sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

BARRICHELLO BICAMPEÃO DA STOCK

Rubens Barrichello comemora a conquista do título da Stock Car 2022, seu segundo título na categoria.

            A temporada do automobilismo nacional encerrou-se no último domingo, e vimos a decisão da Stock Car Brasil, a maior categoria de competições do país, decidir o título em sua derradeira etapa, no melhor palco de todos, a pista de Interlagos. Quatro pilotos chegaram ao circuito paulistano com chances de título, mostrando a grande competitividade que foi a temporada da categoria nacional, e eis que no final deu Rubens Barrichello, que aos 50 anos de idade, chegou ao seu segundo título na Stock, tendo conquistado a sua primeira taça em 2014.

            Barrichello é um caso raro de amor ao automobilismo. Tendo completado 50 anos de idade em 23 de maio deste ano, Rubens continua com o entusiasmo e paixão de quando começou no esporte, décadas atrás. Poderia estar curtindo uma aposentadoria das pistas, mas segue acelerando como nunca, e mostrando-se competitivo, mesmo encarando uma geração muito mais nova nas pistas, tão ou até mais talentosa do que ele. Verdade que, em um certame como a Stock Car, a diferença de idade costuma pesar um pouco menos do que em outras categorias, mas isso só mostra o quanto ele ainda pilota, mesmo tendo sido motivo de chacota por parte da torcida quando competiu na F-1.

            Barrichello era uma das grandes promessas do automobilismo brasileiro em fins dos anos 1980/início dos anos 1990. Vivíamos um grande momento no automobilismo internacional, com o tricampeonato de Nélson Piquet, os títulos de Ayrton Senna, o título de Raul Boesel no Mundial de Marcas, e o título de Émerson Fittipaldi na F-Indy. Cada brasileiro que chegava na Europa com um capacete na mão provocava calafrios nos demais pilotos dos campeonatos onde iriam competir. Barrichello foi campeão na F-3 Inglesa, parada obrigatória para quem desejava chegar à F-1, e ele aportou na categoria máxima do automobilismo em 1993, na Jordan. Um piloto extremamente promissor, em um time promissor. Barrichello já seria apontado como um “novo Senna” pela imprensa especializada, e tinha mesmo potencial para tanto.

            A realidade, contudo, não se materializou. A morte súbita de Senna em Ímola, em 1994, provocou um baque nesse processo, criando dificuldades inesperadas para o novo representante brasileiro na F-1. Na ânsia de se criar um novo ídolo nacional, a imprensa exagerou nas cobranças em cima do piloto, que equivocadamente, achou que estava pronto para dar seguimento ao legado do falecido tricampeão. As circunstâncias também acabaram ficando desfavoráveis, e o brasileiro não teve as oportunidades para deslanchar como deveria, além de também dever em certos momentos, sentindo a enorme pressão que tentou carregar. A certa altura, precisou voltar atrás para renovar a carreira, quando estava em baixa, tendo de recuperar a imagem de piloto de talento que faziam dele até chegar à F-1. Sem um equipamento competitivo, estava longe de repetir a sina vencedora de nossos campeões anteriores na categoria máxima do automobilismo.

            Apesar dos erros de gestão em sua carreira, Rubens Barrichello foi o mais longevo piloto brasileiro na F-1, e até pouco tempo atrás, era o recordista de GPs disputados na categoria máxima do automobilismo. Foi um excelente piloto, mas não um fora de série, como os torcedores sempre exigiram, depois das conquistas de Émerson Fittipaldi, Nélson Piquet, e Ayrton Senna. Quando teve um carro vencedor nas mãos, como na Ferrari, infelizmente o time só tinha olhos para o outro piloto, um tal de Michael Schumacher, que não por acaso é um dos maiores vencedores da história da F-1. Não fosse a política da Ferrari de apoio total ao alemão, talvez os números da passagem de Barrichello pela escuderia italiana fossem melhores. Teria mais vitórias e poles? Certamente. Um título? Talvez, mas seria difícil. Quando teve o carro vencedor da Brawn em 2009, demorou para se acertar com os freios do carro, e Jenson Button abriu vantagem para nunca ser alcançado no restante da temporada. Foi execrado por boa parte da torcida, por ter se curvado ao time da Ferrari, que o relegou ao papel de “escudeiro” de Schumacher.

Tricampeão da Stock, Daniel Serra (acima) se enroscou com Gabriel Casagrande (abaixo) no início da corrida e ficaram fora da luta pelo título. Daniel abandonou com o carro avariado, e Casagrande acabou desclassificado, considerado culpado pelo acidente.


            Depois de deixar a F-1, disputou uma temporada na Indycar, onde poderia ter trilhado carreira, se não tivesse que levar patrocínio para ter um carro decente. Optou pela Stock Car, onde isso não foi necessário, e ainda ganharia salário. Para quem já tinha passado quase vinte e cinco anos competindo lá fora, não foi um mau negócio. E Barrichello vestiu a Stock Car como poucos.

            Rubinho ajudou a revigorar a Stock Car, que se tornou na última década a mais forte categoria de competições do esporte a motor nacional. E é um certame extremamente disputado e competitivo, exibindo um nível técnico que nada deve a outras categorias internacionais da modalidade. Na verdade, há mais de uma década que a Stock abriga alguns de nossos ex-pilotos da F-1. Ricardo Zonta, Enrique Bernoldi, Nelsinho Piquet, Tony Kanaan, Antonio Pizzonia, Luciano Burti, Felipe Massa, entre outros, marcaram ou ainda marcam presença no grid da competição.

            Disputou as últimas provas de 2012, e fez sua primeira temporada completa no ano seguinte, terminando em 8º lugar. Em 2014, alcançou suas primeiras vitórias na competição, e conquistou o título, redimindo-se perante si mesmo e parte da torcida que nunca deixou de apoiá-lo e que respeitava o piloto que ele era. Nos anos seguintes, manteve-se competitivo na Stock: 4º colocado em 2015; vice-campeão em 2016; 5º colocado em 2017; 4º novamente em 2018; mais uma vez 5º em 2019; 6º colocado nas temporadas de 2020 e 2021; e coroando a temporada de 2022 com o bicampeonato. Em 199 provas, venceu 19 corridas, marcou 12 poles.

A Stock Car viveu mais um ano de muitas disputas na pista.

            Nesta temporada, pilotou forte o tempo todo. Arrancou duas vitórias na rodada dupla de Goiânia, em 20 de março. Foi 2º colocado nas duas provas no Velocitá, em 15 de maio. Ele voltaria ao pódio novamente em Santa Cruz do Sul, com um 2º lugar na primeira corrida, e nova vitória na segunda prova, ambas no dia 25 de setembro. Os pontos negativos foram a primeira prova da temporada, onde abandonou na corrida de duplas, em 13 de fevereiro; e um abandono duplo na etapa do Galeão, no Rio de Janeiro, em 10 de abril. Depois disso, o pior fim de semana foi no dia 31 de julho, novamente na pista de Interlagos, onde foi 13º e 22º colocado nas duas provas, respectivamente. Nas demais etapas do campeonato, manteve-se em boas posições pontuáveis, dentro do TOP-8, com uma exceção, procurando manter sempre uma boa constância, enquanto os principais adversários tinham seus altos e baixos em maior número, permitindo que Rubens chegasse para a disputa do título na reta final, junto com Daniel Serra, já tricampeão da Stock Car, o atual campeão Gabriel Casagrande, e o argentino Matias Rossi.

            Na primeira corrida do domingo, Daniel Serra tratou de ir para o ataque, terminando a prova em segundo lugar, com Rubens Barrichello em terceiro e Gabriel Casagrande em quarto. Quem se deu mal foi Matias Rossi, que na sua parada de box, ao sair, colidiu com Denis Navarro no pit lane, o que o levou ao abandono, não apenas da primeira corrida, mas também da disputa pelo título, que ficou restrita então a Barrichello, Serra, e Casagrande. Felipe Batista, que nada tinha a ver com a luta pelo campeonato, largou na pole, e lá ficou até a bandeirada, numa performance sólida, só eclipsada mesmo pelo duelo dos postulantes ao título, que fizeram marcação cerrada entre eles durante a maior parte da corrida, e transferindo as tensões da disputa para a segunda e derradeira corrida do domingo.

            Logo após o fim da primeira prova, os carros já se alinharam para a segunda e última corrida da etapa e da temporada 2022. Com a inversão de posições, a pole position ficou com Ricardo Maurício, enquanto os três candidatos restantes ao título, Gabriel Casagrande, Rubens Barrichello e Daniel Serra, saíram em 7º, 8º e 9º, respectivamente. Novamente, seria uma marcação homem a homem entre os três. Na largada, Ricardo Maurício manteve-se na ponta sem problema, mas logo atrás o caos reinou, envolvendo justamente os candidatos ao título. Barrichello, Serra e Casagrande tentaram dividir o S do Senna. Barrichello perdeu o controle ainda no meio do S, rodando e batendo de leve em Serra. Rubens rodou e caiu para trás, enquanto Daniel tentava controlar o carro, mas aí acabou atingido por Casagrande, que havia saído da pista e acertado o tricampeão. Serra conseguiu retornar ao traçado e voltar aos boxes, mas teve de abandonar a corrida, dando adeus também ao título da temporada. O incidente entre os pilotos foi colocado sob investigação pela direção de prova. Barrichello conseguiu retornar à pista após uma breve passagem pelos boxes enquanto o Safety Car estava na pista, tendo sorte de seu carro não ter sofrido danos e não ter sido atingido por mais ninguém, já que outros pilotos acabaram se envolvendo na confusão, como Julio Campos, Rafael Suzuki e Allam Khodair. Quando a corrida foi liberada novamente, Ricardo Maurício, Felipe Lapenna e Cesar Ramos formava o top-3, enquanto Gabriel Casagrande era o 7º e Rubens Barrichello apenas o 21º. Com o resultado da primeira corrida, Rubens tinha 10 pontos de vantagem para Gabriel, e naquele momento, o campeão de 2021 estaria conquistando o bicampeonato. Enquanto Casagrande seguia na sétima posição, Barrichello buscava escalar o grid, já chegando mais à frente, e conseguindo atingir posições que lhe garantiriam o título, se Casagrande permanecesse em sétimo.

A confusão no início da segunda corrida: Barrichello rodou e levou um toque de outro carro, enquanto lá mais à frente, Casagrande acertava o carro de Serra.

            Só que, pouco depois, saiu a decisão da direção de prova sobre o acidente na largada, e Gabriel Casagrande foi excluído da prova, o que dava o título da temporada a Rubens Barrichello antes mesmo do fim da corrida. Desnecessário dizer que Casagrande ficou bem contrariado com a punição recebida. Ao fim da prova, vitória de Ricardo Maurício, com Nelsinho Piquet em 2º, e César Ramos em terceiro, enquanto Rubens Barrichello recebeu a bandeira quadriculada em 11º para garantir o seu segundo título na Stock Car Pro Series.

            Com o resultado da última corrida, Barrichello, da Fulltime, fechou a temporada com 330 pontos. Daniel Serra, da RC Eurofarma, ficou com o vice-campeonato, com 316 pontos. Gabriel Casagrande (A. Mattheis Vogel) foi o 3º, com 307 pontos, seguido por Matias Rossi (A. Mattheis Vogel), com 268. Ricardo Zonta (RCM Motorsport) completou o TOP-5, com 262 pontos.

            Rubens Barrichello tornou-se o piloto mais velho a vencer um campeonato pela Stock Car, e apesar de seus números não parecerem tão impressionantes, muitos já colocam o veterano com um dos mais importantes da história da Stock, ao lado de lendas como Ingo Hoffman, com seus 12 títulos na competição. Por parecer certo exagero, mas não há como negar a importância de Rubinho na Stock desde 2013. Sua devoção ao automobilismo o mantém firme em atividade, disputando todo tipo de corrida que tem a oportunidade de participar, e isso tem de ser admirado, numa altura da vida onde muitos outros pilotos já deram outro rumo às suas carreiras, com boa parte deles tendo pendurado o capacete, e ido curtir outras coisas.

            Além de se dedicar à Stock Car desde 2013, de lá para cá Barrichello ainda participou de corridas das mais variadas. Esteve nas 24 Horas de Le Mans, 24 Horas de Daytona, IMSA, GT Endurance, Super TC2000, entre outras participações. E ele começa a ver seus filhos seguirem seu caminho no mundo do automobilismo, repetindo a história dele de mais de trinta anos atrás. Tem lá seus defeitos, mas é sempre considerado um grande profissional, e costuma ser gente boa com todo mundo com quem se envolve, com muito raras exceções. E colhe agora um reconhecimento que muitas vezes lhe faltou, e ainda falta, por boa parte do público fã de automobilismo, sendo que ainda há aqueles para os quais Rubens ainda é um “fracassado” e um “vendido”, pelo que ocorreu em seus tempos de F-1, atitude mais do que ridícula para quem se diz amante do automobilismo.

            E ele não dá sinais de que vai parar tão cedo. Seu entusiasmo ao volante nada fica a dever aos mais jovens, e a ele mesmo, quando deu seus primeiros passos na carreira. Quanto tempo mais ele irá seguir adiante, ninguém sabe. Ele ama o que faz, e se diverte ao volante de um carro de competição. E enquanto tiver esse prazer, e essa verve de pilotagem, podem estar certos de que ele vai seguir acelerando forte, e encarando os desafios das pistas. E pela mais nova conquista, do bicampeonato da Stock Car, meus sinceros cumprimentos e respeitos. Parabéns, Rubinho! E que ninguém duvide que ele vá tentar o tricampeonato, já em 2023. Afinal, quem diria que, oito anos depois de conquistar o título da Stock em 2014, ele conseguiria repetir a dose? Não duvidem do “velhinho”, portanto. Vida longa a Rubens Barrichello!

 

 

A Ferrari já tem o seu novo diretor de equipe, que ocupará o lugar que foi de Mattia Binotto. É Fréderic Vasseur, que ocupava a mesma posição na Alfa Romeo, time que utiliza propulsores de Maranello na F-1. Binotto, apesar dos pesares, declarou que deixou a Ferrari mais forte do que quando assumiu a chefia da equipe, há poucos anos, mas apesar dos avanços obtidos nesta temporada, as falhas da escuderia, nos boxes e na pista, infelizmente dizem o contrário. Mattia poderia ter continuado no cargo, se pelo menos a escuderia tivesse oferecido briga à Red Bull, mesmo perdendo os títulos de pilotos e de construtores, mas o vareio que o time dos energéticos, especialmente Max Verstappen, aplicou nos rivais, não deu qualquer chance de redenção aceitável. E agora, a pergunta que se faz é se Vasseur vai aguentar a pressão que é comandar um time como a Ferrari. Ele não é novato no quesito, já que tem dirigido a Alfa Romeo nos últimos anos, mas o time sediado em Hinwill é uma coisa, e a equipe de Maranello é outra, completamente diferente, e em sua longa história, tem um retrospecto nada glorioso de dirigentes que foram crucificados pela falta de conquistas do time nos campeonatos onde comandaram a escuderia italiana. Ele que se prepare bem para o que vier pela frente, até porque em teoria a disputa em 2023 deve ser bem mais acirrada, com uma Red Bull campeã tentando manter o seu reinado, e com uma Mercedes que vem disposta a ser novamente protagonista na luta por vitórias e pelo título. Se a Ferrari não se cuidar, pode acabar ficando para escanteio nessa briga, e aí, as cobranças vão começar a infernizar, e bastante. Pior, se começar de novo muito bem, e perder a pose durante a temporada, vai ser uma chefia de duração muito breve em Maranello...

 

 

E a Alfa Romeo agiu rápido para substituir Vasseur, cujo posto será ocupado por Andreas Seidl, que desempenhava função similar na McLaren desde 2019. Seidl não é estranho ao time, tendo estado na equipe quando esta era o time oficial da BMW. Foi para a Porsche, comandando o time no Mundial de Endurance, obtendo três vitórias nas 24 Horas de Le Mans. E pode voltar à batuta do Grupo Volkswagen, que assume o time de Hinwill em 2026 com a Audi. O bom filho à casa torna, e terá a missão de organizar a equipe para a futura parceria, já que a associação com a Alfa Romeo termina no fim do ano que vem.

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