Nico Rosberg e Daniel Ricciardo estavam pra lá de sorridentes na cerimônia do pódio de Mônaco. Já Lewis Hamilton... |
O que todo mundo
esperava que aconteceria mais cedo ou mais tarde começou: os pilotos da equipe
Mercedes, time que vem dominando o campeonato deste ano da Fórmula 1, já não
falam a mesma língua. Depois de 4 vitórias consecutivas de Lewis Hamilton, Nico
Rosberg conseguiu dar o troco em Monte Carlo e vencer pela segunda vez no ano,
retomando a liderança da competição, que havia perdido para Lewis em Barcelona.
Verdade que algumas circunstâncias ajudaram também: pista travada e sem pontos
de ultrapassagem, Nico, que largou na pole, só perderia a corrida se cometesse
um erro ou sofresse uma falha mecânica. Não aconteceu nem uma nem outra:
Rosberg largou bem e firme ficou na dianteira até a bandeirada. Hamilton, que
não conseguiu tomar a ponta no arranque da largada, só teria chance de tomar a
dianteira na parada de box, mas aí o acidente de Adrian Sutil, que estampou o
guard-rail na saída do túnel, complicou as coisas, porque quase todo mundo
aproveitou para trocar os pneus, e a Mercedes chamou seus dois pilotos na mesma
hora, arruinando os planos de Lewis, que certamente tentaria ficar um pouco
mais na pista para tentar voltar à frente. Mas Hamilton saiu de Mônaco com o
sangue quente.
O que certamente o
incomodou mesmo foi o "erro" de Rosberg no Q3, após ter feito o
melhor tempo, quando saiu reto na Mirabeau e motivou bandeira amarela no local,
o que "matou" a volta de Lewis naquele momento, que nas parciais,
vinha 0s2 mais veloz que o tempo da pole de Nico. E como a pole era mais de
meio caminho para a vitória no Principado, e sabendo que podia ter batido o
colega não fosse sua saída de pista, normal achar que o companheiro tenha
"encenado" aquilo como artífice para garantir a pole. Qualquer um suspeitaria.
Até aí, nada de anormal. O problema foi externar essa opinião, e mesmo com a
FIA tendo analisado o caso e nada encontrado de errado, Hamilton cometeu o erro
crasso de acusar o golpe, mostrando-se vulnerável emocionalmente. Ele prometeu
revanche na corrida, mas não deu em nada. Mas soube manter a cabeça sob
controle ao não tentar arriscar um duelo renhido pela vitória, o que poderia
ser muito pior.
Uma luta roda a roda
pela liderança durante a prova seria arriscado, e um erro, por mínimo que
fosse, jogaria um, ou ambos, no guard-rail, arruinando a corrida de todo o
time, e como autor da tentativa de ultrapassagem, se causasse tais problemas,
poderia ficar queimado com o time, que até o presente momento tem deixado ambos
duelarem livremente nas corridas, com a determinação de que ambos não se
estranhem e coloquem tudo a perder. Nesse ponto, melhor garantir o 2° lugar,
tanto na prova como no campeonato. Nico retomou a liderança, por 4 pontos, e
ainda temos 2 terços do campeonato pela frente. Tem muito chão até o final do
campeonato, e no ritmo em que ambos se encontram, é possível que a decisão se
dê apenas na última corrida, graças à idéia mequetrefe da FIA de estabelecer
pontuação dobrada no encerramento da competição. Mas, a partir de agora, as
provas serão de guerra dentro do time da Mercedes. E, apesar das declarações
esquentadas de Hamilton em Mônaco, posso dizer que o clima de combate ainda é
relativamente velado. Mas falta pouco para a guerra aberta ser declarada.
Porque falo que o
clima ainda é de guerra "velada"? É só lembrar que, nas 4 corridas
vencidas por Hamilton, era Nico quem cada vez mais estava ficando com a cara
fechada. Seu semblante em Barcelona, prova anterior a Mônaco, era tão
insatisfeito quando o de Lewis após o fim da corrida de Monte Carlo. Apenas por
ser um pouco mais frio e controlado, ele não saiu também chiando, o que não
quer dizer que estivesse satisfeito com a situação. Em Mônaco, ele preferiu
contemporizar, como se o problema não fosse com ele. Claro, tendo vencido, era
natural que estivesse todo sorridente e faceiro. Afinal, está de volta à
dianteira da classificação, e espantou, por hora, o fantasma de virar sombra do
parceiro de equipe. Mas e se tivesse tomado outra derrota do inglês. Certamente
que seu humor estaria um tanto quanto diferente. Se Hamilton voltar a dar as
cartas nas próximas corridas, como fez nas provas antes de Mônaco, vamos ver
até onde vai a frieza de Rosberg. Por enquanto, é só Hamilton que está de
cabeça quente, e esse é o maior problema dele: se deixar que isso o perturbe,
pode perder a concentração e dar a Nico a vantagem psicológica que ele
precisava para se impôr no time e na pista. Pior, suas declarações inflamadas
já causaram um tremendo mal-estar na própria Mercedes, e isso pode pesar muito
contra ele, dependendo de como as coisas evoluírem, em caso de nova derrota.
A direção da Mercedes
já se movimenta para colocar panos quentes na questão. Tanto Toto Wolf como
Niki Lauda já estão se movimentando para evitar que os ânimos fiquem mais
exaltados, e se necessário, Wolf já avisou que poderá impôr ordens de equipe
aos pilotos na pista. Nada pior para o campeonato a esta altura, quando a única
atração é ver a briga entre os pilotos do time que domina a competição. Já
vimos isso em 1988, quando a McLaren arrasou a concorrência e tinha Ayrton
Senna e Alain Prost.
A situação na McLaren,
aliás, até que ficou serena boa parte do ano. Apenas mais para o final da
temporada, em Portugal, quando Senna deu uma largada que quase prensou Prost no
muro é que os ânimos ficaram mais tensos, fora o fato de Prost achar que seus
motores andavam "descalibrados" para favorecer o brasileiro a certa
altura do campeonato (que nada se provou, com os japoneses até dando ao francês
a chance de escolher quais motores queria no lote de unidades disponíveis a
cada GP), mas ambos ainda terminaram o ano relativamente numa boa. Mas em 1989 a coisa azedou de vez, quando
o brasileiro descumpriu o pacto de não-agressão na primeira volta em San Marino
e venceu a corrida. A situação na Mercedes está se deteriorando mais rápido:
foram apenas 6 corridas até agora.
Fica a dúvida de como
ficará o clima na Mercedes a partir de agora. A tempestade se aproxima, resta
saber a intensidade das trovoadas. Se nas próximas corridas houver luta
ferrenha pela vitória, tudo deve azedar de vez mesmo, vai depender de quem
ganha e quem perde. E pode ficar menos ou mais complicado se um dos pilotos
conseguir vencer com margem ampla, suplantando o parceiro com folga. Amigos de
longa data, tanto Rosberg quanto Hamilton estão prestes a jogar a amizade no
lixo pela disputa acirrada do título, uma pena, mas a F-1 atual é assim,
destrói amizades e traz o pior à tona. Hamilton é o primeiro a falar algo mais
escancaradamente de que está incomodado por ter perdido, e não duvidem que
Rosberg demorará a falar algo parecido quando perder também.
No fundo, ambos sabem
que é uma chance que pode não se repetir. Quem garante que no ano que vem a
Mercedes continuará dando as cartas da maneira como vem fazendo agora? Pode
tanto continuar vencendo como pode enfim ter concorrência maus dura ou até
ficar em desvantagem, dependendo de como ficarem os novos carros de 2015.
Portanto, é aproveitar para ser campeão agora e arcar com possíveis
consequências depois. Hamilton busca o bi desde 2009, após ter sido campeão em
2008, e nos últimos 4 anos, viu-se subjugado pela hegemonia do conjunto
Sebastian Vettel/Red Bull. De novo com um carro vencedor e campeão em mãos, ele
não vai deixar passar a chance. Para Nico Rosberg, que está na F-1 desde 2006, e
desde então sendo considerado sempre uma "promessa", esta é sua
primeira temporada efetiva como postulante ao título, e nunca tendo sido
considerado um dos favoritos antes, também não vai querer deixar ninguém
estragar suas chances de finalmente ser campeão.
Continuo reafirmando o
que já falei em colunas anteriores: piloto por piloto, Lewis Hamilton é mais
rápido e talentoso do que Nico Rosberg, mas nem por isso o alemão deve ser
subestimado. Vai ser um duelo homem-a-homem, e o principal problema até o
presente momento é o fato de Hamilton por vezes se perder emocionalmente se as
coisas não correm bem a seu favor. É um ponto fraco que pode ser explorado por
Rosberg, que a princípio saiu-se bem em Mônaco. Por outro lado, não dá para
saber até que ponto Nico também vai ser manter impassível no caso de ser
superado por Hamilton com frequência. Ele ficou relativamente quieto nas 4
corridas que foram ganhas pelo inglês, mas não ia escondendo seu incômodo com a
situação. O fato de ser apenas o início do campeonato ajudou, mas e quando isso
ocorrer mais à frente, em momentos decisivos? Vai se manter impassível, ou
também pode perder as estribeiras? É algo que precisa ser conferido. Rosberg só
foi superado no campeonato por um companheiro de equipe no ano passado, mas com
o domínio imposto por Vettel e sua Red Bull na segunda metade da competição,
isso passou meio que em branco. Agora que o título está diretamente na alça de
mira, a situação é diferente, e promete mexer com os brios de ambos os pilotos,
e da escuderia.
Que eles se preparem
para a tempestade que se aproxima...ela pode ser bem feroz...
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