sexta-feira, 8 de junho de 2018

ENCRUZILHADA

A Toro Rosso terá a nova versão das unidades motrizes da Honda no GP do Canadá, onde os japoneses prometem melhorar substancialmente a potência. E o desempenho será cuidadosamente observado pela equipe matriz, a Red Bull (abaixo), que precisa saber se valerá a pena trocar as unidades da Renault pelas nipônicas.

            Hoje começam os treinos oficiais para o Grande Prêmio do Canadá, e uma das novidades aqui no circuito Gilles Villeneuve são as novas versões atualizadas dos propulsores Renault e Honda, que não por acaso estão no centro da grande dúvida que cerca o destino de uma das principais escuderias da F-1 para a próxima temporada: Afinal, com qual motor a Red Bull irá correr em 2019?
            Quando o acordo que permitiu à McLaren romper seu acordo com a Honda no ano passado, para poder utilizar os propulsores franceses este ano, e repassar as unidades de potência nipônicas para a Toro Rosso, todo mundo já antevia que um dos motivos, fora permitir que a Honda continuasse na categoria máxima do automobilismo, e não perdessem outro fabricante de motores, era que a Red Bull iria avaliar a evolução das unidades japonesas, visando a possibilidade de substituir os motores Renault que utiliza há uma década, e com os quais foram campeões nas temporadas de 2010 a 2013. Trabalhar com um time pequeno como a Toro Rosso permitiria aos japoneses da Honda terem tranquilidade e sem pressões para poderem desenvolver sua unidade de potência, que até o ano passado, depois de três temporadas equipando a McLaren, viraram motivo de piada na categoria, não conseguindo entregar nem confiabilidade, e muito menos performance. E sofrendo cobranças por vezes bem explícitas por parte do time inglês, que não teve mais a paciência para esperar os japoneses melhorarem seu equipamento.
            Os motores japoneses melhoraram para este ano, especialmente em confiabilidade, deixando de quebrar a torto e a direito. É verdade também que a escuderia de Faenza deu mais atenção às solicitações dos nipônicos quanto às necessidades de seu propulsor, que por vezes eram negligenciadas pela escuderia de Woking. Com a acessoria da Ilmor, a Honda já conseguiu fazer bons aperfeiçoamentos, e se a performance ainda está devendo, a marca prepara-se agora para tentar ir em busca desse objetivo. A nova versão que Brendon Hartley e Pierre Gasly terão à sua disposição aqui em Montreal terá, segundo a Honda, 40 HPs a mais de potência, sem comprometimento da confiabilidade. A se cumprir essa promessa, será uma boa evolução da unidade. Mas, será o bastante para fazer a diferença entre os propulsores japoneses e os demais motores diminuir significativamente?
            A Red Bull se queixa de que os propulsores da Renault não conseguem diminuir o déficit de performance para as unidades da Mercedes e da Ferrari, mas neste momento, o motor francês ainda é melhor do que o japonês. Seria, para alguns, uma troca do seis pelo meia dúzia, uma vez que com a Honda, o time dos energéticos continuaria refém de um equipamento com performance inferior. Mas será que com a evolução, a Honda pode passar a Renault? Não podemos esquecer que os franceses também estão trazendo uma nova unidade para uso neste circuito, e a meta dos franceses é diminuir significativamente seu déficit para os rivais. Fica a dúvida sobre qual equipamento pode ter o maior potencial de evolução, e é esse o ponto que deixa a Red Bull indecisa: permanecer com a Renault, que vem tentando desde o início da era híbrida alcançar Mercedes e Ferrari, o que não conseguiu fazer efetivamente até agora, ou apostar na Honda, que no atual momento, ainda está atrás dos franceses?
            A Renault já possui um time de fábrica, e vem investindo pesado para melhorar tanto o seu propulsor, quanto seu time. Apesar da melhor condição de competitividade da Red Bull, o time austríaco é uma equipe “cliente”. No caso da Honda, o time dos energéticos se tornaria o time de fábrica dos japoneses, que mesmo se permanecerem fornecendo suas unidades de potência para a Toro Rosso, farão do time austríaco sua prioridade máxima, o que significa que não apenas receberão os propulsores de graça, mas também receberão um aporte financeiro significativo, igual eles faziam quando estavam associados à McLaren, recursos muito bem-vindos, mesmo que, em termos orçamentários, a Red Bull não precise disso. No caso da Renault, a prioridade do desenvolvimento de suas unidades atende às necessidades de seu time de fábrica, com atenção também para seus times clientes, dividindo sua atenção entre estes times. A Honda daria dedicação integral à Red Bull, e a Toro Rosso, por sua vez, ficaria completamente em segundo plano. Uma diferença de tratamento que também seria muito tentadora para Christian Horner & Cia.
            O que complica a situação é o futuro das duas marcas, e o passado de ambas. A Red Bull já mostrou impaciência com os franceses, fazendo críticas públicas tão constrangedoras quanto as que a McLaren fez à Honda, a ponto de quase o time austríaco ter ficado sem fornecedor de motores. Somente depois de receber negativas veementes de Mercedes e Ferrari em fornecer seus propulsores ao time dos energéticos que seus dirigentes engoliram as críticas a seco e tiveram que ficar quietos, pois não havia outras opções de fornecedores. A relação nunca mais foi a mesma, e o passado de glórias do time austríaco junto com os motores franceses foi claramente esquecido, mesmo que parte das críticas com relação à performance dos propulsores fosse justificada. E, diante do fato de que a Renault ainda não conseguiu eliminar seu déficit de performance, permanece a insatisfação dos dirigentes do time austríaco, que agora tem uma opção para trocar de propulsor.
            Para isso, portanto, a Red Bull quer ver como se comportarão as novas e atualizadas unidades motrizes tanto da Renault quando da Honda. Tanto que já afirmou que tomará a decisão de escolher a unidade que utilizará em 2019 apenas em julho, o que desagradou à Renault, que já queria uma decisão no fim de maio, mas aceitou prorrogar o prazo, porque, afinal, apesar dos problemas enfrentados na relação, não quer perder um time como o dos energéticos no seu portfólio de clientes, e acabou novamente surpreendido pela decisão da escuderia austríaca. Para a Honda, claro, seria um lucro imenso trabalhar com um dos melhores times do grid, o que motivaria os japoneses a redobrarem seus esforços para prover uma unidade motriz mais competitiva no próximo ano. E eles estão claramente dando passos à frente, finalmente.
            Mas, será que conseguirão dar conta disso? A Honda, desde o final de sua primeira temporada com a McLaren, em 2015, sempre prometeu evolução. Em 2016, de fato, as coisas melhoraram, mas ainda longe do que se esperava. E, em 2017, com evolução “liberada”, ocorreu um forte retrocesso por parte dos japoneses, que acabou sendo a gota d’água na relação dos ingleses com os nipônicos. Será que o erro pode se repetir? Teoricamente, não, até porque se espera que a Honda tenha aprendido com os erros cometidos, mas quem garante que tudo dê certo como a Red Bull espera que ocorra? Por outro lado, a Renault também promete tirar a diferença de seu equipamento para as rivais Mercedes e Ferrari, e embora tenha feito grandes progressos, como as rivais não ficaram paradas, deu na mesma: a Renault continua até hoje atrás das duas marcas. Será que agora a Renault consegue cumprir a promessa, ou ficará devendo novamente?
A Honda só teria a ganhar fornecendo sua unidade motriz à Red Bull, mas será que seu desempenho vai ser superior às unidades da Renault? A marca francesa continuará fornecendo para a McLaren, além de seu próprio time, em 2019 (abaixo).
            E, se a Red Bull, mesmo conseguindo agora, com a Renault, incomodar Ferrari e Mercedes na pista, tendo até conseguido vencer já duas corridas no ano, onde seu carro claramente dá sinais da excelência do projeto de Adrian Newey, ainda está insatisfeita com a Renault, vai precisar, em teoria, estar preparada para um possível período de vacas magras com a Honda, caso firme a parceria, e ela se mostre complicada no início. As chances de a unidade motriz nipônica agora ser muito mais eficiente é infinitamente maior do que quando eles forneciam para a McLaren, mas se continuarem atrás de todos os outros, Christian Horner, Helmut Marko, e Dietrich Mateschitz vão ser compreensivos, ou começarão com as críticas? Já vimos esse filme antes, e a situação quase terminou mal para a Red Bull, portanto, eles que fiquem de sobreaviso. Não é querer ser pessimista, ou cantar que a Honda novamente vai fracassar, mas é preciso levar em consideração que a chance de contarem com uma unidade motriz menos eficiente que as demais em 2019 não pode ser ignorada.
            A Renault, claro, é quem tem a perder nessa história, pois ficaria sem o seu principal time na F-1 em termos de resultados, enquanto a Honda teria a chance de ouro para enfim conseguir brilhar na categoria máxima do automobilismo, como nos velhos tempos. Tanto que uma das condições dos franceses é renovar o contrato por pelo menos 3 anos, e nesse prazo, há outro ponto interessante a se considerar: ele englobaria a temporada de 2021, onde passarão a valer novas regras técnicas para os motores, com apenas um sistema de recuperação de energia. A intenção da marca francesa é manter todos os seus times de modo a conseguir ter o fluxo de informações de performance em pista inalterado, e assim, ter maior e melhor feedback no desenvolvimento a ser aplicado no projeto das novas unidades motrizes. Este prazo “prenderia” a Red Bull à Renault até o fim de 2021, e em tese, poderia ter a vantagem de, com as novas regras técnicas, novos fornecedores entrarem na F-1, oferecendo maiores possibilidades de escolha. Daria também à Honda um prazo maior para desenvolver seu equipamento, o que poderia lhes ser benéfico também, já que na Red Bull voltarão a sofrer as pressões por resultados de forma muito mais implacável do que na Toro Rosso, onde poderiam continuar a evolução de seus projetos com mais calma, possibilitando-os alcançar o grau de excelência que caracterizou seus motores nos tempos de Williams e McLaren nos anos 1980.
            Por isso, observar o desempenho das novas unidades motrizes aqui em Montreal ganha grande importância. A pista canadense tem bons trechos de aceleração, e conta com uma das maiores retas dos circuitos do calendário, impondo aos motores uma aceleração total em aproximadamente 70% do traçado, um desafio contundente para servir de avaliação da performance das unidades. A Renault está confiante de ter dado um passo à frente na evolução de suas unidades motrizes. Mas a Honda garante ter feito um trabalho muito mais substancial. Mas não podemos esquecer também que a Ferrari também está trazendo aqui importantes evoluções em suas unidades motrizes, que em tese pode deixar tudo na mesma. A Mercedes também trouxe inovações, mas optou por cancelar a utilização das novas unidades, após descobrir alguns problemas nos novos componentes, que passarão por nova verificação e avaliação na fábrica, antes de serem efetivamente utilizados. Com isso, as unidades de potência alemãs estarão indo para a disputa de sua 7ª corrida na atual temporada, mas o time prateado garante que isso não será um problema. De fato, se teve uma unidade motriz que até agora não apresentou problemas de confiabilidade, foi justamente a alemã, onde o mais próximo de um enguiço foi uma queda da pressão do óleo que levou Esteban Ocon, da Force Índia, ao abandono no GP da Espanha.
            Se o desempenho obtido com as novas atualizações feitas pela Honda confirmarem a evolução da performance do propulsor, a Red Bull terá muito mais segurança de promover a troca das unidades de potência para 2019 e dar um belo pontapé nos fundilhos dos franceses, o que vem querendo há tempos. Espera-se também que o carro da Toro Rosso corresponda, como aconteceu com o brilhante 4º lugar de Pierre Gasly no GP do Bahrein deste ano, dando ao piloto e à Honda seus melhores resultados na categoria, desde que os japoneses retornaram. Infelizmente, até o presente momento, aquele foi um resultado isolado, que a equipe B dos energéticos não conseguiu repetir, mostrando que os japoneses ainda tem muito chão pela frente para percorrerem, mas um indício muito promissor de que o potencial começa a ser exposto. Se com a nova evolução da unidade motriz, e ainda mais numa pista exigente como Montreal, e que possa ser repetida nas provas seguintes, a Honda mostrar serviço, os franceses que se preparem para ficar com um time a menos, e que poderá fazer muita falta na ajuda da coleta de dados para o desenvolvimento de seus propulsores. Mas, se os franceses também mostrarem serviço e evolução, o ponto de interrogação que já paira sobre a cúpula da Red Bull não apenas tende a permanecer como até ficar ainda maior. O que a pista do circuito Gilles Villeneuve nos mostrará? Este texto foi fechado nesta quinta-feira, e portanto, ainda sem saber como se desenvolveram os treinos desta sexta-feira.
            Só nos resta aguardar e ver quem estará dando as cartas. Adoro as corridas neste circuito porque geralmente a pista oferece sempre alternativas para boas corridas e disputas, e com uma imensa reta onde as ultrapassagens podem ser realizadas efetivamente. Aliás, este ano teremos três zonas de ativação do DRS neste circuito, o que deve deixar as disputas ainda mais concorridas. Vamos ver o que acontece...


Um momento histórico ocorre neste final de semana, com a disputa do ePrix de Zurique, marcando o retorno de uma competição automobilística à Suíça, que proibiu as corridas em todo o seu território após o violento acidente ocorrido nas 24 Horas de Le Mans de 1955. Recentemente, o país abrandou essa proibição, estabelecendo como exceção a disputa de corridas de carros elétricos, descrição que a Formula-E atende com perfeição. O traçado montado nas ruas de Zurique tem 2,46 Km de extensão, com 11 curvas. Jean-Éric Vergne, da equipe Techeetah, lidera o campeonato, e se conseguir abrir mais 17 pontos sobre Sam Bird na corrida suíça, poderá encerrar a disputa e conquistar o título da temporada, pois não poderá ser alcançado, mesmo que o inglês faça todos os pontos possíveis na rodada dupla de Nova Iorque, em julho. Vergne já tem 40 pontos de vantagem, e se chegar a 57, fatura matematicamente o campeonato, já que Sam Bird poderia marcar apenas 56 pontos nas corridas da metrópole estadunidense.

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