sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

CORREÇÕES NECESSÁRIAS NA F-E

A F-E deu a largada para seu novo campeonato com os novos carros Gen2, mas persistiu em alguns erros batidos nas punições a vários pilotos após a classificação para a corrida e durante a prova.

            A Formula-E deu início ao seu 5º campeonato na Arábia Saudita, e o resultado da nova geração de carros foi mais do que bem-sucedido, mostrando que a tecnologia dos carros elétricos tem tudo para continuar evoluindo, e tendo na categoria uma boa vitrine para expor essa evolução, aliada a um campeonato que tem conseguido se mostrar bem disputado entre vários pilotos e equipes, e que tem tudo para continuar assim. E foi muito legal ver a BMW, que acabou de chegar oficialmente à competição, associada ao time de Michael Andretti, vencer logo na sua estréia, ajudando a apimentar a disputa entre as marcas presentes na categoria.
            Mas, nem tudo são flores, e a F-E precisa aparar algumas arestas do novo regulamento, e corrigir algumas posturas que já vem sendo cometidas, e que precisam também mudar, sob pena de comprometer parte da credibilidade do certame.
            Confusões à parte do dia da competição, provocadas pela chuva, que resolveu aparecer no deserto bem no dia da corrida, e que bagunçou a programação inicial, as punições do grid de largada pegam muito mal para quem quer ver tudo certo e arrumado. A desculpa de que os pilotos usaram mais potência do que o permitido é ruim, e se isso vem acontecendo, é preciso tomar providências para melhorar os programas de gerenciamento de energia, para que ninguém extrapole o limite estabelecido no treino. A opção seria eliminar esse limite, mas aí poderia desnivelar a performance, com cada fabricante iniciando uma corrida de performance que poderia descambar para o descontrole de gastos, algo que a direção da F-E quer evitar a todo custo, e que tem sua justificativa para manter o campeonato acessível a todos. O controle de energia precisa ser mais eficaz, e punições sempre são ruins porque acabam muitas vezes castigando o piloto em alguns parâmetros que às vezes eles não tem controle da situação. E, afinal, já é o 5º campeonato, e este tipo de coisa não deveria mais acontecer
            Da mesma forma, as punições vistas durante o desenrolar da corrida, que vieram por atacado, e sem maiores esclarecimentos durante a transmissão, onde eram apenas declaradas como “infração técnica”, deixam um clima ruim no ar, parecendo que são tomadas meio que aleatoriamente, sem explicar direito o que acontece. Até mesmo os pilotos ficaram sem saber direito o que estava acontecendo, quando lhes foi comunicada a punição, a meio da prova, o que arruinou os esforços de alguns. Mas pior é ver depois algumas das justificativas, e algumas são esdrúxulas.
            Recuperação de energia além do permitido? Ora vamos, se o sistema permite recuperar mais energia nas freadas do que o esperado, isso deveria ser comemorado como avanço da evolução do sistema, que em tese não deveria ficar “estático”. Novamente, a justificativa do controle de gastos vem à tona, mas alguns parâmetros deveriam ser mais flexíveis, estabelecendo, por exemplo, uma faixa de percentual de recuperação, com tolerância de ultrapassagem do teto máximo. Se algum time consegue um ajuste de software que permite que seu sistema recupere mais força, isso deveria ser permitido, como prêmio por sua maior competência, e não apenas nivelar por baixo os limites. Regras mais claras, e sem tanta frescura, ajudariam as corridas a serem mais objetivas e descomplicadas aos olhos do público, que quer ver disputa e duelos na pista. Felipe Massa, por exemplo, acabou recebendo até punição pelo uso “irregular” do fanboost, outro recurso que é bem legal, mas precisaria ser mais simples de se usar.
Antonio Félix da Costa marcou a pole-position e venceu a corrida na estréia oficial da BMW na competição de carros monopostos elétricos.
            Quanto ao novo “modo ataque”, tudo foi meio confuso nesta primeira corrida, mas a própria direção da categoria e a FIA deveriam ser mais práticos e ágeis na explicação do uso do novo recurso, que já está sendo debatido para ser melhorado, em especial a respeito do aumento da potência disponibilizada, já que os pilotos consideraram que os 25 Kw adicionais permitidos se mostraram insuficientes para o que esperavam poder fazer. Por mais que os organizadores queiram divulgar os detalhes de uso do sistema somente pouco antes da largada, para evitar favorecer algum time, é preciso estudar direito como seu uso será feito, para pelo menos na hora da divulgação, ninguém ter dúvidas. Espero ver isso solucionado nas próximas corridas. Os pilotos sugerem que a carga extra chegue aos 250 Kw, a potência máxima, liberada apenas na classificação. Acho viável, desde que se estabeleçam regras claras e objetivas com relação a seu uso. E é interessante também saber que essa potência “extra” não vem de graça: como a carga da bateria continua sendo a mesma, o uso dessa energia extra pode fazer falta lá na frente da prova.
            Um ponto interessante foi ver a autonomia dos novos carros e baterias: todo mundo praticamente recebeu a bandeirada com cerca de 10% ainda de carga disponível, mostrando como os novos sistemas evoluíram em relação aos antigos. Pode ser que, em se tratando da primeira prova com os novos sistemas, todo mundo foi um pouco mais prudente e conservador no uso de suas energias, tentando evitar ficar sem carga pelo meio do caminho. E a bandeira amarela, decorrente da batida de José Maria Lopez também ajudou todo mundo a economizar energia. Como a prova foi disputada em uma pista totalmente nova, não deu para avaliar ou comparar a nova velocidade dos carros e sua autonomia, o que só poderemos ver na etapa de Marrakesh, em janeiro. Mas o novo formato de duração das provas já merece ser revisto. Além de ter deixado as corridas mais curtas, em caso de intervenção do Safety Car, acaba-se comprometendo um bom período da corrida, prejudicando a competição, o que era menos impactante no formato antigo, onde as voltas ainda eram percorridas. A folga vista ao fim da prova, com todo mundo ainda tendo bastante carga em seus carros sugere que as provas podem muito bem voltar a ser disputadas por voltas, e não por tempo. Creio que isso certamente deverá ser debatido pela direção da F-E, após analisarem os resultados das próximas corridas, vendo o percentual de energia que todos ainda tiverem em seus carros na bandeirada final. Do contrário, o desafio de gerenciamento de energia torna-se inútil, porque todo mundo sabe que não ficará sem carga durante a prova.
A corrida teve várias disputas entre os pilotos, que ainda estão tentando se adaptar às novas regras e recursos do "Modo Ataque".
            Algo que precisa mudar são os circuitos. A proposta de se manter as pistas de rua, e de a categoria ficar mais próxima de seu público não é ruim, mas alguns traçados são demasiado travados e estreitos e alguns trechos, e isso estrangula o desenvolvimento da corrida. Com os carros agora sendo muito mais velozes, será preciso ver também se os trechos de retas se mostrarão suficientes para permitirem ultrapassagens, já que o tempo para percorrer estes espaços cairá com a nova velocidade dos carros. Caso contrário, poderemos acabar criando procissões que em nada empolgarão os fãs de corridas, já que os traçados não oferecerão espaço hábil para manobras sem alto grau de risco. E já expliquei na coluna anterior que, como agora cada piloto possui apenas um carro, arriscar certas manobras no final de semana poderá custar caro se o piloto cometer um erro, ou tiver algum percalço no meio do caminho.
            Com relação à disputa na pista, as punições aplicadas acabaram interferindo nas disputas, e isso não agradou aos pilotos, e muito menos ao público. Foi positivo ver a BMW, um fabricante recém-chegado, ganhar sua primeira prova, mas é bom que não se esqueça que a corrida tinha tudo para ver o atual campeão, Jean-Éric Vergne, receber a bandeirada em primeiro lugar. A Techeetah, agora com o trem de força da DS-Citroen, em substituição ao equipamento da Renault, mostrou-se muito competitiva, com Vergne a andar sempre muito forte, o que também foi visto com Andre Lotterer, que terminou anotando a volta mais rápida, mostrando que a escuderia chinesa, ao menos nesta primeira prova, era o time a ser batido, e que só não venceu pela punição dada a Vergne. Não é desmerecer o trabalho competente de Antonio Félix da Costa, que arrebatou a pole-position e guiou muito bem na prova. A e.Dams também andou firme, com Sébastien Buemi e seu novo parceiro Oliver Rowland terminando em 6º e 7º, trazendo os primeiros resultados para a Nissan na competição.
            Jerôme D’Ambrosio foi outro que fez uma grande corrida, levando a Mahindra ao pódio, na 3ª posição, ainda que sem conseguir se intrometer na disputa entre Félix e Jean-Éric, mas travando uma boa disputa de posição com Mith Evans, que novamente levou a Jaguar perto do pódio, e conseguiu se defender das investidas finais de Lotterer após a punição dada ao alemão. Lucas Di Grassi, punido na classificação, largou em 18º e conseguiu chegar em 9º, em uma corrida de recuperação que o time da Audi não foi tão eficiente como se esperava, já que ele chegou bem atrás de Daniel Abt, em 9º lugar, uma vez que o parceiro de time largou a meio do grid e não conseguiu avançar tanto quando se imaginava. Nelsinho Piquet fechou a zona de pontuação, em uma corrida complicada onde o piloto não conseguiu aproveitar as oportunidades também como esperava, e sendo novamente batido pelo colega de escuderia Mith Evans. Felipe Massa até que começou bem a prova, mas depois que tomou a punição, despencou para a parte de trás do grid e lá ficou, com sua corrida completamente comprometida.
Felipe Massa, estreando na categoria, vinha fazendo uma boa corrida, até sofrer a punição que o jogou lá para trás.
            Quem também não conseguiu andar como se esperava foi a Virgin, com Sam Bird e Robert Frijns também sendo punidos com a perda de posições no grid, e lutando para fazer corridas de recuperação que não geraram os resultados esperados. E Dragon e a novata HWA também não conseguiram exibir boas performances. Ainda é cedo para fazer um panorama da competição, até porque os treinos livres e a classificação acabaram atrapalhados pela chuva que resolveu cair justo no dia da competição. Teremos de esperar pela corrida de Marrakesh para ver o que cada time pode realmente render, e também onde poderemos fazer uma análise da nova performance dos novos carros e sistemas de força em comparação com o antigo equipamento.
            A F-E atravessa um bom momento fora das pistas. Já tem 11 escuderias, e 22 pilotos, número que no próximo campeonato deverá ser ampliado para 12 times e 24 pilotos, com a chegada da Porsche, e transformação da HWA no time oficial da Mercedes. Em número de participantes, está melhor do que a F-1, que patina nos 10 times e 20 pilotos, e não consegue ir além disso. Já tem corridas mais interessantes que a categoria máxima do automobilismo, pelo menos no que tange a disputa entre pilotos e escuderias na pista. Precisa agora corrigir os deslizes que vem cometendo, e ser mais transparente nas suas normas quando o assunto são infrações técnicas e limites de uso de energia ao longo da corrida, para que o público não fique com uma impressão de improviso e punições que por vezes parecem vir apenas para apimentar as disputas na pista. A direção da F-E precisa ser mais profissional e menos bagunçada. Parecer um campeonato de várzea não combina com uma categoria que se propõe internacional, e se tornou a queridinha dos grandes fabricantes de automóveis do mundo. Pega muito mal você ver um resultado na pista, e algumas horas depois, tudo acabar mudando, por conta de algumas punições inesperadas, e principalmente, mal explicadas. A categoria bem crescendo em número de público, em que pese muitos ainda serem críticos ferozes dos carros elétricos, considerando-os lentos e, pasmem, criticando principalmente por não fazerem o barulho tradicional de um carro de competição, como se fosse obrigatório um veículo desses deixar todo mundo por perto surdo com o seu ronco de funcionamento. Se já é complicado convencer estes fãs que fazem críticas ridículas sobre a competição, tudo o que não se pode permitir é surgirem críticas realmente válidas e coerentes, como o que estamos vendo, infelizmente.
            Não é difícil corrigirem estes erros, alguns que vem sendo até crônicos. Mas é preciso vontade e atitude. Que acertem estes detalhes, e possam enfim atingir a totalidade de seu potencial, como categoria esportiva e grande evento que se propõe a ser, bem mais acessível ao público do que a F-1...


O novo campeonato da F-E mal começou, mas já começaram a sair definições para o grid para a próxima temporada. Uma delas é a posição do atual campeão, Jean-Éric Vergne, que renovou seu contrato com a Techeetah, e garantiu sua permanência no time por mais alguns anos, embora não tenha esclarecido a duração do acordo, mencionando apenas que ele é de renovação plurianual. E, a julgar pelo desempenho do francês na primeira corrida da 5ª temporada, ele tem todos os motivos do mundo para permanecer onde está, já que a Techeetah parece ter conseguido manter o seu nível de competitividade, mesmo após a troca do seu trem de força, passando a usar o equipamento da DS-Citroen, em substituição ao da Renault. Claro que tem também a nova posição da escuderia, que era cliente da marca francesa, que tinha na e.Dams sua equipe de fábrica; e que agora é o time da fábrica da DS. O comunicado fecha portas para outros pilotos que poderiam ter interesse em tentar competir pela Techeetah nas próximas temporadas. E a julgar pelo desempenho de Andre Lotterer, que vem andando também muito forte, eles não deverão ter interesse em substituir seus pilotos tão cedo...
De contrato renovado com a Techeetah, Jean-Éric Vergne teria vencido a corrida na Arábia Saudita se não tivesse sido punido. O francês ainda foi o 2º colocado, e mostra que lutará pelo bicampeonato na nova temporada.


A Porsche é outra fábrica que já anunciou o seu ingresso na 6ª temporada da F-E, e enquanto não inicia seus testes de pista, pelo menos já definiu um de seus pilotos: Neel Jani, que foi campeão do Mundial de Endurance em 2016 pelo time de fábrica da Porsche, inclusive tendo vencido as 24 Horas de Le Mans do mesmo ano, será um dos titulares da nova escuderia que iniciará disputa na próxima temporada da competição de carros elétricos. Fica agora a dúvida sobre quem será o seu companheiro de time, e uma das especulações aponta para Brendon Hartley, que disputou a temporada 2018 da F-1 na equipe Toro Rosso e acabou dispensado por eles. Mas, até o presente momento, a marca alemã não se pronunciou a respeito dessa possibilidade, pelo menos, não oficialmente. Com a entrada da Porsche, e o ingresso da Mercedes, a F-E terá a disputa de nada menos do que 4 fábricas alemãs na competição. Já temos a Audi, e a BMW acabou de estrear oficialmente, portanto, e teremos Porsche e Mercedes na 6ª temporada.


Com esta coluna, fecho a série deste ano, com as tradicionais 50 colunas produzidas anualmente. É hora de um pequeno descanso, para curtir as festividades de Natal e Ano Novo. Portanto, nos vemos novamente no início de 2019, no que espero que seja um ano muito mais proveitoso e cheio de emoções do que foi 2018. Até mais, e cuidem-se todos!

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