sexta-feira, 18 de outubro de 2019

A ESTRELA BRILHA NOVAMENTE

A Mercedes comemorou em Suzuka o seu 6º título de construtores (acima), e garantiu o título de pilotos, que obviamente deverá ser de Hamilton. Uma jornada de sucesso sem precedentes na história da F-1 que teve início em 2014, com a nova era híbrida turbo da categoria máxima do automobilismo, com a apresentação do time para temporada daquele ano (abaixo).

            Depois de um fim de semana menos convencional que os demais de um Grande Prêmio, devido ao risco da passagem do tufão Hagibis pelo Japão, no mesmo final de semana da corrida em Suzuka, vimos uma decisão na pista nipônica. Preventivamente, a F-1 suspendeu suas atividades no sábado, quando se previa a chegada do fenômeno climático à região de Nagoya, onde Suzuka se encontra, com o treino de classificação remarcado para a manhã de domingo, se tudo corresse bem. Felizmente, a chuva que atingiu Suzuka foi até menor que a esperada, e tudo pode ser retomado no domingo sem sustos, em que pese várias outras áreas do Japão terem tido muitos estragos com o tufão, que mostrou que o temor de sua chegada não era nada exagerado.
            E, numa corrida que teve lá seus bons momentos, eis que mais um título foi decidido em terras nipônicas, como nos seus bons tempos. Mas não o título de pilotos, o mais aguardado e até mais óbvio desta temporada, mas o de construtores. E a Mercedes, com mais uma vitória, e com direito a ter seus dois pilotos no pódio de Suzuka, garantiu sua 6ª taça consecutiva, um recorde na história da F-1.
            A rigor, a equipe alemã igualou o número de conquistas consecutivas de construtores da Ferrari, que entre 1999 e 2004 faturou 6 títulos no Mundial de Construtores, durante o período áureo dos “anos Schumacher”. Mas há um detalhe importante a ser considerado, e que faz do atual período de domínio da Mercedes algo maior: o título de 1999 de pilotos não foi da Ferrari, mas da McLaren, com o finlandês Mika Hakkinen a conquistar o bicampeonato. Em suma, 6 títulos de construtores, e 5 títulos de pilotos. A Mercedes, por sua vez, terá 6 títulos de construtores, e também 6 títulos de pilotos, uma conquista bem mais completa.
            Outro detalhe interessante: entre 1999 e 2004, apenas em duas temporadas a Ferrari fez dobradinha no campeonato, em 2002 e 2004, quando o brasileiro Rubens Barrichello, segundo piloto do time vermelho, foi vice-campeão. A Mercedes fez a dobradinha em 2014, 2015, 2016, e já praticamente garantiu a dobradinha neste ano. Resta apenas liquidar a fatura matematicamente. Com o resultado do GP do Japão, apenas Lewis Hamilton e Valtteri Bottas estão na luta pelo título, mas com 64 pontos de vantagem para o finlandês, a conquista de Lewis é mera questão de tempo, podendo vir semana que vem, na Cidade do México, México, ou em Austin, no Texas, Estados Unidos. Bottas, por sua vez, estava com sua posição no campeonato ameaçada pelo renascimento da Ferrari a partir da etapa da Bélgica, com Charles LeClerc chegando perigosamente no finlandês da Mercedes. Mas o time prateado, com um pouco de sorte, e estratégia, conseguiu virar o jogo na Rússia, e no Japão, e recolocou Bottas como favorito ao vice-campeonato.
            Valtteri tem 53 pontos de vantagem para LeClerc, e mesmo que ainda tenhamos 104 pontos disponíveis, inclusos os pontos extras de melhor volta, o monegasco precisaria de um azar tremendo de Bottas para conseguir alcança-lo na pontuação, e superá-lo. Com Hamilton quase garantido como hexacampeão, a escuderia alemã pode se permitir dar ao finlandês a devida atenção para que ele pudesse vencer a etapa japonesa, e reforçar sua posição na classificação. Hamilton pode até não ter gostado da estratégia que o time lhe reservou, que acabou por deixa-lo em 3º no final da corrida, mas o inglês não pode reclamar, visto que sua vantagem ainda é considerável, e que só um completo desastre lhe tira o título da temporada, que aliás, é seu por muitos méritos.
Competência dentro e fora da pista, como nas estratégias e nos pit stops, são algumas das ferramentas do domínio da Mercedes nestas seis temporadas.
            Mas de nada valeria tudo isso se Bottas não tivesse cumprido seu papel à perfeição em Suzuka. O finlandês ganhou de presente a largada falhada de Sebastian Vettel, o pole-position, e não desperdiçou a oportunidade, fazendo um excelente arranque que o levou para a liderança já na primeira curva, de onde só se ausentou em determinados momentos da corrida pela estratégia traçada pelo time. E, enquanto esteve na pista, Valtteri imprimiu um ritmo forte, para lhe garantir merecer a vitória na prova japonesa, em uma performance que ele ficou a dever em outros momentos no ano. Com contrato renovado para 2020, e com sua performance posta em questão depois que o time liberou Esteban Ocón para a Renault no próximo ano, Bottas tinha de fazer por merecer continuar no time prateado, onde chegou com muitas expectativas de reprisar o papel desempenhado por Nico Rosberg, de ser um parceiro, mas também um rival à altura de Lewis Hamilton, em um clima mais cordial.
            Infelizmente, Bottas não manteve essa expectativa em tempo integral, decepcionando um pouco quando se esperava que representasse um desafio para Hamilton. Tanto é que isso permitiu que a Ferrari surgisse como ameaça nos últimos dois anos, com Sebastian Vettel a conquistar o vice-campeonato, sem desmerecer a performance renovada dos carros vermelhos, que chegaram a ameaçar a hegemonia prateada, mas só não concluíram sua ameaça por azares, alheios e próprios, e incompetência em momentos cruciais.
            E é nesse ponto, a competência, que a Mercedes tem se destacado. Por mais que afirmem que, quando da introdução do novo regulamento técnico das unidades de potência híbridas em 2014 ter favorecido os alemães, que já se encontravam adiantados no desenvolvimento de sua unidade motriz, o regulamento tem sido basicamente o mesmo desde então, com os concorrentes a terem tido suas chances de desafiar o domínio dos carros prateados. A Renault, desde a introdução da nova tecnologia, tem patinado desde então, alternando alguns momentos de altos e baixos; já a Honda, em seu retorno em 2015, foi um desastre completo, que só agora está começando a colher resultados mais animadores. Mesmo assim, as duas marcas ainda estão bem atrás para declararem que são desafiantes das unidades produzidas pela Mercedes.
            A Ferrari, por outro lado, também começou mal, em 2014, mas soube começar a evoluir em 2015. Mas foi só em 2017, com a liberação do desenvolvimento sem as amarras das “fichas” implantadas de 2014 a 2016, que os italianos começaram a balançar o poderio dos alemães. A unidade híbrida da Mercedes, inigualável entre 2014 e 2016, hoje tem uma rival não apenas à altura na da Ferrari, como está até um pouco atrás, no que tange à potência bruta total, haja visto a velocidade de reta proporcionada aos carros vermelhos, em que pese sua configuração aerodinâmica voltada para esta área.
Niki Lauda (acima, ao lado de Toto Wolf, o chefe da escuderia Mercedes) foi lembrado por Lewis Hamilton por sua ausência no time, depois de colaborar para o sucesso do time, ainda que de forma simbólica, nestes últimos anos.
            Muito se falava que o domínio da Mercedes era unicamente devido ao motor, tanto que em 2014 e 2015, mesmo com um carro que muitos podem considerar mediano, a Williams foi 3ª colocada no Mundial de Construtores. Em parte, isso até tinha sua razão de ser, mas a partir do momento em que o time alemão começou a ser acossado pelos ferraristas de forma efetivamente séria, vimos que o sucesso do domínio prateado é muito mais do que apenas uma excelente unidade de potência: eles também possuem um chassi e um projeto de bólido extremamente competente e bem desenvolvido, e acima de tudo, tem mantido o time e seu ambiente interno sob controle, e sem cometerem deslizes. E, mais importante do que tudo, eles conseguem manter as áreas e profissionais do time rendendo o seu máximo, e conjugar seus esforços para obterem sempre a máxima eficiência. Tudo isso sob o comando de Toto Wolf, que tem conseguido manter o foco e a excelência do time em alta. E, por mais que possam afirmar que Niki Lauda era uma figura mais decorativa do que efetiva em Brackley, o ex-piloto austríaco também teve papel importante na montagem e condução desta máquina de competição que tem conseguido se manter perfeitamente azeitada até agora. Tanto é que este novo título de construtores, para Lewis Hamilton, é dedicado a Lauda, falecido há alguns meses, e cuja ausência tem sido sentida no ambiente do time.
            Não se trata apenas de garantir os recursos para se obter o melhor, é conseguir que seus integrantes possam alcançar esse “melhor”, sentindo-se em harmonia e sintonia com o restante da escuderia, de modo a maximizar seus potenciais. Ou alguém aí lembra de Paddy Lowe, que deixou o time, por desejar ter mais destaque e importância na escuderia, e foi para a Williams, no que resultou? Lowe não apenas não conseguiu reerguer o time de Grove, como nesta temporada, o desempenho do time decaiu ainda mais, sem que Paddy conseguisse mostrar em seu novo time a mesma competência e sinergia que conseguia produzir na Mercedes. E, em exemplo inverso, podemos citar James Allison, que saiu desacreditado da Ferrari, ou pelo menos, não valorizado, para ir para Brackley, e ter sido mais um nome a reforçar com extrema competência o setor técnico da escuderia desde então? Conseguir manter um ambiente onde seus funcionários consigam produzir o melhor, e se sintam mais do que motivados a manter este alto padrão é um dos grandes méritos da Mercedes neste seu período de domínio na F-1.
            Em contrapartida, a Ferrari tem nos mostrado o quanto isso é verdadeiro: desde 2017, tendo conseguido competir no mesmo nível, e até melhor do que a Mercedes, em vários momentos, o time italiano perdeu várias oportunidades por não conseguir apresentar esse mesmo nível de sinergia dentro e fora da pista com a mesma eficácia. O time italiano, aliás, chegou a menosprezar a escuderia alemã, quando afirmou que, muito acostumados a ganhar, os alemães perderiam o controle quando se vissem em situação inferior. E o que aconteceu foi justamente o contrário: a equipe de Brackley manteve-se calma e com a cabeça no lugar, enquanto a turma de Maranello começou a bater cabeça, dentro e fora da pista. E na pista, Lewis Hamilton tem se mantido focado e extremamente eficiente. Tanto que, mesmo nos momentos em tese mais difíceis, quando a Ferrari parecia imbatível, não vimos o inglês fazendo barbeiragens para tentar diminuir a desvantagem a qualquer custo. Lewis tem tido uma pilotagem firme, segura, e arriscando quando é necessário. Parece ter uma visão muito maior do campeonato em si. Sabe que a Mercedes, mesmo quando é superada, ainda é competitiva, e por isso, sabe que há os momentos onde se deve guiar com a cabeça mais do que com coração.
Pelo terceiro ano consecutivo a Ferrari ameaçou destronar a Mercedes na F-1, mas novamente se perdeu em erros próprios e azares, além da falta de competência para capitalizar seu potencial de competição.
            E, na reta final da temporada de 2019, vimos novamente a Ferrari a desperdiçar suas oportunidades. Primeiro a tentar entender o seu carro como deveria, tendo sido surpreendidos pela eficiência da rival Mercedes na primeira metade do campeonato. E segundo, ter que aprender a gerenciar melhor seus pilotos, algo que o time italiano faria muito melhor se perdesse alguns hábitos ruins de querer controlar tudo o que acontece na pista. O resultado é que, com dois pilotos muito rápidos, ainda que Sebastian Vettel tenha tido mais dificuldades com o carro do que Charles LeClerc, ambos poderiam ter tido resultados muito melhores se o time não ficasse interferindo com sua política de primeiro e segundo piloto: desse a ambos tratamento igual, e os deixasse competir de forma mais livre, talvez até ainda tivessem alguma chance de lutar pelo título, agora que conseguiram acertar o rumo do desempenho de seu carro. A Mercedes aproveitou seu melhor momento, e disparou na frente, e se Bottas não está mais próximo de Hamilton nos pontos, o finlandês teve parte de culpa nisso, pois muito menos o time complicou sua corrida do que a Ferrari acabou fazendo com seus dois pilotos.
            Fica a expectativa se a Mercedes manterá este domínio no próximo ano. Eles já começaram a trabalhar com grande antecedência no projeto do novo carro, o que explicou uma certa “estagnada” do carro atual, tido como uma das explicações para terem sido superados pela Ferrari desde a Bélgica. Mas isso não significa que os prateados deixaram de ser competitivos. Nos testes da pré-temporada, quando todo mundo imaginava que a Ferrari viria mais forte do que nunca, o que vimos foi a Mercedes novamente se mostrar mais eficiente e competente. Que fique a lição para os ferraristas tentarem de novo em 2020, sem caírem nos mesmos erros deste ano. O que não significa que o desafio será mais fácil.
            A estrela da Mercedes brilhou intensamente quando de sua primeira participação na F-1 nos anos 1950. E depois de retornarem oficialmente como time completo, em 2010, foi um caminho de construção da estrutura que permitiu, a partir de 2014, exibir o domínio que muitos consideram extremamente prejudicial para a competição da F-1. A preocupação não é irrelevante, mas seria muito menor, se os concorrentes conseguissem exibir o mesmo grau de eficiência que o time prateado tem demonstrado nos últimos anos. A estrela da Mercedes brilha por vários méritos, e tem tudo para continuar brilhando intensamente por um longo tempo. Cabe aos concorrentes mostrarem que podem ser tão bons quanto os alemães. As chances eles possuem, e condições também, como vimos a Ferrari demonstrar. Que consigam aproveitar isso, e superar quem parece insuperável.
            Uma conquista que certamente será mais do que reconhecida, caso se concretize. Mas enquanto isso não se torna realidade, todos tem que se acostumar a serem eclipsados pela estrela Mercedes, e ela brilha como nunca! Parabéns, Mercedes, por mais um título de construtores, e outro de pilotos que logo logo se definirá. E que venha 2020...


A MotoGP chega ao Japão com o título já decidido a favor de Marc Márquez, que faturou o hexacampeonato na etapa anterior, na Tailândia. Mas nem por isso as comemorações da Honda, que inclusive é dona do complexo de Twing Ring Motegi, onde será realizada a corrida, serão menores. Foi neste circuito, aliás, que o espanhol faturou o título do ano passado, então para os japoneses o clima de triunfo será mais do que justificado. E Márquez faz história, com 6 títulos averbados em 7 temporadas na classe rainha do motociclismo, e todos eles conquistados defendendo o time oficial da Honda na MotoGP. Os treinos e a corrida terão transmissão ao vivo no canal pago SporTV3.


Apesar dos percalços causados pelo tufão Hagibis, cerca de 90 mil torcedores encheram as arquibancadas de Suzuka no domingo do GP do Japão de F-1. A categoria chegou a desmontar parte da estrutura da corrida para evitar que sofressem estragos na passagem da tormenta no sábado, remontando-a completamente no domingo de manhã, que amanheceu com sol e tempo bom. Mas se a área de Suzuka escapou de sofrer muitos estragos, muitos outros locais, especialmente ao norte, e próximos a Tóquio, sofreram com o forte tufão. Melhor prevenir do que remediar, e se tem um país que não costuma brincar com isso é justamente o Japão. Não se pode menosprezar as forças da natureza, e os nipônicos, que também convivem com terremotos em seu país, sabem disso melhor do que ninguém.

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