Semana passada tivemos duas datas que, respectivamente a 30 e 20 anos atrás, marcaram o início e o fim de nossos melhores anos na Fórmula 1. Para quem curte hoje o automobilismo da categoria mais famosa do planeta, fica a saudade de uma época onde o Brasil brilhava nas pistas e era considerado a primeira força da categoria, eclipsando todos os demais países que tinham representantes no grid. No último dia 17 de outubro, há exatos 30 anos atrás, no Grande Prêmio dos Estados Unidos-Las Vegas, Nélson Piquet conquistava o seu primeiro título na categoria, pilotando um Brabham BT49C, projetado por Gordon Murray, e impulsionado pelo confiável motor Ford Cosworth DFV. A corrida acabou vencida pelo australiano Alan Jones, maior rival de Piquet em toda a temporada, e que no ano anterior tinha se sagrado campeão justamente em cima do brasileiro. Jones venceu a corrida, mas o 5° lugar conquistado pelo piloto brasileiro garantiu o título para Piquet, pela diferença de apenas 1 ponto (50 pontos de Piquet contra 49 de Alan Jones). Carlos Reuteman dava a dimensão da frustração de perder corridas para Piquet, ao afirmar que o brasileiro limpava seu carro nas corridas no autódromo de Brasília, nos anos 1970. Piquet dava seus primeiros passos nas corridas, e aprendia ali o ofício de mecânica, que lhe seria muito útil em toda a sua carreira de piloto, por ter um grande conhecimento técnico do carro e seus componentes.
E, no último dia 20, também completou nada menos do que 20 anos da última conquista de um título de F-1 por um piloto brasileiro. Ayrton Senna chegava ao tricampeonato na pista de Suzuka, palco onde conquistou todos os seus 3 títulos na categoria, depois que seu então único rival na luta pelo título, Nigel Mansell, saiu da pista na primeira curva e deu adeus à corrida. Com o piloto inglês fora de combate, Senna chegou ao título independentemente do que acontecesse com ele na corrida. O brasileiro foi atrás de Gerhard Berger, que liderava a prova, e o superou, mas na última curva da última volta, cedeu a vitória ao austríaco, por ordem da equipe McLaren, em retribuição aos esforços de Berger para a escuderia na luta pelo campeonato. Senna ficou contrariado, e Berger sem jeito, pois a manobra não foi bem vista por boa parte dos torcedores, uma vez que Senna deixou seu companheiro vencer. Para os brasileiros, que já haviam criado o hábito de permanecer acordados nas madrugadas para assistir às corridas de F-1 no extremo Oriente, tudo ótimo: éramos campeões novamente, Senna tornava-se um dos gigantes da categoria ao atingir o clube dos pilotos tricampeões, e tudo indicava que o domínio brasileiro na F-1 não tinha data para acabar, pois Senna continuaria na McLaren, considerada a melhor equipe, apesar dos avanços inegáveis que a Williams dava no sentido de recuperar o seu poderio dos tempos da associação com a Honda.
No período de apenas 10 anos, do primeiro título de Piquet ao último de Senna, o Brasil conquistou nada menos do que 6 campeonatos. Foi uma época áurea para o Brasil na categoria máxima do automobilismo, onde se criou o lema de “Brasil X Resto do Mundo”, que alguns já haviam bradado muitos anos antes nas Copas do Mundo. Nesses 10 anos, apenas um piloto se intrometeu regularmente nas conquistas verde-amarelas: Alain Prost. O francês baixinho foi tricampeão nesse período, que inclui a polêmica decisão de 1989, quando Prost fechou Senna na última chicane de Suzuka, tentando forçar o abandono do brasileiro com o choque dos carros. Funcionou parcialmente, porque Ayrton manteve o carro funcionando, voltou à pista e ainda conseguiu vencer a corrida, mas foi desclassificado por cortar a chicane e com isso Prost conquistou o tri. A vingança seria dada no ano seguinte, com Senna a abalroar Prost, agora na Ferrari, na mesma pista de Suzuka, mas em situação inversa. Para os brasileiros, a justiça havia sido feita: Prost recebera uma dose de seu próprio remédio. No período, fora Prost, o único que ainda se intrometeu entre as conquistas brasileiras foi o finlandês Keke Rosberg, que venceu o campeonato de 1982 vencendo apenas 1 corrida, em um ano conturbado na história da categoria, que assistiu à morte de Gilles Villeneuve, e ao forte acidente de Didier Pironi, num ano em que a Ferrari tinha tudo para vencer o certame.
Estes 10 anos também viram a consagração e o ocaso de Nélson Piquet na F-1. Nova estrela da categoria, Piquet conquistava suas primeiras vitórias na temporada de 1980, mas o título veio apenas em 1981. Nos anos seguintes, Piquet mostraria sua versatilidade sendo o único piloto campeão com equipamentos distintos. Seu primeiro título foi pilotando um Brabham BT49C equipado com motor Ford aspirado. Já em 1983, Piquet conquistaria o primeiro título de um motor turbo na história da F-1, no caso o BMW de 4 cilindros em linha, equipando o Brabham BT52. Em seu último título, em 1987, Piquet guiava o Williams FW11B motorizado pelo Honda V-6 RA 166, que segundo diziam, atingia 1.500 HPs em configuração de classificação. O título de Piquet teve ainda mais méritos pelo fato de o brasileiro ter passado boa parte da temporada recuperando-se de seqüelas originadas de seu forte acidente sofrido na pista de Ímola, onde bateu forte na curva Tamburello e não participou da corrida, que foi vencida sem problemas por seu rival e companheiro de equipe, Nigel Mansell. Mansell, aliás, era favorecido pela escuderia, e Piquet, ciente disso desde meados da temporada anterior, tratou de virar o jogo dentro do time com muita malícia, astúcia, e até um pouco de malandragem. Fez da constância sua principal arma, e no fim do campeonato, a pressão em cima de Nigel Mansell fez o inglês sofrer um forte acidente na pista de Suzuka, que o impediu de participar da corrida, e dando o título por antecipação ao brasileiro.
Foi o último ano de Piquet na luta pelo título. Nos dois anos seguintes, transferiu-se para a Lótus, mas o time entrou em crise, e produziu carros pouco competitivos, relegando Piquet ao meio do grid. Na Benetton, em 1990, Piquet voltou a mostrar a velha garra, voltando a vencer, mas ainda sem condições de disputar um título. Em 1991, no que prometia ser uma evolução do ano anterior, revelou-se um retrocesso, e cansado do ambiente da categoria, encerrou sua carreira no fim do ano. No espaço de 11 anos, foram 23 vitórias, 24 poles e 3 títulos. Muitos sentiram a perda de Piquet, mas boa parte dos fãs, que torciam por Senna, não davam a mínima, afinal, Piquet era o passado, Senna era o presente e o futuro da F-1.
Estreando em 1984 por um time médio, a Toleman, Ayrton conseguiu impressionar em várias corridas, e em 1985 já estava na Lótus, um time longe de seus melhores dias, mas com melhores condições de andar na frente. Senna venceu algumas corridas no lendário time fundado por Colin Chapman, mas foi só após mudar para a McLaren que enfim conquistou seus títulos. De 1988 e 1991, apesar de algumas dificuldades pontuais, Ayrton tornou-se o nome de referência na F-1. E, com relativa pouca idade, 31 anos, em seu terceiro título, muitos diziam que ele poderia igualar o feito de Juan Manuel Fangio, com 5 títulos. Mas 1992 foi um massacre da Williams em cima da concorrência, como se prenunciava em 1991. Em 1993, Senna brilhou mais, mas a Williams ainda era muito superior. Ao conseguir finalmente se transferir para o time de Frank, Senna esperava dar seguimento à conquista de novos títulos na categoria, mas a mudança de regras técnicas de 1993 para 1994 deixou a Williams com um carro problemático nas mãos, e Senna, novamente inferiorizado numa disputa, ao ver que a Benetton, com Michael Schumacher, tornara-se o duo a ser batido. O brasileiro em nenhum momento baixou os braços, e mostrava ter condições de reverter sua desvantagem. O destino, porém, tinha outros planos...veio o fatídico GP de San Marino de 94, e o resto todos sabem.
Nunca mais o Brasil conquistaria um título. Faltou piloto, e faltou principalmente carro. Rubens Barrichello e Felipe Massa, os melhores nomes que tivemos na categoria depois de Senna, mostraram que até teriam condições de serem campeões, desde que tivessem carro para isso. Barrichello, porém, esbarrou na falta de sorte de ter Michael Schumacher como colega de equipe em seus anos de Ferrari. Na Brawn GP, viu Jenson Button se dar melhor nas provas onde tinham o melhor carro. Já Massa, em sua única oportunidade de vencer um campeonato, tropeçou nos próprios erros e de seu time. Agora, ao lado de Fernando Alonso na escuderia rossa, suas chances praticamente se esvaíram. Barrichello, por sua vez, arrasta-se com um carro medíocre de um time que já fez história na F-1.
Por essas e outras, ninguém esperava que nosso jejum de títulos na F-1 fosse durar tanto. Já vão 20 anos desde o último título, um tempo que, fosse dito em 1991, de que passaríamos assim sem ver novamente o triunfo de um campeonato de F-1, diriam que estaríamos loucos. A realidade, contudo, nos trouxe um período de “seca” de campeonatos que, lamentavelmente, não tem data para terminar. Inclusive, podemos até nunca mais ganhar um campeonato, dadas as condições atuais do automobilismo nacional, que praticamente morreu para os monopostos.
Em 1981, antes de Piquet conquistar seu primeiro título, já havíamos tido uma “entressafra”, que durara de 1976 a 1979, apenas 4 temporadas, desde as últimas vitórias de Émerson, às primeiras de Piquet. Todos sabiam que era questão de tempo um brasileiro voltar a brilhar, o que não é o caso atual. Verdade que passamos de 1994 a 1999 sem uma única vitória, mas mesmo em 2000, quando Barrichello venceu sua primeira corrida, o clima não era o mesmo, pois a Ferrari já dizia com todas as letras que Barrichello não poderia ansiar pelo título, e às vezes, nem mesmo por vitórias. Felipe Massa teve mais chances, mas em apenas um ano competiu pra valer pelo título. O resto, foram apenas vitórias ocasionais, muito pouco para saciar a sede daqueles que viveram os 10 anos de glória entre 1981 e 1991.
Realmente, dá mesmo saudade daqueles bons dias do Brasil na F-1. E fica a torcida para, pelo menos parcialmente, reviver aqueles dias de glória...
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