 fora, e seria melhor pensar já em 2020... Exagero, claro, mas que representa a frustração com o que o time italiano tem se apresentado até agora na competição...

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