Mudanças técnicas nos carros da F-1, que entrariam em vigor em 2021, foram adiadas de comum acordo para 2022, devido à crise da pandemia do coronavírus. |
Para o mundo do
automobilismo, já se começa a perguntar se o ano de 2020 está praticamente
perdido, devendo agora se concentrar em tentar planejar as coisas para 2021.
Exagero ou apenas uma realidade? Um pouco das duas coisas, eu diria. Ainda é um
pouco cedo para tentar achar um panorama seguro do jeito que a situação se
encontra. Cada vez mais países, e até mesmo regiões, estão se fechando em si
mesmas, e corremos o risco de termos o planeta completamente paralisado, onde
isso poderá causar até mais estragos do que a própria doença em si. E o mundo
do automobilismo, no presente momento, não tem certeza alguma do que pode fazer
para tentar normalizar, tão logo seja possível, o ano na área.
Depois de fazer um
papelão na Austrália, a F-1 parece que resolveu mostrar serviço, e tão logo na
sexta resolveu “adiar” as etapas do Bahrein – que seria neste final de semana,
e do Vietnã, jogando o início da temporada para maio, com a volta da Holanda à
competição, já que a China já tinha sua prova adiada antes que tudo ficasse
ainda mais complicado, eis que a direção da categoria “adiou” também as etapas
de Zandvoort e Barcelona, além do que muitos achavam impensável: a prova de
Mônaco está cancelada este ano. Não teremos corrida no Principado, e o
campeonato, na melhor das hipóteses, começará em junho, em Baku, no Azerbaijão,
se não tivermos mais confusão até lá, obviamente.
Outra medida
importante que a categoria tomou, e felizmente houve concordância entre os
times, foi o de postergar para 2022 a introdução do novo regulamento técnico da
categoria máxima do automobilismo. Das novas medidas que seriam implantadas em
2021, ficou apenas o teto e gastos. Nada mais sensato, uma vez que mesmo sem
ter as corridas, os times, procurando preservar seus funcionários, paralisaram
as atividades em suas fábricas tanto quanto possível. Mesmo assim, este já
seria um ano complicado para os setores de engenharia das escuderias, tendo de
se ocupar em desenvolver os carros do atual campeonato, ao mesmo tempo em que
trabalhavam nos novos modelos do ano que vem, já sobre as novas regras. Como já
perdemos praticamente um mês de trabalhos, e a suspensão dos serviços deve
fazer com que o mês de abril também seja um período “morto”, os times teriam de
correr ainda mais nos projetos para se prepararem para 2021. Adiar o novo
regulamento para 2022 resolve boa parte do problema que os times enfrentariam
para se prepararem para o próximo ano.
Isso não diria
respeito somente ao tempo de trabalho disponível no ano, mas também ao aspecto
financeiro. Com as corridas adiadas e/ou canceladas, a F-1 já começa a sofrer
prejuízos, pelo não cumprimento de suas obrigações, com a realização das
provas. E não é uma questão de prejuízo exatamente. Devido à situação atual,
excepcional, todos devem concordar em “socializar” as perdas, ou seja,
promotores de GPs não realizados não pagariam as multas, mas também não
receberiam o que ganhariam com a realização das corridas. E a FOM, e os times,
obviamente, também deixam de receber os valores de patrocínio proporcionais ao
número de corridas não disputadas, ganhando menos dinheiro. E, com menos grana
em caixa, os times, principalmente os menos abastados, não teriam como
desenvolver adequadamente seus projetos para 2021 com as novas regras técnicas.
Manter o regulamento atual por mais um ano simplifica e reduz custos, evitando
que todos tenham de fazer seus novos projetos agora, podendo trabalhar num
ritmo mais calmo, e claro, menos dispendioso. E, por isso mesmo, manter a
adoção do teto orçamentário já para 2021, como planejado, ajudaria os times a
evitarem gastos maiores com os novos projetos.
Resolvido isso, fica o
desafio do que se poderá fazer para o resto do ano. Ross Brawn e o restante do
pessoal do Liberty Media, assim como os times, tentam achar uma solução para
poderem encaixar as corridas no segundo semestre, e a medida mais coerente é
simplesmente antecipar as férias de verão que os times teriam no mês de agosto
agora para março/abril. Com isso, o mês de agosto poderia receber duas ou
talvez três provas, na Europa, obviamente, o que ajudaria a encaixar aí as
etapas da Holanda e da Espanha. E, com algumas mexidas aqui e ali, achar um
espaço na logística de viagens que permitisse encaixar as demais etapas pelo
mundo afora. Continuaria sendo complicado, mas redefinindo completamente as
datas, seria possível encaixar algumas corridas de forma lógica, e que não
demandaria alterações absurdas na enorme operação de logística que a categoria precisa
fazer para viajar para as corridas fora do Velho Continente. Tudo dependerá,
obviamente, de como e quando a situação se normalizará, ou se vai se
estabilizar em algum ponto onde os riscos já sejam mais controláveis.
Junto com estas
mudanças, a F-2 e a F-3 que fariam provas nos mesmos finais de semana da F-1
agora também ficam completamente em suspenso, no aguardo dos acontecimentos, e
nem poderia mesmo ser diferente. E enquanto as corridas não começam, os times,
cada um à sua maneira, mesmo com suas fábricas fechadas parcialmente,
continuarão a trabalhar nos seus carros, com a perspectiva de termos já modelos
bem revisados em junho. Para a Ferrari, o time que mais dúvidas suscitou na
pré-temporada, de que poderia passar o ano sem conseguir confrontar Mercedes e
Red Bull como imaginava fazer, terá uma boa chance de tentar reestudar seu
modelo SF-1000, e achar alguma solução que o torne mais competitivo e com melhores
chances de encarar seus rivais diretos. Resta saber, contudo, se seus rivais
também não irão caprichar no desenvolvimento de seus carros, de forma não
apenas a manter a relação de forças que tivessem, como talvez até aumenta-la,
mas isso é assunto para outra hora.
As 500 Milhas de Indianápolis também podem acabar adiadas, dependendo do avanço do coronavírus nas próximas semanas. |
Enquanto isso, nos
Estados Unidos, a Indycar, que cancelou de última hora a corrida inicial de sua
temporada 2020, já se antecipou e cancelou também as etapas seguintes,
procurando tentar preservar as atividades do mês de maio, com as disputas de
Indianápolis. Long Beach, aliás, que já havia cancelado a corrida da Indycar, a
mais badalada do calendário depois da Indy500, confirmou o cancelamento também
da mesa etapa no certame do IMSA Wheather Tech Sportscar. Enquanto todo mundo
se pergunta se as medidas da Indycar foram suficientes, eis que Roger Penske,
novo dono da categoria, e também do circuito de Indianápolis, já se mostra mais
adiantado, e cogita transferir a Indy500 de sua data tradicional no último
domingo do mês de maio para agosto, tendo montado um grupo de estudo para
avaliar as possibilidades de fazer isso. Com um calendário que termina em
meados de setembro, não seria exatamente um grande problema prorrogar a
competição no segundo semestre. Nos últimos anos, a categoria sempre fez
questão de encerrar sua competição no mês de setembro para fugir da
concorrência esportiva na TV do Campeonato de Futebol Americano, mas com as
partidas da NFL também paradas por causa da Covid-19, é mais do que certo ter
de ignorar este receio, porque quando a situação se normalizar, praticamente
todos os campeonatos voltarão a ser disputados, e ao mesmo tempo.
Uma das provas mais famosas do automobilismo mundial, as 24 Horas de Le Mans foram adiadas de junho para setembro desde ano. |
E neste ponto a FIM e
a Dorna já se mostram um pouco mais flexíveis. O campeonato da MotoGP deveria
começar em abril, nos Estados Unidos, mas tudo acabou adiado para maio, e a
esta altura, até mesmo as provas deste mês ficam na berlinda, à espera dos
acontecimentos sobre o surto da Covid-19. Mas a direção da competição em duas
rodas já adiantou que, se necessário, pode até terminar o campeonato deste ano
em 2021. O fã quer ver corridas, e não importa tanto as datas, e se tem
campeonato que começa em um ano e termina no outro, porque a MotoGP não pode
fazer isso também? Todo mundo sabe que é um momento excepcional, e se isso
garantir a realização do campeonato, tanto faz as datas das corridas.
Enquanto isso, a
organização das 24 Horas de Le Mans preferiu ser mais prudente, e a tradicional
corrida de endurance já não será mais realizada no tradicional mês de junho,
sendo transferida para o mês de setembro, no segundo semestre, quando se espera
que a situação esteja mais normalizada, e tudo possa ser feito com mais calma.
Por enquanto, as 6 Horas de Spa-Francorchamps foram para o vinagre, mas podia
ser bem mais complicado.
Aqui no Brasil, a CBA
também decretou a suspensão dos campeonatos nacionais, em apoio às medidas de
contenção do coronavírus, que começa a fazer vários estragos ainda maiores em
nossa já combalida economia, que se já não ia muito bem das pernas antes,
apesar de alguns indícios de recuperação, agora fica completamente na
incerteza, o que ajuda também a complicar o panorama em nosso esporte, com a
CBF a também decretar a suspensão das partidas de futebol, enquanto a Copa
América também acabou sendo suspensa, entre outros campeonatos esportivos.
Resta agora esperar
para que as medidas sejam realmente eficazes, e se mostrem aplicadas na
proporção adequada, para se evitar que algum exagero, diante da histeria e
paranoia que alguns tendem a espalhar mundo afora, acabem por fazer mais mal do
que bem na luta contra este surto que certamente colocará a humanidade à prova.
Torçamos para que a situação possa se normalizar e estabilizar o quanto antes,
uma vez que os danos econômicos que a paralisia de muitas atividades poderá ser
tão ou mais prejudicial do que a doença propriamente dita. Não se trata de
subestimar a Covid-19, apenas de manter a calma, e não se deixar perder a
cabeça e se entregar ao pânico.
Aos fãs do mundo do
esporte a motor, só resta aguardar. E, se for preciso deixar 2020 para trás, e
já começar a pensar em 2021, que seja... Não é agradável, mas poderia ser
muito, muito pior... E esperamos que realmente não seja, pelo bem de todos...
Com o cancelamento da prova de
Mônaco, este será o 4º campeonato do Mundial de F-1 a não contar com a prova
monegasca em seu calendário de competição. Prova mais charmosa de todo o
campeonato, Mônaco foi uma das etapas que compôs o primeiro campeonato da
categoria, em 1950, mas a corrida no Principado, de frente para o Mar Mediterrâneo,
já existia desde 1929, muito antes da categoria máxima do automobilismo ser
criada, em fins dos anos 1940. A primeira prova, valendo para a F-1, teve
vitória de ninguém menos que Juan Manuel Fangio, com a Alfa Romeo. A corrida
não foi disputada em 1951, mas retornaria em 1952, quando o triunfo acabou nas
mãos de Vittorio Marzotto, com a Ferrari. A corrida voltaria a não ser
realizada em 1953 e 1954, mas em 1955, voltou a ser disputada, e desde então,
nunca mais saiu do calendário da F-1. Mônaco também é o último palco
remanescente dos primórdios da F-1 que ainda conserva o velho charme dos “grand
prix”, que as corridas desfrutavam antigamente. Com a crescente
profissionalização da F-1, imposta a partir dos anos 1980 por Bernie
Ecclestone, as corridas foram perdendo gradativamente aquele glamour de
antigamente, ficando todas com um ambiente muito mais estéril, e sem
personalidade, que infelizmente vigora até hoje. Menos em Mônaco, onde a beleza
do Principado, e as características do GP ainda permitem sentir o clima de
antigamente. Infelizmente, a corrida há muito deixou de ser empolgante, uma vez
que as estreitas ruas do charmoso Principado tornam a pista um verdadeiro
pesadelo para ultrapassagens, e quem larga na frente só perde a corrida se
cometer um erro, mesmo tendo um carro menos rápido. É também em Mônaco que
muitos contratos são firmados, e boa parte dos pilotos reside, pelas
facilidades fiscais que o pequeno país oferece a seus residentes, como não
pagar impostos, sejam cidadãos monegascos ou estrangeiros. Mas é também um
lugar caro, uma vez que os imóveis são altamente valorizados, e um grande
destino turístico, com destaque para o famoso cassino, que atrai endinheirados
do mundo todo. E, como não poderia deixar de ser, tudo fica ainda mais caro na
época do Grande Prêmio, algo que não veremos este ano.
Vencer o Grande Prêmio de Mônaco
sempre foi um grande desafio, e não foram poucos os grandes nomes do
automobilismo que almejaram escrever seu nome mais de uma vez no rol de
vencedores da corrida. Graham Hill, com cinco vitórias, em 1963, 1964, 1965,
1968, e 1969, ganhou o apelido de “Mr. Mônaco” pela façanha. Sua marca só seria
batida muitos anos depois, por Ayrton Senna, que venceu nas ruas do Principado
em 1987, 1988, 1990, 1991, 1992, e 1993, totalizando 6 vitórias, fazendo do
brasileiro o recordista de triunfos e atual “Mr. Mônaco”. Michael Schumacher até
conseguiu igualar as cinco vitórias de Hill, ao vencer em 1994, 1995, 1997,
1999, e 2001. Entre os pilotos da F-1 atual, Lewis Hamilton acumula três
vitórias, em 2008, 2016, e 2019. Sebastian Vettel venceu duas vezes, em 2011 e
2017. Daniel Ricciardo venceu em 2018. Quem também venceu uma prova em Monte
Carlo foi Kimi Raikkonen, tendo triunfado na edição de 2005. Entre os pilotos
brasileiros, apenas Senna venceu em Mônaco.
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