sexta-feira, 3 de março de 2017

BALANÇO DOS PRIMEIROS TESTES



Na primeira semana de testes da pré-temporada, a Mercedes foi o time que mais andou, e menos problemas mecânicos sofreu. Nova temporada de domínio na F-1?

            Enfim, depois de um longo e tenebroso inverno, os carros da F-1 voltaram à pista. O circuito de Barcelona, na Catalunha, já virou lugar comum destas pré-temporadas, e todo mundo foi conhecer os novos bólidos e testar seus limites se preparando para a temporada que começa em breve na Austrália. E, embora, como de costume, não se possa fazer análises definitivas, algumas dicas podem ser apontadas pelo que se viu nestes primeiros quatro dias de testes.
            Quem esperava um maior equilíbrio de forçar, até o presente momento, terá de se contentar com um potencial duelo Mercedes X Ferrari. O time tricampeão do mundo foi o campeão de quilometragem rodada em Barcelona, o que denota que o modelo W08 é rápido e confiável. O único problema aparentemente mais grave surgiu nesta quinta, impedindo Lewis Hamilton de treinar pela manhã, mas após o almoço, Valtteri Bottas já estava na pista para cumprir o seu cronograma, e rodou mais do que a distância do GP da Espanha. O time alemão sediado em Brackley mostrou muita calma durante toda a semana, mesmo quando estava sob forte pressão dos tempos da Ferrari, fosse com Sebastian Vettel ou com Kimi Raikkonen, e essa calmaria só indica que eles possivelmente não deram todas as cartas na mesa, mas deram uma pontinha delas quando Bottas marcou o melhor tempo da semana na quarta-feira, o que pode ser motivo de preocupação para a concorrência. O carro demonstrou grande estabilidade nas curvas do circuito, ainda que seus pilotos precisassem dar algumas corrigidas, mas nada que pareça preocupante. Ainda é cedo para afirmar com todas as letras que a Mercedes vai dominar a temporada, ou de quanto será a sua vantagem para os rivais, no caso do pior caso (para a competição) se confirmar. E outro ponto a favor dos alemães é sua unidade de potência, que estima-se já estar na casa dos mil HPs de potência, e pode até passar disso, uma vez que o desenvolvimento está liberado a partir deste ano. Ferrari e Renault ainda não demonstraram o real potencial de suas novas unidades de 2017. É certo de que elas evoluíram, mas também é mais do que óbvio que a Mercedes não ficou parada neste quesito.
            O ponto positivo é que a Ferrari parece estar melhor do que se esperava. Tanto Vettel quanto Raikkonen anotaram tempos significativos, mas farol de treino à parte, a alta quilometragem do novo modelo SF70H é digna de nota, indicando que o novo bólido de Maranello nasceu confiável, e que em tese pode ser uma pedra nos calcanhares dos prateados. Como não dá para saber exatamente as configurações de combustível das melhores marcas, é preciso ficar um pouco com o pé atrás, para não cair na euforia antecipada. Aliás, o time rosso está mantendo os pés no chão a ferro e fogo. Nada de indicações do que eles podem ou não conseguir na temporada. Isso é um reflexo do que aconteceu no ano passado, quando o time vermelho saiu da pré-temporada achando que conseguiria incomodar os rivais, mas além de não vencer nenhuma corrida, ainda acabou levando algumas sovas da Red Bull. Então, a ordem agora, com um time técnico completamente novo, é não prometer nada, de modo que o que vier será considerado lucro. Mas pelo sorriso de Vettel ao volante do carro, podemos ter coisa boa por aí. Sobre Raikkonen, esqueçam qualquer empolgação: andando bem ou ruim, a expressão do finlandês não muda muito, mas os bons tempos obtidos por ele são interessantes, e a Ferrari, quem sabe, pode vir a ser a redenção da temporada, com alguma sorte. Afinal, Maranello já completou uma década desde o último título, e a expectativa de um jejum maior do que o visto de 1980 a 1999 vive rondando os italianos e a cúpula da Fiat e da Ferrari. Mas, pelo bem da competição e da disputa, ter a Ferrari na frente disputando com a Mercedes é o anseio de muitos. E pelo que se viu na Catalunha, o novo carro parece realmente muito bem nascido, contrariando todas as expectativas de que o novo grupo técnico talvez não conseguisse produzir um resultado tão positivo logo de saída. Um problema ou outro ali, mas aparentemente, nada fora do normal, contrastando com o nervosismo que era nítido nos boxes do time italiano na pré-temporada do ano passado.
Todos esperavam que a Red Bull (acima) pudesse enfim desafiar efetivamente a Mercedes, mas faltou combinar com os italianos da Ferrari (abaixo), que parecem ter outra idéias...
            Já a Red Bull, se não foi um desastre, também não foi aquela maravilha que todos esperavam. O novo modelo RB13 era tido com altas expectativas, como capaz de desafiar abertamente a supremacia da Mercedes, em virtude das novas regras técnicas que aumentaram a carga aerodinâmica dos carros, área na qual Adrian Newey é o nome mais respeitado da categoria há tempos. Mas tanto Max Verstappen quanto Daniel Ricciardo não conseguiram incomodar o duo Mercedes/Ferrari até o momento como imaginavam poder fazer. Mau prognóstico para o time dos energéticos? Não necessariamente: no ano passado, a equipe austríaca não impressionou muito nos testes da pré-temporada, mas conseguiu evoluir seu carro consistentemente durante o ano, e terminou como vice-campeã. Mas ainda é cedo para descartar as possibilidades de a Red Bull mostrar o que pode fazer. Daniel Ricciardo já afirmou que Mercedes e Ferrari estão melhores, mas a Ferrari também iniciou melhor que eles no ano passado, e depois, acabou ficando para trás. Com uma dupla que é considerada a mais forte do grid, ninguém pode menosprezar a capacidade de reação da escuderia. Precisamos ver, contudo, como se deu a evolução da nova unidade de potência da Renault. E, mesmo com alguns percalços, o RB13 mostrou também boa confiabilidade, rodando um bom número de voltas.
            Outras boas notícias nos testes foi ver as performances da Hass e da Renault. O time francês, depois de um ano de retorno juntando os cacos em 2016, colocou a casa em ordem, e se concentrou no modelo 2017, já que não havia muito o que fazer no ano passado que valesse a pena. E a escuderia francesa conseguiu alguns bons tempos, assim como certa confiabilidade. A fábrica francesa quer voltar a dominar a categoria, mas não quer atropelar as expectativas. Este é efetivamente o ano de seu verdadeiro regresso, com um carro criado especificamente para isso. Maiores cobranças deverão ser feitas a partir do ano que vem, uma vez que a escuderia quer sentir qual é sua real força este ano. Enquanto isso, a Hass, que entra em sua segunda temporada, mostra que tem boas chances de fincar bandeira em definitivo como equipe média. O novo modelo VF17 andou bastante, e seus dois pilotos conseguiram marcar tempos significativos que indicam que o time brigará com regularidade pelos pontos. E é preciso lembrar que a escuderia é estadunidense, ou seja, não deve levar o lance de disfarçar sua performance a sério, como os demais times, de mentalidade européia, costumam fazer.
            A Force India, que fez o seu melhor campeonato em 2016 e tem metas ousadas para este ano, conseguiu alguns tempos interessantes, e mostrou certa confiabilidade e potencial. Como a escuderia está melhor financeiramente este ano, deve permitir trabalhar melhor na evolução do modelo VJM10, e garantir uma performance decente na disputa pelas melhores colocações. Se conseguirem repetir o 4° lugar do ano passado, certamente já será um desempenho elogiável, visto que será muito complicado superarem Mercedes, Ferrari e Red Bull. Mas não é impossível serem os melhores do resto. Sérgio Perez segue firme no time, e já mostrou do que é capaz, e a nova estrela Esteban Ocon não foi colocada ali pela Mercedes a troco de nada.
            A Sauber, que comemora 25 anos de sua estréia na F-1, até que mostrou certa confiabilidade no seu novo modelo C36, mas que ninguém se iluda: o time suíço será a lanterna do grid, em condições normais. O carro não mostrou exatamente velocidade em Barcelona, e ainda contou apenas com seu piloto titular Marcus Ericsson, e o substituto Antonio Giovinazzi. Mas sem mostrar um desempenho muito promissor, a confiabilidade do carro não fará milagres. E competir com o modelo 2016 da unidade de potência da Ferrari será um trunfo de vida curta, pois se o motor será confiável, por outro lado, com carros mais pesados, e um maior arrasto aerodinâmico na reta, a menor potência do propulsor se fará sentir em relação às demais unidades, que estarão mais fortes e competitivas. E o fato do carro não ostentar nenhum patrocínio de monta na carenagem indica que o orçamento para desenvolvimento também não será dos mais generosos. Se conseguirem pontuar, já será uma vitória, como o foi no ano passado com o resultado de Felipe Nasr no GP do Brasil, quando marcou os únicos pontos do time em todo o ano.
            Os demais times, contudo, tiveram sua cota até maior de problemas do que o esperado. A Toro Rosso mostrou uma bela pintura no seu novo STR12, mas o carro enfrentou vários problemas, sendo que ontem nem andou praticamente. Os tempos obtidos também não foram de empolgar ninguém, e a quilometragem percorrida foi mediana, em comparação com as demais escuderias. Talvez os testes na próxima semana mostrem o real potencial do time de Faenza, que recebeu importantes investimentos da Red Bull, aumentando a sede do time e incrementando seu staff técnico, a fim de não ser apenas um “time B” na F-1. Mas, até o presente momento, eles terão que trabalhar mais do que o esperado.
McLaren-Honda 2017: evolução ou reprise do que se viu no ano passado?
            Mas, se tem quem esteja parecendo um disco riscado, por prometer melhorias, e não conseguir entregar melhores expectativas, é a McLaren. Partindo para sua terceira temporada em parceria com a Honda, ainda mais em um ano onde o desenvolvimento das unidades de potência está liberado, era de se esperar que os japoneses, depois de dois anos tentando entender a tecnologia das unidades híbridas de potência, foi só Fernando Alonso sair dos boxes para ficar a pé, novamente com problemas no motor, perdendo com isso praticamente o dia inteiro. E, quando conseguiu dar várias voltas, os tempos não foram muito animadores. Mas é exagerado dizer que os problemas se concentram no motor: o novo MCL-32 ainda carece de maior desenvolvimento, mas sem a fiabilidade da unidade de potência, a compreensão do chassi também fica prejudicada. De qualquer forma, os maus resultados desta primeira semana já deram margem à imprensa espanhola apregoar que Alonso pode dar adeus ao time de Woking ao fim da temporada, bem como a própria Honda, por mais um ano de muita expectativa e baixos resultados, algo que foi prontamente desmentido por ambas as partes no paddock catalão. Mas é inegável que todos esperavam uma evolução da performance do carro, o que não se viu até aqui.
            E a Williams praticamente terá de começar a aguentar as piadas sobre a performance de seu novo piloto, Lance Stroll, que conseguiu a proeza de rodar 3 vezes em dois dias, e com isso, acabar com metade do tempo disponível para testes na semana. A grosso modo, apenas na segunda-feira, o primeiro dia de testes, o time conseguiu mostrar serviço, com Felipe Massa ao volante, atingindo uma excelente quilometragem e um tempo até encorajador para o novo modelo FW40. Mas na terça, o novato canadense rodou e danificou o carro na caixa de brita, acabando com as chances da Williams de continuar o treino. Stroll ainda conseguiu andar bem na quarta-feira, mas conseguiu rodar duas vezes, na última delas batendo o carro, e acabando com a semana do time, que não andou neste último dia. O maior prejudicado, além do próprio time, foi Felipe Massa, que perdeu sua sua segunda sessão de treinos porque o time resolveu mudar o cronograma e manter Lance na pista. Certo, o garoto é novato, e está aprendendo, e os testes de pré-temporada servem para isso mesmo. Mas o caso da Williams é um exemplo prático de como as regras da pré-temporada precisam ser revistas. Esse lance de cada time ir com apenas um carro à pista por vez é uma tremenda furada. Com apenas 8 dias de testes da pré-temporada, e com carros concebidos sob novas regras técnicas, todos os times com condições deveriam estar com seus dois carros na pista, obtendo assim muito mais dados sobre o monoposto, e no caso de algum acidente ou imprevisto, como o ocorrido com a Williams ou da McLaren, estar com o outro piloto também na pista, em um segundo carro, ajuda a minimizar o prejuízo.
Com esta batida, Lance Stroll encerrou prematuramente a primeira semana da Williams na pré-temporada. O garoto começou mal na F-1, por enquanto...
            Não interessa se os times preferem ficar com apenas um carro de cada vez. McLaren e Williams, com seus percalços, perderam tempo importante para acertar e desenvolver seus carros, e com isso, diminuem as expectativas de melhorar a disputa nas corridas, já que não conseguirão render o que poderiam. Espera-se que este tipo de regra mude para o próximo ano, a fim de que a pré-temporada, mesmo curta, seja muito mais movimentada, e dê maior prazer de se acompanhar. Se estivesse com seus dois carros em ação, Felipe Massa teria sido muito mais útil à Williams do que Stroll. E a McLaren não ficaria também refém das quebras do motor da Honda, ou com problemas no carro. Pelo menos, nesta semana, o Liberty Media já tomou uma decisão inédita até então na F-1, permitindo aos times e pilotos postarem fotos e vídeos curtos nas redes sociais e na internet, ajudando na interação com os fãs, algo nunca permitido quando Bernie Ecclestone estava no comando da categoria. É um passo promissor, e espera-se que continue com o avanço das atividades da pré-temporada e durante o campeonato.
            Ainda é cedo para dizer se este campeonato será melhor do que foram os últimos. As novas regras foram concebidas para tentar dar uma chacoalhada na relação de  forças da F-1, mas a exemplo do que aconteceu na primeira metade da década passada, quando Michael Schumacher e a Ferrari dominavam, várias mudanças de regras também foram implantadas, e o piloto alemão e o time italiano conseguiam continuar sempre na frente. Não há garantias de que a Mercedes não vá dominar novamente, mas pelo menos os fãs não poderão reclamar da velocidade dos carros, que já quebraram as marcas do ano passado, e podem ser ainda mais rápidos, a conferir nos testes da semana que vem. O melhor tempo em Barcelona, no GP do ano passado, foi de Lewis Hamilton, com 1min22s00. Valtteri Bottas já alcançou 1min19s705, ou seja, 2s295 mais rápido. Vai ser interessante observar qual será a performance final dos novos carros de 2017. A conferir...

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