sexta-feira, 27 de julho de 2018

BALANÇO DA ALEMANHA

Do céu de largar na pole e liderar a corrida ao inferno de errar e bater (acima), e ainda por cima ver o principal rival vencer com dobradinha da Mercedes (abaixo, com o diretor do Grupo Mercedes comemorando com seus dois pilotos): O dia de Vettel na corrida alemã.

            O campeonato da Fórmula 1 desta temporada está se mostrando mais interessante do que as corridas poderiam demonstrar. As disputas não tem sido exatamente as mais emocionantes, mas os resultados, e alguns acontecimentos inesperados, vem dando um tempero que promete apimentar a disputa pelo título mais do que se imaginava. Depois de vermos um GP da Inglaterra onde esperávamos ver um Lewis Hamilton difícil de ser batido, uma largada ruim e um toque logo após, que fizeram o piloto inglês cair para o fim do pelotão, só não teve consequências mais drásticas para o atual tetracampeão porque um Safety Car na parte final da corrida ajudou a aproximar todo mundo, e nas voltas finais a ritmo intenso, Hamilton salvou um impensável 2º lugar, minimizando os estragos da vitória de uma Ferrari e um Sebastian Vettel mais fortes do que se esperava. No pódio, a provocação de Sebastian ao rival “da casa” fazia suor que Hamilton viria mais do que nunca determinado a dar o troco na corrida seguinte, agora na casa de Vettel, a Alemanha. Mas é claro que o alemão e o time italiano tinham outras idéias...
            E, além de encontrarem novamente uma Ferrari mais rápida e forte do que nunca, eis que Lewis ainda alimenta seu drama pessoal com uma pane hidráulica em seu carro no Q1, fazendo com que o piloto pare na pista, e tenha de largar em 14º. E como desgraça pouca é bobagem, Sebastian resolve mostrar quem está mandando na brincadeira em Hockenhein, marcando a pole, e dando o sinal de que a prometida “vingança” do rival na sua casa estaria fora de cogitação. E até que tudo vinha bem no script no domingo: Vettel largou bem, e vinha fazendo sua corrida, rumo a uma vitória tranquila, enquanto Hamilton se esgoelava lá atrás para chegar no pelotão da frente. O que se via até então era uma espécie de repeteco inicial do que vimos em Silverstone, com o agravante de não haver um Safety Car que servisse de alento para Lewis. Mas tinha outra ameaça: a chuva, que ameaçava chegar, e estava rondando o autódromo.
            E ela chegou, mas ao mesmo tempo, também não chegou. A esperada chuva caiu apenas parcialmente, e deixou todo mundo enrolado nas estratégias. Uma pequena pancada rápida que deixou a pista úmida, mas não inteiramente molhada, bagunçou as estratégias de pilotos e times. Ninguém sabia se era melhor parar e trocar os pneus, ou aguardar um pouco, e arriscar ver se a chuva se firmaria ou não. Todo mundo arriscou: os que trocaram os pneus, e aqueles que se mantiveram na pista. Não havia como apontar a escolha menos arriscada: nas cercanias do autódromo, a chuva já era realidade em alguns cantos, enquanto em outros, ainda não. Podia dar que a chuva forte viria para a pista, e aí, quem trocou de pneus teria dado o pulo do gato. Por outro lado, se a água não viesse, quem arriscou ficar na pista se daria bem, e ganharia larga vantagem porque quem trocou de compostos fatalmente teria de voltar aos boxes para desfazer a troca, perdendo muito tempo. E, mesmo com todo mundo de olho nas informações meteorológicas, não dava para saber quem se daria bem ou não.
Mais um fim de semana abaixo das expectativas para a Williams. E nenhuma perspectiva real de melhora...
            Pois é, mesmo numa era onde dispomos de informações a nível nunca antes vistos para analisar uma situação, e tentar evitar ser surpreendidos, as interpéries climáticas ainda mostram que podemos ter todas as informações e ainda assim não termos como saber nada ao certo. Se por alguns momentos, quando a chuva chegou, era quase patente apostar que a chuva viria pra valer, e poderia mudar o panorama da corrida alemã, o que se viu nos momentos seguintes foi a confirmação da última afirmação, mas não da primeira. A chuva foi diminuindo, mas sem exatamente eliminar sua presença ou ameaça de retorno a qualquer instante.
            Quem parou tentando se dar bem com a troca de pneus entrou pelo cano, e precisou voltar aos boxes para nova troca de pneus para pista seca, perdendo um tempo precioso, e ficando com sua estratégia de corrida completamente comprometida. Um exemplo foi a dupla da Hass, que caiu lá para trás, sendo que até então ocupava suas melhores posições de pontuação depois da corrida da Áustria. Fernando Alonso também se deu mal, e se tinha conseguido entrar na zona de pontuação, caiu para os últimos lugares. Mas quem ficou na pista corria ainda o risco de a chuva voltar, e havia outro perigo ainda mais traiçoeiro, que eram os trechos do circuito que ficaram mais molhados nos poucos momentos em que a água caiu com força, formando aquela combinação de piso nem seco, e nem molhado, a pior combinação possível, onde a umidade se junta à poeira e borracha do asfalto, produzindo uma superfície tremendamente escorregadia, pronta para se transformar em uma armadilha fatal aos mais desavisados, ou azarados. E, de fato, em alguns momentos, alguns pilotos acabaram saindo levemente do traçado, tendo muita sorte para conseguirem voltar à pista, ou mostrando sua habilidade para driblar o piso traiçoeiro.
Romain Grosjean levou a Hass a outra boa posição nos pontos, apesar da parada extra motivada pela possibilidade de chuva. Atrás dele, Sérgio Perez também fez bonito com a Force India em Hockenhein.
            A pista já havia até secado um pouco, e à essa altura da corrida, Hamilton vinha tentando diminuir a diferença para Vettel, e andava muito mais veloz que todos à sua frente. Fatalmente, até o fim da corrida, ele poderia alcançar o alemão, e com pneus mais novos que o ferrarista, talvez até ameaçar sua até então tranquila vitória. E talvez essa pressão, ainda indireta, já que sua vantagem ainda era considerável, levou Sebastian a tentar responder, apertando o ritmo. E eis que o alemão acabou caindo numa das armadilhas do piso traiçoeiro que ainda restava no circuito que ficava cada vez mais seco, e num erro que poderia ser facilmente evitável, Vettel saiu da pista direto para o abandono, numa cena que parecia surreal demais para ser verdade. Acabava ali a corrida de Sebastian, e sua raiva ao socar o volante dizia muito sobre o que realmente ocorrera ali: ele próprio havia jogado sua corrida fora.
            Aí, com o Safety Car, e a chuva ainda ameaçando, o que fazer? Trocar de pneus, mesmo para seco, e partir para o tudo ou nada nas voltas finais? Kimi Raikkonen precisava de um novo jogo de pneus, e Valtteri Bottas acabou pegando todo mundo no box da Mercedes sem estarem preparados com os pneus. Foi a deixa inesperada para fazer com que Hamilton abortasse sua ida ao box, e voltasse à pista, mesmo passando pela grama, e indo para a liderança. Quando a corrida foi reiniciada, o ponto negativo, pelo menos do ponto de vista esportivo, foi a Mercedes dar a ordem para Bottas não atacar Lewis, mantendo sua posição. O inglês agradeceu e acelerou firme para uma vitória que parecia completamente improvável, e que reacende novamente a luta pelo campeonato, com uma nova reviravolta na liderança da classificação. Talvez nem Hamilton acreditasse que viveria um domingo daqueles: além de vencer, viu seu rival ficar zerado, e ainda tendo abandonado por um erro bobo de si próprio. E diante de sua torcida. Realmente, acabamos tendo um repeteco de Silverstone: Hamilton tendo de fazer prova de recuperação; Ferrari mais forte; um fato inusitado que muda o panorama de uma corrida não muito emocionante; e um duelo alucinante nas voltas finais. Nem tudo foi igual, claro. Mas tudo caminhava em uma direção, e acabamos indo parar em outra.
            O campeonato ainda está plenamente aberto, e a vantagem de Hamilton na liderança é ínfima, e por dois motivos simples: a Ferrari, neste momento, tem um carro mais competitivo do que a Mercedes; e hoje já começam os treinos para o GP da Hungria, aqui em Hungaroring, e a tendência, nesta pista travada ao extremo e de difícil ultrapassagem, é vermos Vettel e a Ferrari ainda mais fortes. As chances de o alemão retomar a liderança da classificação são altas, se a Mercedes não conseguir mostrar ritmo para duelar com os carros vermelhos. Se Vettel largar na frente, e não cometer erros, ele dificilmente perde a corrida. Certo, mas ele largou na frente na Alemanha, e errou. Quem garante que não acontece aqui também? Não é impossível, mas vai ser difícil. Vettel está com o erro atravessado na garganta, e vai tomar cuidado em não errar de novo. E tem mais: a morte de Sergio Marchionne, o executivo que reergueu a Ferrari nos últimos anos, e todo o grupo Fiat-Chrysler. Todos na escuderia estão de luto, e nada mais óbvio para honrar a memória do falecido chefe do que vencer na Hungria, a exemplo do que a própria Ferrari fez em 1988, ao vencer o GP da Itália, em reverência à morte de Enzo Ferrari, ocorrida pouco tempo antes daquela corrida. Se naquele ano o resultado foi um golpe de sorte com o abandono da então dominante dupla da McLaren, aqui a Ferrari tem tudo para ser o time a ser batido. E com determinação ferrenha de esmagara rival Mercedes.

Luto na Ferrari: Sergio Marchionne, responsável pela reestruturação da Ferrari e do seu renascimento como força competitiva na luta pelo título da F-1 faleceu vítima de problemas cirúrgicos nesta semana.
            Vão cumprir essa ameaça? Só teremos uma idéia mais precisa depois dos treinos livres de hoje. Curiosamente, o maior trunfo da Ferrari no momento é um dos fatores que são amenizados aqui em Hungaroring: a potência do motor. A unidade da Ferrari conseguiu apresentar um incremento de potência que está deixando a Mercedes desorientada nas últimas corridas, mas neste circuito travado, ela contará menos. Se isso vai ser bom para a Mercedes, ainda não dá para saber. Mas o que conta aqui é um chassi equilibrado e ágil, e isso traz outro competidor para brigar na linha de frente: a Red Bull, cujo chassi ninguém discute ser talvez o melhor da F-1, cortesia do “mago” da aerodinâmica Adrian Newey. O time dos energéticos, contudo, tem que ver se não terá problemas nos seus carros, como aconteceu com Daniel Ricciardo em Hockenhein no fim de semana passado. Mas, se não tiver percalços, deve entrar firme na luta pela vitória.
            Tradicionalmente, a corrida da Hungria não é nenhuma maravilha em termos de disputa. Quem larga na frente aqui só perde a posição se errar na pista, porque mesmo na reta dos boxes, com DRS e tudo, é bem difícil ultrapassar. É preciso entrar bem próximo na curva de entrada da reta para conseguir fazer uso hábil do recurso, e isso tem sido bem complicado nos últimos anos. E com os carros mais largos e dependentes da aerodinâmica desde o ano passado, tudo ficou ainda mais complicado. Não que as últimas corridas, antes dos acontecimentos que mudaram as dinâmicas das provas, tenham sido lá exemplos de corridas disputadas, mas na teoria, os circuitos eram favoráveis a apresentarem boas perspectivas de disputas. Será que Hungaroring, tradicionalmente avesso a boas provas, vai mostrar o contrário? A única certeza é que as chances de termos uma nova reviravolta na liderança do campeonato são grandes aqui, e isso deve manter a disputa pelo título em pé de guerra na volta dos times após as férias do verão europeu, na Bélgica, daqui a um mês. É o que está sustentando o interesse na competição...
            Definitivamente, a F-1 ainda precisa conseguir mostrar maior competitividade e disputas no pelotão da frente. No intermediário, pelo menos, a coisa anda mais interessante...


O abandono de Sebastian Vettel, vejam só, foi comemorado efusivamente por muitos torcedores nas arquibancadas do circuito de Hockenhein. O piloto podia ser alemão, mas muitos torcem pela Mercedes, da mesma forma como na Itália muitos torcem pela Ferrari, não importa quem seja o seu piloto. Curiosamente, vi diversas cenas de torcedores comemorando nas arquibancadas, com a presença de torcedores ferraristas nas proximidades, que obviamente, não estavam nem um pouco animados com o entusiasmo dos vizinhos ali naqueles setores. Felizmente, nada de confusão ou brigas entre o pessoal...


Sebastian Vettel teve chiliques pelo rádio durante a corrida alemã, quando se viu atrás de Kimi Raikkonen, e o finlandês não diminuía o ritmo para lhe dar passagem. Precisou esbravejar com a equipe, que precisou pedir ao finlandês, meio disfarçadamente, para dar passagem ao companheiro de equipe. Raikkonen não gostou da enrolação, e foi direto, pedindo para eles falarem logo de uma vez o que era para ele fazer. E pegou mal para Vettel, cuja fama de reclamão já é mais do que conhecida. Afinal, se ele é o primeiro piloto do time, que passasse logo de uma vez Kimi na pista, ou ele não é o tetracampeão que afirma ser? Precisar de “ajuda” do box para isso só desmerece o piloto como profissional. Na minha opinião, se é mais rápido, que trate de passar logo, sem firulas ou ordens de box. Se não consegue, problema dele. Com a obrigação de deixar o alemão passar, Kimi teve de abrandar o ritmo, e claro, perdeu tempo na pista, e a partir dali, para quê também forçar o ritmo do carro. Para muitos, e partilho da opinião, o abandono de Vettel veio como castigo dessa mania de alguns pilotos acharem que o companheiro de equipe deve sacrificar sua corrida pela sua, só porque ele quer. E, para a Ferrari, pode ter sido o tempo perdido que ainda permitiria a Raikkonen, quem sabe, voltar ainda à frente de Hamilton quando o Safety Car entrou na pista, e o finlandês fez sua segunda e última parada de box. Quem sabe, poderíamos até ter tido uma vitória de Kimi, que certamente seria muito mais conveniente para a Ferrari do que ver a rival Mercedes fazer uma dobradinha na prova. Podem me chamar de ingênuo por ser idealista, mas jogo de equipe, para mim, só é aceitável mesmo quando estamos na corrida final, e não praticamente no meio do campeonato. Mas Vetttel não foi o único reclamão neste quesito: lá mesmo, em Hockenhein, em 2010, Fernando Alonso, então piloto da Ferrari, fez o mesmo escarcéu para Felipe Massa deixa-lo passar, de onde veio a famosa frase que todos se lembram. Alonso perdeu o campeonato na corrida final para Sebastian Vettel. Castigo mais do que merecido também pela patifaria antidesportiva àquela altura da competição...


E também não gostei do que a Mercedes fez com Valtteri Bottas nas voltas finais, quando o finlandês ameaçava tomar a liderança de Lewis Hamilton na briga pela vitória em Hockenhein. Posso entender os motivos do time prateado, mas isso não signifique que concorde com eles. Jogo de equipe nesta altura da competição não... E pessoalmente vou adorar se o Liberty Media resolver pôr um fim nisso, em nome do interesse maior do esporte. Se a F-1 quiser voltar a ter um pouco mais de atratividade, jogo de equipe nesta altura do campeonato é um dos fatores que ajuda a “queimar” a credibilidade da competição em si... Posso estar sonhando demais, eu sei... Mas é o que eu acredito, e faço questão de defender, por mais utópico que isso pareça...

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