Com algumas mudanças, a Fórmula 1 poderia se tornar bem mais atraente e disputada. Bastaria relaxar algumas limitações que viraram um peso morto na categoria e atualmente só a prejudicam. |
Semana passada dissertei
aqui na minha coluna sobre os problemas de se conseguir voltar a
"encher" o grid da Fórmula 1, que no ritmo atual, só tende a se
esvaziar cada vez mais. Mas os problemas da categoria não se resumem somente a
poucos times competindo. A própria competição da categoria nos dias atuais
precisa melhorar, e nesta semana, a FIA, em reunião realizada em Genebra, na Suíça,
vetou a possibilidade de se efetuarem mudanças radicais na competição,
postergando-as para 2017, no mínimo. A decisão foi sensata, ainda mais porque,
mudar novamente tudo na categoria, como já foi feito no ano passado, seria um
baque financeiro para todo mundo, e praticamente metade dos times que sobraram
não iriam aguentar este tranco tão já. Mas, a meu ver, não é preciso fazer uma
nova "revolução" na categoria para melhorar a F-1. Algumas mudanças
mais localizadas já fariam muita diferença, e para melhor.
Em primeiro lugar, os
motores. As discussões de mudança falaram em implantar motores de 1.000 HPs,
como forma de melhorar a competição e as disputas. Será que só a potência maior
pode proporcionar isso? Tenho outra opinião, e ela inclui manter os atuais
sistemas de potência introduzidos no ano passado, que promoveram uma grande
revolução nos propulsores da categoria, que em 2014 permitiram aos times
rodarem os GPs com menos 1/3 do combustível gasto nas antigas unidades V-8
aspiradas até 2013. Considero isso uma tremenda evolução. Claro, muita gente
chiou, e ainda chia, mas a verdade é que estes novos sistemas, ainda em seus
primórdios de desenvolvimento, ainda podem render muito, e satisfazer
amplamente quem quer ver motores mais potentes na F-1. Basta apenas um pouco de
raciocínio lógico.
Em primeiro lugar, o
ano passado foi de exploração para todos os fabricantes, e com a limitação de
uso de apenas 5 unidades de potência por piloto durante toda a temporada, todo
mundo começou da forma mais conservadora possível. Com um limite que pode
chegar às 15 mil rotações, todo mundo praticamente ficou longe disso. O
objetivo era preservar os motores, pois uma quebra poderia ser crucial no
campeonato. Assim, todos eles, de comum acordo, começaram a explorar os novos
sistemas bem abaixo de todo o seu potencial. Para este ano, contudo, com as
possibilidades de melhorias previstas pelo regulamento, os sistemas já ganharam
bem mais potência. A Mercedes alega ter tido um incremento de 50 HPs em sua
unidade motriz, o que segundo alguns dados, indica que o propulsor alemão já
esteja rendendo, junto com os sistemas do ERS, cerca de 800 HPs. Não é uma potência
desprezível. Mas pode melhorar ainda mais, até porque, como já mencionei, a
limitação do número de motores continua obrigando os fabricantes a deixá-los
cada vez mais duráveis, e dessa maneira, ninguém ainda está forçando tudo o que
pode, para não comprometer a fiabilidade do conjunto. Assim, essa limitação age
como um freio, impedindo que estes novos propulsores possam render bem mais do
que demonstram atualmente.
Como mudar isso?
Conforme falei na coluna passada, a limitação de 4 unidades deveria ser
ampliada, a meu ver, para números bem mais razoáveis. Em 2013, cada piloto
podia dispor de 8 motores por ano. Com 20 corridas no campeonato, creio que
disponibilizar 12 unidades por piloto seria uma boa opção. Podendo dispor de
mais motores durante o campeonato, sem sofrer punição, os fabricantes poderiam
afrouxar mais as amarras, e permitir às unidades produzir mais potência bruta. Isso
poderia levar estas unidades facilmente a atingirem os 1.000 HPs desejados,
como ir até além. E o custo financeiro de mais unidades também não seria
exatamente um problema, mas seria reduzido. Não seria necessário projetar uma
nova base de motores mais potentes como muitos imaginam, o que exigiria novos e
prováveis vultosos investimentos. Desenvolver a atual tecnologia sairia bem
mais em conta. E a relação custo/benefício melhoraria: todos os fabricantes já gastaram
fortunas desenvolvendo os motores atuais, e este custo, claro, está sendo
repassado aos times, que estão gastando mais de US$ 20 milhões com estes
sistemas. O problema é que o custo no momento está dividido por poucas unidades,
uma vez que, este ano, na prática, cada equipe só terá direito a usar 8
unidades de potência em toda a temporada. Podendo produzir mais motores, o
gasto se dilui por unidade produzida a mais, e, teoricamente, os gastos seriam
menores por unidade. E cada escuderia teria bem mais motores à sua disposição. E
menos dor de cabeça tendo de gerenciar a durabilidade dos mesmos. E não seria
preciso mexer na limitação do combustível. O desenvolvimento das unidades mais
amplo teria capacidade de compensar esse detalhe amplamente.
Um exemplo de como ter
mais motores disponíveis melhoraria a competição é que as escuderias precisam
dosar o uso dos sistemas o tempo todo com a limitação atual. Dessa forma, até
mesmo os treinos livres acabam sendo sacrificados em algum momento. No ano
passado vários treinos tiveram poucos carros na pista em algum momento, pois os
times queriam poupar quilometragem nas unidades, a fim de preservá-las para a
classificação e a corrida. Com mais motores, os carros ficariam mais na pista,
poderiam ser mais exigidos, tanto na classificação quanto em corrida, e teríamos
mais competição, com os pilotos não precisando dosar tanto o equipamento.
Outro quesito a ser
discutido que poderia melhorar a competição são os pneus. Tem muita gente que
detesta a obrigação de se usar dois tipos de compostos durante a corrida,
alegando que com os pneus de pouca duração que a Pirelli tem fornecido, todo
mundo tem de economizar em algum momento. Concordo em partes. E, da mesma forma
como expliquei acima com relação aos motores, os pneus não precisam exatamente
mudar, mas sua limitação de unidades, sim. Cada piloto tem direito a 7 jogos de
pneus por fim de semana, de acordo com o
regulamento. Isso já vem de vários anos, e nas últimas temporadas, com
os pneus de duração "variável" produzidos pela Pirelli sob exigência
da FIA/FOM, para dar imprevisibilidade às disputas, esse número de compostos
também passou a ser um limitador de performance. Todos os pilotos e times
passaram a andar menos nos treinos, para economizar pneus para a classificação
e corrida, a exemplo das unidades de potência. E mesmo nas classificações, a
necessidade de largar com o mesmo composto da volta mais rápida inibia os
pilotos na disputa da pole. Tanto que a FIA até modificou a regra, dando aos
pilotos participantes do Q3 um jogo extra, que deveria ser utilizado somente
naquela parte do treino e depois devolvido, só para que os pilotos partissem
mesmo com tudo ou nada para a disputa da pole. Da mesma maneira, defendo o
aumento do número de compostos, além de tornar facultativo a escolha de com
qual pneu um piloto largue na corrida, independente de qual usou nos treinos de
classificação. Quem sabe dando aos pilotos 10, ou 12 jogos de pneus por fim de
semana, eles se sintam mais dispostos a acelerar mais? Com mais alguns jogos,
eles certamente não se poupariam tanto, e na corrida, tendo mais jogos, alguns
poderiam optar por parar mais nos boxes e ter pneus mais velozes e novos
durante a maior parte da disputa. E mais jogos de pneus não significam mais
gastos para os times? Sim, há um gasto maior, mas acreditem, esse custo não
subiria tanto como se imagina. E isso, tecnicamente, sem aumentar o tamanho dos
pneus atuais. No caso de aumentar o tamanho dos pneus, o mesmo raciocínio vale
quanto à limitação de compostos, mas os pneus de maior tamanho obrigariam os
times a repensar parte dos carros, uma vez que o maior tamanho mudaria os parâmetros
de aerodinâmica, mas também poderiam dar chance de se aumentar a aderência mecânica,
permitindo aos pilotos desenvolverem mais velocidade, pela maior área de
contato com a pista, e maior controle também dos carros, pelo mesmo raciocínio.
Com sorte, não seria mais necessário o uso da asa móvel traseira, o DRS, que
muitos consideram ter feito perder a graça nas ultrapassagens da categoria.
O mesmo vale para as
caixas de câmbio, que a exemplo dos motores, precisam durar várias corridas,
mais especificamente, 6 provas. Se o piloto precisar trocar a caixa antes da 7ª
corrida, acaba tomando punição. Assim, literalmente é preciso correr a
temporada apenas com 4 caixas de câmbio, e torcer para não sofrer uma quebra. Liberar
mais unidades por temporada, diminuindo o limite de provas sem poder trocar a
peça ajudaria a exigir mais do carro, e por tabela, aumentaria a performance.
Como se depreende do
raciocínio que utilizei até aqui apenas para estes itens, o que prejudica a F-1
atualmente é a tentativa de economizar a todo custo nestes equipamentos, que
nos últimos anos, provaram ter pouca eficiência em baixar os gastos dos times. Claro
que os custos foram reduzidos, uma vez que, antigamente, os times de ponta
podiam se dar ao luxo de jogar motores e câmbios no lixo logo após o primeiro
treino, algo que os times pequenos não tinham a mínima condição de fazer. Gastava-se
motor apenas na classificação, onde apenas os times grandes tinham unidades
específicas somente para isso. Na tentativa essa gastança toda de material, a
FIA fez bem de limitar o uso dos equipamentos, mas isso já foi longe demais, e
a tão perseguida melhor competitividade entre os times nunca chegou com a
limitação destes equipamentos. Não se deve voltar à gastança desenfreada de
antes, apenas ser mais razoável com os limites impostos atualmente, e
redimensioná-los de forma a servirem para melhorar a disputa nas pistas.
Mas nada é pior do que
o excesso de punições que a FIA pratica atualmente contra os pilotos. Há punições
demais por qualquer coisa, e qualquer toque entre os carros hoje já é motivo
para se ver na tela o aviso de que "incidente X está sendo investigado
pelos comissários...", que dá nos nervos de quem assiste, e pode imaginar,
deixam os times e os próprios pilotos ainda mais nervosos. Desse modo, muitas
escuderias e pilotos acabam ficando "controlados" na pista, evitando
manobras mais arrojadas e determinadas na disputa de posições. E o público,
logicamente, quer ver briga na pista, e não uma prova burocrática. Na ânsia
pela segurança a qualquer custo, a FIA praticamente promove uma "caça às
bruxas", onde até o piloto xingar alguém é passível de punição. Mas
acreditem, já foi um pouco pior. Depois, eles passaram a contar com um piloto
convidado a cada GP para ajudar os comissários a discutir melhor as situações
que são vistas na corrida, e isso pelo menos serviu para parar em parte com as
punições que chegam a sair a torto e a direito. Mas ainda precisa melhorar
mais. O problema é que as próprias escuderias alimentam por vezes a postura
"conservadora" de seus pilotos, temendo que uma maior liberdade de
atuação aumente as chances de acidentes, o que significa prejuízo para o time,
com os estragos no monoposto, que dependendo da pancada, pode ficar irrecuperável.
É preciso vencer essa letargia também, mas nada vai mudar se a FIA não tirar
sua mão pesada de cima dos pilotos em qualquer situação mais belicosa que
surgir na pista. O automobilismo, por natureza, é um esporte de risco, e quando
se corta todos os riscos, ele perde a graça.
Afinal, toda
ultrapassagem pressupõe um risco: o de não conseguir efetuar a manobra, o de
perder a própria posição, caso esteja em luta direta com mais de um piloto, e
até o de um toque, em caso de levar uma fechada, involuntária ou não de piloto
adversário. Nélson Piquet já dizia que, se você não quer correr riscos numa
corrida, deveria ficar em casa. E o que dizer de Gilles Villeneuve, que só
desistia de uma disputa quando o carro literalmente já não conseguia andar? Gilles
nunca foi campeão, mas suas performances arrojadas ao volante da Ferrari são
lembradas até hoje e reverenciadas. Mas, pelo atual parâmetro de comportamento
que a FIA gosta que os pilotos sigam, o canadense seria considerado um barbeiro
inconsequente, e muito provavelmente seria proibido de competir na categoria. Esse
é o problema que a entidade criou para a F-1. E, pior, os pilotos atuais estão
acostumados com essa "idéia" de comportamento implantada, visto que
volta e meia eles ficam de beicinho para qualquer manobra mais
"rebelde" que vivenciam seja nos treinos ou na corrida. Não é preciso
tornar a categoria um derby de demolição, onde todo mundo pode simplesmente dar
pancada em todo mundo, mas serem mais razoáveis e usarem o bom senso na hora de
analisarem os casos existentes, já ajudaria a deixar os pilotos mais livres
para ousarem nas disputas.
Ainda não cheguei a
falar de outra coisa profundamente irritante na categoria hoje em dia, que é o
seu distanciamento do torcedor comum, mas deixarei para dissertar sobre isso em
outro texto, pois há muito o que dizer. Espero que tenham apreciado minhas
sugestões, e que façam uma boa discussão dos meus pontos de vista. E nos vemos
na próxima coluna, semana que vem.
Ainda que tomando uma decisão
meio ridícula, pois teria coisa melhor para fazer, concordo com a limitação do
desenho dos capacetes dos pilotos, que devem deixá-los "fixos" pela
temporada atual. O capacete é a identificação que o torcedor tem com o piloto,
sua "digital", marca pessoal, etc. Manter o mesmo design cria uma
identificação e empatia do público para com o esportista do automobilismo, já
que eles mostram seu rosto apenas no pódio e fora do carro. Vários pilotos
ficaram com suas pinturas eternizadas, como Ayrton Senna, com seu capacete
verde e amarelo; Nélson Piquet com seu design branco com pingos e listra
vermelhos; Graham Hill e seu capacete preto, utilizado depois por seu filho
Damon, e por aí vai. Ficar mudando a toda hora chega a irritar, e o público não
consegue identificar o piloto na pista. Mesmo assim, apesar de concordar, a FIA
não precisava baixar norma para isso, pois deveria se ocupar de assuntos mais
relevantes. O problema é que, se não se toma esta atitude, os pilotos
continuariam a mudar sua pintura a seu bel-prazer. Um pouco de bom senso de
alguns pilotos ajudaria a evitar isso, mas parece que hoje em dia o bom senso
anda bem duro de se impor...
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