quarta-feira, 23 de abril de 2025

ARQUIVO PISTA & BOX – JULHO DE 2000 – 07.07.2000

            E depois de um longo e tenebroso inverno, hora de voltar com uma de minhas antigas colunas, sendo que esta foi publicada no dia 7 de julho de 2000, e o assunto principal era nada menos do que o triunfo de Roberto Moreno no GP de Cleveland, pelo campeonato da F-Indy original, chamada à época de F-CART. O texto faz uma pequena recapitulação dos percalços que o brasileiro sofreu naquela década, e um tributo à sua persistência e capacidade, em que pese seu valor nunca ter sido devidamente reconhecido por muitos ditos “fãs” do automobilismo, para os quais só títulos e campeonatos interessam. De quebra, alguns comentários rápidos a respeito de alguns acontecimentos do mundo da velocidade naquela semana. Uma boa leitura para todos, e apreciem o texto...

 

O DIA DE MORENO

 

            Enfim, chegou a hora. Depois de amargar por tantos anos carros pouco competitivos e equipes ruins, sem contar com a falta de apoio, finalmente a sorte de Roberto Moreno mudou. O piloto brasileiro, conhecido pelo apelido de “Baixo”, venceu a última etapa da F-CART no domingo passado, no circuito de Cleveland, montado na pista do Burke Lakefront Airport, com uma atuação impecável na pista: pole-position, líder pelo maior número de voltas, e vencedor da corrida. Não por acaso, ele perguntou a Pat Patrick, dono de seu time, se a vitória tinha sido do jeito que o patrão mais gostaria.

            Todo o paddock da CART fez festa pela conquista de Moreno. Roberto tem um ótimo conceito entre todos os times da categoria, sendo considerado um piloto muito técnico, experiente e, acima de tudo, talentoso e rápido. Entretanto, até hoje, a vida de Moreno tem sido uma montanha russa com mais baixos do que altos. É um caso de extremo amor ao automobilismo. Já vi inúmeros outros pilotos caducarem com suas carreiras frente a adversidades muito menores do que as que Moreno enfrentou até hoje. Mas a persistência de Roberto um dia teria de trazer recompensas, e agora ele está conseguindo colher o que plantou na CART.

            Contratado pela Patrick Racing para correr pelos próximos 3 anos pela equipe na F-CART, Moreno finalmente pode se concentrar naquilo que mais gosta: competir. Até o ano passado, sem time e sem muita perspectiva, Moreno se limitava a substituir pilotos titulares e pensar quando e onde faria a sua próxima corrida. Uma situação nada agradável para alguém que, na sua idade, muitos já dizem ser a aposentadoria para o automobilismo. Mas Moreno não deu mole para as marés contras. Trabalhando com todo o seu empenho mesmo em condições precárias de contrato, ele deixou sua marca em diversas equipes da CART, como a Penske, a Newmann-Hass e a PacWest, onde demonstrou todas as suas qualidades como acertador de carros e como piloto, coisa muito importante em uma categoria tão equilibrada como a F-CART.

            Os bons trabalhos na Newmann-Hass garantiram a Moreno suporte para correr pela Patrick, com apoio oficial da fábrica para receber a nova versão XF do motor V-8 turbo da fábrica americana, duramente testado pelo brasileiro em testes em 99 pela equipe de Paul Newmann e Carl Hass. Pat Patrick, que já teve um outro piloto brasileiro em sua equipe anos atrás, o campeão Émerson Fittipaldi, apostou em Moreno, e não está arrependido do que fez. O piloto brasileiro praticamente deixou o mexicano Adrian Fernandez na sobra. Apesar de cada um dos pilotos da Patrick ter uma vitória na atual temporada, a regularidade e consistência de Moreno é impressionante, e o “Baixo” poderia estar ainda melhor no campeonato não fossem alguns problemas mecânicos que o afligiram, mas como poderia ser melhor do que já está? Moreno lidera o campeonato com boa folga e tem sua liderança garantida mesmo que não pontue na próxima etapa. Em um momento em que os pilotos jovens são a tendência na categoria, Moreno, do alto de seus 41 anos, está dando uma aula de competência e velocidade pra todo mundo.

            E Moreno ainda diz que sua equipe ainda não está rendendo tudo o que pode. Ainda meio mal acostumado a correr por um esquema sólido e firme, Moreno ainda não pegou totalmente a mão na Patrick, mas já começa a colher os frutos de seu trabalho antes mesmo do que esperava. Se na última etapa, ao assumir a liderança do certame, Moreno foi erguido no ar pelos mecânicos de seu time, desta vez foi todo o pessoal da categoria a festejar a vitória do piloto brasileiro. As trocas de cumprimentos e parabéns após o fim da corrida foram memoráveis, com vários rivais e donos de times pelos quais o brasileiro andou pilotando dando-lhe cumprimentos efusivos pelo show na pista. Uma imagem que Roberto, com certeza, jamais esquecerá.

            Um triunfo pessoal deste batalhador incansável, que nunca conseguiu ter boas chances no automobilismo e, como se diz no jargão técnico, teve de suar a camisa feio para poder ter chances de mostrar o que sabe. As primeiras oportunidades no automobilismo vieram na Lótus, onde não correu nenhuma corrida por ter tomado uma rasteira de Colin Chapman na época. Depois, uma temporada de tirar leite de pedra na F-3000 internacional em 1988, com um carro emprestado da Ralt, o qual ele não poderia sequer bater, pois tinha que devolve-lo no fim do campeonato, que ele acabou vencendo com um esquema mínimo com cada centavo contado, derrotando os times favoritos da categoria (algo como se a Minardi conseguisse derrotar McLaren e Ferrari na F-1). Depois veio um bom trabalho como piloto de testes na Ferrari, desenvolvendo o revolucionário câmbio eletrônica concebido por John Barnard (hoje corriqueiro na F-1), e a entrada na categoria máxima do automobilismo em equipes medíocres, como AGS, Coloni e Eurobrun.

            A sorte veio com sua chamada para substituir Alessandro Naninni na Benetton nas últimas corridas de 1990. Moreno fez uma dobradinha com Nélson Piquet, seu grande amigo, no GP do Japão daquele ano, e ganhou um contrato para disputar toda a temporada de 91 pelo time multicolorido. Tudo ia razoavelmente bem até que Flavio Briatore, que nunca foi fã de Moreno, deu-lhe uma rasteira e contratou a jovem estrela Michael Schumacher para seu lugar no GP da Itália de 91. O episódio até hoje ainda repercute mal na categoria, apesar da ética questionável da F-1, que nunca foi muito santa.

            Depois disso, a vida de Moreno se resumiu a corridas por equipes novamente pouco competitivas, chegando ao fundo do poço na ridícula Andrea Moda, que até hoje é motive de piada na F-1. E sua última oportunidade na categoria foi na extinta equipe Forti Corse, ao lado de Pedro Paulo Diniz. De lá para cá, corridas aqui e ali, sem nada muito fixo, e nos últimos anos correndo por esquemas medianos na F-CART e substituindo pilotos acidentados. A resposta de Moreno para tamanha perseverança em uma carreira que até agora tem se mostrado tão dura e sofrida? Amor. Amor ao automobilismo! Moreno nunca deixou de confiar no seu taco. Com alguns anos de atraso, ele finalmente está mostrando o que realmente vale e, na situação atual, como ele próprio está dizendo, enquanto ele tiver disposição para pilotar, ainda terá muitos anos à frente para mostrar o que sabe. Se, com todas as adversidades que enfrentou, ele nunca esmoreceu, agora que tem todas as chances pelas quais sempre mereceu ter, os adversários que se preparem. Chegou a hora do Baixo descer o pedal do acelerador, e descer com vontade!

 

 

Depois de vencer a corrida no Canadá, Michael Schumacher se complicou com o abandono no GP da França, no último domingo. A Ferrari deu mostras de inferioridade frente ao time prateado e David Coulthard venceu com autoridade a corrida francesa, depois de Michael Schumacher liderar, a duras penas, a maior parte da corrida. O bicampeão alemão acabou ficando a pé com problemas mecânicos, o segundo nas três últimas corridas, e começa a manifestar certa preocupação com o avanço do time inglês, que dá mostras de que não só recuperou o atraso no desenvolvimento de seu carro como já mostra o melhor conjunto de toda a temporada. Muito mal para os planos do time de Maranello, que depois de um início de temporada fulminante em cima da concorrência, começa a ver seus planos de conquistar finalmente um título depois de 21 anos de jejum seriamente ameaçados potencialmente.

 

 

Rubens Barrichello parece ter finalmente encontrado alguma paz na Ferrari. Pontuando pela terceira corrida consecutiva e terminando todas no pódio, o piloto brasileiro começa a mostrar regularidade no campeonato e pelo menos pode se gabar de que não é apenas o seu carro que quebra. Com os dois abandonos de Michael Schumacher até agora, ambos praticamente estão empatados em abandonos por motivos mecânicos: 2 a 2...

 

 

A equipe Prost protagonizou alguns momentos ridículos no GP francês: Jean Alesi e Nick Heidfeld tocaram rodas e acabaram rodando após disputarem um com o outro posições no último bloco dos competidores na prova. Para um país que outrora teve Alain Prost como expoente máximo de seus pilotos e via na Ligier (atual Prost) um motivo de orgulho nacional (ou tentativa disso, a exemplo da Itália com a Ferrari), a situação atual da França com Jean Alesi, e a posição atual da Prost no campeonato, é de se dar pena. Não são apenas os brasileiros a enfrentarem um tremendo jejum de bons momentos na categoria...

 

 

Uma situação curiosa ocorreu na cerimônia do pódio do GP de Cleveland na F-CART. Os organizadores simplesmente perderam a fita com o hino brasileiro. Teoricamente, não deveria haver problemas, já que, com três vitórias brasileiras consecutivas na categoria, todo mundo já deveria estar acostumado a ouvir a letra de cor, mesmo se tratando de português...

 

 

Depois de trocar farpas há algum tempo atrás com Jacques Villeneuve, Michael Schumacher ganhou um novo rival para fazer acusações verbais. David Coulthard fez um gesto obsceno durante a corrida para criticar a atitude pouco esportiva do alemão ao resistir à ultrapassagem do piloto da McLaren. Pelo visto, o bate-boca entre o escocês e o alemão promete ser o principal atrativo da temporada, especialmente agora em que Mika Hakkinen atravessa um período meio insosso na pista, enquanto o piloto escocês parece ter recuperado seu vigor de pilotagem...

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