sexta-feira, 11 de julho de 2014

O RETORNO DE MONTOYA


Montoya largou na pole e venceu as 500 Milhas de Pocono. E avisa: está na luta pelo título da temporada na IRL.

            Quando foi anunciado por Roger Penske como terceiro piloto de sua escuderia para o campeonato 2014 da Indy Racing League, Juan Pablo Montoya encontrou a chance de voltar aos campeonatos de monopostos, onde havia feito sua fama no fim da década de 1990, não apenas na Europa, mas nos Estados Unidos. Tendo brilhado na F-3000 internacional, onde foi campeão em 1998, o colombiano foi para a América do Norte, e na F-CART, a Fórmula Indy original, foi campeão logo em seu ano de estréia, 1999, correndo pelo time de Chip Ganassi, que vinha de uma parceria vitoriosa com o piloto italiano Alessandro Zanardi, que fora bicampeão nos anos anteriores. O colombiano mostrou que estava à altura de ter substituído Zanardi.
            No ano seguinte, em virtude de uma troca de equipamento da escuderia, a performance da Ganassi não foi a mesma do ano anterior, mas nem por isso Montoya deixou de impressionar: conquistou 3 vitórias e fez 7 poles, mostrando possuir uma velocidade ímpar e um grande talento como piloto. Mas a falta de fiabilidade mostrou-se fatal: com 12 abandonos, foi apenas o 9° colocado, com 126 pontos, bem distante de Gil de Ferran, campeão daquela temporada, com 168 pontos. O ponto alto, contudo, não foi no campeonato da F-CART, mas nas 500 Milhas de Indianápolis daquele ano, prova do campeonato da IRL, liga rival da Indy original. Com um esquema montado apenas para a Indy500, Montoya simplesmente chegou e conquistou: foi pole-position, e liderou a maior parte da corrida, obtendo uma vitória inesquecível, e a Ganassi mostrando para Tony George, então dono da categoria, que seus times não tinham a mesma qualidade dos da Indy original.
Montoya chegou à F-CART em 1999 e foi campeão com a Chip Ganassi.
            Consagrado, mesmo sem o título de 2000, Juan Pablo enfim foi para a F-1, como novo contratado da equipe Williams. Ficava uma dúvida: seria o colombiano um novo fenômeno na categoria máxima do automobilismo, ou repetiria o fiasco de Alessandro Zanardi, que em seu retorno à F-1 em 1999 foi uma decepção completa, não marcando um ponto sequer? Montoya deu a resposta logo no GP do Brasil de 2001, ao ultrapassar ninguém menos do que Michael Schumacher de forma arrojada no "S" do Senna e mostrar que vinha para andar na frente. Mas, se era um piloto rápido, era também veloz em se meter em algumas encrencas. Com 12 abandonos na sua temporada de estréia, Montoya ainda foi 6° colocado no final do ano, contabilizando 1 vitória e 3 poles. Sua melhor temporada foi em 2003, quando terminou o campeonato com 82 pontos, sendo 3° colocado no mundial. Em 2004, em um ano de altos e baixos, conquistou sua última vitória na Williams no encerramento do campeonato, aqui no Brasil. Nos dois anos seguintes, iria defender a McLaren.
Na F-1, o colombiano atrevido foi logo mostrando o "cartão de visitas" a Michael Schumacher no GP do Brasil de 2001.
            Apesar do bom ano de 2005, Montoya nunca se mostrou à vontade no time de Ron Dennis, muito mais sério e sisudo do que a organização de Frank Williams. Foi 4° colocado naquele ano, com 2 poles e 3 vitórias. Em 2006, a união desandou, com o colombiano conseguindo a proeza de bater no próprio colega de equipe Kimmi Raikkonem em duas provas seguidas, arruinando resultados potenciais do time em ambos os GPs. Foi demais para Ron Dennis, que nunca gostou muito da postura do colombiano, por achar que não tinha o comprometimento necessário para defender um time de ponta. E a carreira de Montoya na F-1, infelizmente, terminou ali. Seria apenas mais um grande talento desperdiçado pela categoria, ainda que Juan Pablo também tenha tido parte da culpa por talvez se envolver em confusões nos momentos mais impróprios. E colidir com um companheiro de equipe nunca causa uma boa impressão...
            A saída foi retornar aos Estados Unidos, e surgiu o convite de seu velho patrão, Chip Ganassi, para correr em seu time. Mas, quando muitos imaginavam um ingresso na Indy Racing League, o colombiano optou por um território inexplorado em sua carreira: a Nascar. E lá foi ele defender seu velho time correndo na Stock americana. Em 2007, disputando pela primeira vez o campeonato na íntegra, venceu sua primeira corrida e ainda foi o estreante do ano. Um início bem satisfatório, considerando o estilo de carro completamente diferente do que havia guiado até então.
            Só que Juan Pablo não conseguiu despontar na Nascar. Tornou-se apenas mais um, deixou de ser protagonista, salvo raros momentos, quando conquistava uma de suas poucas vitórias, ou se envolvia em confusões na pista, sendo que até nisso ele se tornou apenas mais um, pois a stock americana tem lá sua cota de confusões, e o que Montoya aprontava não era nada além do normal. Seu melhor ano foi em 2009, quando finalizou o certame na 8ª posição. Havia sido 20° em 2007, e 25° em 2008. Nos últimos anos, só foi caindo: 17° colocado em 2010, 21° em 2011, 22° em 2012, e por fim, terminou 2013 em 21° lugar, já sabendo por parte de Ganassi que não o teria mais ao volante de seus carros no ano seguinte. Certamente Chip tinha expectativas maiores em relação aos resultados de Montoya na Nascar, mas infelizmente o colombiano não conseguiu corresponder aos anseios de seu patrão.
Montoya na Nascar: 7 temporadas completas e poucos resultados de monta.
            Não é uma situação anormal. Há pilotos extremamente talentosos que, por diversas razões, parecem não conseguir demonstrar seu talento em determinados carros ou campeonatos. Montoya correu na Nascar sempre com um esquema competente: a Ganassi não era uma superpotência, mas não era um time pequeno. Mas a extrema competitividade da categoria, e sua dinâmica própria, fizeram de Juan Pablo um piloto apenas normal. Ele conseguiu dar continuidade à sua carreira após o fim de sua participação na F-1, e conseguiu voltar a se divertir pilotando, no ambiente muito menos carregado e mais cordial que sempre caracterizou o automobilismo americano. Fosse alguém com menos currículo, e competindo por um time menos visado, talvez ainda estivesse por lá, quem sabe. Com o anúncio de sua dispensa, seu futuro ficou em aberto. Tudo apontava para achar outro time na Nascar, ou então abandonar o automobilismo, ou quem sabe, tentar até outra categoria. Várias opções foram especuladas, até que surgiu a idéia de Michael Andretti contar com Montoya em um de seus carros nesta temporada, se conseguisse fechar o apoio de um patrocinador disposto a bancar a empreitada.
            Mas foi Roger Penske quem se mostrou mais rápido, e o anúncio da entrada do colombiano na categoria, onde havia disputado apenas a Indy500 de 2000, foi saudada por todos como um grande incentivo para a IRL, que tentara algo parecido em 2012, quando teve o brasileiro Rubens Barrichello correndo por lá e pouco resultado se viu disso. Claro que é preciso mencionar que Barrichello correu em um time médio, a KV Racing, que mesmo em seus momentos mais inspirados, não conseguia manter a constância, como se viu nas temporadas em que Tony Kanaan defendeu a escuderia. Montoya, por outro lado, viria para a Penske, o time mais poderoso do certame, e com garantia de ter um equipamento competitivo e certamente vencedor. Claro que ficava a dúvida: o Montoya de 2014 seria o Montoya arrojado e audacioso que vimos até 2005, ou o Montoya "normal" que competiu na Nascar? Foi uma aposta ousada de Roger Penske visando fortalecer seu time, e não sem motivos: a Ganassi, campeã em 2013 com Scott Dixon, havia perdido Dario Franchiti para este ano, com a aposentadoria forçada do escocês após seu violento acidente em Houston, mas havia contratado Tony Kanaan. Se em um time médio o baiano inspirava respeito, de volta a uma escuderia grande, seria um adversário tão temível quanto Dixon, talvez até mais. Era preciso buscar reforços para alinhar ao lado de seus pilotos Will Power e Hélio Castro Neves.
            Para alegria de todos, Montoya entrou firme em uma dieta e um forte programa de exercícios, para perder os quilos a mais que ganhou pilotando os pesados carrões da stock americana, onde espaço nunca era problema. Era preciso recuperar a forma física para poder encarar com a desenvoltura necessária o desafio de pilotar novamente um carro monoposto. Juan Pablo recebeu uma segunda chance de continuar sua carreira, e se deu conta de que teria de dar duro para fazer por merecer, pois poderia não ter outra. Quando testou enfim o chassi DW12 da Dallara, foi um alívio ver que já estava sentindo a velha intimidade de antes com um monoposto. O talento ainda estava lá. Mas precisava tirar a ferrugem, que certamente ainda iria exibir.
            De fato, nas primeiras corridas da temporada, se não foi um desastre, também não foi bonito. Na primeira corrida, em São Petesburgo, alinhou apenas em 18°, para terminar em 15°, muito pouco levando-se em conta que Power e Helio lutaram pela vitória e terminaram no pódio, em 1° e 3°. O resultado deixou dúvidas em muita gente que apostava no retorno triunfal de Juan Pablo. Felizmente, as dúvidas começaram a clarear logo na segunda corrida, em Long Beach, onde após largar em 16°, fez uma prova combativa, terminando em 4° lugar. No Alabama, outro resultado ruim, sendo apenas o 21° colocado, e 16° no GP de Indianápolis. Na Indy500, os bons ventos voltaram a soprar, agora com mais frequência: finalizou a corrida mais famosa dos EUA em 5° lugar; e apesar do mau fim de semana na rodada dupla de Detroit, conseguiu seu primeiro pódio no ano em Forth Worth, com um 3° lugar; conseguiu novo pódio na primeira corrida de Houston, e nas 500 Milhas de Pocono, conquistou sua 2° pole-position na categoria. E ganhou a corrida andando sempre em ritmo forte e no pelotão da frente. É nítido que vai se acostumando cada vez mais com o carro e com as características do campeonato da IRL, e vai cada vez andando mais no ritmo de seus companheiros de equipe, que ocupam a liderança da competição, com 446 pontos cada um. Juan Pablo ocupa agora a 4° posição, com 391 pontos. Entre o colombiano e seus companheiros de equipe, encontra-se o francês Simon Pagenaud, que faz uma temporada excelente pela equipe de Sam Schmidt, com 402 pontos e 2 vitórias.
            Mas Montoya quer mais, e à medida que fica mais à vontade com o carro, sua confiança de que pode lutar pelo título deixa de ser uma bravata para se tornar algo real. A Penske tem o melhor carro da temporada, e contabiliza 4 triunfos em 2014: 2 vitórias de Will Power, 1 de Hélio Castro Neves, e 1 de Montoya agora. Com desempenhos iniciais abaixo de seus companheiros, o colombiano evoluiu bastante, embora ainda precise ter um melhor desempenho nos circuitos de rua, onde ainda está devendo um pouco para seus parceiros de time. Nos ovais, circuito ao qual está mais adaptado, até pelos tempos da Nascar, que corre quase que exclusivamente neste tipo de pista, Montoya não apenas já está à vontade como passa a ser um adversário poderoso. Ainda é cedo para dizer se ele vai desbancar Power ou Hélio na classificação, mas certamente seus companheiros já sabem que precisão prestar atenção em seu avanço. Diferente da F-1, na Indy é cada um por si, sem jogos de equipe. Se precisarem duelar entre eles, assim será. Dependendo da situação, se houver um rival de outro time ameaçando na etapa final, pode até haver uma pequena ajuda na corrida, mas nada de sacrificar ou ceder posição, como já vimos na F-1.
            O melhor de tudo é ver um Montoya concentrado, voltando a pilotar com afinco, e determinado como há tempos não se via. O retorno aos monopostos fez-lhe muito bem. Ainda é preciso desenferrujar em certos aspectos, mas o maior desafio o colombiano já superou: voltou a largar na frente, e a vencer. Um feito que não é de se desdenhar, visto que o campeonato da IRL deste ano tem sido de um grande equilíbrio de performances, tendo até o presente momento visto nada menos do que 8 pilotos diferentes a vencerem corridas. E Montoya não pode se descuidar: atrás dele vem 3 pilotos da Andretti, um deles, Ryan Hunter-Reay, campeão de 2012, praticamente em seus calcanhares, com 388 pontos. Carlos Munõz, com 340 pontos; e Marco Andretti, com 325, estão um pouco distantes, mas de um momento para o outro, tudo pode mudar, e todos eles não apenas virem para cima como até o superarem. Ainda há 7 corridas pela frente, 3 delas em ovais, como a prova deste fim de semana, na pista de Iowa, onde Juan Pablo tem tudo para mostrar um bom resultado, considerando seu retrospecto em ovais do ano. Depois, ainda teremos o pequeno oval de Milawukee, e a corrida de encerramento no superoval de Fontana, em outra prova de 500 milhas.
            Outro ponto a ser considerado extremamente positivo é que Juan Pablo vem tendo uma temporada praticamente sem acidentes, algo que não se via há muito tempo, e um revés para seus adversários, que volta e meia tem se envolvido em alguns problemas. Só para dar o exemplo, Hélio acabou abandonando a segunda corrida em Houston depois de dar uma fechada e ser atingido por Sebastién Bourdais, jogando fora um provável pódio; e Will Power, por sua vez, já teve várias punições durante o ano, em decorrência de algumas estripulias na pista, o que fez o australiano perder pontos muito preciosos em várias oportunidades, a última delas em Pocono mesmo, onde quase deu uma fechada em Helinho na reta dos boxes, fazendo um movimento duplo de mudança de direção, quando o regulamento permite apenas uma mudança na defesa de posição. Montoya até deu um toque em Power, mas para sua sorte, ele foi leve, e na proteção do pneu traseiro, o que o fez perder apenas parte da lateral da asa dianteira, que felizmente não afetou seu desempenho.
            A aposta de Roger Penske se mostrou foi certeira, e podemos dizer que Juan Pablo Montoya está realmente de volta ao lugar onde nunca deveria ter saído. Tivesse vindo para a IRL logo de cara em 2007, talvez tivesse feito muito sucesso de lá para cá. Agora em 2014, ele mostra, mesmo com vários anos de atraso, que ainda possui aquele talento que o tornou um piloto diferenciado nos campeonatos de 1999 e 2000 da finada Fórmula Indy e de seus primeiros anos na F-1. Pode não estar com a mesma exuberância de antigamente, mas pode ser questão de tempo até o vermos novamente com carga total. Brilho, ele já mostrou que ainda tem.
            Seja bem-vindo de volta, Montoya. Sentimos muito sua falta!

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