sexta-feira, 22 de novembro de 2013

14 ANOS DE FERRARI E BRASIL


Áustria 2002: Barrichello dominou todo o fim de semana, e para quê? Teve de entregar a vitória para Schumacher, pois sua vitória "não interessava ao time", que só tinha prioridades para Michael Schumacher.

            Hoje começam os treinos oficiais para o Grande Prêmio do Brasil, fechando a temporada de 2013, que infelizmente não foi das mais emocionantes, como a do ano passado, quando tivemos 8 pilotos diferentes vencendo corridas, mesmo que apenas 2 deles tivessem chegado aqui discutindo o campeonato. Sebastian Vettel muito provavelmente vai vencer de novo, se nada diferente do normal acontecer. Está previsto chuva para o domingo, o que pode ajudar a deixar as coisas mais divertidas para quem espera uma prova fora dos padrões, resta saber se a ajuda de São Pedro vai ser suficiente.
            Esta corrida marca a despedida de Felipe Massa da equipe Ferrari. Com contrato assinado com a Williams para 2014, o piloto brasileiro busca renovar suas esperanças na F-1, após praticamente uma década em Maranello. Não o fez por opção própria, já que o time vermelho resolveu trazer um piloto mais forte para ser companheiro de Fernando Alonso no próximo ano, Kimmi Raikkonem. Mas a mudança de ares fará bem a Massa, que estava precisando buscar espaço em outro lugar, uma vez que na Ferrari, ele já não tinha mais espaço.
            É o fim também para uma era, entre a Ferrari, e pilotos brasileiros, iniciada há 14 anos, em 2000, quando Rubens Barrichello fez sua estréia nos carros vermelhos. Anunciado como substituto do irlandês Eddie Irvinne na segunda metade de 1999, a contratação de Barrichello por um time de ponta encheu os torcedores brasileiros de esperança. Após a perda de Ayrton Senna, tínhamos virado coadjuvantes na F-1. Voltar a ter um piloto em um time capaz de disputar o título significava voltar, pelo menos, a vencer corridas. E Barrichello, por sua vez, queria mostrar realmente do que era capaz de produzir.
            A partir daí, foram mais decepções do que satisfações. A política interna da Ferrari, que dava preferência exclusiva para Michael Schumacher, sempre foi um ducha de água fria para as esperanças dos torcedores brasileiros. O problema não era exatamente Michael Schumacher, que afinal, como maior talento da F-1, fazia por merecer ter seus privilégios. O problema era que isso mostrava que não dava para esperar muito de Rubinho, que apesar de não ser talentoso como o parceiro alemão, também não era um joão ninguém. Infelizmente, o brasileiro nunca pôde pensar em disputar o título, e para reafirmar isso, o próprio Luca de Montezemolo afirmou, com todas as letras, ainda em 2000, após a vitória espetacular de Barrichello em Hockenhein, que o único objetivo da Ferrari era fazer Schumacher campeão, e que o brasileiro devia ficar em seu devido lugar. E tal política nunca mudaria. Não apenas pelo tipo de gestão de Maranello, mas também por que Schumacher nunca aceitaria que seu "escudeiro" dividisse curvas com ele. Michael nunca digeriu bem quando ficava atrás do colega de equipe, e costumava perder as estribeiras por causa disso.
            Ainda que seja leviano falar em sabotagem, pode-se dizer que isso ocorreu veladamente com Barrichello. Num universo onde detalhes fazem a diferença, como é a F-1, bastava deixar de atentar para um detalhe para que o piloto brasileiro perdesse totalmente as chances de ter uma luta justa com seu companheiro de equipe. Não que Schumacher precisasse disso, mas quando, em 2002, o time proibiu Rubens de vencer na Áustria, em um campeonato amplamente dominado pelo piloto alemão, pode-se ter uma idéia de como as coisas corriam em Maranello. Afinal, porque o piloto brasileiro sempre tinha uma primeira metade de campeonato geralmente problemática, enquanto nada de anormal ocorria com Schumacher? Ou algumas situações totalmente inusitadas, como quando esqueceram o carro do brasileiro em cima dos cavaletes no grid de largada, com todos os carros partindo para a corrida? Um erro dos mais primários e inconcebíveis de se admitir num time de ponta da F-1. E o GP do Brasil de 2003, onde Rubinho vinha com boas chances de vencer, e sofreu uma pane seca até hoje mal explicada pelo time, que alegou ter ficado sem telemetria e cujos dados de consumo prévio não batiam? A Ferrari nunca admitiria, mas conversas de fundo com alguns integrantes do time apontam que a pane seca teria sido deliberada, para impedir que o brasileiro, então empatado com Schumacher no campeonato àquela altura, disparasse na frente, o que poderia causar "distúrbios" indesejados dentro do time e em Schumacher.
            Uma verdade incontestável é que Michael Schumacher era muito mais piloto do que Rubens Barrichello. Um fato sobre o qual não pesa a menor dúvida. O que fica na dúvida é qual seria a verdadeira diferença entre ambos, uma vez que devido à política adotada pela escuderia italiana, em muitos momentos a atenção para com Rubinho limitava sua performance. Não vou dizer que sem isso o brasileiro seria campeão ao invés de Schumacher, mas certamente Rubens teria alguns números muito melhores de sua passagem por Maranello. Disputar o título até poderia ter ocorrido, mas ser campeão, aí já é difícil saber.
            E a forma como o time dá atenção influi sobremaneira na performance de um piloto. Está aí o exemplo deste ano de Romain Grossjean na Lotus, que depois que foi anunciada a ida de Kimmi Raikkonem para a Ferrari, passou a andar muito melhor do que vinha andando. E podemos ter um exemplo mesmo da Ferrari em 2004: quando Schumacher já tinha conquistado matematicamente o título daquele ano, a escuderia passou a priorizar Rubinho, para que ele conquistasse o vice-campeonato. O resultado foram duas vitórias do piloto brasileiro em corridas onde, vejam só, Schumacher andou muito atrás do que normalmente andaria, incapaz até de lutar pelo pódio, e em um ano onde a Ferrari massacrou a concorrência. Curiosamente, depois que Barrichello atingiu o vice-campeonato, a performance do brasileiro despencou novamente, enquanto a de Schumacher voltou a subir. Coincidência? Dizem que na F-1 não tem disso...
            Rubens sempre foi ficando acreditando que uma hora chegaria sua vez, apostando numa aposentadoria de Schumacher, e acreditando que seria escolhido para então liderar a escuderia italiana. Mas sua paciência acabou antes, e mesmo tendo contrato para 2006, preferiu sair e tentar buscar espaço em outros lugares, ao fim de 2005. E então, entrou Felipe Massa em seu lugar. Felipe já era piloto da Ferrari desde sua estréia na F-1, tendo disputado sua primeira temporada pela Sauber como "empréstimo" ao time suíço, que usava os motores italianos. Dispensado para 2003, Massa passou o ano como piloto de testes da Ferrari, retornando à Sauber em 2004 e 2005.
            O destino de Felipe em Maranello tendia a ser igual ao de Rubens, mas ele teve uma sorte diferente: próximo do fim do campeonato, Schumacher anunciou que ia se aposentar, e Massa, então, teria a oportunidade que Barrichello sempre esperou e nunca surgiu: comandar o time. Para 2007, teria a companhia de Kimmi Raikkonem. Se em 2006, fora escudeiro de Schumacher, e saiu-se bem para seu primeiro ano como titular em Maranello, cumprindo o figurino, em 2007, era aproveitar a chance de ser o veterano do time para tentar enfim poder lutar pelo título.
            Massa até tentou, mas teve azar na segunda metade do campeonato, e com uma arrancada forte do finlandês, teve de dar suporte ao parceiro para a conquista do título daquele ano. Foi um ano em que a política de pilotos da Ferrari foi meio posta de lado realmente, com o time optando por Kimmi quando o brasileiro já estava fora da briga, ao contrário do que ocorria nos tempos de Schumacher, quando seu parceiro de time já era posto para escanteio antes mesmo da competição se iniciar. Em 2008, Massa teve sua melhor chance de ser campeão, e quase chegou lá, perdendo o título por um único ponto, aqui mesmo em Interlagos. Foi um ano ímpar de Felipe, que venceu 6 corridas. Mas a Ferrari pecou em algumas provas, assim como o próprio Massa também errou feio em outras. A postura de Felipe na derrota aqui foi a mais nobre e sincera possível: "Ganhamos e perdemos juntos", afirmou, referindo-se que tanto ele quanto seu time falharam em momentos do ano, repartindo responsabilidades e méritos.
            Em 2009, um carro apenas mediano, e um violento acidente na Hungria fizeram daquela temporada um ano a ser esquecido. A plena recuperação do brasileiro para 2010 era a melhor notícia possível. Se tivesse um carro vencedor, o brasileiro poderia mostrar que ainda daria alegrias aos torcedores nacionais. Mas havia um Alonso no meio do caminho...
            Contratado para substituir Kimmi Raikkonem, que estava desmotivado, o espanhol chegou no time com o status de "salvador da pátria", o único capaz de levar o time vermelho de novo ao título. E, para quem achava que Massa seria capaz de enfrentar o espanhol, veio a pior notícia possível: a volta da política interna de pilotos da Ferrari, tal qual era aplicada nos tempos de Schumacher. E a ficha caiu como uma bomba naquele GP da Alemanha de 2010, com a frase que até hoje ficou gravada na memória dos torcedores "Alonso está mais rápido que você..."
            Se Rubens Barrichello tinha seus momentos de revolta, e costumava andar muitas vezes mais perto de Schumacher do que a equipe gostaria, Massa entretanto desabou dali em diante, raramente mostrando a combatividade de antigamente. Não foi apenas o abalo psicológico de virar "escudeiro" de Alonso que incomodou sobremaneira, mas vários fatores que se aglutinaram, como os novos pneus instáveis da Pirelli, e carros não tão competitivos quanto antigamente. Felipe sempre teve mais dificuldades para lidar com eles do que Alonso, que conseguia quase sempre superar as limitações do equipamento, enquanto o brasileiro, sem a autoconfiança de antes, se debatia até mais do que o normal, tentando extrair deles a mesma performance do companheiro de equipe, o que poucas vezes aconteceu.

No confronto com Alonso, Massa teve seus piores momentos na Ferrari. Desgaste tornou-se inevitável, e o brasileiro ainda sucumbiu psicologicamente, poucas vezes mostrando sua real capacidade.
            Felipe ainda teve muita sorte com a paciência da Ferrari, que o manteve como piloto por mais 4 temporadas, embora isso possa ser devido mais à política de não ter dois pilotos fortes no time do que qualquer outra coisa. Não fosse a impaciência e críticas de Fernando Alonso a meio desta temporada para com o time, que fizeram até mesmo Luca de Montezemolo perder a paciência com o espanhol, muito possivelmente Massa ainda poderia estar garantido em Maranello. Foi mais o desejo de punir Alonso, tirando-o de sua posição de conforto na Ferrari, onde não tinha concorrência interna, do que a falta de resultados do brasileiro, o que mais contribuiu para a saída de Massa da escuderia. Mas é verdade também que a política da de pilotos da Ferrari, ainda mais não tendo um carro tão competitivo, ajudou o brasileiro a não conseguir resultados de maior monta, uma vez que Alonso sempre recebia mais atenção do time, relegando o brasileiro a segundo plano. Para Fernando Alonso, era conveniente continuar tendo o brasileiro como colega de time, sempre o defendendo como o melhor parceiro, certo de que sabia poder domá-lo sem problemas, além de contar com as regalias da preferência do time para si, o que sempre deixou o brasileiro em segundo, ou até terceiro plano, dentro da própria Ferrari.
            No ano passado, depois de um início medíocre, Massa se recuperou de forma contundente na segunda metade do campeonato, garantindo sua permanência na Ferrari em 2013. Mas, na política interna, tudo continuou igual a antes, chegando ao cúmulo do time provocar uma punição deliberada ao brasileiro no GP dos EUA do ano passado ao romper o lacre do câmbio de seu carro apenas para promover Alonso a uma posição à frente no grid de largada, e do lado mais favorável. Neste ano, parecia que Felipe tinha recuperado totalmente a boa forma, mas os problemas retornaram, e com o time não tão competitivo quanto em 2012, foi novamente mais o brasileiro a sofrer as consequências do que Alonso.
            Apenas com sua saída da equipe confirmada é que Felipe pareceu tirar um peso das costas como há muito não se via. Passou a correr com a velha combatividade que raras vezes apresentou nos últimos anos. Terá na Williams um papel inédito em sua carreira, que será liderar um time, algo que apenas em 2008 teve chance de exercer na Ferrari, e ainda assim, apenas em parte da temporada. Tal qual Barrichello, Massa passou um bom tempo em Maranello, e assim como seu antecessor, teve seus bons momentos na escuderia. Não por acaso, em sua despedida oficial, em Mugello, semana retrasada, teve um público de 15 mil torcedores aplaudindo-o, um raro reconhecimento de seus serviços prestados à escuderia italiana. E até hoje, Rubens Barrichello também é lembrado com respeito pela escuderia, pelo seu tempo como titular lá, assim como pela torcida.
            É um ciclo que se encerra, e para a maioria dos torcedores, não vai deixar saudade alguma, pelo fato de tanto Massa quanto Barrichello não terem tido maiores chances de vencer ou de serem campeões. E embora para muitos, guiar pela Ferrari seja considerado um grande mérito, pelo prestígio e história da escuderia em todo o mundo do esporte a motor, poucos torcedores brasileiros irão concordar com isso, preferindo mais as críticas ao jogo de equipe praticado em Maranello, que raras vezes favoreceu nossos representantes.
            Tanto Felipe Massa quanto Rubens Barrichello tiveram suas carreiras na F-1 marcadas por sua passagem pelo time de Maranello. Concordando ou não, é algo a ser respeitado e admirado, pois são muito poucos os que chegam a tal posto, e menos ainda os que pilotaram para o time italiano por tanto tempo quanto os brasileiros. A seu modo, a Ferrari valorizou tanto Massa quanto Rubinho em suas campanhas nos últimos 14 anos, que agora ficarão registrados na história do time italiano e também nos anais da F-1. Pode não ter sido do jeito como muitos queriam, mas não dá para se ter tudo o que se deseja.

Um comentário:

Anônimo disse...

Infelizmente o Barrichello e o Massa não passaram de simples coadjuvantes e não tiveram papel importante na Ferrari!!!