sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

PORSCHE FAVORITA, DE NOVO?

A Porsche venceu na estréia da temporada 2024 da Formula-E, com Pascal Wehrlein conquistando sua segunda vitória na Cidade do México.

            A temporada 2024 da Formula-E deu sua largada com o ePrix da Cidade do México, no último final de semana, e para variar, Pascal Wehrlein venceu a corrida com a Porsche, reafirmando que está, mais uma vez, na briga pelo título da competição. Mas, tomando como parâmetro o ano passado, será que estará mesmo?

            O piloto largou na pole-position, e sempre esteve entre os líderes, só deixando de ocupar a liderança nos momentos em que saía para efetuar a ativação do Modo Ataque, quando então Sébastien Buemi, da Envision, ficava com o primeiro lugar. No final, Pascal recebeu a bandeirada de chegada na frente, com o piloto suíço embutido atrás. Não foi uma vitória tranquila, como Wehrlein fez questão de frisar. Um erro, e ele perderia a liderança para Buemi, que nunca deixou que ele escapasse o suficiente para administrar uma vantagem.

            Pascal, aliás, recusa o favoritismo, e não está errado nesta postura. Afinal, no ano passado, a Porsche terminou em 2º lugar no México, justamente com ele, indicando que seria um forte candidato ao título. A força da equipe alemã e seu piloto até se confirmou na etapa seguinte, em Diriyah, mas depois o panorama mudou, com a Jaguar e Envision assumindo a primazia e fazendo a Porsche virar azarona na disputa. Não podemos esquecer também que, dois anos atrás, a Porsche também venceu no México, no que foi sua primeira vitória na competição de carros elétricos, e até fez dobradinha naquele momento. Mas no restante da temporada, não fez muita coisa. O time alemão, e em especial, Wehrlein, parecem ter uma afinidade com a pista do circuito Hermanos Rodriguez, portanto, não dá para garantir que ambos mantenham a mesma força nas próximas etapas.

Sébastien Buemi (acima) e Nick Cassidy (abaixo) mostraram que a Jaguar vai dar trabalho na temporada deste ano, e com seus dois times.


            Do contrário, contando apenas com o que vimos na capital mexicana, poderíamos até dizer que a Porsche resolveu seu principal problema do ano passado, que era sua velocidade em classificação, ponto fraco da escuderia durante todo o ano, ainda que possuísse um ritmo de corrida respeitável. Será que, a exemplo de 2022, a força da Porsche no México é fogo de palha, ou algo mais durável, mas ainda relativamente efêmero, como vista em 2023? Só saberemos na próxima etapa, na semana que vem, na Arábia Saudita, e mesmo assim, dado o ocorrido no ano passado, teremos de esperar até a etapa de São Paulo para termos uma resposta mais confiável.

            Vencedora no México no ano passado, a Andretti ficou pelo meio do caminho este ano. Jake Dennis alegou problemas de freio para justificar o desempenho modesto de seu time, que largou com seus dois pilotos na segunda metade do grid, para terminarem apenas em 9º e 10º lugares, os últimos a pontuarem. Os treinos livres mostraram o time um pouco melhor, mas será preciso conferir nas próximas corridas se o que vimos na Cidade do México foi um ponto fora da curva, ou a Andretti decaiu de 2023 para 2024, caso contrário, os planos do atual campeão Jake Dennis de defender o título e tentar o bi podem ficar bem comprometidos. De positivo, apenas o fato de que ambos os pilotos terminaram, e próximos, com Norman Nato a justificar, pelo menos neste início, sua contratação pela escuderia norte-americana.

            Mas podemos contar que, entre os rivais, a Jaguar se mantém forte, e deve ser levada a sério para a temporada. A Envision conseguiu chegar à frente do time oficial da marca inglesa, com Buemi, mas Cassidy, em sua estréia na nova casa, garantiu o degrau mais baixo do pódio para a equipe de fábrica da Jaguar, e Mith Evans creditou seu 5º lugar a ter tido problemas com a direção do carro, justificando a posição em que terminou a corrida. No cômputo geral, em qualidade, deu Envision, mas em quantidade, deu Jaguar. A Envision só não esteve melhor porque Robin Frijns, retornando à escuderia, ficou pelo caminho, e sistematicamente batido por Buemi no panorama geral do fim de semana. Frijns mostrou que não perdeu o ritmo, mas na corrida, não deu sorte, e ainda por cima, bateu de novo no México, como já acontecera na etapa do ano passado. Ao menos dessa vez não se machucou, como em 2023, o que o fez perder várias etapas da competição, mas já começa a temporada devendo, enquanto Buemi sai na frente para se colocar como líder da Envision na pista. E candidato a lutar pelo título, podendo encerrar uma fase de baixos resultados que já vem de várias temporadas, já que a escuderia se mostrou forte como já vimos em 2023.

            A Jaguar, porém, não pode ser subestimada. Cassidy chegou firme ao time, e a disputa com Mith Evans promete tanto reforçar as chances da escuderia como incendiar o clima dentro da equipe. Nesta primeira etapa foi Evans a ficar atrás, alegando problemas de direção do carro para justificar não ter participado da luta pela vitória. O trem de força da marca britânica tem tudo para continuar sendo o mais eficiente do grid, a menos que a Porsche consiga contestar esse favoritismo com o decorrer do campeonato em curso. E precisaremos ver quem de fato vai se colocar como principal força da Jaguar. E não podemos desprezar a chance de tanto Cassidy quanto Evans virem firmes para a briga, e duelarem pelo título com tudo a que tem direito.

            Um pouco mais atrás, Maserati e DS Penske parecem candidatas a serem as forças seguintes ao binômio Porsche-Jaguar. Enquanto a Penske tem como trunfo sua dupla de pilotos campeões, com destaque para Jean-Éric Vergne, e um potencial Stoffel Vandoorne disposto a recuperar sua imagem depois do ano apático de 2023, no time italiano, Maxximilain Gunther parece ser o único ponto positivo, com Jeran Daruvala, novo piloto do time, a ter de mostrar a que veio, depois de praticamente nem ser notado na etapa mexicana, onde só não terminou em último por causa dos percalços de Nico Muller, da ABT, e do fraco desempenho de Dan Ticktum, da ERT. E pensar que o time pode ter desperdiçado a chance de contar com Felipe Drugovich, que fez ótimos testes com o carro da escuderia no ano passado, se tivessem sido mais incisivos nas tratativas com o piloto brasileiro, e se este não priorizasse se manter na F-1, ainda que como reserva da Aston Martin.

A ERT (ex-NIO) foi um fiasco no México (acima), arrastando-se pela pista, sendo que Sergio Sette Câmara nem conseguiu largar. Já Lucas Di Grassi (abaixo) retornando à velha equipe ABT teve problemas nos freios e deixou a prova cedo.


            Na Mahindra, confirmou o panorama esperado: apesar de algumas melhoras nos poucos ajustes permitidos pelo regulamento, o trem de força da equipe indiana ainda é o grande calcanhar de Aquiles do time, que não conseguiu em momento algum brigar por posições pontuáveis na etapa mexicana. Edoardo Mortara destacou-se por conseguir os melhores tempos da escuderia, com Nyck De Vries, em seu retorno ao certame onde foi campeão andando sempre atrás, mostrando que terá grandes dificuldades com o carro indiano nesta temporada. A Mahindra começou a formalizar um acordo de desenvolvimento para seu trem de força com a Mercedes, ex-participante da competição, com vistas a acelerar a melhoria de seu equipamento para a próxima temporada, mas já levou um revés, com o anúncio da ABT, seu time cliente e parceiro, de rescindir o acordo de fornecimento do trem de força para 2025, e procurar uma nova parceria, muito possível de ser a Porsche, pela boa performance exibida pelo powertrain alemão, fora o fato de ser uma marca do Grupo Volkswagen, com o qual a ABT já trabalhou no passado, quando estava ligada à Audi, outra empresa do grupo germânico.

            Para os brasileiros, o início da temporada 2024 da Formula-E foi para esquecer. Sergio Sette Câmara foi o que ficou mais frustrado. Os treinos demonstraram que sua equipe ERT tem tudo para ser a lanterna do ano, diante da falta de competitividade do equipamento. O brasileiro até conseguiu andar à frente do companheiro Dan Ticktum em certos momentos dos treinos, mas na hora da classificação, os esforços não frutificaram, condenando ambos a largarem lá atrás no grid. Mas, como desgraça pouca é bobagem, eis que Sergio nem conseguiu largar na corrida. Quando conduzia seu carro para o grid, o monoposto apresentou problemas técnicos, e não foi pouca coisa; Sergio relatou ter ouvido um estouro na parte de trás de seu carro, que acabou recolhido aos boxes para investigação, a qual foi assumida pela própria FIA, diante do estrago ocorrido, indicando que não foi uma simples falha do equipamento. O colega de Sergio, Ticktum, por sua vez, não conseguiu fazer nada de relevante na prova, tendo terminado na última colocação, indicando que a escuderia terá muito trabalho pela frente, e sem garantias de melhoras efetivas. O México pode ter sido apenas o início dos pesadelos da temporada.

            Já Lucas Di Grassi, que costuma ter boas lembranças da etapa mexicana, não vai ter nada de positivo para falar desta edição de 2024. Lucas teve problemas com os freios de seu carro desde o início dos treinos, o que atrapalhou seu desempenho. O time tentou resolver a situação, mas ao que parece, não obteve o sucesso necessário, já que o brasileiro acabou perdendo o carro na classificação, o que o levou a se classificar na penúltima fila. E, na corrida, repetiu-se o mesmo problema, de modo que Di Grassi acabou perdendo novamente o carro e saindo da pista, o que o levou ao abandono, após conseguir retornar aos boxes e tentar solucionar o problema. A sublinhar que, apesar do trem de força da Mahindra ainda apresentar um bom déficit de performance frente aos equipamentos mais competitivos, a ABT mostra que pode conseguir algum resultado com trabalho firme no carro, já que Nico Muller conseguiu uma posição de largada razoável, em 12º, e na corrida, só não teve melhor desempenho porque acabou atingido por Antonio Felix da Costa, da Porsche, numa disputa de posição, onde o piloto da ABT foi de encontro aos pneus. Mesmo não abandonando a corrida, ao contrário do piloto da Porsche, que deu adeus à prova, Miller caiu lá para trás e por lá ficou, sem chances de recuperação.

            A pista da Formula-E montada no Autódromo Hermanos Rodriguez, infelizmente, parece não colaborar para oferecer uma boa prova para a categoria. Pelo terceiro ano consecutivo, o ePrix da Cidade do México foi uma prova de poucas emoções, leia-se, poucas ultrapassagens, uma tônica destoante do restante da temporada, onde muitas disputas e brigas na pista levantaram a emoção da disputa. O circuito é travado, e os trechos de reta curtos para o potencial dos novos carros Gen3. A pista já foi ainda mais travada, uma vez que sua configuração original, usando o traçado oval presente no autódromo, era mais curta, e com mais curvas. Nos últimos anos, foi feita uma modificação que criou um novo trecho, aumentando a extensão do traçado, mas isso parece ter sido insuficiente para criar melhores condições de disputa. Formou-se um trem de carros que comboiavam um ao outro, e com raros momentos de troca de posições, parte delas provocada pela utilização do Modo Ataque, quando os pilotos saíam do traçado ideal na curva dentro do estádio para acionar o recurso. E a potência extra também não ajudou a melhorar as disputas.

Jake Dennis (acima) teve um início de temporada bem mais difícil do que esperava no México, onde venceu no ano passado. A corrida mexicana, mais uma vez, se mostrou com poucas emoções, com os carros andando até agrupados, mas com poucas chances de ultrapassagem (abaixo).


            Desse modo, mesmo que alguns pilotos andassem juntos, em especial até entre os primeiros colocados, não tivemos, de fato, brigas efetivas, de modo que o resultado pode ter frustrado quem esperava principalmente por um duelo pela vitória, já que Pascal Wehrlein, Sébastien Buemi, e Nick Cassidy estavam bem juntos, e qualquer um deles poderia partir para o ataque decisivo nas voltas finais da corrida, o que não aconteceu. Gunther ficou tranquilo em 4º, já que Mith Evans segurou vários pilotos atrás de si, sem que estes conseguissem ultrapassá-lo, e entre eles mesmos não se viu duelos que valessem a pena. Não havia espaço nas retas para se conseguir discutir as freadas nas curvas com potencial de ataque para concluir uma ultrapassagem.

            Será preciso repensar o traçado, algo complicado, já que o autódromo da capital mexicana não tem traçados alternativos que possam ser usados, além do que já é utilizado para as competições dos carros elétricos. O uso do traçado integral, usado pela F-1, ainda é inviável para os bólidos da F-E. Uma alternativa seria procurar por outro local de competição, o que esbarra em dificuldades de se achar não apenas o local, mas conseguir sua liberação e viabilização da realização da prova. Em 2021, a corrida mexicana não foi realizada na Cidade do México, já que o autódromo Hermanos Rodriguez estava sendo usado como hospital emergencial para tratamento dos casos da Covid-19, e forma que a prova acabou realizada no circuito de Puebla, que até tinha um traçado interessante, e bem mais plausível que o da Cidade do México. Porém os pilotos e equipes reclamaram das condições do asfalto da pista. Se esse problema fosse solucionado, poderia vir a ser uma opção interessante para manter o México no calendário da competição.

            Outro problema que a F-E precisa resolver são suas punições ao regulamento. Durante a corrida mexicana, foi anunciada uma investigação que seria levada a cabo depois da prova, envolvendo os carros equipados com o powertrain da Porsche, no caso, o de Wehrlein, e da dupla da Andretti, o que poderia resultar em alguma punição, caso uma irregularidade fosse encontrada, embora não tenham divulgado qual era durante a corrida. Isso deixou o resultado em suspense por mais de quatro horas, até que foi divulgado o boletim anunciado que nada de anormal foi encontrado. No caso, a suspeita era de que poderia haver um tipo de controle de tração eletrônico nos carros via software, algo que é proibido pelo regulamento. Os carros usam um sistema padrão da FIA para medição de torque, para coibir sistemas de controle de tração nos carros. Felizmente, nada foi constatado, mas evidenciou-se novamente uma falta de agilidade para se conferir eventuais suspeitas, o que poderia ter colocado em xeque o resultado da corrida, uma situação que já desagradou e muito os fãs, que terminaram vendo um resultado, e algum tempo depois, era anunciado outro.

            Não foi uma estreia das mais empolgantes para a nova temporada da Formula-E, se bem que, comparada ao ano passado, quando a competição correu sob olhares de desconfiança no novo equipamento de competição, podemos dizer que o clima foi bem mais tranquilo. Agora resta esperar que, tal qual em 2023, o campeonato pegue fogo a partir das próximas corridas, e vejamos provas com disputas alucinadas e entusiasmantes, para levantar a emoção do público amante da velocidade. Vamos conferir o novo round semana que vem, na Arábia Saudita...

 

 

A transmissão da estreia da temporada 2024 da Formula-E brindou os fãs nacionais da velocidade com um belo empenho em mostrar tudo o que estava acontecendo na etapa da Cidade do México. O Grupo Bandeirantes, que transmitiu treinos e corridas através do canal pago Bandsports, além do aplicativo Bandplay, mandou Tiago Mendonça para acompanhar “in loco” todas as atividades no Autódromo Hermanos Rodriguez, com entradas ao vivo durante as transmissões. Por sua vez, o site Grande Prêmio, que também transmite oficialmente a competição através de seu canal no You Tube, contava com Geferson Kern também presente na capital mexicana, também entrando ao vivo durante as transmissões. Um esquema que só deve se repetir por ocasião da etapa brasileira do campeonato, aqui em São Paulo, certamente, mas que mostra a aposta dos dois veículos no campeonato dos carros monopostos elétricos.

 

 

O Brasil, aliás, reforça sua presença na Formula-E. Além de contar com dois pilotos titulares no grid, e uma etapa no calendário, nosso país agora tem mais um representante na competição: Caio Collet, que nos últimos anos disputou a F-3, foi anunciado oficialmente como piloto reserva e de testes da equipe Nissan, já tendo estado presente no paddock da Cidade do México em sua nova função. O acordo não impede Caio de competir por outro certame, caso haja algum convite, e pode abrir uma opção para o piloto vir a conseguir uma vaga de titular no grid, dependendo de seu desempenho nas atividades de testes e no simulador na equipe nipônica, que para este ano tem como dupla titular Oliver Rowland e Sacha Fenestraz.

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