quinta-feira, 29 de outubro de 2015

ARRIBA, MÉXICO!


O Grande Prêmio do México está de volta à F-1, mas infelizmente não teremos mais a Curva Peraltada: os carros utilizarão uma chicane por dentro do estádio de baseball, como fizeram nas corridas da F-Indy original.

            E a Fórmula 1 está de volta ao México. Mais de duas décadas depois da última corrida, os mexicanos terão a chance de rever a principal categoria de monopostos do planeta. O palco é o mesmo de sempre, o velho e conhecido circuito do autódromo Hermanos Rodrigues, que sediou praticamente todas as 15 edições oficiais do Grande Prêmio do México já disputadas até hoje na história da F-1, e que será palco desta 16ª edição.
            Tudo começou em 1962, quando os mexicanos conseguiram realizar sua primeira corrida, ainda extra-campeonato, com a F-1. Naquele tempo, realizar uma corrida extra-campeonato era requisito básico para sediar um GP. A prova era usada para avaliar as capacidades dos novos circuitos de sediar uma corrida da categoria. Interlagos, primeiro palco de nosso Grande Prêmio do Brasil, também passou por esse procedimento, sediando uma etapa extra-campeonato em 1972, e em 1973 já tendo uma etapa oficial do campeonato da F-1. Com os mexicanos foi a mesma coisa. E em 1963, sediaram seu primeiro GP oficial, disputado no dia 27 de outubro, praticamente há 52 anos atrás. A primeira corrida a valer pontos para o campeonato assistiu à vitória de Jim Clark, com a Lotus, que arrasou a concorrência no circuito da Cidade do México, fazendo também a pole e a melhor volta da corrida, em 1min58s1, com a velocidade média de 152,413 Km/h. O traçado na época tinha 5 Km de extensão, e era um pouco diferente do atual, mas apenas no desenho em algumas curvas, tendo seus trechos de retas iguais aos de hoje.
            Clark foi implacável naquele GP, liderando a prova de ponta a ponta, e vencendo com uma vantagem assustadora de 1min41s1 para o segundo colocado, que era ninguém menos do que Jack Brabham, pilotando seu próprio carro. Na pista, estava o piloto Pedro Rodriguezde La Vega, representando o México no grid. Ele havia estreado justamente no GP anterior, o dos Estados Unidos, em Watkins Glen, e a prova mexicana foi sua 2ª participação em uma prova de F-1. Infelizmente, perante seu público, não teve um bom desempenho: largou em 20°, e abandonou depois de 26 voltas, com problemas na suspensão. Pedro seguiu os passos de seu irmão Ricardo Rodriguez, que estreara na F-1 em 1961, no GP da Itália, e conseguiu disputar 5 provas até o GP da Itália do ano seguinte. Sua carreira na categoria máxima do automobilismo foi breve, tendo falecido nos treinos para o GP extra-campeonato do México em 1962, quando sofreu um violento acidente por problemas de suspensão no carro que conduzia, vindo a colidir nas proteções da curva Peraltada. Sua morte, aos 20 anos de idade, causou comoção nacional no México. Considerado um futuro campeão mundial, o jovem mexicano marcou apenas 4 pontos nas poucas corridas que disputou como piloto da Ferrari. Curiosamente, na prova extra-campeonato que marcaria a entrada do México na F-1, ele conseguira uma permissão especial de Maranello para disputar a corrida pelo time privado de Rob Walker, com um carro Lotus, já que o time italiano decidira não disputar a prova. Sua felicidade por finalmente poder correr numa prova em seu país durou pouco, lamentavelmente.
            Seu irmão Pedro teve mais sorte, chegando a disputar 54 Gps de F-1, entre 1963, até o GP da França de 1971. Conquistou 2 vitórias na categoria, no GP da África do Sul de 1967, ao volante de um Cooper/Maserati; e no GP da Bélgica de 1970, com um BRM. Subiu ao pódio 7 vezes. Chegou a vencer as 24 Horas de Le Mans em 1968, além de obter 4 triunfos nas 24 Horas de Daytona, onde competiu além da F-1. Mas, assim como seu irmão Pedro, Ricardo também teve um fim trágico, ao falecer durante a disputa das 200 Milhas de Norisring, em um campeonato interseries de Nuremberg, quando seu carro colidiu com o de outro competidor que andava lento pela pista e mudava abruptamente de direção.
            Em memória aos dois melhores pilotos que seu país já produzira no mundo do automobilismo, o autódromo da Cidade do México, até então chamado de Circuito Magdalena Mixhiuca, foi renomeado para Autódromo Hermanos Rodriguez em 1973, e assim permanece até hoje. A F-1 permaneceu na cidade do México de 1963 até 1970, quando a prova saiu do calendário, tendo então o belga Jack Ickx como último vencedor, ao volante da Ferrari.
            A corrida só retornaria ao calendário da F-1 em 1986, no mesmo circuito, mas com algumas modificações em algumas curvas, o que reduziu seu traçado dos antigos 5 km para 4,421 Km. neste retorno à categoria, o circuito mexicano assistiu à primeira vitória do austríaco Gerhard Berger, a bordo da então nova escuderia Benetton (ex-Toleman), que disputava seu primeiro campeonato. O circuito permaneceria no calendário até 1992, quando as péssimas condições do asfalto da pista, que estava cheio de ondulações, e até com remendos de pau cobrindo alguns buracos, fizeram com que o circuito deixasse novamente a competição. Em seu último ano, o GP do México teve como vencedor o inglês Nigel Mansell, ao volante da Williams/Renault, que naquele tempo era o carro supremo da categoria, a exemplo da atual Mercedes. Ayrton Senna, recém-coroado tricampeão mundial de F-1 no fim do ano anterior, se via impotente diante dos carros de Frank Williams, capazes de andar 2s mais rápido que os concorrentes mais próximos por volta. Em 1991, quando os carros da Williams já começavam a impôr tal domínio, Senna, na ânsia de tentar acompanhar o ritmo, escapou na curva Peraltada e foi de encontro aos pneus, capotando com o impacto, mas sem sofrer maiores consequências. O brasileiro ainda sofreria outro acidente, em 1992, em outro trecho da pista, desta vez sofrendo alguns ferimentos na perna, em virtude um braço de suspensão que varou o cockpit e o atingiu, mas sem maiores sequelas.
            E agora, 23 anos depois, o México está de volta ao calendário. O circuito ainda é o mesmo, mas novamente ele traz mudanças, e a maior delas é a exclusão da Peraltada, para decepção dos antigos fãs que tiveram a oportunidade de ver os F-1 desafiarem a veloz curva que liga a reta oposta à reta dos boxes. No seu lugar, entra uma chicane, construída dentro de um estádio de baseball construído bem naquele setor da pista, cortando a Peraltada ao meio. Não é algo exatamente novo, feito agora: há anos atrás, quando a F-Indy original correu aqui, eles já usavam essa nova chicane, não usando mais a Peraltada tal como era antigamente. Há uma justificativa plausível, que é o fato de atualmente não existir mais a grande área de escape ao fim da curva, na entrada da grande reta dos boxes, estando hoje totalmente ocupado por arquibancadas. Na prática, a pista ficou cercada de ambos os lados, tal qual um circuito oval, que aliás, existe mesmo ali, com as demais curvas fechando o traçado logo após o complexo dos boxes e paddock. Em 1989, Michele Alboreto escapou naquele trecho com sua Tyrrel, indo acertar os pneus depois de atravessar toda a área de brita. Hoje, uma escapada daqueles o levaria a se chocar direto contra as arquibancadas.
            É bem verdade que haveria soluções de segurança que pudessem deixar a Peraltada utilizável, com os modernos softwalls usados nos circuitos ovais americanos, mas como a chicane já está lá, e já foi usada antes, acabou ficando por isso mesmo. Mas os pilotos gostaram do estádio que está ao redor desta curva, que tem o nome de "Foro Sol", e que permitirá ao público um contato bem próximo com os carros e pilotos que atravessarem aquele trecho. O pódio da corrida, aliás, num diferencial em relação aos demais circuitos do mundo, será ali naquele setor, bem próximo também do público, que poderá curtir a cerimônia de premiação com uma proximidade pouco vista em todas as pistas do calendário. Mas, como um acompanhante veterano da F-1, não posso deixar de confessar que sentirei falta da Peraltada, uma curva que era descrita como "curva de macho", uma versão bem mais rápida da Parabólica da pista de Monza, devido ao seu raio mais aberto, permitindo aos carros entrarem muito mais velozes, e quase sem tirar o pé do acelerador, praticamente. Como esquecer a manobra de Nigel Mansell, em 1990, ultrapassando Gerhard Berger por fora na Peraltada, na penúltima volta da corrida, deixando o público de cabelo em pé? Impossível. Infelizmente, são tempos que não voltam mais...
Os carros deverão atingir os 350 Km/h ou até mais na grande reta do circuito mexicano. Acima, a largada da corrida de 1989, com Ayrton Senna largando na frente.
            E, para o público mexicano, o melhor de tudo é que eles terão por quem torcer na pista: Sérgio Pérez Mendoza, piloto da Force India, é mexicano, e está eufórico para disputar o seu primeiro GP em casa. E ele não está otimista por acaso: vem de um excelente 5° lugar no GP dos Estados Unidos, no último domingo, e de um pódio (3° lugar) no GP da Rússia, além de ter sido também 5° colocado no GP da Bélgica, e pontuado bem na Itália e Cingapura, ocupando no momento a 9ª colocação no campeonato, com 64 pontos. E lembrando que a Force India tem um carro que deverá andar bem nas longas retas do circuito mexicano.
            A prova do México tem tudo para oferecer uma boa corrida, ainda mais pelo fato de que é esperado chuva para o fim de semana. E foi justamente a chuva que proporcionou ao GP dos EUA, domingo passado, oferecer a melhor corrida do campeonato até o momento. Claro que ninguém quer uma chuva torrencial como a que inviabilizou os treinos na sexta e no sábado, mas basta uma que deixe os times e pilotos perdidos com relação à estratégia de corrida, acerto do carro, e que fique meio seco/meio molhado. Eles podem odiar essa situação, mas os torcedores certamente vão adorar, como aconteceu em Austin, cuja prova foi cheia de emoções do começo ao fim. E é de provas com esse nível de disputa e emoção que a F-1 precisa para voltar a cativar os fãs do automobilismo. E quem sabe a volta da etapa mexicana não ajuda nesse sentido? Vejamos como serão os treinos livres de hoje, então. Arriba, México!


O circuito Hermanos Rodriguez tem uma particularidade interessante: é a pista de maior altitude de todo o calendário da F-1. A pista está situada a 2.200 metros acima do nível do mar, e o ar mais rarefeito influi na aerodinâmica dos carros, por oferecer um pouco menos de resistência. Nos tempos dos motores aspirados, a maior altitude da pista mexicana mexia também com a potência dos propulsores, que perdiam entre 10 a 20% da potência, dependendo do motor. É um detalhe que não prejudicará as atuais unidades motrizes da F-1, todas turboalimentadas. Mas o maior perigo que os pilotos podem sofrer no México é o famoso "Mal de Montezuma", piada relacionada à comida mexicana, fortemente temperada e picante, que costuma derrubar aqueles que têm estômagos mais sensíveis. Riccardo Patrese que o diga: em 1991, o piloto italiano passou boa parte dos treinos com o estômago embrulhado, e disseram na época que ele marcou a pole-position porque precisava ir urgentemente ao banheiro, onde precisou estar várias vezes durante o fim de semana. E dizem que foi pelo mesmo motivo que o italiano arrasou a concorrência no domingo, obtendo a primeira vitória da Williams naquela temporada, onde começaria a impôr um domínio que se estenderia pelos anos de 1992, 1993, 1996, e 1997. Outra vítima da culinária mexicana teria sido Nigel Mansell, em 1987, quando também defendia a Williams. E para piorar a situação do inglês, seu parceiro de time, o brasileiro Nélson Piquet, aproveitava a situação para infernizar ainda mais Mansell, e vivia sumindo com os rolos de papel higiênico do banheiro...


Além de assistir à primeira vitória do austríaco Gerhard Berger e da recém-fundada equipe Benetton, em 1986 (no que foi a última vitória do motor BMW turbo na F-1), o GP do México também foi palco da primeira vitória da Honda na categoria máxima do automobilismo. Foi em 1965, e o triunfo veio pelas mãos de Richie Ginther, que pilotava o carro nipônico. Foi o único bom resultado do time na temporada, que marcou apenas 11 pontos no ano, terminando o campeonato de construtores em 6° lugar, e Ginther ficando em 7° lugar na classificação de pilotos. O time japonês disputou 5 temporadas, de 1964 a 1968, e os poucos resultados fizeram com que os japoneses abandonassem a categoria, voltando apenas no início dos anos 1980, como fornecedores de motores, dando início ao seu período áureo na F-1 como parceira das equipes Williams e McLaren. Coincidentemente, a Honda hoje vive também um período de maus resultados, em nova associação com a McLaren.


O temporal que caiu em Austin no fim de semana passado atrapalhou bastante as atividades de sexta e sábado, a ponto de o treino de classificação ter sido adiado para domingo de manhã, que felizmente pôde ser realizado, e ainda assim, sem a parte do Q3, devido à forte chuva. Mas felizmente ela parou, e a corrida transcorreu sem maiores problemas, exceto os normais em virtude de uma prova em piso molhado. E tivemos um show na pista, com disputas a rodo, e com vários times e pilotos surpreendendo em diversos momentos da prova. Por fim, Lewis Hamilton ainda acabou premiado com a vitória, após a escapada de Nico Rosberg da pista a poucas voltas do final, o que foi suficiente para o piloto inglês encerrar a disputa do título e conquistar finalmente o tricampeonato mundial, o que era mesmo só questão de tempo. E Rosberg tão cedo não vai esquecer esse seu erro, onde viu chegar ao fim suas pretensões de título deste ano. E vai ter de fazer muito mais em 2016 para apagar a má impressão desta temporada...

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