Quem
acha que a Fórmula 1 vive enrolada com algumas de suas politicagens que não
fique achando que isso é exclusividade da categoria máxima do automobilismo.
Nos Estados Unidos, a Indy Racing League, vulgo Indycar, tem tido sua cota de
confusões nesta temporada. A única diferença é que, como se trata de uma
categoria menor, e de popularidade mais restrita, seus rolos também são mais,
digamos, discretos. Mas que eles existem, isso, existem.
Comecemos
pela estranha permissão para a Honda mexer em seu novo motor turbo. Inaugurando
uma nova fase, a IRL passou a usar pela primeira vez motores turbo em seu
campeonato, tirando-se sua primeira temporada, lá em 1996, quando ainda usou os
mesmos equipamentos da F-Indy, que na época, usava motores turbo. Acontece que
a Honda levou uma lavada da Chevrolet no início do campeonato, e então, eis que
a direção da categoria permitiu aos japoneses fazerem uma modificação no seu
motor, com vistas a melhorar a competitividade. Isso foi visto pela Chevrolet
como uma quebra das regras da categoria, que espelhando-se nas regras atuais da
F-1, estabeleceu o “congelamento” técnico dos motores como forma de redução de
custos, além de limite de unidades, punições de perda de posição no grid por
troca de propulsor, etc. A modificação permitiu a volta da Honda na briga, e
embora os Chevrolet ainda sejam os melhores motores, o desnível existente até
então para os propulsores nipônicos ficou bem reduzido. Houve quem não tenha
gostado ainda mais disso, como John Barnes, dono da Panther, que escolheu o
Twitter como local de desabafo público, colocando lá suas queixas e motivos para
desgostar do presidente da Indycar, Randy Bernard, entre outras coisas.
Numa
atitude ridícula, Barnes tomou uma multa de cerca de US$ 25 mil pelas suas
críticas, e o caldo entornou de vez. E concordo com sua atitude, afinal, que
palhaçada é essa de não poder manifestar sua opinião? Os EUA viraram uma
ditadura feito Cuba, por acaso? Mas não fiquem achando que tal palhaçada é
exclusividade da IRL: em outros certames, existem cláusulas que impedem
expressamente seus participantes de dizerem qualquer coisa desabonadora sobre o
campeonato em que participam, e nem é preciso dizer que a F-1 está cheia disso,
com pilotos e times que falam e seguem o manual do politicamente correto tão
certo que chega a encher o saco.
A
coisa na IRL engrossa quando Barnes resolve pedir a cabeça de Randy Bernard,
presidente da Indycar, e segundo alguns, ele estaria sondando outros colegas
para ver se a idéia pega, entre eles, adivinhe só, Tony George. Era só o que
faltava! Pra quem não sabe, Tony George foi o criador da Indy Racing League.
Enciumado por não ter todo o poder que desejava na F-Indy, e detendo o comando
das 500 Milhas
de Indianápolis, George deu um ultimato à direção da CART em 1995: ou lhe davam
o respeito e posição de poder que achava que merecia, ou ele tirava a Indy500
do calendário da F-Indy. A CART era um órgão colegiado formado por donos de
todas as escuderias da categoria, e deram uma banana para George, que resolveu
cumprir sua ameaça, e criou seu próprio campeonato, onde ele mandava em toda a
bagaça.
Deu
no que deu: com duas categorias disputando o mesmo público, a Indy perdeu
prestígio e importância. Até hoje a IRL não consegue recuperar a fama que a
F-Indy original tinha, e pior, George ainda bancava boa parte do campeonato,
que nunca foi economicamente auto-sustentável até alguns anos atrás.
Felizmente, acabou afastado da direção da IRL, embora ainda faça parte do
conselho da categoria. Entrou então Randy Bernard, que já havia feito fama nos
certames de rodeios, e bem ou mal, começou a introduzir mudanças na categoria.
Verdade que nem tudo foi bom, mas pelo menos, houve tentativas de se melhorar o
que havia disponível, e torná-lo algo ainda melhor. O campeonato foi
reorganizado, com várias pistas sendo descartadas em prol de etapas
financeiramente mais viáveis. Não é surpresa nenhuma que várias etapas em ovais
tinham um público ínfimo, onde o que mais se via eram arquibancadas vazias ou
apenas um lance ou outro ocupado por torcedores. Como Tony George bancava o
campeonato, essas etapas eram enfiadas por ele e tudo seguia em frente. Chegou
a criar sua própria escuderia, a Vision, para enfiar mais carros no grid. Mas
uma hora, a brincadeira tinha de acabar, e George acabou destituído até da
direção do autódromo de Indianápolis por depauperar o patrimônio da família
bancando sua brincadeira de campeonato próprio. Não é novidade para ninguém que
George quer recuperar sua antiga posição de poder. O problema é que sua visão
mostrou-se equivocada, na ânsia de querer acabar com a antiga F-Indy, e hoje, a
IRL precisa saber andar com as próprias pernas. Isso Randy Bernard está
conseguindo fazer acontecer, o que torna uma atitude descabida querer tirá-lo
do comando da categoria apenas por desavenças pontuais. Mas, foi começando por
este tipo de desentendimento que a IRL surgiu, na década retrasada...
Tivemos
também o caso das punições bestas, comandadas por Brian Banhart, comissário
chefe, que se envolveu com bate-bocas com vários pilotos, entre os quais Hélio
Castro Neves. Felizmente, ele acabou substituído, mas nem por isso a categoria
evitou de se envolver em algumas zicas, como foi a punição besta a Scott Dixon
em Milwaukee, que acabou sendo punido injustamente por queimar uma relargada, e
perdeu as chances de vencer a corrida, terminando apenas em 11°.
E
as equipes também estão chiando por causa do novo chassi DW12. O modelo,
fabricado pela Dallara, está custando cerca de US$ 500 mil por unidade,
enquanto as promessas do novo equipamento eram de que ele estaria à disposição
por no máximo US$ 350 mil. Para conter os custos, os kits aerodinâmicos que
permitiriam ser usados para customizar os carros, acabaram adiados para 2013, e
agora, para 2014. Os times alegam que os custos estão altos, e estão exigindo
que a Dallara baixe os preços de seus equipamentos, uma vez que enfiaram uma
regra besta que proíbe os times de fabricar peças e equipamentos para os novos
carros: qualquer peça usada neles tem de ser original da Dallara. Neste ponto,
a chiadeira é generalizada, e negociações estão sendo feitas com os italianos
para baixar os custos, e tem muita gente exaltada com isso. Na minha opinião,
manter o campeonato sendo monomarca de chassi foi um erro crasso. Deviam ter aberto
a quem quisesse fornecer chassis, desde que respeitando o regulamento técnico,
e estabelecendo regras que permitissem um desenvolvimento restrito por parte
dos fabricantes para deixar os custos sob controle. Na antiga Indy tinha
chassis fabricados pela Lola, Reynard, Penske, e até March e Swift em
determinadas temporadas. Por que não agora? Contenção de custos, foi a
resposta. Bem, parece que o tiro, até o momento, está saindo pela culatra, pois
os italianos estão meio que dando uma banana para os clientes americanos. E nem
é preciso dizer que as peças de reposição estão saindo a preços “de ocasião”...
Era
preciso atualizar os carros, que já estavam sendo usados há quase uma década,
dando a impressão de que a categoria não evoluía no tempo. Mas os antigos
chassis tinham algumas vantagens, e de tanto serem usados, vários times já
implantavam neles peças de fabricação própria, ajudando a conter algumas
despesas. Muitos também consideram que foi um disperdício terem ignorado os
chassis Panoz desenvolvidos para a antiga F-Indy, que quando foi absorvida pela
IRL há alguns anos, foram praticamente descartados pela nova categoria, ainda
tendo um bom potencial e vida útil. Mais uma decisão equivocada, na opinião de
muita gente.
A
economia americana também não ajuda. Desde 2008, com a crise financeira, o
mercado não voltou aos níveis de outrora, e quem tem dinheiro sobrando hoje
pensa duas vezes antes de gastar seu dinheiro. Um hábito bom, porque antes,
muitos americanos tinham tendência a saírem gastando a torto e a direito, e
hoje eles são mais comedidos. Mas a fonte secou para alguns times, que não
conseguem encontrar patrocinadores com a facilidade de antes. Há pontos a serem
comemorados, como os níveis de audiência estarem subindo, com um contrato de
exibição na TV americana muito melhor do que o que havia antigamente, a entrada
da Izod como patrocinadora oficial do campeonato, e estar entrando mais
dinheiro nas promoções de corridas, direitos de transmissão, etc. Mas ainda não
está bom o suficiente, é preciso cortar alguns custos. E para isso, será
preciso mudar algumas das regras. O problema é conseguir consenso para fazer as
mudanças certas, e nessas horas, cada um defende a idéia que lhe parece mais
conveniente. E ainda há a sensação de que muita gente está reclamando de
barriga cheia, algo que certamente não ajuda nem um pouco na hora de se
demonstrar boa vontade na tentativa de achar soluções para os desafios que se
apresentam...
Se
não houver vontade de corrigir algumas derrapadas, e união para implementar as
idéias e medidas corretas, a IRL pode ver naufragar seus planos de reerguimento
da categoria. Até o momento, a única coisa positiva deste ano foi a volta da
disputa de motores, com a briga Chevrolet X Honda. Mas é preciso um pouco mais.
Vamos ver se eles acertam o rumo, ou se poderemos ver um “racha” ou uma troca
de comando no certame. Qualquer uma das duas hipóteses terá conseqüências
negativas, e de notícias ruins todos já estão meio cheios.
Felizmente,
a briga dentro da pista segue boa, e o campeonato promete mostrar uma luta pelo
título potencialmente interessante. Vamos ver domingo como as coisas se ajeitam
na corrida de Toronto, no Canadá...
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A F-1 chegou a Silverstone para a disputa do Grande Prêmio da
Inglaterra, uma das corridas com ambiente extra-pista dos mais agradáveis. No
descampado que cerca o autódromo, milhares de torcedores acampam para
acompanhar a prova, e bater bons papos sobre corridas e afins. E a briga na
pista? Podemos esperar qualquer coisa: ainda não teve nenhuma corrida monótona
este ano, felizmente. Quem sabe o que pode acontecer agora?
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