Tudo já estava pronto no Albert Park para os carros irem à pista, quando enfim saiu a nota oficial do cancelamento da prova que abriria o Mundial de F-1 de 2020. |
De última hora, a
corrida de estréia do Mundial de Fórmula 1 de 2020 acabou cancelada. O motivo é
o surto do coronavírus Covid-19, que segue fazendo estragos mundo afora,
vitimando mais as pessoas pelas consequências das providências que estão sendo
tomadas contra a doença do que por ela propriamente dita. A cada dia, a
histeria e pânico parecem se acentuar. Parece que estamos prestes a sofrer o
apocalypse zumbi da série de TV Walking Dead, tamanha algumas reações que vejo
serem tomadas. E será que todas se justificam, ou estamos diante de muitos
exageros diante da paranoia das pessoas atualmente? Uma pergunta que não tem
uma resposta única, infelizmente.
O mundo do
automobilismo é apenas um entre vários outros eventos esportivos que estão
sendo afetados pelo mundo inteiro. A F-1 ganhou críticas por vir à Austrália
realizar a prova de estréia do campeonato deste ano, mas até poucos dias atrás,
as condições de segurança em relação à doença do coronavírus eram razoáveis.
Dava pra se disputar a prova, tomadas as medidas de proteção necessárias.
Infelizmente, de um momento para o outro, tudo virou de pernas para o ar, dando
a impressão de que estamos diante de algo como a peste negra, e que todos no
Albert Park seriam os próximos candidatos a um funeral coletivo. A atitude do
cancelamento, apesar de ter sido em cima da hora, em tese deve acalmar os mais
afoitos, e tentar trazer um pouco mais de calma, mas os efeitos agora se tornam
um verdadeiro dominó, que deve comprometer boa parte do campeonato, se não todo
ele.
A corrida seguinte
seria no próximo final de semana, no Bahrein, que iria fazer a prova a portas
fechadas, sem ninguém na arquibancada. Podem esquecer esta prova, assim como a
do Vietnã, como foi confirmado hoje. Não haverá corrida até o mês de maio, e
mesmo as provas programadas para este mês, inclusive Mônaco, estão na total
incerteza. Uma previsão aponta que o campeonato poderia começar apenas em
junho, no Azerbaijão, e olhe lá. E, por consequência, as provas da F-2, cuja
maioria do calendário é disputada junto com a F-1, também foram para o vinagre.
A F-E já tinha cancelado a corrida que faria em Roma em abril, e a etapa de
Paris também iria dançar. Jacarta já foi para o brejo, assim como tinha
acontecido com a prova de Sanya, e também a corrida marcada para Seul, na
Coréia do Sul. Então, veio o comunicado da direção da categoria, suspendendo o
seu campeonato pelos próximos dois meses. No caso da F-E, eles ainda têm a
vantagem de ainda poderem usar praticamente todo o segundo semestre para
tentarem realocar as corridas suspensas deste período, e ao menos tentarem
concluir sua competição. A F-1, por outro lado, não tem a mesma facilidade,
devido ao inchaço de seu calendário.
Uma opção, ventilada
no paddock, seria antecipar para este momento as tradicionais férias de meio de
ano da categoria, normalmente realizadas em agosto, e naquele mês, se a
situação se acalmar, alocar as provas que estão sendo prejudicadas agora.
Parece uma opção razoável. Espero que tudo se ajeite até lá, e que ao menos
possamos ter um campeonato minimamente organizado.
A Indycar também daria
a largada em seu certame neste final de semana, e já tem seus problemas. Em São
Petesburgo, na Flórida, onde a prova iria ocorrer, já tinha sido comunicado que
até iria acontecer, mas com portões fechados, e hoje também veio a notícia de
que a etapa foi cancelada. Já se antecipando à confusão, a cidade de Long
Beach, uma das provas mais famosas do calendário, já adiou a corrida para data
ainda a ser definida, não mais ocorrendo em abril, como o planejado. E com a
direção da Indycar também anunciando que a corrida no Alabama e em Austin foram
suspensas, o certame norte-americano agora espera poder dar início às disputas
no mês de maio, com as provas em Indianápolis, em especial a mais importante
delas, as 500 Milhas de Indianápolis. O Mundial de Endurance, que iria disputar
uma prova em Sebring, na Flórida, este mês, acabou cancelada pela decisão de Donald
Trump de barrar praticamente todos os vôos provenientes da Europa, em uma
atitude que irritou muita gente, dada a tempestividade de como a decisão foi
tomada. Com a maior parte de seus integrantes sediada na Europa, o WEC não teve
alternativas a não ser cancelar a prova nos Estados Unidos, e torcer agora para
que ao menos as 24 Horas de Le Mans possam ser disputadas, em junho.
Prova em São Petesburgo abriria a temporada da Indycar, e também foi cancelada de última hora. Etapas de Austin, Alabama, e Long Beach também foram canceladas. |
O IMSA Weather Tech
Sportscar também teria uma etapa em Sebring, e a princípio, iria ocorrer, mas a
direção da categoria também preferiu adiar a corrida para o segundo semestre,
esperando a poeira se assentar, e realizar uma corrida em um clima mais calmo.
A MotoGP, então, está igualmente
enrolada. No Catar, tudo correu bem com as categorias Moto2 e Moto3, que já
estavam no país do Oriente Médio, e escaparam das medidas restritivas impostas
pelo governo do país a quem viesse do exterior, e principalmente, da Itália, ao
contrário da categoria principal. Com a prova da Tailândia adiada
preventivamente por causa do surto, para o segundo semestre, tudo indicava que
a classe rainha do motociclismo daria seu pontapé inicial em Austin, no Texas,
no início de abril. Mas a prova nos Estados Unidos também acabou adiada para o
final do ano, e a corrida na Argentina também acabou de ter o mesmo destino.
Com isso, o início do campeonato, agora, em tese, só será em maio, e isso se
nada mais acontecer até lá. Mas, no ritmo dos atuais acontecimentos, tudo ainda
pode piorar, dadas as reações que estamos vendo sobre a doença pelo mundo
inteiro.
Os estragos econômicos
tem sido feios, mas por enquanto, restringem-se mais ao mercado de ações, onde
“perdas bilionárias” e “nervosismo” dos investidores tem deixado meio mundo em
polvorosa. Mas, desde que considero há muito tempo bolsa de valores como um
lugar onde o que se vê mais é especulação de papéis, com muito poucos a
ganharem quando a bolsa “sobe”, e prejudicando muita gente quando ela “desce”,
diria que boa parte desse pessoal que ganha com sobe e desce de papéis não me
fará perder o sono. Temos que nos preocupar com medidas concretas, e sensatas,
sem histerias, que possam dar alguma tranquilidade às pessoas, que no presente
momento, em sua maioria, parecem ver o fim do mundo pela frente, e ainda não é
para tanto esse pânico.
A MotoGP também teve de cancelar sua prova de estréia da temporada, em Losail. |
Será preciso lembrar
que, aqui no Brasil, temos a crise da dengue, e que isso já dura vários anos? E
esta doença pode ser tão ou até mais letal do que a Covid-19. Não temos uma
vacina, mas temos um tratamento, que costuma funcionar. O mundo aqui no Brasil
não acabou por causa da dengue, como o coronavírus dá a entender que vai fazer.
Fôssemos aplicar à dengue a mesma histeria e paranoia que vem sendo atribuídas
à Covid-19, o Brasil já seria considerado terra “maldita” pelo planeta inteiro.
Temos só este ano mais de 180 mil casos no nosso país, e as contas vem subindo
muito mais do que as do coronavírus em todo o mundo. E, enquanto isso, várias
outras doenças ainda infectam e matam pelo planeta inteiro muito mais pessoas.
De repente, parece que estas outras doenças “sumiram”, uma vez que quase não se
fala mais delas.
Eu ficaria muito mais
preocupado se, em vez da Covid-19, tivéssemos uma epidemia do vírus ebola, que
há algum tempo atrás promoveu inúmeras mortes em países africanos, sendo
extremamente letal, e exigindo providências imediatas e extremamente severas
para ser administrado. Isso sim seria algo que justificaria um pânico como o
que se vê no momento em relação ao coronavírus, que repito, não deve ser
tratado com leviandade, mas também não pode ser encarado como um verdadeiro
pandemônio.
As próprias pessoas
por vezes se esquecem de hábitos simples de higiene e saúde que, se aplicados,
poderiam minimizar e muito a situação. Manter as mãos limpas, e a higiene dos
locais onde se vive, e ter os devidos cuidados no preparo de alimentos e
refeições. Infelizmente, apesar de básicas, muita gente, em muitos países, não
tem condições de ter nem mesmo isso. São flagrantes as imagens de poluição,
sujeira, e por vezes maus hábitos entranhados em vários povos, que perpetuam
condições de pobreza, tanto financeira quanto moral, que uma hora, favorecem o
surgimento de doenças e moléstias que podem acabar fugindo ao controle. Não é
preciso nem ir muito longe, pois aqui mesmo no Brasil, temos cenas degradantes
onde a população, sim ela, em que pese o poder público também ter sua parcela
de culpa, joga lixo e degrada o meio ambiente como se isso nunca fosse gerar
consequências.
A F-E suspendeu seu campeonato pelos próximos dois meses. |
Voltando a citar a
dengue, é uma doença onde todos sabem como podem evitar, ou dificultar sua
proliferação. Mas entra ano, sai ano, e a dengue continua por aqui, e as
pessoas continuam a não tomar os devidos cuidados, que são até simples, mas por
isso mesmo, ainda mais condenáveis por não serem praticados. Há muitas pessoas
conscientes que fazem sua parte, mas infelizmente seus esforços muitas vezes
acabam comprometidos por aquelas que além de nada fazerem, ainda estragam os
esforços daqueles que cumprem com suas obrigações. E pior, sempre acusando o
poder público, como se este fosse o único culpado por tudo o que de ruim
acontece.
Difícil dizer aonde o surto da Covid-19 vai
parar. A Itália fechou literalmente o país inteiro, achando que assim vai se
prevenir. Uma medida talvez radical demais, e sem garantias de que funcione. E
os Estados Unidos, literalmente proibindo todos os vôos vindos da Europa,
revelam que cada nação parece atropelar o bom senso quanto a alguns
procedimentos que poderiam ser adotados para se combater a disseminação, sem
cair no exagero de medidas tão radicais. Mas nada é pior do que aqueles que
disseminam falsas informações a respeito da doença, muitas vezes colaborando de
forma intencional, na mais profunda má fé, para ampliar o caos, a histeria, e o
pânico nas pessoas. E é fácil de ver isso até mesmo aqui no Brasil, onde já vi
algumas pessoas, especialmente com intenções políticas, de se aproveitar da
situação para criarem ainda mais instabilidade e confusão, algo que já temos em
demasia, justamente por patifes que não pensam em nada além de poder, ganância,
e interesses mesquinhos. Pessoas sem nenhuma moral ou sentimento de
solidariedade e cidadania, para ajudar a manter um clima sereno e ordeiro, com
todos trabalhando juntos para minimizar os efeitos negativos que este surto
está causando.
Alguns lugares, preventivamente, suspenderam
suas atividades, procurando colaborar para evitar maiores aglomerações de
pessoas, e tentar conter a disseminação do vírus. Muitos com grande
antecedência, ajudando as pessoas a se programarem para saber o que irá ou não
acontecer por aí. No caso da F-1, uma decisão sobre a prova australiana já
deveria ter sido tomada com mais antecedência, procurando minimizar a situação,
e assim, também evitando receber críticas por manter a realização da corrida,
dando a entender que não se solidarizava com as preocupações a respeito da
doença.
Não seria a primeira
vez que a F-1 atrairia atenções negativas assim. No início desta década, quando
irromperam os protestos da “Primavera Árabe”, foi com custo que a F-1 resolveu
cancelar a prova no Bahrein, na região, que também sofria com os protestos.
Apesar do governo barenita garantindo a segurança, demorou-se um pouco até
descobrir o óbvio: que era melhor ficar sem a corrida naquele ano, a brincar
com os sentimentos do povo que se sentia prejudicado por seus governantes.
Diante do histórica que a categoria máxima do automobilismo costumava
apresentar, foi quase um milagre o cancelamento. Mas a F-1 já tinha sofrido
pressões em plenos anos 1980, por competir na África do Sul, país onde na época
vigorava o odioso regime do Apartheid, que justificava a discriminação da
população negra, maioria no país, por parte da elite minoritária branca, que
governava. Bernie Ecclestone costumava dizer que política e esporte não se
misturavam, mas ao competir em Kyalami, a F-1 na prática era condescendente com
o racismo praticado oficialmente pelo governo. Foram vários anos de pressão,
até que a F-1 competiu pela última vez por lá em 1985. Voltaria lá somente na
década seguinte, quando o regime de discriminação racial havia sido abolido.
Cancelar a prova foi a
melhor opção. Já seria ruim continuar, e ficou pior uma vez que a McLaren, que
teve um de seus funcionários diagnosticado com a Covid-19, optou por não
disputar a corrida. Teríamos então 18 carros na pista. Mas depois que Sebastian
Vettel e Kimi Raikkonen teriam desistido de competir, e já estariam voltando
para a Europa antes que a FIA, FOM, e direção da prova optassem pelo
cancelamento, seriam então 16 carros no grid. Como Lewis Hamilton afirmou, em
tom de desabafo, o “dinheiro fala”, e tudo pareceu ser apenas uma queda de
braço para ver quem dava o primeiro passo para se cancelar oficialmente o GP, e
com isso, ter de arcar com as multas milionárias que isso significa. Ninguém
queria dar o braço a torcer, e principalmente, arcar com este prejuízo. Mas
convenhamos, numa situação como essa, não era muito mais fácil chegarem a um
acordo mútuo, diante dos motivos excepcionais do momento?
A F-1 agora terá que
decidir o que fazer. O mais óbvio era simplesmente cancelar oficialmente as
etapas do Bahrein e Vietnã, o que foi comunicado hoje, e aguardar o desenrolar
dos acontecimentos na Europa, antes de definir como e quando o campeonato irá
de fato começar. Começam as especulações sobre como o campeonato irá ficar,
dependendo dos acontecimentos, mas a verdade é que ninguém tem a mínima certeza
do que fazer neste momento. Algumas pessoas mais pessimistas já falam até em
esquecerem 2020, e se programarem para 2021.
A Stock Car Brasil
também resolveu se mexer, e a corrida de duplas que abriria a temporada de 2020,
dia 29 deste mês, teria proibição de pilotos do exterior participarem, como programado
inicialmente. Mas a proibição se tornou inócua, pois hoje a direção da
categoria anunciou a suspensão da corrida, adiada para o dia 22 de novembro, na
mesma pista onde seria realizada, em Goiânia. É, o ano de 2020 promete ser
mesmo inesquecível... E todo mundo vai fazer questão de detestar isso...
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