Largada das 24 Horas de Le Mans de 2017. A Toyota monopolizou a primeira fila e o carro Nº 7 não tinha rival à altura. Mas não foi dessa vez que o time nipônico conquistou Sarthe. |
Para os amantes do
automobilismo, o fim de semana passado foi para ninguém botar defeito. A 85ª
edição das 24 Horas de Le Mans apresentou, como de costume, um festival de
emoções a rodo que satisfez a sede de disputa, em maior ou menor grau, de quem
aprecia uma corrida. Lógico que nem todo mundo pode ter gostado do resultado,
afinal, não dá para agradar a todos. Mas ninguém pode negar: a mítica de Sarthe
esteve novamente presente, transformando uma das provas mais famosas do mundo
do esporte a motor num desafio de proporções épicas. Houve um pouco de tudo em
Le Mans.
Para as principais
estrelas do show, os times da classe LMP1, os mais avançados protótipos a estarem
presentes na pista, a sensação este ano era de um pouco de tristeza: com o
abandono da Audi, e a decisão da Rebellion de descer para a categoria LMP2, o
grid da categoria mais badalada esteve bem reduzido, com apenas 6 carros
presentes: 3 da Toyota, 2 da Porsche, e 1 da ByKolles, que foram os primeiros a
abandonar a corrida, com apenas 7 voltas disputadas. Para Porsche e Toyota, foram
um misto de frustração e superação. Frustração para a marca japonesa, que
novamente chegou a Sarthe como grande favorita, e viu suas chances de vitória
desmoronarem de maneira incrível pelo caminho. Para a fábrica alemã, uma
performance épica que serviu para gravar mais uma vez na história das 24 Horas o
nome da Porsche como maior recordista de vitórias na pista de Sarthe.
É difícil mensurar a desilusão
da Toyota em Le Mans este ano. O destino não foi tão cruel quanto no ano
passado, quando a marca japonesa viu sua vitória virar poeira a 5 minutos do
fim de uma corrida de 24 horas, mas de que isso importa? Eles tinham o carro
mais veloz na corrida, e não havia rivais que pudessem ameaçar seu domínio, que
só não era perfeito porque um dos Porsches estava heroicamente resistindo na 2ª
posição. Mas, parece que os japoneses e Sarthe tem algum quê de destino
incompatível: foi duro para a marca, ainda mais com a presença de Akio Toyota,
o CEO do grupo Toyota, ver dois de seus carros irem a nocaute em poucos
minutos, dando um adeus completo às esperanças de vencer em Le Mans, até porque
seu terceiro carro também teve problemas e, depois de mais de duas horas de
reparos nos boxes, conseguiu voltar à prova para terminar em 8º, com 9 voltas
de desvantagem para o vencedor.
De praticamente últimos na pista à uma vitória que parecia improvável: A Porsche escreve outro capítulo dramático de sua saga vencedora em Le Mans, com sua 19ª vitória. |
Para a Porsche, vencer
em Le Mans parecia um sonho, diante da performance absurda demonstrada especialmente
pelo carro Nº 7 dos japoneses, que com Kamui Kobayashi ao volante, trucidou um
recorde que já durava mais de 3 décadas, e colocava mais de 2s de vantagem sobre
o segundo colocado, e que, enquanto esteve na pista, não deu chances a ninguém.
Mas Le Mans não é apenas velocidade, é também fiabilidade, e para chegar em
primeiro, primeiro é preciso chegar, e a Toyota não conseguiu. Mas a Porsche
também viveu quase o mesmo drama: com o abandono dos favoritos nipônicos, o
carro Nº 1 de Sttutgart assumiu a dianteira, e chegou a ter mais de 10 voltas
de vantagem para o segundo colocado, da classe LMP2. E, por incrível que
pareça, mesmo andando em um ritmo mais conservador, para justamente poupar o
equipamento, eis que o carro também quebra. Pesadelo para os alemães, a exemplo
dos japoneses. E delírio para a classe LMP2, que de repente tornavam-se as
estrelas principais da corrida. Seria o dia deles, enfim?
Não... Não seria, por
incrível que possa parecer. O Porsche Nº 2, que já tinha tido problemas no
início da corrida, e perdido mais de uma hora nos boxes efetuando reparos,
ainda estava na pista. Mas, fechada a 6ª hora de corrida, eles eram apenas o 54º
colocado na prova, vindo entre os últimos colocados, com uma desvantagem de 18
voltas para o líder. Conseguiriam voltar às primeiras posições, muitos
perguntavam. Podiam, e não podiam conseguir. Mas, sem quase nada a perder, era
hora de acelerar fundo. E foram conseguindo se recuperar na corrida. Andando a
um ritmo em média 10s mais rápido que os carros da LMP2, as chances de
recuperarem posições eram boas (a comparação com os carros GT seria ridícula),
desde que nada mais de ruim acontecesse. Era preciso pisar fundo, e tomar
cuidado com o carro, para evitar percalços. E, quando os líderes começaram a
ficar pelo caminho, o carro Nº 2 foi galgando posições: do 50º lugar ao final
da 7ª hora de prova, eles já haviam alcançado a 6ª posição, faltando apenas 4
horas para o fim da prova, com 16 voltas de desvantagem para seus companheiros
de time, e 3 de desvantagem para o líder da classe LMP2.
Com a quebra do carro
Nº 1, a desvantagem reduziu-se sobremaneira, e ao fim da 21º hora, o carro Nº 2
já era o 2º colocado, com uma volta de desvantagem para o novo líder, o carro
Nº 38 da equipe Jackie Chan DC Racing, da LMP2. Mantendo o mesmo ritmo forte, e
tirando desvantagem a cada volta, e lembremos do tamanho da pista de Sarthe, em
algum momento, eles chegariam lá. Mas se manteriam firmes? Nada de errado
aconteceria? A tensão e expectativa só cresciam, conforme a prova
encaminhava-se para seus momentos finais. Ao fim da 22ª hora, o carro Nº 38 ainda
liderava, mas já começava a sentir a pressão da Porsche, que vinha 2min45s504
atrás, já estando na mesma volta. Todos ainda se perguntavam se um carro LMP2
venceria a corrida, apesar da cavalgada dos remanescentes de Sttutgart. Afinal,
já eram mais de duas horas na liderança da corrida, e apesar da diferença de
equipamento, mantinham um ritmo forte. E quem sabe ainda acontecesse algo com o
Porsche restante?
A noite cai em Le Mans, mas na pista, os bólidos continuam acelerando firme. A mítica das 24 Horas esteve mais presente do que nunca na corrida francesa. |
Mas, não deu: ao fim
da 23ª hora de prova, o carro Nº 2 da equipe alemã já havia assumido a
liderança, com cerca deum minuto e meio de vantagem para o Nº 38. Mas, Le Mans
é Le Mans: quem sabe o que ocorreria na hora final da corrida? Bom, sonhar não
custava, e a vitória realmente não veio para o carro da Jackie Chan DC Racing,
que fechou mesmo a prova em 2º lugar na classificação geral com seu modelo
Oreca 07 com motor Gibson, com uma volta de desvantagem para a Porsche, que com
seu carro sobrevivente, obteve talvez a mais improvável de todas as suas vitórias
em Sarthe, dada a condição em que seu trio de pilotos chegou a figurar durante
a fase inicial da corrida. Uma pilotagem impecável do trio Timo Bernhard, Earl
Bamber e Nick Tandy, um excelente trabalho de box dos mecânicos no conserto do
bólido, e depois nas paradas no pit-line, e uma dose de sorte de não se meterem
em nenhuma confusão depois, ou enfrentarem nenhum outro percalço mecânico. Um
feito de superação, após tudo ser considerado perdido. Foi mesmo um dia
daqueles, sem conseguiu respirar direito até a bandeirada de chegada.
Para o time da Jackie
Chan DC Racing, um dia de glória: além de liderar as 24 Horas com autoridade,
até serem superados, eles ainda fizeram 2º e 3º lugares no resultado final,
coroando o bom trabalho desenvolvido, mesmo que um deles tenha chegado na realidade
em 4º lugar. E vitória da classe LMP2 para o trio Ho-Pin Tung/Thomas Laurent/Oliver
Jarvis, que comandou o carro Nº 38. Com 3 voltas a menos, o outro carro do
time, o Nº 37, com o trio David Cheng/Alex Brundle/Tristan Gommendy, também tem
do que se orgulhar, tendo chegado uma volta à frente do próximo rival, o carro
Nº 35 da Signatech-Alpine, pilotado por Nelson Panciatici, Pierre Ragues, e o
brasileiro André Negrão.
E, para quem fala que
corridas de longa duração costumam ser chatas, devia pensar melhor: os momentos
finais da prova na classe LMGTE-Pro viu o clima pegar fogo na disputa pela
vitória entre a Aston Martin e a Corvette, que já vinha acirrado desde o início
da prova. Acabou dando a marca inglesa, com o seu carro nº 17, com a trinca Darren
Turner/Jonathan Adam/Daniel Serra praticamente na volta final, quando o
Corvette Nº 63, pilotado pelo trio Jan Magnussen/Antonio Garcia/Jordan Taylor
acabou capitulando, vítima de problemas nos freios, que ocasionou uma saída de
pista, e um pneu furado, fazendo-o perder 2 posições. Melhor também para a Chip
Ganassi, que levou seu modelo Ford GT Nº 67 com os pilotos Andy Priaulx, Harry
Tincknell, e o brasileiro Pipo Derani ao 2º lugar na classe, superando o 63
também na última volta.
Nos momentos finais, Sarthe viu o duelo entre a Corvete e a Aston Martin se decidir com a vitória desta última na volta final, após disputarem durante todas as 24 Horas da corrida. |
Outros pontos
positivos das 24 Horas de Le Mans este ano foi o fato de não termos chuva
durante todo o fim de semana. Os pilotos puderam acelerar seus carros à
vontade, sem que São Pedro viesse deixar tudo mais complicado do que
normalmente já é. E também tivemos poucos acidentes, e os ocorridos, foram de
baixa gravidade, com todos os pilotos praticamente ilesos, e como maior
prejuízo algumas avarias mecânicas leves também, apesar de uma ou outra batida
um pouco mais forte, mas felizmente, sem maiores consequências. Com poucos
acidentes, tivemos também um índice de quebras relativamente baixo, com 49 dos
60 carros que largaram chegando ao seu final, um número muito expressivo para uma
corrida de longa duração como as 24 Horas, onde a resistência dos equipamentos
é colocada a toda prova. E tivemos também um pouco de paz com a F-1: a largada
da prova foi dada por Chase Carey, manda-chuva do grupo Liberty Media, que
controla agora a categoria máxima do automobilismo, e quem sabe, possa ser um sinal
de possibilidade de pilotos da F-1 participarem de Le Mans mais facilmente,
como ocorreu com Nico Hulkenberg há dois anos atrás. No ano passado, Bernie
Ecclestone jogou a corrida do Azerbaijão para o mesmo final de semana de
Sarthe, e o resultado foi uma audiência pífia para a etapa da F-1, que também não
teve uma boa corrida, e viu um público mirrado nas arquibancadas da cidade de
Baku. Neste ano, a prova não coincidiu com aF-1, mas a falta de vagas impediu
que os pilotos pudessem se divertir na França. Quem sabe isso ocorra no ano que
vem?
Sim, porque já começou
a contagem regressiva para a 86ª edição das 24 Horas de Le Mans, com data
marcada para os dias 16 e 17 de junho do ano que vem. A prova de 2017 já ficou
para trás, com todas as suas emoções. Que venha a corrida de 2018! E quem sabe
a zica da Toyota com o circuito de Sarthe finalmente chegue a bom termo...?
Pelo sim, pelo não, os japoneses que comecem a fazer todo tipo de reza brava e
a orar para todos os deuses que conhecem... Porque os deuses do
automobilismo... Ah, estes já mostraram que ainda não foram conquistados pelos
nipônicos...
Nelsinho Piquet foi o brasileiro
melhor classificado na chegada das 24 Horas de Le Mans este ano, ao terminar em
3º lugar na classificação geral, e em 2º da classe LMP2, com o carro Nº 13 da Rebellion,
juntamente com seus parceiros David Hanson e Mathias Beche. Mas a equipe teve
seu bólido desclassificado por ter feito um buraco na carenagem do carro, a fim
de poder ajudar a dar partida no motor de arranque, que estava com problemas.
Como a carroceria é um item que precisa ser homologado, esta modificação,
proibida pelo regulamento, acabou sendo encarada como irregularidade técnica, e
mesmo que não tenha influído na performance da pista, bastou para o carro ser
excluído do resultado da prova, o que foi comunicado somente no dia seguinte.
Piquet e seus companheiros haviam subido ao pódio e comemorado muito o bom
resultado, meritório, do trio e do time na corrida. Foi um tremendo balde de água
fria para todos. Coincidência ou não, o carro utilizado pelo trio usava o
número 13 na carenagem... Podem colocar azar mesmo nisso...
Todos os brasileiros presentes em
Sarthe este ano receberam a bandeirada nas 24 Horas de Le Mans. Nelsinho Piquet
tinha sido 3º colocado geral e 2º na LMP2, antes de sua desclassificação. André
Negrão foi o 4º colocado na geral, e 3º na LMP2. Rubens Barrichello, uma das
atrações da prova este ano, foi o 13º colocado geral, e 12º na LMP2, resultado
até bom para o pouco competitivo chassi Dallara de seu time. Bruno Senna foi o
16º classificado na geral, e 15º na LMP2. Na classe LMGTE-Pro, Daniel Serra fez
parte do trio vencedor da categoria, ocupando a 17ª colocação geral; Pipo
Derani ficou logo atrás, na 2ª posição na classe, e 18º no geral; Tony Kanaan
foi o 6º colocado na categoria, e 22º no geral. Apenas Fernando Rees, nosso
único representante na classe LMGTE-Am, teve uma corrida sem brilho: largando
praticamente na pole de sua categoria, seu carro infelizmente foi perdendo
performance ao longo da corrida, sofrendo inclusive uma saída de pista, e
comprometendo qualquer chance de um bom resultado, o que explica ter ficado em
48º lugar na classificação geral, sendo o último colocado que recebeu a bandeirada
de chegada. A todos eles, meus cumprimentos pelos esforços demonstrados na
pista, e boa sorte na próxima volta a Le Mans, em 2018.
A F-1 inicia hoje as atividades
do Grande Prêmio do Azerbaijão, no circuito de rua montado nas ruas de Baku,
capital do país. No ano passado, esta foi uma das corridas mas fracas da
temporada em termos de público, e também de emoção na pista. O circuito conta
com a maior reta da categoria atualmente. Com os novos carros, quem sabe isso
resulte em algumas boas disputas? A conferir no domingo... A Globo transmite a
corrida ao vivo a partir das 10 da manhã.
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