sexta-feira, 28 de junho de 2013

WILLIAMS – 600 GPS



O primeiro carro fabricando por Frank Williams na F-1: o modelo FW06, de 1978, com Alan Jones ao volante.

            Chegamos a Silverstone para a disputa do Grande Prêmio da Inglaterra de Fórmula 1, e um dos assuntos mais comentados no paddock, fora da disputa na pista, é a comemoração da equipe Williams, que vai completar 600 corridas disputadas na categoria máxima do automobilismo. Há uma certa discussão a respeito deste número, pois para alguns, o time disputará a 600ª corrida na Alemanha, na semana que vem. Mas preferiu fazer a festa aqui, na Inglaterra, onde afinal tem sua sede, perto de casa. Não se pode culpá-los por isso, é até legal. Mas para alguns, o time já passou as 600 corridas. Alguns não contam o GP dos EUA de 2005, quando a Williams não largou para a corrida, como os demais competidores que usavam os pneus Michelin, e por isso, a prova não é contabilizada. Fora isso, no site GP Guide (www.gpguide.com), o time tem 611 provas contabilizadas, com estréia em 1975. Mas foi apenas em 1978 que Frank Williams estreou sua nova denominação de competição, a Williams Grand Prix Engineering.
            Independente do número de corridas efetivamente disputado, a Williams é hoje a terceira escuderia mais antiga da história da F-1, ficando atrás apenas da Ferrari e da McLaren, e sendo destas a única em que seu fundador ainda está presente. E, embora a Williams como tal exista desde 1978, Frank Williams já tinha uma boa história antes disso. Sua estréia havia sido ainda em 1969, com a equipe Frank Williams Racing, com a qual disputou seu primeiro campeonato. Foram dias tremendamente difíceis, em uma F-1 que, apesar de ainda estar em seu período “romântico”, já começava a sofrer a escalada de custos, que aumentariam exponencialmente a partir dos anos 1980 e 1990. Frank usava carros construídos por outros times, prática comum naqueles tempos.
            Não foram poucos os momentos em que Frank teve de fechar negócios e resolver problemas usando um telefone público, na prática seu “escritório” na época das vacas magras. Para manter um pouco de dignidade, consta que pelo menos uma vez por semana ia a um hotel para tomar um banho decente e se apresentar com mais desenvoltura. Durante os anos 1970, Williams foi aumentando seus contatos no meio automobilístico, e em 1978, depois de muito esforço, conseguia colocar na pista o primeiro carro construído inteiramente por ele, o FW06.
            Tendo conseguido convencer os árabes a entrar como patrocinadores de seu time, não demorou para os resultados surgirem: a primeira pole e vitória vieram no Grande Prêmio de 1979, com Clay Regazzoni. E em 1980, Alan Jones conquistaria o primeiro campeonato do time, tanto no campeonato de pilotos quanto de construtores. Um novo título seria conquistado em 1982 com Keke Rosberg. Os motores Ford, utilizados pela maioria dos times até então, estava perdendo a disputa para os novos motores turbo. Frank então, associou-se aos japoneses da Honda para fornecimento de motores turbo, e seu time voltaria ao topo da F-1. de um time modesto no início dos anos 1970, Frank Williams agora comandava um dos melhores times da categoria máxima do automobilismo, uma grande e longa jornada, feita com muito esforço e sacrifício, mas que tinha finalmente rendido frutos.
O modelo FW07B daria a Frank Williams seu primeiro título, em 1980, com Alan Jones.
            O momento de maior supremacia de seu time, nos anos 1980, também marcaram uma mudança drástica em sua vida: no início de 1986, voltando de um teste em uma estrada francesa, sofreu um violento acidente que o deixou permanentemente em uma cadeira de rodas, em uma recuperação que levou um bom tempo. Se na pista seus carros naquele ano, equipados com os fantásticos motores turbo da Honda, detonavam os adversários, Frank lutou bravamente no hospital para que sua vida não se encerrasse ali. A briga fraticida entre seus pilotos em 1986 acabou deixando o título para Alain Prost, mas em 1987 a Williams não daria chance à concorrência, vencendo 9 corridas e conquistando o título com o brasileiro Nélson Piquet. Mas era o fim da associação com a Honda, que foi para a equipe McLaren, enquanto Piquet, seu campeão, rumou para a Lotus.
Nélson Piquet ao volante do FW11: título em 1987, e dois anos de disputas ferrenhas dentro da escuderia com Nigel Mansell.
            Como se esperava, 1988 foi um ano difícil. A saída da Honda fez a Williams perder sua grande força, e o raquítico motor Judd proporcionou um ano tenebroso, cheio de abandonos, onde só se salvaram 2 pódios de Nigel Mansell, que ao fim da temporada, foi para a Ferrari. Mas para 1989, uma nova era se iniciava, em parceria com a Renault, que no primeiro ano da nova era de motores aspirados, já fez o time voltar, ainda que paulatinamente, às primeiras colocações, com 2 vitórias, resultado repetido em 1990.
 
Nigel Mansell e seu famoso "Red Five" no modelo FW14B, campeões em 1992, e considerado por muitos o melhor carro já feito pela Williams.
          
No ano seguinte, Nigel Mansell retornou ao time, e com um carro projetado pela nova estrela das pranchetas, o inglês Adrian Newey, o time voltaria a ser uma força a ser respeitável e temida. Mansell perdeu o título de 1991 para Ayrton Senna e a McLaren, mas a evolução do modelo FW14 para 1992 colocaria a categoria de joelhos novamente, com Mansell conquistando seu tão sonhado título, e Riccardo Patrese assegurando o vice-campeonato com 10 vitórias no campeonato. Para 1993, Alain Prost manteve a hegemonia da equipe, conquistando mais um título. No ano seguinte, entretanto, o time sofreria seu maior trauma: a morte de Ayrton Senna, finalmente piloto da escuderia, a quem Frank havia oferecido o primeiro teste com um carro de F-1 praticamente 10 anos antes. A escuderia conseguiu se reencontrar para lutar pelo título da temporada, mas ficou com o vice de pilotos. No ano seguinte, o time foi novamente vice-campeão em pilotos, com Damon Hill, então principal piloto da equipe, que em 1996, aproveitando-se do excelente carro que tinha, finalmente veio a ser campeão, situação que seria repetida em 1997 por Jacques Villeneuve, que conquistaria neste ano o último título da escuderia.
Jacques Villeneuve conquistou o último título da Williams em 1997 com o modelo FW19.
            Para 1998, o time tinha sofrido duas perdas consideráveis: a Renault havia saído da categoria, e o time, perdido o projetista Adrian Newey para a McLaren. Até iniciar uma nova parceria, agora com a BMW, teve altos e baixos, mas soube manter-se firme. Em 2001, retornou às poles e vitórias, mas sem exercer um domínio como nos anos 1980 e 1990. A situação perdurou até 2004, quando Juan Pablo Montoya conquistou o último triunfo do time com os motores alemães, que deixariam o time no ano seguinte.
            A BMW queria ser dona de um time, e Frank, totalmente contrário a vender a escuderia, desentendeu-se com os bávaros. Ao fim de 2005, a Williams perdia seu principal apoio de peso, e ficava sem uma parceria firme para os próximos anos no quesito motor. Em 2006, virou-se com os Cosworths, e em 2007, tornou-se equipe cliente da Toyota, usando os motores nipônicos por 3 temporadas. Em 2010, voltou aos Cosworths, abandonados no ano passado pelos Renault, que a partir do ano que vem, cederão lugar aos novos Mercedes turbo. O desempenho do time, desde o fim da parceria com a BMW, só foi caindo após 2007, quando ficaram ainda em 4° lugar no campeonato de construtores. Em 2011, o ano foi pífio: apenas 5 pontos conquistados, e o 9° lugar na competição. No ano passado, o time deu renovadas esperanças de voltar a crescer, e num lance incrível e até inesperado, voltou a vencer, com Pastor Maldonado, no GP da Espanha, com uma performance que lembrava os bons tempos. Este ano, contudo, o time voltou ao fundo do pelotão, e não conseguiu marcar um ponto sequer até agora no campeonato. E pelo andamento do carro, marcar ponto já será uma tarefa árdua, pois o modelo FW35 não tem demonstrado rendimento, por mais que seus pilotos se esforcem.
            No início de sua jornada como dono de equipe, a perda de Piers Courage, que era seu piloto e grande amigo, em um acidente com um carro preparado por Frank em Zandvoort, em 1970, deixou Williams extremamente triste e traumatizado com o ocorrido. Por aí, o futuro construtor de carros de F-1 nunca mais teria um relacionamento próximo a futuros pilotos e/ou funcionários de seu time, exceção a Patrick Head, que desde que se uniram em meados da década de 1970, tornaram-se a dupla inseparável que impeliria o time pelas décadas seguintes. A perda de Ayrton Senna, em 1994, produziu trauma similar, embora neste caso, o pouco tempo de convivência de Williams com o brasileiro tenha contribuído para minimizar o novo trauma, que mesmo assim foi forte, por ver outro piloto morrer ao volante de um de seus carros.
Frank Williams, quando ainda não estava confinado em uma cadeira de rodas, e Ayrton Senna, em 1983. Ayrton teve sua primeira experiência com um F-1 com Frank, mas só mais de 10 anos depois ele guiaria para a Williams, onde infelizmente faleceria.
            Neste fim de semana, o time, mesmo vivendo seu pior momento em muitos anos, em termos de resultados, pretende manter o clima festivo pela data, e para tanto, vai estampar um visual personalizado nos carros, com os nomes de todos os seus funcionários, além do número 600 ilustrando os carros. E apesar das vacas magras que o time vive nos dias de hoje, as estatísticas da escuderia ainda são muito respeitáveis, tendo até o momento 114 vitórias, 127 pole positions e 131 voltas mais rápidas. Além de Nélson Piquet e Ayrton Senna, Rubens Barrichello, Bruno Senna, e José Carlos Pace foram outros brasileiros que entraram nas provas da F-1 pelo time da Williams. O “Môco” esteve presente quando a Williams ainda corria com carros comprados. E, no ano passado, Bruno Senna foi nosso último representante a pilotar para a escuderia.
            Há de se admirar a persistência de Frank Williams, que aos 71 anos, e preso a uma cadeira de rodas, continua a gerir sua escuderia, sendo na prática o último dos “garagistas” a se manter firme na categoria em todos os GPs. Há alguns anos, Ron Dennis, que dividia tal condição com Frank, afastou-se da direção da equipe McLaren, designando Martin Withmarsh para comandar o time, e de lá para cá, Ron só aparece esporadicamente às corridas. Portanto, não se pode deixar de prestar reverência ao velho Frank por manter viva sua grande paixão pelas corridas. Verdade que nos últimos tempos Frank delegou parte das tarefas de gestão da escuderia a outras pessoas, como Adam Parr, Toto Wolf, e mais recentemente, sua filha Claire Williams assumiu função de direção no time, mas o velho Frank está sempre lá, lúcido, acompanhando tudo com olhos atentos e mantendo-se firme na sua paixão tanto quanto possível. É a sua vida, e isso há de ser respeitado. Mesmo seu parceiro de longa data, Patrick Head, já deixou de ir a todas as provas, assumindo outras funções e preparando sua saída. Mas Williams, assim como aconteceu com Enzo Ferrari e Colin Chapman, só deixarão a competição de fato quando deixarem esta vida, podem apostar.
 
Patrick Head (de pé) e Frank Williams: de um início modesto até se tornar uma das mais poderosas escuderias da F-1.
          
É verdade que, em sua longa jornada, Frank Williams já cometeu vários erros. Para muitos, sua teimosia ajudou a deixar o time na atual situação, tendo de aceitar pilotos pagantes para manter a escuderia, atitude bem diferente de quando simplesmente despedia seus pilotos por pedirem aumento, mesmo que eles fossem campeões pela equipe. Nessa toada, e por outros motivos, a Williams perdeu nomes do calibre de Keke Rosberg, Nélson Piquet, Nigel Mansell, e Damon Hill, entre outros. Sempre colocando seu time acima de tudo e de todos, Williams acabou deixando vários talentos escaparem para a concorrência. Eram tempos de fartura, que foram aos poucos minguando, enquanto Williams mantinha sempre seus velhos hábitos, e tentava se manter independente de todos. Era sua opção, mas ele poderia ter sido um pouco mais flexível, e quem sabe, poderia ter evitado algumas decisões equivocadas. E pode ser que a escuderia estivesse melhor do que se apresenta hoje. Mas, de fora, é sempre fácil falar.
            O futuro da escuderia parece nebuloso. O atual campeonato é um fracasso para o time, que já começa a se voltar para 2014, quando terá novo motor e novos desafios técnicos. Mas o principal desafio é conseguir patrocínio próprio, para não depender das verbas trazidas por seus pilotos. Maldonado, insatisfeito com o desempenho do carro, pode ir para outro time, e se ele sair, leva a PDVSA junto, que hoje praticamente sustenta todo o time. Valtteri Bottas trouxe alguma verba, mas não chega ao valor do aporte do venezuelano. E vale lembrar que, embora o time tenha conseguido manter as finanças relativamente equilibradas, isso não quer dizer que não esteja com os cintos apertados. E sem dinheiro, é difícil conseguir competir de forma decente na F-1 de hoje.
            Difícil dizer o que o futuro reserva para a Williams. Que possa continuar competindo, e recuperar seu status de grande equipe, e não definhar lentamente como aconteceu com a Tyrrel. E quem sabe o time ainda possa comemorar outras datas como a deste número expressivo de GPs disputados...

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