Alguém pode parar a Mercedes? Hamilton venceu pela quarta vez e assumiu a liderança da competição. |
Quem esperava uma
reação, ainda que tímida, da concorrência frente ao poderio da equipe Mercedes
na expectativa de ver alguma esperança para o campeonato de Fórmula 1 deste
ano, saiu com os burros n'água após a bandeirada do Grande Prêmio da Espanha,
realizado domingo passado em Barcelona. O domínio dos carros prateados foi
ainda maior do que o esperado, e a corrida só não foi totalmente insossa porque
houve expectativa de briga pela vitória entre os pilotos do time alemão, além
de algumas disputas razoáveis no pelotão do "resto", com direito a
uma grande recuperação de Sebastian Vettel, depois de enfrentar problemas a
rodo nos treinos livres e de classificação.
E quem venceu de novo
foi Lewis Hamilton, que com sua 4ª vitória consecutiva, passa a liderar o
mundial, com 3 pontos de vantagem sobre seu companheiro Nico Rosberg, que mais
uma vez foi batido pelo colega inglês. E a cada vez que isso acontece vai dando
ares de ficar cada vez mais incomodado. Mas não se pode descartar o alemão tão
facilmente. Esta foi a segunda corrida onde Nico, apesar de ter andado sempre
atrás de Hamilton, esteve sempre com o parceiro de time na mira, pronto para
aproveitar qualquer escorregão do companheiro de equipe. A vantagem do inglês
para Nico oscilou, mas nunca ficou muito grande. E, nas voltas finais, estava
com mais ação para atacar e brigar pela vitória. Mas, a exemplo do que
aconteceu no Bahrein, Hamilton conseguiu rechaçar os ataques, sendo que em
Sakhir chegaram até a trocar de posições rapidamente, em um belo duelo que
levantou o pessoal não apenas no circuito, mas no mundo inteiro.
Apontar o inglês como
campeão é fácil, mas Lewis não pode errar em nenhum momento. Nico está cada vez
mais "mordido" com a incômoda situação de ver o parceiro vencer
sempre, e em algum momento, ele pode conseguir o revide. Não vai ser fácil,
porém. Hamilton vem guiando muito, e até o momento, mostrou ter mais
"braço" para segurar a posição na pista, se bem que estando na
frente, há certa vantagem no controle da posição. E em Barcelona, uma pista de
difícil ultrapassagens, isso foi um ponto a favor do inglês, que conseguiu
manter Rosberg sob controle.
A disputa entre ambos,
aliás, é a única atração do campeonato. Claro, atrás deles, todo mundo anda se
batendo uns com os outros, mas é na luta para ser campeão que todo mundo presta
atenção. Nico tem a melhor chance de sua carreira de repetir o feito do pai,
Keke, que foi campeão em 1982 pela equipe Williams, e se tornar o segundo
piloto de F-1 a
repetir a façanha do pai sendo campeão na categoria máxima do automobilismo -
até o presente, apenas Damon Hill, filho do bicampeão Graham Hill, logrou
também a conquista do título na F-1. Uma derrota para Hamilton pode
estigmatizar Nico, e iniciar uma descendente em sua carreira. Ou não. Depende
dele apenas.
Cada vez mais afirmam
que o campeonato atual guarda similaridades com a temporada de 1988, que foi
dominada de forma arrasadora pela McLaren, que venceu 15 das 16 corridas da
temporada. E com pilotos que possuem estilos similares. Nico tem mais
sobriedade e frieza, ficando com a posição que era de Alain Prost, enquanto
Hamilton, pelo seu arrojo, lembra facilmente Ayrton Senna. Já fizeram inclusive
menção ao inglês dessa comparação, e Lewis falou com todas as letras que no
duelo atual, ele é "Senna", e com orgulho da comparação com o piloto
brasileiro. Para Rosberg, a comparação infelizmente também tem um detalhe
curioso que bate igualzinho ao momento atual: ele, assim como Prost,
praticamente era o nome central do time. Alain estava na McLaren desde 1984,
onde já havia sido bicampeão e vice-campeão, quando Ayrton chegou à escuderia.
Estava mais do que convencido de que sua capacidade de pilotagem e frieza
técnica poderiam dar conta do parceiro brasileiro, que àquela altura, era um
talento já mundialmente reconhecido, mas que era apenas arrojado ao extremo.
Era uma questão de descobrir os pontos fracos de Ayrton e se valer disso para
sobrepujá-lo. Tinha sua lógica, mas Prost viu que o buraco era mais embaixo...
Do mesmo modo, Nico
comandou a Mercedes de 2010 a
2012, sobrepujando ninguém menos do que Michael Schumacher, que a bem da
verdade, não se adaptou totalmente à nova F-1 que encontrara. Andava forte, é
verdade, mas já não com a mesma genialidade de antes. Subestimado pelo que
produzira em seus primeiros anos na F-1, correndo pela Williams, Nico
certamente evoluiu na Mercedes. Se ele se superestimou por ter superado
Schumacher nas 3 temporadas em que foram companheiros de equipe, já sabia que
com Hamilton a parada seria mais dura. E foi o que aconteceu. Apesar de ter
vencido 2 corridas, contra apenas 1 de Hamilton, Nico terminou o campeonato de
2013 na 6ª colocação, com 171 pontos. Hamilton, por sua vez, foi o 4° colocado,
com 189 pontos. Nico foi pole 3 vezes; Hamilton, 4. O alemão não era mais o
galo único do terreiro alemão, como Prost deixou de ser o rei do pedaço na
McLaren em 1988.
Prost era um
adversário forte, e mesmo surpreendido com a força de Senna, conseguiu se impôr
em vários momentos. Cabe a Nico fazer o mesmo, para evitar virar coadjuvante do
companheiro de equipe. O que diferencia a posição de ambos em relação à dupla
Senna-Prost é que Hamilton já foi campeão, e Rosberg não. Quando chegou à
McLaren, Ayrton ainda buscava seu primeiro título. Currículo por currículo, os
papéis são trocados. Mas o que deve incomodar Nico é o que vem depois no
histórico: tricampeão em 1989, Prost saiu da McLaren, onde já não tinha mais
clima para trabalhar junto com o brasileiro, e só foi ter chance efetiva de ser
campeão em mais duas temporadas, 1990 - onde foi vice, e 1993, onde chegou ao
4° e último título. O sucesso de Hamilton irá minar o alemão na Mercedes? Pode
acontecer, ou não. Vai depender do que os acontecimentos futuros proporcionarão
a ambos. Fala-se na fofoca de a Mercedes trazer Alonso para seu lugar, o que
acho difícil, pois o espanhol teria de engolir Hamilton novamente; ou até mesmo
na possibilidade de Vettel ir para o time alemão, também no lugar de Nico, o
que também acho difícil, pelo menos por enquanto.
A rigor, no momento a
Mercedes não tem porque se queixar de seus pilotos. Se possui um carro superior
a todos os outros, impossível ter resultados melhores do que os obtidos até
aqui, sendo que só não fizeram dobradinha na Austrália porque o carro de Lewis
quebrou, o que não foi culpa do inglês. Mesmo que acabe derrotado por Hamilton,
Nico precisa estar sempre atrás do inglês, tão perto quanto possível, para
mostrar que o time pode contar com ele para vencer tanto quanto com o inglês.
Mas se torna imperativo manter um ambiente fraterno dentro do time, sem rusgas
e com disputas limpas na pista. É possível competir a fundo e ainda ser amigo
de seu companheiro de equipe? É, mas vai exigir de ambos, e da escuderia, muita
força e determinação para evitar maus momentos e especialmente egos inflados.
Até o momento, a situação está sob controle.
Para a concorrência,
não há muito a fazer. A Red Bull cresceu bastante, mas enquanto o motor Renault
não render tanto, ou até mais do que o motor Mercedes, o time dependerá mais de
um abandono dos carros prateados para vencer do que qualquer outra coisa. E a
situação só se aprofunda em relação aos outros times. A McLaren parece perdida;
a Lotus, ainda que tenha melhorado bastante, é uma sombra do que foi ano passado;
a Williams pode ser a 3ª ou a 4ª força, e nada mais; e a Ferrari, pra variar,
errou de novo no projeto de seu carro. O consolo é que eles parecem se alternar
nas performances, o que sugere que a briga para ver quem vai ser o campeão do
"resto" do grid até pode ser interessante, resta saber quanto.
E, se alguém acha que
a prova espanhola viu um massacre da Mercedes só porque deram uma volta no 7°
colocado, Kimmi Raikkonem, com a Ferrari, deveria saber que em 1988 houve
situações piores. Basta mencionar que o GP de San Marino daquele ano apenas os
dois pilotos da McLaren chegaram na mesma volta, com Senna a bater Prost por
2,3s, enquanto o 3° colocado, Nélson Piquet, com a Lotus, ficou a mais de uma
volta atrás. E, contando-se apenas as primeiras 5 corridas, nas provas de
Mônaco, México e Canadá, apenas os 3 primeiros colocados terminaram na mesma
volta do vencedor. Ainda não houve situação parecida este ano, portanto, em 88
o massacre, em certos termos, foi ainda maior, pelo menos no fator performance frente
aos rivais da concorrência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário