O grid da Fórmula 1
está fechado para 2018. A Williams, única escuderia que ainda não havia
definido seu segundo piloto, comunicou que o russo Sergey Sirotkin será o
companheiro do canadense Lance Stroll na temporada deste ano. Robert Kubica,
que até então era dado como certo na posição, acabou “rebaixado” a piloto de
testes e desenvolvimento da escuderia. O motivo, em boa parte, seria o
patrocínio maior trazido pelo piloto russo, em detrimento da verba oferecida
pelo polonês. Foi o que bastou para meio mundo e mais um pouco crucificarem o
time de Grove, condenando-o pela escolha mais financeira do que técnica de sua
dupla de pilotos.
Há alguns motivos
plausíveis justificando a escolha da Williams, da mesma forma que se pode
também criticar a posição do time britânico na definição de sua dupla de
pilotos. Um motivo a se criticar é o fato da dupla ser muito jovem, e em um ano
onde o time aposta em um projeto completamente novo de seu carro, um nome mais
experiente para capitanear o time na pista seria mais adequado. Sirotkin fará
sua primeira temporada, e Stroll, apesar de ter demonstrado certa evolução
durante sua temporada de estréia, não tem ainda o estofo necessário para
comandar o time nas corridas e efetuar o desenvolvimento do bólido junto aos
engenheiros da equipe. No campo financeiro, todo mundo sabe que a Williams
quase se vendeu ao pai de Lance Stroll, que está bancando a carreira financeira
do filho, que não é exatamente um barbeiro, mas até o presente momento, não é
de empolgar, em que pese ter tido um currículo respeitável até chegar à F-1. O
canadense parte para o seu segundo ano ainda precisando “apagar” a pecha de
“pagante”, que virou sinônimo de piloto que só fica na F-1 enquanto rolar grana
de patrocínio, uma fama que pode ser até exagerada de crítica aos pilotos
“pagantes”, que sempre existiram na F-1 desde sempre, mas que continua a ser
motivo de intolerância para muitos torcedores, para os quais estes pilotos
estão roubando vagas de pilotos verdadeiramente talentosos, mas que por não
terem patrocínio, estão fadados a não ter chance em suas carreiras no
automobilismo, uma vez que os times não lhes dão chances.
Um modo de atenuar
estas críticas, já que os times não podem prescindir de reforços financeiros, é
pelo menos contar com um piloto “pago” ao lado de um “pagante”, tentando
equilibrar suas necessidades. Mas, o que pegou mal para a Williams é que é um
time com um patrocínio forte (leia-se Martini), e que já tinha um piloto pagante
(Stroll), reduzir-se a time de pilotos pagantes integrais, com a contratação de
Sirotkin pela verba maior que trouxe em relação a Kubica. E alguém parece
esquecer que o polonês também estaria trazendo dinheiro, o que o tornava também
um pagante, menos do que Sirotkin, mas também um pagante. Mas Kubica contava
com a simpatia dos torcedores, em virtude do drama que ele viveu no início
desta década, quando sofreu um forte acidente em uma prova de rali, e por pouco
não morreu, sofrendo sequelas em um dos braços que na época inviabilizaram sua
permanência na F-1, onde era tido como um campeão em potencial. Pagante ou não,
o retorno de Kubica seria visto mais como a superação de um grande talento, que
voltava à F-1, do que pelo aspecto financeiro propriamente. Sergey não conta
com essa simpatia, portanto, a chuva de críticas pela sua escolha no lugar de
Robert.
Isso explicaria também
parte das críticas que torcedores brasileiros fazem ao time, já que o russo
entrou no lugar de Felipe Massa, que tinha desejo de permanecer na competição,
e ajudar o time a voltar a evoluir no novo projeto do carro. Mas, como a
Williams simplesmente o dispensou sem maiores cerimônias, repetindo o que
fizera em 2016, não há porque demonstrar simpatia à escuderia depois deste tipo
de atitude. Por considerarem Kubica um piloto que merecia a chance de retornar,
devido ao seu drama pessoal, e pela torcida também o considerar um talento até
maior do que Felipe, a rejeição a seu nome seria menor... Mas, um nome
“desconhecido” e sem grandes feitos nas categorias de acesso não seria
exatamente engolido sem chiadeira. Daí, não ser novidade vários comentários na
net afirmando que o time “merece” andar para trás ou ter a pior temporada de
sua história, etc... E isso levando em conta o fato de muitos brasileiros
descerem a lenha em Massa, considerando-o um “fracassado” por não ter sido
campeão na F-1...
Felipe Massa acabou dispensado duas vezes pela Williams, em 2016, e em 2017. |
Até mesmo no que tange
à condição financeira, a equipe do velho Frank não escapa do linchamento:
contando com um forte patrocinador como a Martini, a escuderia deveria se
empenhar em conseguir mais patrocínios, sem apelar para pilotos “pagantes”.
Certo, o orçamento da Williams, mesmo assim, não chega perto de times como
Mercedes, Ferrari, Red Bull ou McLaren, mas isso também não ajuda na
comparação, quando se lembra que a Force India teve um orçamento bem menor do
que a Williams, e andou muito melhor, o que depõe contra a competência do time
de Grove, não apenas em termos técnicos, mas também financeiros, insinuando que
o time não sabe aproveitar o que tem. Não dá para discordar dessa crítica: em
2014, tendo feito uma reestruturação, a Williams renasceu na competição,
terminando o ano como o melhor carro depois da dominadora Mercedes, e ficando
em 3º lugar no campeonato de construtores. Tudo indicava que a escuderia
poderia voltar ao rol das protagonistas, mesmo com o domínio do time alemão
sediado em Brackley, mas o que se viu foi a Williams se acomodar, e ir
despencando novamente ano a ano, culminando em 2017 por mal conseguir pontuar
em algumas corridas, perdendo boa parte de sua credibilidade junto à torcida,
por se mostrar conservadora demais, e não saber evoluir como se deveria frente
aos concorrentes. Neste ponto, as críticas ao modo como o time se comportou nos
últimos anos, cometendo erros no desenvolvimento do carro, nas estratégias de
corrida, e no modo como se relacionou com seus pilotos, são muito válidas
mesmo. O resultado foi que as premiações da FOM foram despencando, junto com a
posição da equipe no Mundial de Construtores. E agora, quando precisava em tese
ser um pouco conservadora para manter o parâmetro de desenvolvimento de seu
carro, a escuderia terá uma dupla de pilotos ainda ”verdes”? Tenha dó. O único
elogio seria pelo fato de o time finalmente tentar arriscar mais, já que
escolheu um nome novo que, em tese, pelos testes realizados, demonstra
potencial para fazer um bom trabalho, que é o caso de Sirotkin. Mas, mesmo esse
ponto teoricamente positivo parece não empolgar muito.
Mas o time inglês se
redime parcialmente pelo fato de manter Kubica como terceiro piloto, onde se
ocupará de alguns testes e fará as sessões no simulador. Se nem Stroll nem
Sirotkin tem a finesse exigida para ajudar a desenvolver o carro como se
necessitará, Kubica irá assumir essa função, auxiliando os engenheiros com sua
experiência e conhecimento, que podem estar um pouco enferrujados, mas não a
ponto de torna-lo menos útil do que os pilotos titulares. Kubica deverá
participar dos testes da pré-temporada, e também de alguns treinos livres
durante a temporada, e se necessário, correr em algum GP, se algo inesperado
ocorrer com um dos titulares, ou se o time precisar lhes dar algum puxão de
orelhas. Assim, o recado seria de que, caso não se empenhem na pista, Kubica
estará a postos para substituir quem estiver fazendo corpo mole. E também um
recado para se manterem longe de encrencas, evitando assim desperdiçarem
oportunidades de trazer bons resultados à escuderia.
Claro que, nas
declarações oficiais, a Williams afirma que o russo tem todas as condições para
brilhar em Grove. E nem seria diferente: por mais óbvia que uma contratação
seja, sempre afirmarão que a decisão foi “técnica” e levando em conta o
“potencial talentoso” do piloto. É cedo, claro, para afirmar que Sergey será um
fiasco. O russo precisará mostrar a que veio, e terá a dura tarefa de encarar
um noviciado na competição, mesmo já tendo tido algumas experiências em algumas
escuderias, embora nunca como um piloto titular, onde as cobranças e pressões
serão infinitamente maiores. Se ele vai brilhar ou se meter em confusões,
dependerá apenas dele e das situações que surgirão. A jogada da Williams,
críticas à parte, pode dar certo, mas o time também precisará cumprir a sua
parte, e lhes entregar um bólido que apresente potencial de desenvolvimento
efetivo, o que não foi visto nas últimas temporadas, onde a escuderia até
parecia iniciar com boas perspectivas, mas depois só ia ficando para trás,
enquanto os concorrentes avançavam a passos largos. E, com a performance
despencando, certamente surgirão cobranças pela queda de rendimento, que
precisarão ser endereçadas corretamente a seus responsáveis, e não a bodes
expiatórios. Sergey parece estar ciente disso, e é bom que se prepare para, na
pior das hipóteses, enfrentar momentos bem adversos, ou do contrário, poderá
ser rifado antes do que se imagina, uma vez que o histórico de respeito da
Williams por seus pilotos não é dos mais elogiáveis...
Robert Kubica bem que tentou voltar à F-1 como piloto titular, mas terá de se contentar em ser reserva da Williams. |
Mas, no cômputo dos
testes realizados pelo time, o russo saiu-se bem o suficiente para acabar
deixando a opção por Kubica em dúvida. Afinal, o polonês já havia testado
também pela Renault, que acabou preferindo o espanhol Carlos Sainz Jr., sinal
de que Kubica ainda dá para o gasto, mas o time queria mais do que ele poderia
oferecer. E isso também se aplica à Williams, uma vez que o russo é jovem, e se
for uma surpresa positiva, pode ficar no time um bom tempo, o que não seria o
caso de Robert, cujo prazo de validade, pela idade, seria teoricamente menor.
A Williams terá um
desafio complicado este ano: precisará superar a descrença gerada pela sua
dupla de pilotos, e mostrar que reencontrou o rumo da evolução, para voltar a
disputar posições na frente das corridas. O resultado de 2017 é catastrófico se
levarmos em conta que a escuderia teve um grande reforço de orçamento, provindo
não apenas do patrocínio do pai de Lance Stroll, como também da negociação do
time para liberar Valtteri Bottas para a Mercedes, que se traduziu literalmente
no grande alívio do pagamento do fornecimento dos motores Mercedes, ainda os
melhores propulsores do grid da F-1, e justamente por isso, não ter conseguido
dar um desenvolvimento razoável ao seu carro, cuja competitividade esgotou-se
mais rápido do que todos imaginavam, mesmo dispondo do motor Mercedes, a ponto
de nas últimas corridas, Massa estar disputando posição na pista com Fernando
Alonso, da McLaren, apesar do motor claudicante da Honda que ele utilizava. O
time inglês precisa dar uma resposta cabal a seus críticos para justificar suas
escolhas, e mostrar que realmente quer voltar a ser protagonista, e não apenas
figurante na F-1, e uma escuderia de meros pilotos “pagantes”, por mais
talentosos que estes sejam. O sentido pejorativo do termo, mesmo que seja
equivocado, e não corresponda à realidade, ainda é muito forte, e certamente
não ajudará a superar tão facilmente mais um ano de resultados fracos, muito
pelo contrário...
Outro motivo para a Williams
tratar de acertar o rumo em 2018 é o crescimento da concorrência. A Renault vem
com uma dupla forte, Nico Hulkenberg e Carlos Sainz Jr., e a fábrica francesa
está investindo pesado tanto na sua divisão de desenvolvimento de unidades de
potência, a ponto de encerrar “oficialmente” sua participação na F-E (que
ficará a cargo de sua subsidiária Nissan), quanto na estrutura da fábrica em
Enstone, Inglaterra, e sua escuderia deverá crescer de performance
significativamente este ano. E quem promete vir atropelando também, e tem tudo
para fazer da Williams uma de suas vítimas é a McLaren, agora em sua nova
parceria justamente com a Renault, que se não é ainda um propulsor tão forte
quanto o Mercedes, é muito melhor do que a Honda, que no ano passado marcou
mais um ano de frustrações, vendo sua parceria com o time de Woking encerrada
por motivos mais do que óbvios. Se a Force India tiver mais um ano competente,
como as duas últimas temporadas, eles deverão ser adversários já complicados de
serem superados pelo pessoal de Grove. Então, numa perspectiva não muito
animadora, a equipe de Frank Williams poderia despencar da 5ª para a 7ª posição
no campeonato. Interessante, não? Mas duvido que o pessoal de Grove vá achar a
mesma coisa. Portanto, é bom que a Williams reaja em todos os setores, não
apenas produzindo um carro mais competitivo, como acertando suas estratégias de
corrida, e sobretudo, que sua dupla de pilotos esteja pronta para cair matando
de pau em cima dos rivais na pista, e não sendo saco de pancadas... Caso
contrário, há quem aposte até que a Hass, a Sauber, em parceria com a Alfa
Romeo, e até a Toro Rosso impulsionada pela Honda, possam complicar a situação
do time. Exagero? Bom, se formos levar em conta que nos últimos anos, a
Williams sempre se apresentou promissora, e foi despencando cada vez mais
rápido ao longo do ano, quem pode me acusar de aparentar certo ceticismo e até
descrédito...? O que salva é a expectativa do que a reestruturação na área
técnica, promovida ao longo do ano passado por Paddy Lowe, ex-Mercedes, pode
fazer para impulsionar a performance da escuderia, com novos profissionais
vindos de outros times onde atuavam com comprovada eficiência. Vamos ver se
conseguirão mostrar em Grove o mesmo que conseguiram em suas antigas equipes...
O time da Williams certamente
deixou de contar com a simpatia dos torcedores brasileiros nos últimos anos.
Escuderia pela qual Nélson Piquet foi tricampeão na F-1, o time acabou sendo o
canto do cisne de vários pilotos brasileiros na categoria máxima do
automobilismo, dispensando-os sem a menor cerimônia, e por vezes sem o menor
respeito devido pelo profissionalismo com que eles se empenharam para dar à
escuderia os melhores resultados possíveis. Nesta lista, contamos com Antonio
Pizzonia, Rubens Barrichello, Bruno Senna, e agora, Felipe Massa, que chegou a
ser dispensado duas vezes, praticamente. Então, não é difícil entender a
malhação de judas que o time sofrerá por aqui...
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