O GP da França está de volta à F-1, e traz de volta também o belo circuito de Paul Ricard, próximo da costa francesa do Mar Mediterrâneo. |
Em clima de Copa do
Mundo de Futebol, o mundo da velocidade não descansa, e hoje começam os treinos
para uma das corridas mais aguardadas da temporada 2018 da Fórmula 1: o Grande
Prêmio da França. A corrida francesa estava ausente há praticamente uma década
do calendário da categoria máxima do automobilismo, tendo sido disputada pela
última vez em 2008. Mas, além da comemoração por sua volta, que faz com que a
França, um dos berços mundiais do automobilismo mundial, volte a sediar um GP
de F-1, há outro motivo para a grande comemoração do retorno desta prova: a
volta de Paul Ricard como sede da corrida francesa, de onde andava ausente
desde 1990, quando esteve presente pela última vez no campeonato.
Em 1991, a corrida foi
mudada para o circuito de Magny-Cours, no interior da França, próximo à cidade
de Nevers. O maior motivo para a mudança do palco do GP foi político: Guy
Ligier, proprietário da extinta equipe Ligier, inaugurou a nova fábrica e sede
de sua escuderia na região, e a pretexto de usar o autódromo como base de um
plano para atrair investimentos para a região, que era seu berço político,
cobrou muitos favores do governo francês, à época presidido por François
Miterrand, para conseguir que a corrida fosse para lá. O grande trunfo, claro,
era o autódromo, novinho em folha, e com instalações à época que deixaram todo
mundo de queixo caído, oferecendo uma estrutura que nenhuma outra pista podia
proporcionar até então.
Para Bernie Ecclestone,
promotor da F-1, era o máximo, em poder ver sua categoria correr naquele
circuito que era tão suntuoso. Todos os times, claro, gostaram das estruturas oferecidas,
no início de um processo que desencadearia, anos mais tarde, nos megacomplexos
circuitos que a categoria passou a exigir para se apresentar pelo mundo afora.
Até aquele tempo, ainda era possível correr em pistas onde as instalações eram
mais acanhadas e simples, como nos bons tempos românticos que fizeram a fama da
F-1. Magny-Cours mudaria tudo isso, para melhor, e para pior, com suas
facilidades e reveses. Mas, a grosso modo, Magny Cours só agradava mesmo pela
pista. Tirando o circuito, não havia praticamente nada nos arredores que
compensasse a presença dos torcedores e profissionais num fim de semana de GP.
Por estar situado numa zona quase inteiramente rural, a estrutura hoteleira
próxima à pista era quase nula. Até mesmo Nevers, a cidade de maior porte perto
da pista, não oferecia atrativos que justificassem uma viagem de passeio por ali.
Pilotos, equipes, e profissionais de imprensa passaram muitos anos complicados
em termos de arrumar locais para se hospedarem por ali. Lembro-me do Lívio
Oricchio mencionar que, certa ocasião, acabou hospedado em cima do estábulo de
um sítio. Aventuras mais complicadas, creio que apenas quando a F-1 resolveu
correr em Aida, circuito perdido em meio ao nada na parte sul da principal ilha
do arquipélago do Japão, em 1994 e 1995, quando houve a realização do GP do
Pacífico...
Mas a prova, com farto
apoio do governo francês, foi sendo mantida no calendário, até que as taxas
exorbitantes cobradas por Ecclestone decretaram o fim da etapa francesa depois
de 2008. O prometido desenvolvimento feito por Guy Ligier e os políticos nunca
se concretizou, e a região hoje não está muito melhor do que em 1991. Ligier,
aliás, deixaria a F-1 na segunda metade dos anos 1990, quando vendeu seu time a
Alain Prost, que mudou a sede da escuderia para as cercanias de Paris,
enterrando de vez os projetos um dia pensados de Guy para tentar promover a
região de Nevers. E a própria escuderia, rebatizada de Prost, que nos seus
tempos aúreos era tida como orgulho nacional francês, não resistiu à má
administração de Alain Prost, falindo no começo dos anos 2000 sem deixar
saudades. Assim como Magny Cours também deixou poucas saudades em todos que lá
correram. Se a estrutura da pista era ímpar, seu traçado, truncado, e pouco
inspirado, nunca propiciou boas corridas, deixando muitas saudades em quem teve
a chance de correr em Paul Ricard, sede anterior da prova francesa.
Mas, depois de muito
tempo, as injustiças foram corrigidas, e em fins de 2016, foi anunciado o tão
aguardado retorno, não apenas da prova da França, mas de seu melhor palco, Paul
Ricard, ao calendário da F-1, para a temporada de 2018. A pista hoje está
completamente recuperada, e a F-1 voltará a usar o seu traçado original
completo, utilizado pela última vez em 1985. Volta também a duração original da
prova, em 54 voltas. Com a adoção de uma chicane para cortar a velocidade da
grande reta mistral, o novo percurso do traçado é de 5,861 Km, ante os 5,810 Km
de 1985. De 1986 a 1990, a pista foi encurtada, numa tentativa de torná-la mais
segura, após o violento acidente que vitimou Elio de Angelis em 1986. Numa
sessão de testes particulares da Brabham, a asa traseira de seu carro quebrou
em plena reta Mistral, em altíssima velocidade, e o piloto perdeu o controle de
seu bólido pela falta do aparato aerodinâmico, De Angelis sofreu um forte
acidente, vindo a falecer. Ninguém gostou da versão “encurtada” da pista, que
ficou com apenas 3,813 Km de extensão, mas era o que dava para fazer na época,
portanto, a segurança falou mais alto. Hoje, a introdução de uma chicane
justamente a meio da grande reta Mistral serve para quebrar a alta velocidade
do trecho, garantindo sua segurança.
Com algumas curvas
travadas, em meio a outras curvas de raio longo e de alta velocidade, Paul Ricard
deve oferecer um bom desafio aos pilotos e equipes da atual geração da F-1. O
recorde absoluto da pista é de Keke Rosberg, em 1985, com Williams FW10 Honda
turbo, que marcou o tempo de 1min39s914, que deve ser pulverizado já no
primeiro treino livre de hoje, haja visto a grande diferença de performance dos
bólidos da F-1 daquela época para a atual, mesmo com a introdução da chicane no
meio da Mistral. Quanto os carros atuais serão mais velozes que os daquela
época só saberemos ao fim do primeiro treino de hoje.
Mas, o que mais atrai
aqui, no pequeno povoado de Le Castellet, além do traçado de Paul Ricard ser
muito mais interessante do que o de Magny Cours, é o que há além da pista. E
não faltam opções: estamos próximos da Côte D’Azur, e todo o encanto da costa
mais carismática e disputada do Mar Mediterrâneo, próximos de várias cidades
cheias de atrativos turísticos, além das praias que atraem milhares de turistas
nesta época do ano, como Marselha, Toulon, Cannes, Nice, e claro, Mônaco, um
pouco mais distante. Para não mencionar também a pujante área agrícola deste
entorno, com seus vinhedos, onde se produz excelentes bebidas, mesmo as que não
sejam famosas. E aqui ao lado da pista ainda temos o Aeroporto Internacional de
Le Castellet, e temos nas vizinhanças vários hotéis, restaurantes, e estrutura
turística pra ninguém botar defeito, tudo o que não havia em Magny-Cours. Como
competir com um lugar desses? Não por acaso, a etapa francesa era uma das
provas favoritas dos pilotos sempre que a F-1 correu aqui, e não é preciso
pensar muito para descobrir o porquê. E acredito que tem tudo para voltar a ser
um dos melhores GPs para pilotos e equipes, pelo menos no clima extrapista.
Dentro da pista, fica
a dúvida de quão boa pode ser a corrida de reestréia da F-1 no domingo. Em
tese, com seus longos trechos de retas, Paul Ricard deve proporcionar bons
pegas entre os pilotos, com bons trechos para se tentar ultrapassagens. Pelo
menos, na teoria. Em Montreal, esperávamos um GP agitado, e o que tivemos foi a
corrida mais monótona da temporada até aqui. Paul Ricard também é um circuito
que exige potência dos motores, e as atuais unidades motrizes híbridas terão
boa chance de mostrar a que vieram, pelos longos trechos de reta e curvas de
raio longo. Será um prato cheio para verificarmos se as novidades introduzidas
por Honda e Renault na etapa do Canadá realmente proporcionaram ganhos
significativos de performance que os tenham aproximado do desempenho das
melhores unidades, Ferrari, e especialmente Mercedes, que aqui finalmente
estréia sua nova versão, que não pôde ser usada no Canadá por problemas de
confiabilidade que poderiam comprometer o desempenho dos pilotos na corrida e
nos treinos.
Portanto, a prova pode
ser bem interessante na disputa pelo campeonato. Será que Lewis Hamilton e a
Mercedes conseguirão dar o troco na Ferrari, depois de Sebastian Vettel ter
dominado a corrida no Canadá? E não se pode esquecer que Valtteri Bottas vem
fazendo algumas corridas com muito mais eficiência do que o atual tetracampeão.
E temos também a Red Bull para tentar se meter no meio desta briga a dois
times, que pode muito bem virar um duelo a três, se as circunstâncias o
permitirem. E, para não dizer que a disputa será apenas na ponta, o pelotão
intermediário também promete bons duelos, com a Renault tentando consolidar-se
como 4ª força; a McLaren tentando acertar o seu rumo, e a Force India e
Sauber/Alfa Romeo (esta especialmente com Charles LeClerc) subindo de produção.
Toro Rosso e Hass voltarão a suas melhores formas? E a Williams, continuará na lanterna
do grid? Começaremos a descobrir as respostas já no primeiro treino livre. E
seja muito bem-vindo de volta à F-1, GP da França, e especialmente, Circuito de
Paul Ricard!
Construído em 1970, a pista de
Paul Ricard já sediou o Grande Prêmio da França em 14 ocasiões. A estréia do
circuito na F-1 foi em 1971, substituindo o circuito de Clermont-Ferrand como
sede da etapa francesa do campeonato. Jackie Stewart foi o primeiro
pole-position, com o tempo de 1min50s71, com sua Tyrrel/Ford-Cosworth, à frente
da dupla da Ferrari, Clay Regazzoni, e Jack Ickx. Na corrida, deu Stewart como
primeiro vencedor da F-1 nesta pista, em uma dobradinha da equipe de Ken Tyrrel,
com François Cévert chegando em 2º lugar. Émerson Fittipaldi, com seu
Lotus/Ford-Cosworth, depois de largar numa pouca inspiradora 17ª posição no
grid, fez uma prova combativa para terminar em 3º lugar, fechando o pódio. Já
Ickx e Regazzoni ficaram pelo meio do caminho: o belga por problemas mecânicos no
motor, e Clay por se envolver em um acidente. Clermont-Ferrand sediaria a
corrida francesa pela última vez em 1972, e Paul Ricard assumiu de vez como
sede a partir de 1973, com exceção das provas de 1974, 1977, 1979, 1981, e
1984, quando a corrida foi disputada em Dijon-Prenois, praticamente em um esquema
de revezamento. E, em 1990, Paul Ricard sediaria a prova pela última vez. Nigel
Mansell, então na Ferrari, marcou a pole, mas a vitória ficou com seu companheiro
de equipe, o francês Alain Prost. E quase que a corrida viu uma zebra incrível
na luta pela vitória: Ivan Capelli, da March, estava liderando a corrida,
graças a uma prova sem fazer parada nos boxes para trocar pneus, e se mantendo
firme na luta pela vitória, dando combate à Ferrari de Prost. Mas, a três
voltas do final, o carro de Capelli começou a apresentar problemas na pressão
do óleo do motor Judd, e o italiano precisou abrandar o ritmo, o que deu chance
de Prost superá-lo e rumar firme para a vitória. O carro de Ivan mal conseguiu
cruzar a linha de chegada ainda em 2º lugar, perto de ser superado por Ayrton
Senna, da McLaren, que fechou o pódio em 3º lugar.
Ivan Capelli lidera a última corrida de F-1 em Paul Ricard, em 1990, à frente de Alain Prost, que acabaria por ser o vencedor da prova. O italiano foi 2º, e quase ganhou a corrida. |
Apesar de vários de nossos
representantes na F-1 já terem disputado essa corrida, apenas dois brasileiros
venceram o GP da França até hoje, e uma das vitórias foi justamente aqui em Paul
Ricard: Nélson Piquet, em 1985, naquela que foi a sua última vitória na equipe
Brabham, e também a última do time fundado por Jack Brabham décadas antes na
F-1. A Brabham faliria durante a temporada de 1992, depois de agonizar nos dois
anos anteriores. A outra vitória foi de Felipe Massa, em 2008, mas na pista de
Magny-Cours, pela Ferrari, na única temporada em que Felipe disputou o título
da F-1, quase conquistando o título, mas ficando com o vice-campeonato pela
diferença de um ponto para Lewis Hamilton, da McLaren, que levantou o caneco.
Dos pilotos atuais, apenas Fernando Alonso, Lewis Hamilton, Kimi Raikkonen e
Sebastian Vettel já disputaram o GP da França e permanecem na F-1.
O circuito de Paul Ricard tem o
nome de seu criador, o industrial Paul Louis Marius Ricard, que se notabilizou
por produzir uma bebida alcóolica conhecida como pastis, muito comum na França,
comercializada com seu nome desde 1932. Entusiasta de esportes, ele logo viu a
oportunidade para patrocinar eventos esportivos para promover seu produto,
tendo sido o primeiro patrocinador da conhecida prova de ciclismo Volta da
França, ainda em 1948. E, claro, a construção do circuito, iniciada em fins de
1969, e finalizada no ano seguinte, também tinha propósito de promover seus
negócios. Nascido em julho de 1909, Paul Ricard faleceu em novembro de 1997,
aos 88 anos de idade.
Paul Louis Marius Ricard, fundador e construtor do circuito que leva o seu nome, junto à pista do autódromo, nos anos 1990. |
A Indycar também acelera fundo
neste final de semana, e naquele que é conhecido como o melhor circuito misto
dos Estados Unidos, Elkhart Lake, com cerca de 6 Km de extensão, e que é
chamado de “Spa-Francorchamps dos Estados Unidos”. A prova terá transmissão
tanto pelo canal pago Bandsports quanto pelo canal aberto da TV Bandeirantes, a
partir das 14 horas, horário de Brasília.
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