sexta-feira, 20 de julho de 2012

HOCKENHEIN SEM SAL


            A Fórmula 1 chegou à etapa do Grande Prêmio da Alemanha, e o palco de Hockennhein, que este ano sedia a corrida, não traz boas recordações para os torcedores brasileiros em tempos recentes. Foi aqui que, há dois anos atrás, Felipe Massa “traiu” seus torcedores ao ceder uma vitória que poderia ser sua ao companheiro de equipe Fernando Alonso, da Ferrari, numa repetição, ainda que com detalhes ligeiramente diferentes, do que todos haviam visto no Grande Prêmio da Áustria de 2002, tendo Rubens Barrichello perdido uma vitória que era sua para Michael Schumacher, em um ato vil e cretino por parte da escuderia italiana. O tempo mostrou que a Ferrari nunca tomou vergonha na cara, muito pelo contrário...
            Para mim, a pista de Hockenhein, há cerca de 10 anos, virou um traçado insosso, sem carisma, depois de ter sido mutilado pelos cartolas da F-1, alegando falta de segurança do traçado antigo, mas que na verdade, incomodava aos interesses comerciais da categoria, uma vez que as longas retas da pista alemã, na opinião deles, eram enfadonhas para os telespectadores, e ainda privavam a maior parte do público dos pegas, uma vez que as arquibancadas naquele setor eram mínimas, por causa da floresta. Justificativas das mais ridículas e falsas. Houve chiadeira dos fãs, mas Bernie Ecclestone, como de costume, venceu a briga, e desde 2002, Hockenhein perdeu todo o seu encanto, não apenas para mim, mas para inúmeros pilotos e torcedores do automobilismo. Em parte, quiseram invocar os motivos que levaram o antigo Nurburgring a ser banido da categoria, nos anos 1970, especialmente depois do violento acidente que por pouco não matou Niki Lauda em 1976. Mas as razões para tirar o Nordschleife da categoria eram mais válidas: com seus impressionantes 22 Km de extensão, as condições de segurança eram mesmo precárias de se garantir em uma pista daquele tamanho. Foi criado um novo autódromo, bem ali junto, com um tamanho mais condizente com os atuais padrões de segurança. Claro que ele nem de longe tem a imponência do original, mas pelo menos este continua existindo ali do lado, e é aberto ao público que quiser conhecer a pista, pagando uma entrada para isso. Sua memória está preservada.
            O mesmo não se pode dizer de Hocknhein. Tiraram as longas retas que cortavam a Floresta Negra alemã, e removeram o asfalto do traçado, de modo que hoje, só se pode ver que ali havia algo porque as árvores que cresceram na antiga pista ainda são mais baixas em relação às vizinhas. O mato já tomou conta do antigo traçado, que não foi preservado nem mesmo para que se pudesse disputar ali corridas de outro tipo de categoria, ou mantido pela memória do automobilismo. Daqui a alguns anos, a maior parte dos resquícios que sobraram de que havia uma pista de corrida por entre aquelas belas árvores terá desaparecido quase por completo. O traçado, de quase 7 Km de extensão, não justificava as acusações de falta de segurança alegadas para sua modificação. Foi criada uma nova seção, unindo as duas antigas retas da floresta, o que encurtou o traçado para 4,57 Km, e uma das retas restante ainda ganhou uma nova curva para “quebrar” ainda mais a velocidade, ajudando a tirar ainda mais o charme do que restou. Sobrou intacta a parte do “Motodron”, o trecho com curvas de baixa próximo à reta dos boxes, com arquibancadas que lembram o formato de um estádio, mas isso foi o mínimo.
            As longas retas na floresta eram a característica marcante desta pista, e seus longos trechos de aceleração plena significavam um desafio para os motores das categorias que corriam aqui naquele traçado. Quem não tinha um motor potente praticamente virava figurante aqui, a menos que o chassi do carro fosse muito, muito bom. E por causa destas longas retas, a pista alemã era um pequeno alívio para quem tinha potência de sobra, e falta de um carro competitivo. Hockenhein era a oportunidade de se “lavar a alma” na temporada. Foi aqui que em 2004, Gerhard Berger tirou a Ferrari de seu mais longo jejum de vitórias na história da categoria. Sem vencer desde o fim de 1990, o time italiano já estava há quase 4 anos sem vencer quando o piloto austríaco tirou o time da fila. Os possantes motores V-12 da Ferrari fizeram a diferença nas longas retas já na classificação, permitindo que Berger e seu companheiro Jean Alesi largassem na primeira fila. A Ferrari não tinha um carro muito competitivo, em um ano onde a Benetton de Michael Schumacher dominava e a Williams parecia não ter capacidade de reagir à altura. Naquele momento, apostar em uma vitória do time de Maranello era quase uma zebra. O GP da Alemanha serviu para revigorar o ânimo do time italiano e dos torcedores.
            Verdade que um acidente múltiplo na largada ajudou ao tirar alguns potenciais rivais, como as Williams, muito mais competitivas. Michael Schumacher, mesmo dando tudo de si, levou sua Benetton aos limites, acompanhando Berger durante a primeira metade da corrida. Mas a diferença do motor Ford V-8, apesar da excelência da série Zetec-R, não tinha como fazer frente ao possante V-12 italiano nas longas retas, e a unidade quebrou, mercê do esforço de Schumacher em tentar vencer. Desnecessário dizer que as longas retas proporcionavam oportunidades de ultrapassagens como não se via em nenhuma outra pista, sendo normalmente palco de duelos muito aplaudidos pelos torcedores. Se ainda fosse usado hoje, duvido que alguém precisasse de Kers ou DRS para efetuar ultrapassagens naquelas retas que hoje não mais existem. Mesmo em seus últimos anos, quando os carros já ficavam muito dependentes de uma aerodinâmica ideal, os longos trechos da Floresta Negra ainda eram palcos de inúmeras disputas. Em 1992, Ayrton Senna defendia sua posição com determinação pilotando uma McLaren que não era páreo para a Williams dominante daquele ano. Mas Riccardo Patrese capitulou na perseguição, perdendo a concentração e saindo da pista, atolando na brita.
            Foi aqui também um palco de um acontecimento inusitado, em 1982, quando Nélson Piquet, na Brabham, liderava a corrida e acabou abalroado a jogado fora da pista quando foi ultrapassar o retardatário Eliseo Salazar. Piquet ficou furioso como ele só, e partiu para cima do chileno dando socos e pontapés, que foram a alegria de fotógrafos e cinegrafistas do mundo inteiro. Uma cena impensável para os dias de hoje, pela chatice que impera na categoria, pra não falar do politicamente correto, a praga dos dias atuais. Mas Piquet teve seus bons dias em Hockenhein, como suas vitórias em 1986 e 1987, pela Williams. Foi também nesta pista que Rubens Barrichello conseguiu sua primeira vitória na F-1, com um show de pilotagem nas voltas finais, domando sua Ferrari numa pista ora molhada, ora seca, e sendo aplaudido por vários outros times e pilotos até. Foram bons dias aqueles.
            Dos pilotos atuais, apenas Michael Schumacher, Kimmi Raikkonen, Pedro de La Rosa, Jenson Button, e Fernando Alonso correram aqui de F-1 na antiga pista. E nem é preciso dizer que a opinião de todos é praticamente unânime em afirmar que o traçado da Floresta Negra era muito mais desafiador do que o atual. Foi por ali que o nome de Hermann Tilke, que tinha começado a ganhar fama na categoria alguns anos antes por ter projetado o autódromo de Sepang, em Kuala Lumpur, sede do GP da Malásia, ficou marcado como “destruidor” de circuitos da F-1, tendo criado depois daquele ano vários outros autódromos quase todos sem nenhum atrativo especial, como eram as pistas de outrora.
            Cada circuito, antigamente, tinha sua marca registrada...sua característica...seu charme... Isso não se vê nas pistas que a F-1 vem incorporando ao seu calendário nos últimos tempos. Hockenhein tinha tudo o que as pistas daquela época precisavam. Acabou podado, “modernizado”, “castrado” na opinião de muitos para se utilizar um termo mais forte. Um tempo nem tão distante assim, mas onde ainda se podia mostrar um pouco mais do que se pode ter hoje. A F-1 na sua essência saiu perdendo, ao contrário do que outros afirmam, em especial a FOM. E os torcedores perderam muito mais...

=====================================================================================
A Indy Racing League começa hoje os treinos para mais uma etapa do campeonato, desta vez em Edmonton, no Canadá. Ryan-Hunter Reay defende a liderança do campeonato, e o piloto da equipe Andretti vai precisar caprichar: Will Power venceu lá no ano passado, e deve vir com tudo para tentar recuperar a liderança do certame. Podemos esperar uma bela disputa no circuito misto montado em parte do aeroporto da cidade canadense.

Nenhum comentário: