Hoje é um domingo de
gala para o automobilismo mundial. Duas das mais importantes corridas do mundo
do esporte a motor são realizadas hoje. Pela Fórmula 1, temos o Grande Prêmio
de Mônaco. Pela Indycar, é o dia das 500 Milhas de Indianápolis. E hoje, mais
do que nunca, estas duas corridas irão dividir a atenção de fãs do mundo das
corridas no mundo inteiro. Isso já ocorre todo ano, mas nesta temporada, a
divisão de atenções dos fãs está mais polarizada do que nunca, tornando as duas
corridas muito mais atrativas do que normalmente já são.
Começando por Mônaco,
a corrida disputada no Principado é a última remanescente no calendário da
categoria máxima do automobilismo onde ainda se respira o ambiente da fase romântica
dos Grand Prix. Esta é uma corrida que já era disputada desde muito antes da
própria F-1 ser criada, em 1950, e nada mais natural que viesse a integrar o
calendário da competição quando esta começou a ser disputada. Por mais
antiquada que possa parecer nos dias de hoje, o charme de Monte Carlo é único,
e mesmo que as corridas aqui não sejam exatamente um primor de emoção e
competição das melhores, vencer o GP de Mônaco é um troféu ímpar no currículo
de qualquer piloto, estando longe de ser desprezado.
No menor circuito do
calendário, formado pelas ruas que normalmente servem ao tráfego comum de
carros durante o resto do ano, o circuito monegasco costuma ser um pesadelo
para os pilotos. Nélson Piquet uma vez definiu que correr aqui é como andar de bicicleta
dentro de um apartamento. Piquet, aliás, nunca morreu de amores pela corrida no
principado, mesmo tendo morado aqui por diversos anos, quando competia na F-1.
Extremamente travado, a pista é também estreita, e sem pontos ideais de
ultrapassagem. Quem larga na frente tem meia corrida ganha, desde que não
cometa erros. E os erros, aqui, costumam não ter perdão: os guard-rails estão
logo ao lado, e uma escorregada, ou tangência errada, ou qualquer outro
deslize, e é batida na certa, que pode arruinar completamente a corrida, quando
não todo o fim de semana. É nesta pista que os pilotos justificam o seu
salário, e onde os impetuosos ao volante costumam testar seus limites, não raro
descobrindo que seu arrojo pode ser o seu pior inimigo. Não por coincidência,
Max Verstappen, considerado o piloto mais destemido do grid atual, e nem sempre
no bom sentido da expressão, ainda não conseguiu receber a bandeirada neste GP,
tendo colecionado intimidades nada recomendáveis com as placas de proteção que
cercam a pista.
E este ano,
particularmente, a corrida está chamando atenção pela expectativa de mais um
duelo entre os principais candidatos ao título da temporada. Depois de uma
vitória firme na Espanha, Lewis Hamilton, da Mercedes, chegou a Monte Carlo
disposto a assumir a liderança da competição, em poder de Sebastian Vettel, da
Ferrari. Vettel, logicamente, não tem intenção de sair da liderança assim tão
fácil, portanto, antevê-se novo duelo renhido entre ambos, ainda mais quando
seus carros estão com um desempenho bem similar, o que significa que a briga
entre ambos tem tudo para ser emocionante, e como ocorreu em Barcelona, poderá
ser decidida nos detalhes. Mas, indiferentes a isto tudo, tem mais gente
querendo sair bem na fita da prova monegasca, a começar pelos companheiros de
Lewis e Sebastian, Valtteri Bottas e Kimi Raikkonen. Por mais que no momento
possam ser considerados coadjuvantes nesta disputa pelo título, Mônaco é uma
pista onde por vezes a lógica não se mantém, e a dupla de finlandeses quer
tirar o seu atraso, depois de abandonarem a prova espanhola. Bottas já venceu
na temporada, e quer repetir a dose, e Raikkonen é o tipo de piloto que pode
estar fazendo uma temporada sem sal e, de repente, acordar com tudo. E ainda
temos a Red Bull, que começou o ano bem atrás, mas que pode ter alguma chance
de se meter no duelo pelas primeiras posições, já que a pista do Principado é
de baixa velocidade, e favorece mais um carro equilibrado e ágil, do que um
motor poderoso. Ah, sim, e onde o braço e o talento do piloto costumam contar
mais do que nunca. E, em se tratando de pilotos, a Red Bull não perde para os
dois principais times da competição. A escuderia austríaca, aliás, perdeu a
vitória aqui no ano passado devido a um pit stop horroroso na parada de Daniel Ricciardo,
entregando o triunfo de mão beijada para Hamilton, que iniciava sua reação na
temporada, até então dominada por seu então parceiro Nico Rosberg, que viria a
ser o campeão.
Por isso mesmo, fica a
expectativa de qual carro, Mercedes ou Ferrari, dos principais times, se dará
melhor nas estreitas ruas de Monte Carlo. Com uma distância entre-eixos mais
curta, o modelo SF70H de Maranello tende a ser mais ágil nas apertadas curvas
da pista, o que em tese não é muito favorável ao modelo W08 criado em Brackley.
Mas isso é a teoria, e é preciso ver se isso se confirma na prática. E o melhor
de tudo que estamos vendo na temporada 2017 da F-1 é que nem sempre a teoria
está batendo com a realidade. Em outras palavras, tudo pode acontecer. E é isso
que esperamos ver neste domingo.
A disputa pela pole em Monte Carlo vai ser ferrenha, já que largar na pole será mais decisivo do que nunca, pelas dificuldades de ultrapassagem na pista monegasca. |
Nos treinos livres desta quinta-feira,
Vettel arrasou o recorde da pista, em um momento onde a Mercedes focava seu
trabalho em simulação de corrida, então, não dá para dizer exatamente quem está
melhor. O certo mesmo é que teremos novamente o duelo Mercedes X Ferrari, e com
direito à Red Bull sonhar em se meter no meio, estragando os planos iniciais da
dupla protagonista do duelo no campeonato, que terá de tomar cuidado para não
ser surpreendida por um desempenho inesperado do time dos energéticos. Ficar
preso atrás de Daniel Ricciardo ou Max Verstappen na corrida decididamente
causa arrepios só de se pensar na possibilidade. Amanhã, no terceiro treino
livre, é que deveremos ver mesmo o potencial real de cada carro nesta pista,
pois largar na frente é imprescindível, mais do que nunca foi. Até porque, se
ultrapassar sempre foi um pesadelo aqui, com os carros mais largos nesta
temporada então...
Daqui de Mônaco, as
atenções do pessoal irão direto para o Indianapolis Motor Speedway, em Indianápolis,
nos Estados Unidos, onde será disputada a 101ª edição das 500 Milhas de
Indianápolis, que este ano chamam especialmente a atenção pela participação do
bicampeão mundial de F-1 Fernando Alonso, que abriu mão de estar na corrida de
Monte Carlo para se aventurar na mítica Brickyard, ambicionando ser o segundo
piloto a conquistar a Tríplice Coroa do Mundo do Automobilismo, composta pelas
etapas de Mônaco da F-1, da Indy500, e das 24 Horas de Le Mans, feito
conseguido até hoje unicamente por Graham Hill. Sem muitas perspectivas de um
bom resultado na F-1, mesmo em Mônaco, Fernando Alonso topou uma idéia que
surgiu a princípio como brincadeira, mas que ganhou ares de coisa séria para
disputar a Indy500, e numa associação da McLaren com o time de Michael
Andretti, eis que o tradicional time da F-1 está de volta às 500 Milhas, onde
participou várias vezes, e até ganhou, nos anos 1970.
Fernando cumpriu os
rituais de avaliação para novatos no IMS, e ganhou a supervisão de Gil de
Ferran, bicampeão da Indy original em 2000 e 2001, e vencedor da Indy500 em
2003. Com um carro competitivo, e ouvindo cuidadosamente as instruções e dicas
de seus parceiros no time da Andretti, bem como de Gil, e até do próprio Mario
Andretti, Alonso foi tomando mais intimidade com os segredos do traçado oval
mais famoso do mundo, e na classificação, entrou no seleto grupo dos mais
rápidos com direito a disputar a pole-position na tarde do último domingo,
terminando por ficar na 5ª posição do grid, no meio da segunda fila, numa demonstração
de como conseguiu se adaptar ao estilo de pilotagem exigido pela pista. Ainda é
cedo para afirmar que Alonso é candidato destacado a vencer a corrida, até
porque há muito chão pela frente, e serão mais de 800 Km de percurso, com
direito a uma pitada de sorte para não ter imprevistos pela frente, e uma boa
estratégia de corrida, para não mencionar outros pilotos já calejados na
experiência de disputar uma Indy500. Por isso mesmo, durante a semana, Fernando
foi se especializando em saber andar no tráfego, condição essencial para se dar
bem em Indianápolis.
.Fernando Alonso atraiu torcedores e a mídia especializada do mundo inteiro com sua intenção de disputar a Indy500. O espanhol larga em 5º, e tem chances de vencer a corrida e entrar para a história. |
E a presença de Alonso
chamou a atenção não apenas de imprensa especializada, mas de seus torcedores
mundo afora, e da F-1, que estarão com seus olhos voltados para a prova
americana. Durante os treinos, a transmissão realizada pela Indycar via
internet de um grande salto de visualizações em relação à edição do ano
passado. Isso é muito bom não apenas para a Indy, mas também para a própria
F-1, por se abrir um pouco de seu mundo fechado, e mostrar como um de seus
maiores pilotos dos últimos tempos irá encarar o desafio de outra corrida em um
universo de competição bem diferente da categoria máxima do automobilismo. Algo
que Bernie Ecclestone nunca permitiria se ainda estivesse no comando da F-1. E
algo também que Ron Dennis nem cogitaria fazer, se ainda fosse o diretor
executivo da McLaren.
E o fato de Alonso
andar forte, com um carro que claramente o credencia a disputar a vitória na
corrida, em que pese as variáveis que ainda podem ocorrer durante as 200 voltas
da prova, só aumentaram ainda mais o interesse dos torcedores da F-1 de ver o
desempenho do asturiano em Indy, até porque, na F-1, Alonso só tem tido
decepções nos últimos anos, incapaz de lutar por vitórias com carros pouco
competitivos, e nas últimas duas temporadas e neste ano, lutando para conseguir
sequer pontuar. A Indy500 este ano está atraindo muito mais atenção do mundo
inteiro e até nos Estados Unidos, do que no ano passado, e olhe que a edição de
2016 foi a 100ª edição da Indy500, algo que não se via todo dia. E se a prova
do ano passado ainda consagrou um novato na competição, Alexander Rossi, um
ex-piloto de F-1 sem um currículo expressivo, o que Fernando Alonso, talvez o
mais talentoso piloto do grid atual da categoria, poderá conseguir disputando a
corrida deste ano? A empolgação é mais do que justificável.
Ninguém vai querer
perder essa. Até mesmo boa parte dos profissionais de imprensa da F-1 já estão
se programando para tentar cumprir seus compromissos profissionais o mais rápido
possível, tão logo seja realizada a cerimônia do pódio e a entrevista coletiva
dos vencedores, para ficarem livres o quanto antes. Depois, todo mundo vai para
seus points preferidos no Principado, em busca de uma TV sintonizada na
Indy500, para acompanhar o que estará acontecendo do outro lado do Atlântico. Quem
sair por último da sala de imprensa correrá o risco de não achar lugar para
ficar onde assistir à corrida. Muitos estão prevendo que os estabelecimentos
ficarão lotados rapidamente. A última vez que vi um interesse assim tão grande
entre o pessoal que acompanha a F-1 pela Indy500 foi em 1993, quando Nigel
Mansell, então campeão da categoria máxima do automobilismo, havia abandonado a
F-1 para competir na então F-Indy. A presença do “Leão” fez boa parte da
imprensa europeia especializada “descobrir” a Indy, até então pouco conhecida e
até ignorada por muitos deles, e igualmente entre os torcedores. Assim, muitos
jornalistas acabaram destacados para cobrir a F-Indy, acompanhando o então
campeão da F-1 que havia ficado sem lugar na sua própria equipe. Mas, naquele
ano, o Grande Prêmio de Mônaco não foi disputado no mesmo domingo que a
Indy500, algo até raro: a prova da F-1 foi no dia 23 de maio, enquanto as 500
Milhas foram realizadas no dia 30 de maio, e registrando uma presença recorde
até então de profissionais da mídia especializada só pela presença de Mansell,
que inclusive tinha iniciado o campeonato Indy daquele ano com uma vitória na
corrida da Austrália, após um duelo com ninguém menos do que Émerson
Fittipaldi, outro nome consagrado na história da F-1. E Mansell esteve na
disputa pela vitória da Indy500, mas no stint final, o inglês foi superado por
Émerson e Arie Luyendick, terminando em 3º lugar, com a vitória de Fittipaldi,
seu segundo triunfo no IMS.
E é essa a pergunta
que todos fazem: Alonso irá vencer a Indy500? As chances existem. Claro,
levando pelo histórico da corrida, qualquer um dos 33 carros no grid pode
vencer a prova. Talento e capacidade Fernando tem de sobra. Mas tem muitos outros
peixes”graúdos” no grid, a começar pelo pole-position, Scott Dixon, que já
venceu na Brickyard e está disposto a repetir a dose. E não podemos esquecer da
dupla brasileira, Tony Kanaan e Hélio Castro Neves, este em busca de seu 4º
triunfo no IMS para igualar-se aos mitos Rick Mears, Al Unser e A. J. Foyt como
os maiores vencedores da Indy500. Para não mencionar dos próprios companheiros
de Alonso na Andretti. A camaradagem dos treinos acabou, e agora todo mundo é
adversário na pista! E os demais pilotos do grid andam até um pouco enciumados
com o assédio centrado no piloto espanhol, sendo até certo ponto ignorados por
parte da imprensa especializada. Todos concordam que a presença do bicampeão de
F-1 é benéfica para a corrida americana, mas é preciso lembrar que ele é apenas
mais um no grid, apesar de todo o seu cartaz, e dos bons resultados nos treinos
e na classificação que demonstrou. A vontade de superá-lo está mais aflorada do
que nunca em certos pilotos. E não é porque a Indy tem um ambiente menos estressante
e fechado do que o da F-1 que a disputa na pista deixará de ser feroz e
acirrada. Muito pelo contrário... O clima cordial e ameno pode até dar uma
idéia errada de como os piloto se portarão na pista.
Alonso, aliás, se
maravilhou com o ambiente mais relax e aberto da Indy, um contraste gritante se
comparado ao ambiente asséptico e impessoal que impera na F-1, e que o Liberty
Media tenta mudar aos poucos. Muitos elogiaram o desafio aceito por Alonso de
competir na Indy500. Muitos outros criticaram, mas de minha parte, um piloto
corre onde quiser e onde puder. Ele pesou os prós e contras, e a experiência de
disputa das 500 Milhas certamente pode vir a ser algo inesquecível. Se vencer a
prova, então, terá realizado um sonho que permeia a mente de todo piloto
profissional que se preze. Será sua segunda conquista no objetivo de conquistar
a Tríplice Coroa. Faltará apenas as 24 Horas de Le Mans, oportunidade que já
surgiu há dois anos, mas que foi vetada por Ron Dennis e pela Honda. Nico
Hulkenberg aproveitou, e saiu de Le Sarthe consagrado. Felizmente, os tempos
atuais são outros, e Fernando certamente haverá de aproveitar novas
oportunidades que surgirem futuramente.
Portanto, aproveitemos
o melhor que pudermos estas duas provas no domingo. E que vençam os melhores!
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