E a Fórmula 1 encerrou
o seu ano, e como era de se esperar, a pista de Yas Marina, em Abu Dhabi,
apresentou uma corrida pra lá de mediana, apesar de termos tido a chance de
vermos algumas disputas na prova, porém insuficientes para dar caldo no clima
geral da corrida. E Lewis Hamilton, agora hexacampeão, fez barba, cabelo e
bigode na pista dos Emirados Árabes Unidos, conquistando a primeira pole desde
a etapa da Alemanha, e fechando o ano com sua 11ª vitória. Já são 84 triunfos,
e com mais 7, empatará com as 91 do recordista de vitórias da história da
categoria máxima do automobilismo, Michael Schumacher. E isso tem tudo para ser
até superado em 2020, a depender da Mercedes manter a sua excelência de performance.
Muitos especulam que o
time prateado poderá enfim ter maiores dificuldades no próximo ano, depois das
boas corridas que tivemos nesta segunda metade da temporada de 2019, mas eu
esperaria para ver. Red Bull forte e vencendo? OK, Max Verstappen deu show em
Interlagos, e se não fosse metido a besta em algumas declarações e ainda um
pouco afobado, poderia ter levado a prova mexicana com um pé nas costas. Mérito
da Honda, também, que parece estar encontrando o sucesso novamente, depois dos
anos de fiasco com a McLaren? Também, mas vamos relativizar um pouco. No ano
passado, Verstappen venceu a etapa mexicana, com sua Red Bull/Renault, e aqui
no Brasil, só não repetiu a vitória porque o holandês correu o risco
desnecessário de dividir freada com o retardatário Esteban Ocon na saída do S
do Senna, quando liderava a corrida, e com isso perdeu as chances de vitória. E
não vamos nos esquecer: a Mercedes, já com uma grande vantagem, já estava mais
concentrada no carro do próximo ano, então...
É claro que todos
queremos mais disputas e mais times e pilotos diferentes vencendo, mas daí a
dizer, pelos resultados das últimas corridas, que a Mercedes vai ter problemas
em 2020 é ainda muito cedo para afirmar. Pode ocorrer, mas também pode ocorrer
o contrário, como vimos na primeira metade deste ano. A Ferrari, que havia sido
vice-campeã nos dois anos anteriores, tendo chegado a dar um sufoco nos
prateados em várias corridas, mas se perdido em várias outras por culpa
própria, dava pinta de que ia endurecer o jogo este ano, e fez questão de
mostrar na pré-temporada que vinha com tudo. Mas faltou combinar com os
alemães, que não se apavoraram (tudo bem, podem ter ficado um pouco
preocupados, mas mantiveram a cabeça fria) com o que viram, e quando tudo
começou pra valer, deram um banho nos rivais, vencendo 8 corridas consecutivas,
praticamente matando o ano dos concorrentes quase todo ali.
A Ferrari só foi se
encontrar de fato no GP da Bélgica, e dali até Cingapura, andou bem forte, mas
só servia mesmo para não deixar o ano passar em branco. Mas o time rosso
poderia ter tido melhores resultados se não ficasse batendo cabeças entre eles
mesmos, e sua dupla de pilotos, que ganhou um reforço até maior do que o
esperado com a chegada de Charles LeClerc, que bagunçou o coreto de Sebastian
Vettel da mesma maneira que Daniel Ricciardo o fez em 2014, quando dividiram a
Red Bull. Com a promessa de que os pilotos teriam liberdade para competir, logo
de cara ficou o dito pelo não dito, e o time se embananou entre manter Vettel
com seu status de primeiro piloto do time e deixar LeClerc correr à vontade.
Por fim, até deixaram seus pilotos mais soltos para competir, mas esqueceram de
ensinar a ambos o que significa respeitar o parceiro na pista, e infelizmente,
tivemos algumas corridas nas quais ambos colocaram tudo a perder, como no caso
do Brasil, onde um duelo mais renhido levou tanto Charles quanto Sebastian a
ficarem pelo caminho, com o time deixando de marcar pontos e resultados
esperados.
E faltou também a
Ferrari acertar nas estratégias, pecando em muitas corridas por atitudes que
beiraram o ridículo, como deixar seus pilotos saírem para a classificação muito
em cima da hora, e com isso perdendo suas chances de abrir volta rápida.
Infelizmente, apesar da grande velocidade que o modelo SF90 demonstrou em reta,
o bólido não se entendeu direito com os pneus em alguns GPs, e isso limitou a
performance de seus pilotos. Foram inúmeros detalhes, aqui e ali, que
fulminaram um ano que, problemas técnicos à parte, poderia ter sido melhor do que
realmente foi. E talvez até tivessem complicado um pouco a conquista do título
por parte de Lewis Hamilton e da Mercedes. De qualquer forma, os ferraristas
também tiveram uma certa dose de sorte este ano.
Digo isso porque a sua
principal adversária em pista, a Red Bull, praticamente correu com apenas um
piloto a tempo integral. Se Max Verstappen não decepcionou e mostrou inclusive
grande maturidade e sua inegável velocidade, liderando o time na pista, por
outro lado a escuderia sentiu a falta de Daniel Ricciardo, embora nunca vá
admitir isso abertamente, dada a soberba que infelizmente baixou por lá nos
últimos tempos. O australiano estava ao nível do holandês, e se não era tão
rápido em velocidade pura quanto Max, compensava com uma visão de corrida e pilotagem
suave, porém eficiente. Atrevo-me a dizer que se Daniel tivesse permanecido em
Milton Keynes, seria a Red Bull a vice-campeã de construtores, e não os
italianos de Maranello. Pierre Gasly não se entendeu direito com o carro do
time principal dos energéticos, e acabou “rebaixado” de volta à Toro Rosso,
depois que seu rendimento foi considerado aquém do esperado. Se Alexander Albon
se mostrou melhor que o francês ao assumir o seu carro no time principal, porém
o tailandês também não conseguiu andar exatamente no nível de Verstappen, mas
como pelo menos conseguia deixar a turma da “F-1 B” para trás, isso acabou
bastando para Christian Horner e Helmut Marko, com o tailandês sendo agraciado
com a confirmação de que continuará no time principal dos energéticos em 2020.
Já Gasly, de volta à Toro Rosso, aparentemente se reencontrou, e junto com um
Danill Kvyat mais maduro, continuarão na escuderia em 2020, agora sob o nome de
Alpha Tauri.
A Honda teve muitos
méritos em sua evolução este ano, e para aqueles que fizeram inúmeras piadas a
respeito de Fernando Alonso e a McLaren, a comparação não é correta. A unidade
de potência nipônica realmente alcançou um nível de performance aceitável com a
reputação que a Honda merece pela sua história na F-1, mas nos tempos de sua
associação com o time de Woking, o desempenho e confiabilidade eram de fato
sofríveis, e isso não era devido apenas ao carro da McLaren ter suas falhas. Se
a Honda tivesse se preparado melhor, duvido muito que a parceria tivesse sido
desfeita. Muitos parecem imaginar que a unidade que equipa hoje os carros da
Red Bull e Toro Rosso são os mesmos de quando equipavam a McLaren, quando na
verdade já são muito diferentes e bem mais evoluídas, tanto em performance
quanto em confiabilidade. E, graças também a um chassi eficiente, apesar de
alguns desaires ao longo do ano, eles também puderam obter melhores resultados.
Mas de certo modo, a Red Bull, em termos de resultados, manteve-se ao nível do
que vimos nas últimas duas temporadas: brilhando em algumas corridas, mas
ficando no geral abaixo de Mercedes e Ferrari, e prometendo que no próximo ano
a situação será diferente. Aguardemos para confirmar.
Dentre as decepções do
ano, podemos citar a Williams, que teve seu pior ano de que há memória. Os
carros de Grove se mostraram incapazes de largar além da última fila por
méritos próprios, e quase sempre foram os últimos a receber a bandeirada. O
desempenho foi tão sofrível que motivou a demissão (oficialmente, ele disse que
“saiu”) de Paddy Lowe, que havia assumido o cargo de diretor técnico em 2018, e
esperava-se poder recolocar o time do velho Frank nos eixos. A escuderia só não
ficou zerada porque, em um golpe de sorte, Robert Kubica marcou o único ponto
do time no caótico GP da Alemanha deste ano. O polonês, aliás, acabou também
vítima da pouca competitividade do carro, e se perdeu o duelo interno com o
novato George Russel, é preciso lembrar que ele voltou à F-1 anos depois de sua
última participação, em 2010, e não vamos esquecer também que Russel foi o campeão
da F-2 de 2018, ou seja, não era um piloto qualquer, mas um novo talento em
potencial que chegou bem à F-1, e só não foi adiante porque pegou um verdadeiro
abacaxi em sua temporada de estréia.
Quem também desandou
foi a Renault, que depois de uma boa temporada em 2018, se reforçou bastante
para 2019, inclusive contratando o australiano Daniel Ricciardo para liderar o
time na pista, e ajudar o time a encostar no trio Mercedes/Ferrari/Red Bull.
Daniel apostou no time oficial da marca francesa, e infelizmente, a aposta deu
errado, com os carros da escuderia apresentando uma performance instável, ora
competitivos, ora se arrastando. A unidade de potência evoluiu, mas sem um
carro de ponta para demonstrar suas qualidades, fica difícil aferir o progresso
alcançado. Se Daniel ainda tirou leite de pedra em alguns momentos, Nico
Hulkenberg infelizmente acabou rifado pelo time, e está dando adeus à F-1 após
uma década de competição sem ter alcançado nenhum pódio na categoria máxima do
automobilismo. Sua saída causa uma certa revolta porque na Hass, outro time que
perdeu o rumo em 2019, manteve sua problemática dupla de pilotos para 2020,
quando todo mundo esperava ver Kevin Magnussem e Roman Grosjean levando o
bilhete azul. O time de Gene Hass vinha crescendo de performance gradativamente
desde que estreou na F-1, e depois da boa temporada em 2018, todo mundo
esperava tentar uma aproximação às grandes. Bem, nem sempre as coisas dão
certo, mas o ponto mais crítico foi ver o desenvolvimento técnico da Hass não
conseguir acertar o desenvolvimento do carro, a ponto de terem percebido
tardiamente que o assoalho inicial do carro, usando nas primeiras corridas, o
deixava mais competitivo do que a peça nova implantada a meio da temporada. Nesse
ponto, com um carro instável e que não reagia conforme o esperado, pode-se até
dar um desconto para a dupla de pilotos, que não conseguiu obter os resultados
esperados. Magnussem até conseguiu alguns pontos, mas Grosjean continuou tendo
uma sombra negra sobre si, tendo sua fase de azar e problemas continuando a
persistir por quase todo o ano.
Quem também teve de
driblar os problemas, técnicos, não financeiros, foi a Racing Point, ex-Force
India. Se em sua antiga gestão a escuderia sediada ao lado da pista de
Silverstone conseguia fazer milagres com um orçamento pra lá de enxuto, este
ano, com recursos financeiros de sobra, tiveram que se entender para achar o
rumo do desenvolvimento do carro, que começou o ano abaixo do que se esperava,
mas demorando a se engrenar. Sergio Perez mostrou sua habitual competência,
obtendo os melhores resultados do time, enquanto Lance Stroll mostrou que sua
conta bancária é de fato o seu melhor talento como piloto. Longe de ser um
braço duro, mas levou um baile do mexicano, que segue firme no time em 2020, ao
lado do canadense. E justamente por Stroll não ser tão bom, que o time terminou
apenas em 7º lugar, quando poderia ter sido até 5º, superando a Renault, se
tivesse uma dupla mais homogênea, quando tinha Esteban Ocon ao lado de Perez.
Para alguns, o fato de estar reformando a fábrica, reformulando a área técnica,
e contratando mais pessoal, 2019 deve ser encarada como uma temporada de
transição no time, que em 2020 deverá conseguir mostrar sua evolução. Não deixa
de ser uma boa desculpa; resta saber se irá ocorrer.
Com o nome Sauber
definitivamente descartado, a Alfa Romeo só não é 100% porque sua unidade
motriz é o da Ferrari, e a escuderia viveu um ano de altos e baixos, com Kimi
Raikkonen a mostrar que ainda tem muita lenha para queimar na F-1, mesmo aos 40
anos, deixando o italiano Antonio Giovinazzi na sobra na maior parte da
temporada. Tanto que o italiano quase perdeu seu lugar para 2020 no time, se
não tivesse melhorado sua performance na segunda metade do ano, mesmo que isso
não tenha se traduzido em pontos como o finlandês conseguiu. O time até começou
o ano demonstrando algum potencial, mas foi ficando para trás a meio da
temporada, terminando em 8º lugar, ficando à frente apenas da Hass em termos de
resultados. E nem faz sentido comparar com a Williams, do modo como foi seu
ano... O time mantém sua dupla de pilotos para o próximo ano, no que deve ser a
despedida de Raikkonen da F-1, ao fim de seu atual contrato com a escuderia.
Resta saber se o time consegue evoluir além do que mostrou este ano.
E, se teve uma grata
surpresa nesta temporada, foi ver a McLaren renascer na F-1. Ainda não voltou a
vencer, marcar pole, nem lutar pelo título, claro, mas terminou o ano como 4ª
força, ficando atrás apenas do trio Mercedes/Ferrari/Red Bull, com 145 pontos,
tendo sua melhor temporada desde 2014, voltando a brigar com frequência nos
pontos. Só não foi melhor porque a confiabilidade pecou em algumas corridas,
jogando fora alguns resultados expressivos, além de algumas trapalhadas do
time, que aos poucos vai voltando a brilhar na sua trajetória de volta às
primeiras colocações. Com uma nova dupla de pilotos, e um ambiente mais arejado
para trabalhar, o time focou em desenvolver adequadamente o carro, e o
casamento com a unidade de potência da Renault melhorou muito. E com um carro
competitivo, Carlos Sainz Jr. foi um dos destaques da temporada, terminando o
ano em 6º lugar, e até conseguindo um pódio, ainda que circunstancial pela
punição de Lewis Hamilton em Interlagos, mas ainda assim, o primeiro pódio da escuderia
de Woking desde o GP da Austrália de 2014. E Lando Norris, em seu primeiro ano
na F-1, não comprometeu, apesar de alguns percalços, mas andando forte sempre
que teve chances. A dupla de pilotos, aliás, também surpreendeu pelo seu bom
entrosamento, algo complicado quando a escuderia tinha Fernando Alonso como
piloto nos últimos anos, pelo clima mais carregado de cobrança que o asturiano
sempre impunha. Alonso, obviamente, não deixou saudades destes tempos.
E o que dizer da
Mercedesw? Mais um ano, e mais um título, de pilotos, e também de construtores.
Lewis Hamilton não deu chances a ninguém este ano, e suas 11 vitórias falam por
si, assim como em outros momentos o inglês batalhou pelo melhor resultado na
pista, visando o campeonato, e evitando erros e riscos desnecessários, mantendo
uma postura firme e decidida. Sua única gafe foi tocar em Albon em Interlagos e
tirar o tailandês da corrida nos seus momentos finais, mas ali ele já era
hexacampeão, e ele próprio admitiu que arriscou porque corria livre para tentar
vencer por vencer, admitindo seu erro. Valtteri Bottas teve seu melhor ano no
time, e foi vice-campeão, mas ainda ficou devendo no combate com Hamilton, a
quem raras vezes conseguiu se impor durante o ano. Mas o time prateado
continuou mostrando sua extrema competência também fora da pista, não perdendo
a calma nem quando a Ferrari assumiu a primazia na pista, como na Bélgica ou na
Itália, e apesar de alguns lances de sorte, manteve-se extremamente coesa e
eficiente, ao contrário da rival Ferrari. E seus pilotos, quando tiveram que
dividir curvas, o fizeram de forma a respeitar um ao outro na pista, sem toques
ou encostadas desnecessárias.
Com um time azeitado e
engrenado, vencer a Mercedes seria mesmo uma tarefa inglória. Que a
concorrência tente de novo em 2020. Mas não se esqueçam que os alemães não
estarão dormindo no ponto, como podemos ver pelo seu período de domínio da F-1
desde 2014, o mais longevo da história da categoria até o momento, e que pode
se prolongar ainda por bem mais tempo...
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