quarta-feira, 1 de junho de 2011

ARQUIVO PISTA & BOX – MAIO DE 1994 – I

            Na retrospectiva de minhas antigas colunas, chegamos agora à minha primeira coluna de maio de 1994. Naquela época, minhas colunas eram mensais, e esta foi a primeira vez que publiquei duas em um mesmo mês. O motivo é bem óbvio: o fatídico Grande Prêmio de San Marino daquele ano, onde perdemos nosso maior campeão na F-1, Ayrton Senna. As colunas eram mais simples do que as atuais, daí o fato de mesmo devido a um acontecimento daquele porte, o texto ser curto. Na verdade, era também difícil achar palavras para expressar o que sentia naquele momento. A corrida foi um trauma para muita gente, e nem mesmo os mais calejados no ramo na imprensa especializada conseguiram suportar o tranco daquele final de semana sem algum percalço. A ficha demorava a cair, mas o pior é não querer que ela caísse, enfrentar o dilema de termos visto um campeão morrer diante de nossos olhos – telespectadores, e/ou monitores – jornalistas na sala de imprensa do autódromo, e/ou o público sentado nas arquibancadas do Circuito Enzo e Dino Ferrari.
            Mas a vida tinha de continuar, como continuou. E o “circo” da F-1 também, traumatizado, mas sobreviveu, e sobrevive, até hoje. Melhor do que antes em alguns aspectos, pior em alguns outros. Algumas coisas que precisavam mudar, mudaram. Mas outras coisas que não precisavam mudar, mudaram também. Fiquem agora com meu texto da época, de um momento que certamente não foi nem um pouco agradável...

SAN MARINO, 1994

Adriano de Avance Moreno

            Ayrton Senna morreu. Por mais duro que tenha sido dizer isso, é uma realidade, e não podemos fugir dela, por mais que queiramos...
            Fatalidade? Provavelmente, apesar de a grande maioria estar procurando culpados que seriam responsáveis pelo que aconteceu, sim. Mesmo falando com racionalidade, tentando aceitar algo a que o mundo da F-1 já tinha se esquecido, é difícil segurar a emoção neste momento. Não me lembro, de todos os GPs que acompanhei, de ter visto um tão bizarro e negro como o último GP de San Marino. O forte acidente com Rubens Barrichello na sexta-feira, apesar de ter sido o menos grave, parecia já prenunciar algo de ruim para os dois dias seguintes.
            A previsão se confirmou no sábado, quando morreu o austríaco Roland Ratzemberger após uma violenta batida. Isso tornou o clima no autódromo Enzo e Dino Ferrari bastante carregado. Desde 1982 que não morria um piloto de F-1 num fim de semana de corrida. Alguns, como Senna, ficaram tão abalados com o fato que decidiram não mais treinar no sábado. A Benetton fez a mesma coisa. Alguns outros, é claro, foram para a pista, tentando esconder seus sentimentos, ou tentando provar que podiam competir ainda, já que o pavor de um acidente começou a perturbar o equilíbrio emocional de vários pilotos.
            Senna teve um funeral de herói. O país esteve de luto na hora em que o grande herói esportivo, que durante vários domingos nestes últimos 10 trouxe um pouco de alegria para nós brasileiros, foi sepultado no cemitério do Morumbi, na zona sul de São Paulo, bem como ao longo da semana, após o trágico acontecimento na pista italiana. Senna era um exemplo veemente de que o Brasil é um país que pode dar certo, apesar dos esforços de muitos para afirmar o contrário.
            Somos um país com poucas alegrias, e a partir de agora, em todos os domingos em que houver uma corrida de Fórmula 1, ao ser dada a largada, se procurarmos (por força do hábito) aquele velho e conhecido capacete amarelo com faixas verde e azul, teremos de lembrar com tristeza, da dura realidade, e nos acostumarmos ao fato de que a “Era Senna”, que durante tantos domingos tivemos a oportunidade de acompanhar e torcer, já não existe mais.
            Sobre a atitude da FIA sobre a corrida, prefiro dizer que não faço idéia do que realmente rolou naquele momento. Prefiro não fazer comentários se a FIA escondeu ou não o jogo sobre Senna e Ratzemberger, se eles morreram na pista ainda, ou não.
            Só posso dizer que, com o que foi dito sobre uma “armação” da equipe médica, posso afirmar que isso é um absurdo. A medicina hoje é uma área complexa e tem feito grandes avanços. Uma regra, porém, conserva o ditame maior de um médico em serviço e como deve agir num momento como o que vimos: qualquer situação, mesmo que pareça inútil, não deve ser considerada perdida; enquanto houver um mínimo de esperança, tudo deve ser tentado e feito. É a vida humana com o que se está lidando e, neste momento, não há lugar para hesitações ou incerteza se algo deve ou não ser feito. Foi o que os médicos fizeram. Tal determinação muitas vezes pode fazer a diferença. Neste caso, apesar de tudo, não houve como salvar Senna. Mas naquele momento, não havia espaço para ver se adiantaria ou não: todo o possível simplesmente deveria ser executado.
            Adeus, campeão...

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