O que muitos nem
imaginavam no fim do campeonato do ano passado aconteceu: Felipe Massa
praticamente “aposentou” sua aposentadoria, e pelo menos por mais uma
temporada, irá estar presente no grid da F-1. O abandono repentino de Nico
Rosberg deixou a Mercedes numa saia justa, onde o time alemão precisou ver suas
possibilidades para achar um substituto ideal para o atual campeão da categoria
máxima do automobilismo, que deu por encerrada, pelo menos até segunda ordem,
sua carreira de piloto profissional.
E Vallteri Bottas foi
o grande sortudo da vez. O piloto finlandês, que era agenciado justamente por
Toto Wolf, hoje o chefe da Mercedes na F-1, sempre foi visto como um talento em
potencial, e era uma das possibilidades. Até a Mercedes dar seus indícios de
que ficaria com o finlandês, o que exigiu uma negociação com muito jogo de
cintura com a Williams, falou-se de um monte de candidatos possíveis a ser o
parceiro de Lewis Hamilton na temporada deste ano. Até a própria escuderia
alemã alimentou a gozação que surgiu sobre o assunto, mas quando a coisa ficou
séria mesma, Bottas foi quem ganhou o maior prêmio da carreira: terá enfim um
carro vencedor neste ano, e poderá confirmar tudo o que sempre se disse sobre sua
capacidade. Ou talvez não?
Valtteri terá pela
frente um osso duríssimo de roer, que é Hamilton, talvez o piloto mais veloz do
grid atual da F-1. Depois de perder o título de 2016 para Rosberg, Lewis deverá
vir com tudo nesta temporada, e se o novo modelo W08 for tão bom quanto os
projetos anteriores de Brackley nas últimas 3 temporadas, vai lutar pelo tetra
com unhas e dentes. Bottas é talentoso, sem dúvida: em 2014, no ano em que a
Williams terminou a temporada como segunda força do grid, o finlandês terminou
o campeonato em 4° lugar, e em 2015, era seriamente considerado pela Ferrari,
até o time italiano resolver dar uma nova chance a Kimi Raikkonen. No ano
passado, com a queda de rendimento do time de Frank Williams, Bottas também
decaiu em seus resultados, restando-lhe somente continuar no time inglês, na
esperança de que a escuderia produzisse um bom carro que lhe permitisse ficar
novamente em evidência.
Bottas vai incomodar
ou ficará à sombra de Hamilton? Pelo sim, pelo não, a própria Mercedes já lhe
dá a deixa: o contrato é de apenas um ano, e se ele quiser ser considerado para
2018, vai ter de andar como nunca andou antes. Caso contrário, a bênção de ir
para o time alemão pode virar um tremendo mico para a próxima temporada,
dependendo do que ocorrer até lá. Se não realizar um bom trabalho, o que muitos
acham difícil, poderá ter que procurar novos ares em outros times, talvez menos
agradáveis e de menor expressão. Não se pode esquecer do exemplo de
Heinz-Harald Frentzen, que em 1997 foi piloto da Williams, substituindo o
demitido Damon Hill, campeão da temporada anterior. Visto como um talento maior
até do que Michael Schumacher quando correram juntos no Mundial de
Esporte-Protótipos, Frentzen acabou sendo uma decepção, e perdeu talvez sua
melhor chance de firmar-se como piloto de ponta. Bottas precisa evitar cair em
armadilha semelhante. Talento para isso ele tem. Veremos se conseguirá
impressionar a direção da Mercedes, a fim de garantir o seu amanhã em 2018.
Quanto a Felipe Massa,
consta que o brasileiro pretendia tirar umas longas férias, mas que já teria
acertado um contrato para defender a Jaguar no campeonato da F-E a partir da
próxima temporada da categoria, que deve começar somente em novembro. Pego de
surpresa pela aposentadoria de Nico Rosberg, o interesse da Mercedes por Bottas
levou a Williams a ter de procurar rápido um substituto. Pressionada pelo seu
principal patrocinador, a Martini, que é uma marca de bebida alcóolica, por não
poder capitalizar com a imagem do outro piloto do time, o novato canadense
Lance Stroll, por este ter apenas 18 anos recém-completados, o time inglês
precisou se mexer rápido, na busca por um piloto experiente e bom para o time. Mas
quem melhor do que Felipe, que mal havia saído do time? As vantagens do brasileiro
eram óbvias: Massa estava livre, ainda em forma, e possui conhecimento da
estrutura do time, do corpo técnico, e de como os carros foram concebidos nas
últimas temporadas, além de contar com a simpatia dos engenheiros e mecânicos.
Massa ainda nem tinha
curtido direito o gosto da aposentadoria, quando recebeu o comunicado de Claire
Williams para voltar ao time. Sem perspectivas de obter um carro competitivo
para 2017, Felipe preferiu se aposentar do que batalhar por um lugar onde faria
mera figuração. Ganhou um prêmio também, e terá mais uma temporada para mostrar
o que sabe. Talvez até mais do que isso. O acordo, que prevê um salário de
cerca de 6 milhões de euros, é por apenas uma temporada, mas se a Williams
conseguir acertar no novo FW39, com o novo regulamento técnico que se inicia
nesta temporada, quem sabe Massa não se empolga e decide continuar em 2018, se
enxergar boas possibilidades de competição no time inglês? Talvez seja
precipitado afirmar isso, mas é uma possibilidade que não se pode descartar
totalmente. O brasileiro ainda tem lenha para queimar, e como será o líder do
time em 2017, em tese tem tudo para ficar realmente motivado a dar o seu melhor
neste ano a mais nas pistas, e quem sabe, como falo acima, ficar até mais, se
sentir-se prestigiado realmente no time, e ver potencial no projeto em que está
trabalhando. De certo modo, faltou um pouco disso no ano passado
No último ano, Felipe
sentiu que suas opiniões não estavam sendo devidamente levadas em conta em
Grove, especialmente na área técnica, que ele defendia que precisava ser
reforçada, e sobre aspectos do carro que ele via que o potencial já havia se
esgotado. Sua aceitação para voltar ao time certamente incluiu ser mais ouvido
tanto pelo grupo de projetos, como pela direção da escuderia. E a Williams terá
de ouvi-lo: com as novas regras técnicas, e um piloto novato de 18 anos, caberá
a Massa dar o feedback necessário para os engenheiros desenvolverem o FW39,
tarefa ainda muito arriscada para ser confiada a Stroll. Portanto, em que pesem
os prós e contras, todo mundo saiu ganhando no acordo. Felipe volta à F-1 sem
ter saído propriamente, e a Williams ganhou um belo desconto de praticamente
100% no pagamento das unidades motrizes da Mercedes, que utiliza desde 2014, pela
liberação de Bottas, que deve reforçar sobremaneira o caixa da escuderia ainda
mais para esta temporada, que já conta com o elevado investimento das empresas
do pai de Stroll, um empresário muito rico, e que banca a carreira do filho. Serão
cerca de 16 milhões de dólares, o que não é pouca coisa. Só de não ter de pagar
a conta dos motores, isso deve permitir ao time inglês investir muito mais no
desenvolvimento técnico dos projetos, já que mesmo com a folga financeira das
últimas temporadas, o orçamento da escuderia de Frank nunca esteve no mesmo
nível da Mercedes, Red Bull, Ferrari, e até mesmo da McLaren, apesar dos maus
resultados desta nos últimos dois anos. Uma vantagem a se considerar também com
o retorno de Massa é a garantia do calmaria de ambiente nos boxes do time
inglês: em suas três temporadas defendendo o time de Grove, Felipe nunca se
envolveu com bate-bocas e outras confusões, sejam externas ou internas, que
pudessem causar stress na escuderia. Um caso até raro na categoria, onde o que
não falta é briga de egos em vários lugares. Massa, que teve uma das despedidas
mais comoventes da categoria em muitos anos em Interlagos e Abu Dhabi em
novembro passado, já começou a ser questionado por alguns sobre este “retorno”,
mas a verdade é que, do jeito que as coisas se sucederam, ele praticamente nem
chegou a sair. E se a Williams o quis de volta, por que ele não deveria
aceitar? Massa é um piloto profissional, e as decisões de sua carreira cabem
somente a ele. Se sua permanência será um erro ou não, isso é algo que concerne
somente a ele e mais ninguém. Se este ano for bem-sucedido, e ele quiser até
continuar, é direito dele, se o time desejar isso. Se não der, paciência: ele
cumpriu o trabalho para o qual foi contratado.
Que sua 15ª temporada,
comandando a Williams na pista, e servindo de professor para o novato Lance
Stroll, seja bem-vinda. A Williams não tem por que se arrepender de voltar
atrás e trazer Massa de volta. Mas é verdade que o time inglês já vinha pegando
uma fama ruim entre os torcedores nacionais, por ter “aposentado” outros
pilotos brasileiros na F-1, como Antonio Pizzonia, Rubens Barrichello, Bruno
Senna, e cuja lista seria engrossada por Massa. Ao menos por enquanto, as
nuances do destino permitiram a Felipe escapar dessa “maldição”, mesmo que, teoricamente,
isso tenha sido adiando por um ano, a princípio.
Outro ganho do time
inglês deverá ser a contratação de Paddy Lowe, que está deixando o time alemão,
que não concordou em renovar seu contrato com o aumento salarial pretendido. E
com Pat Symmonds se aposentando das pistas, seu cargo de chefia no grupo de
projetos da Williams ganhará um sucessor muito capacitado, que poderá ajudar a
escuderia a sanar os defeitos que sua área técnica ainda possui. Junte-se a
isso às possíveis contratações para reforçar a área técnica, e poderemos ter
uma Williams revigorada para encarar, se não a temporada desde ano, a de 2018
com muito mais potencial e otimismo. Para este ano, mesmo com o time tendo
ciência de onde errou no desenvolvimento do carro em 2016, ainda não dá para
apontar quanto o time pode evoluir. Uma meta plausível é ser pelo menos a 4ª
força no campeonato, no mínimo, já que Mercedes, Red Bull, e até Ferrari, devem
continuar sendo muito fortes. Mas há o perigo da McLaren finalmente desencantar
em sua parceria com a Honda, e tornar-se novamente uma rival de peso. Portanto,
com otimismo ou não, a Williams não terá vida fácil neste ano.
Quem ganha também é o
torcedor brasileiro, que estava na iminência de ver a primeira temporada sem um
piloto verde-amarelo desde 1969, e que prenunciava dias sombrios para a
manutenção das transmissões das corridas de F-1 na grade da TV Globo, a menos
para 2018, já que a emissora vendeu até com ágio suas cotas de patrocínio para
esse ano, garantindo a transmissão do campeonato de 2017 nos moldes já
conhecidos do público. Com a manutenção de Felipe no grid, e ainda mais em um
time que pode apresentar um carro competitivo, o Brasil continua firme no grid
por pelo menos mais um ano, e com isso, a emissora deve manter o padrão de transmissão
com mais boa vontade do que no ano passado, quando só contou com o time de
transmissão completo “in loco” apenas na etapa do Brasil, além de transmitir o
treino de classificação somente na etapa brasileira, preferindo nas outras
etapas, ignorar solenemente as sessões, transmitindo programas mais insossos e
até filmes, no caso dos treinos da madrugada.
Mas, se Massa fica,
outro brasileiro saiu perdendo essa semana, e Felipe Nasr viu seu time, a
Sauber, confirmar o nome do alemão Pascar Werhlein para ser o companheiro de
Marcus Ericsson para a temporada. Com a diminuição do patrocínio de Nasr,
estava mais do que óbvio que o brasileiro estava descartado pelo time suíço,
que precisa completar o seu orçamento. E isso também envolveu a negociação com
Wehrlein, através da Mercedes, para um possível fornecimento de motores visando
a temporada de 2018. Sem ter como oferecer contrapartidas à altura, resta agora
a Nasr torcer para que a Manor sobreviva para disputar a temporada deste ano. O
time inglês encontra-se praticamente falido, e sua venda é negociada para um
novo comprador, mas as perspectivas são completamente incertas.
Nasr fez boa temporada
em 2015, mas sua permanência na Sauber em 2016 acabou sendo ruim: perdeu boa
parte das disputas com Ericsson, e quando conseguiu uma performance salvadora
em Interlagos, marcando os únicos pontos do time suíço, indiretamente acabou
condenando a Manor, por permitir à Sauber passar à frente no campeonato de
construtores, e deixar a Manor com muito menos dinheiro a receber na premiação
da FOM. E, com a situação financeira crítica, se a Manor sobreviver, certamente
irá atrás de pilotos com aporte financeiro bem mais alto do que Nasr. Tudo
ainda pode acontecer, mas a chance final do brasileiro, infelizmente, é ínfima,
e é bom Felipe já ir pensando no que fazer no restante do ano. Talvez tenha de
se contentar em seguir para outra categoria, ou tentar a sorte de ser piloto de
testes em algum time, algo que também será complicado de conseguir.
A “despedida” de Felipe Massa da
F-1 não durou muito. Pouco mais de um mês e meio, se contarmos do encerramento
da temporada ao anúncio oficial de sua permanência na Williams para 2017, mas
certamente menos de um mês, se for contado o dia da assinatura do novo contrato
para ficar em 2017, ainda antes do Natal de 2016. Mas o caso de Massa não é o
primeiro de um piloto que anuncia sua aposentadoria, e depois volta atrás. Em
1990, Nigel Mansell, insatisfeito com sua posição na Ferrari, anunciou durante
o Grande Prêmio da Inglaterra que iria aposentar o capacete. Bom, ele nem
chegou a ficar “parado”, como Felipe: Pouco mais de dois meses depois, em Jerez
de La Fronteira, durante o Grande Prêmio da Espanha, o piloto inglês anunciou
seu retorno à equipe Williams para a temporada seguinte. E a temporada nem
tinha terminado ainda, ou seja, a aposentadoria foi aposentada antes mesmo de
começar. No caso do brasileiro, o anúncio foi feito em Monza, mas Felipe
terminou o ano, quando surgiu o lance da retirada de Nico Rosberg. Então, de
certa forma, Massa iniciou sua aposentadoria, que durou praticamente menos do
que todo mundo esperava. A de Mansell, em 1990, nem chegou a ser efetivada. Em
comum, apenas o fato de terem acontecido com o mesmo time, a Williams, que
conseguiu convencer ambos a mudarem de idéia.
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