sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

INDYCAR OU INDYDALLARA?


A Dallara continuará como fornecedora única de chassis na Indycar, mas a categoria promete um novo visual em seus carros para 2018.

            A direção da Indycar anunciou esta semana que foi renovado o contrato com a fabricante de chassis italiana Dallara para continuar sendo a fornecedora “única” de carros para a categoria de monopostos dos Estados Unidos pelo menos até a temporada de 2020. O acordo, segundo a direção, envolve mudar o modelo de chassi a partir de 2018, e a idéia é tentar conseguir atrair novos fornecedores de motores. Será que o plano funciona? A Indy funcionou por quase uma década como categoria monomarca, com os antigos chassis fornecidos pela fabricante italiana, e usando motores da Honda. A idéia, claro, era manter os custos baixos, e esse objetivo permanece atualmente, sendo que o novo modelo, o DW12, utilizado a partir de 2012, o equipamento padrão da categoria. O único diferencial foi que a partir dessa temporada, a Chevrolet, que já era uma das fornecedoras de motores de maior renome nos tempos da F-Indy original, entrou na competição, ao lado da Lotus, que infelizmente teve um desempenho tão medíocre com seus propulsores que não durou muito tempo, além da permanência da Honda.
            Mas, com carros tecnicamente todos iguais, a Indycar até tentou dar uma variada, com os chamados Kits Aerodinâmicos, que seriam fornecidos justamente pelos fabricantes de motores, Chevrolet e Honda. Com idéias um pouco diferentes, os carros ganharam um pouco de personalidade, passando a apresentar visuais distintos, e ajudando a resgatar um pouco a diversidade técnica da competição. Pena que estes equipamentos também tenham sido temas de discussões, como o custo de sua implementação (parece que atualmente tudo resulta em custos altos para os times, o que dá uma idéia de que as escuderias não conseguem obter patrocínios que lhes deem sustentação firme durante todo o campeonato), além de forçadas no regulamento no ano passado, quando permitiram que a Honda efetuasse modificações além das permitidas para tentarem equilibrar o duelo com a Chevrolet, que estava levando vantagem.
Alguns esboços do visual do novo carro da categoria para 2018.
            Um dos grandes atrativos da época áurea da F-Indy original era que o regulamento era bem restritivo em vários aspectos, mas os times tinham boas opções de equipamentos à mão. E, como o desenvolvimento de um ano para o outro era pequeno, havia o caso de times que competiam com carros de mais de uma temporada de defasagem, sem que isso comprometesse de forma crucial o seu desempenho. Quando a década de 1990 começou, os times tinham à mão opções de chassis entre March e Lola, além dos Penske. O time de Roger Penske havia começado a fabricar seus próprios chassis, mas vendia alguns deles para times menores. No campo dos motores, a oferta era um pouco melhor: além dos já citados Chevrolet, que era o melhor equipamento disponível, tínhamos também a Porsche, a Judd, Cosworth, e até a Alfa Romeo. Nas 500 Milhas de Indianápolis, ainda apareciam motores que só competiam nessa prova, como os Buick, entre outros.
            Os melhores times corriam sempre com chassis novos, fabricados no ano da competição, enquanto times com menos recursos geralmente optavam por chassis dos anos anteriores. Mas, como o regulamento privilegiava o equilíbrio, e os equipamentos não tinham um desenvolvimento tão acelerado quanto na F-1, o nível de competitividade de um time com este tipo de chassi ainda era relativamente bom, podendo ser compensado por um bom trabalho dos mecânicos e estratégias de corridas. Com as corridas do campeonato da F-Indy atraindo cada vez mais atenção, em especial após o então campeão da F-1, Nigel Mansell, em 1992, anunciar que iria competir na categoria, os olhos do mundo se voltaram para a categoria, atraindo novos interessados em participar da disputa.
            A Ford, que já tinha a versão turbo do Cosworth, desenvolveu novos motores. A Reynard, renomada fabricante de chassis de competição inglesa, tradicional rival da Lola, também veio para a disputa. E a Mercedes, após comprar a Ilmor, que fabricava os propulsores da Chevrolet, resolveu também entrar na brincadeira, ao lado da Honda, e mais tarde, da Toyota. Além da competição na pista, o alvo era o gigantesco mercado automobilístico dos Estados Unidos, e nada melhor do que vencer na pista para mostrar as suas qualidades. E apesar do poderio de alguns times da competição, como a Penske e a Newmann-Hass, times um pouco menores, mas contando com uma estrutura devidamente azeitada e competente podiam sonhar com as glórias.
            Em 1989, a Patrick Racing, por exemplo, conquistou o título com Émerson Fittipaldi. Além de uma estrutura e time competente, o brasileiro teve chance de usar o mesmo equipamento dos pilotos da Penske, o chassi PC18. E o grande rival de Émerson naquele ano foi o norte-americano Rick Mears, da própria Penske. No ano seguinte, em 1990, a Penske juntou Émerson e Mears, além de Danny Sullivan, campeão de 1988, para formar um trio aparentemente imbatível. Mas quem levou o troféu foi Al Unser Jr., da união dos times Galles e Kraco, que conseguiu derrotar Michael Andretti, da Newmann-Hass, na disputa do título. No ano seguinte, um time novo em folha, criado por Bobby Rahal e Carl Hogan, levou o piloto e co-proprietário do time ao tricampeonato, derrotando as demais escuderias, usando o equipamento “básico”, chassi Lola, com motor Chevrolet. Além do reconhecido talento de Rahal, pesaram na disputa a incrível sincronia entre o corpo técnico e estratégico do time, que não apenas conseguiu igualar mas superar seus rivais teoricamente mais fortes, tanto técnica quanto financeiramente.
            O crescimento do campeonato trouxe novos fabricantes ao certame, e isso se tornou um atrativo a mais. Infelizmente, a partir de certo momento, os times menos estruturados também tiveram de abandonar o uso de chassis defasados, uma vez que o desempenho começou a ficar maior em relação de um ano para outro. A adoção de algumas regras técnicas também complicava a manutenção destes chassis mais antigos, de modo que as chances de times médios e menores de obterem sucesso começou a diminuir. A categoria também viveu sua “guerra dos pneus”, com a Goodyear e a Firestone a se digladiarem nas etapas da competição. A F-Indy começou, de fato, a se agigantar um pouco, e parte desta euforia técnica acabou mitigando os recursos dos times menores. Com uma série de decisões erradas a partir de 2002, a F-Indy original acabou regredindo de forma até abrupta, embora ainda se mantivesse em nível técnico superior ao da rival Indy Racing League. Na tentativa de cortar custos, acabou se tornando também uma categoria monomarca, passando a usar chassis Lola e motor Cosworth, depois optando pelo novo chassi Panoz, em sua última temporada de existência, em 2007.
            Sobrando apenas a IRL a partir de 2008, a categoria, criada como rival e dissidente da Indy, até hoje busca ocupar o lugar que a Indy original um dia alcançou. Mas não tem sido fácil. A opção por manter os mesmos chassis e modelos de motores por praticamente uma década deixou a categoria sem muitos atrativos para possíveis fabricantes se interessarem pela competição. Quando foi anunciado o uso de um novo chassi, muitos se animaram, com alguns fabricantes a disputarem a primazia de fornecer um equipamento novo e mais moderno aos times. O problema foi que mantiveram o lance de fornecedor “único”. E a Dallara, que já estava com eles, acabou vencendo a parada. Boa ou má escolha? Não diria que foi má: ruim foi não terem deixado um fabricante rival fornecer chassis também. Contenção de custos, certo? Mas esse problema poderia ser contornado com um regulamento bem escrito que deixasse o desenvolvimento dos equipamentos bem restrito, como era na F-Indy original. Sem concorrentes, também o desenvolvimento dos carros não precisava ser muito incentivado, já que todos usariam o mesmo equipamento, apesar de que este não era um ponto crucial.
A direção da Indycar quer deixar os novos carros com o visual da antiga F-Indy nos anos 1990, muito mais bonitos na opinião de muitos fãs.
            O único ponto positivo foi que a categoria voltava a ter alguma diversidade técnica. Não era o que muitos queriam, de ver pelo menos duas marcas de chassi, além de mais motores, mas pelo menos a Honda não estava mais sozinha como fabricante de motores. A Chevrolet estava em ação, e pelo menos a briga entre estas duas marcas ajudou melhorar a atratividade técnica da competição. A Lotus, infelizmente, forneceu um equipamento tão ruim que durou pouquíssimo tempo, sendo abandonada sem muita demora por aqueles que optaram por usar seus propulsores. E o certame, por sua vez, não se esforçou muito em tentar atrair novos fornecedores de motor.
            Agora, mais uma vez, tentando alcançar os bons tempos vividos pela F-Indy original, a IRL, ou Indycar, tenta incorporar o que havia de bom na sua categoria original que atraia tanto a atenção do público e da mídia. O novo chassi a ser desenvolvido para 2018 terá um visual claramente inspirado nos tempos da CART de 20 anos atrás, unanimidade entre quase todos os fãs na hora de escolherem os carros mais bonitos que competição que já viram. Não é segredo nenhum que o chassi DW12 nunca agradou a todo mundo, em especial seus dispositivos d proteção junto à asa traseira, que na opinião de muitos, deixaram os carros feios e “gordos”. O novo chassi terá um visual mais arrojado, e prometem, muito mais elegante visualmente. Por isso mesmo, ao reviver o visual da antiga CART, a Indycar espera que isso faça reviver em possíveis interessados o desejo de competir na categoria, como nos anos 1990, como fornecedores de motores. A idéia é ampliar o leque de opções, atualmente restritas ao binômio Chevrolet-Honda.
            Não deixa de ser uma tentativa interessante. Mas o público quer ver diversidade na pista, além de bons duelos. Categorias monomarcas até tem seu apelo em certames de menor alcance e popularidade, mas campeonatos mais estruturados e no topo de seus respectivos continentes merecem e devem apresentar uma disputa mais acirrada e atrativa entre seus participantes. Não é à toa que muitos criticam a F-1 ter apenas um fornecedor de pneus nos últimos anos, quando todo mundo quer ver é duelos entre os fabricantes. E todo mundo lembra que a categoria máxima do automobilismo tinha muito mais graça quando vários fabricantes de motores estava envolvidos, fossem de fábricas ou preparadores. A Indy poderia abrir-se a novos fabricantes de chassis para sua competição. Bastava redigir um regulamento coerente e decente, que estipulasse limites rígidos para o que pode ou não ser feito, e adotasse parâmetros de desenvolvimento que fossem seguidos tanto pelos fabricantes como pelas escuderias, visando conter os gastos nesta área, mas dando a todos uma certa liberdade para dar personalidade a seus projetos. Nos anos 1990, todos curtiam a diversidade dos chassis da Indy original, e cada um tinha sua preferência. E a disputa dos motores também era uma atração à parte, com o regulamento também ajudando a deixar os custos equilibrados e sem discrepâncias. Tudo dando aos times a chance de equilibrarem a disputa com seus talentos de equipe, no caso de algum déficit de performance, fosse do chassi, ou do motor, ou até mesmo do pneu utilizado.
As proteções traseiras dos carros da categoria nunca agradaram os fãs, e devem cair fora no novo kit que será implantado.
            Infelizmente, não parece ser o caso aqui. Trazer mais de um fornecedor de pneus parece completamente fora de questão, além do fato de que, não faz pouco tempo, a própria Firestone teria declarado desejo de sair da IRL, mas acabou voltando atrás, convencida pela direção da Indycar a permanecer, o que dá a entender que o certame não tem parecido muito interessante para outros fabricantes, do contrário, não precisariam ter se esforçado tanto para manter a marca na competição.
            Os aerokits de Chevrolet e Honda, infelizmente, estarão com seus dias contados, uma vez que a intenção da direção da categoria é ter um kit “universal”, que seja mais simples e acessível a todos os times. Segundo Jay Frye, da Indycar, a disputa entre as fabricantes de motores em seus aerokits tornaram as peças caras e demasiado complexas, elevando em muito seus custos de produção, além do forte desenvolvimento feito por Chevrolet e Honda, que deixaram as corridas monótonas em várias pistas, devido a essa disputa. Em outras palavras, a categoria também passou a padecer o mal da sensibilidade aerodinâmica excessiva que torna as ultrapassagens complicadas na F-1. A intenção com os novos kits que serão introduzidos é deixar os carros mais limpos, vistosos, e também menos sensíveis, e claro, sem aquelas proteções traseiras nos pneus.
            De positivo, eles afirmam que há mais de 10 empresas interessadas em fornecer estes novos Kits. Não deixa de ser uma boa notícia, claro. Mas ainda acho que seria preciso um passo mais audacioso para tornar a categoria atrativa, que seria permitir pelo menos mais um fabricante de chassi. A Dallara está presente na IRL há praticamente duas décadas, e não vejo nada de errado com isso. Minha única crítica, como já mencionei, é o fato de ser o único chassi disponível, não por não ter outras opções, mas por não ser permitida por decisão da organização da competição, haver outro fornecedor de carros. Tem gente que já chama a categoria de F-Dallara, ou Indydallara. Estabilidade é bom, mas no caso da Indy, isso tem a haver também com certa estagnação, e na hora de desemperrarem o desenvolvimento dos carros, eles não conseguem acertar as regras de modo a proporcionar uma competição equilibrada e saudável entre potenciais interessandos. E quando decidem que apenas um pode participar da brincadeira, tudo acaba rendendo menos do que poderia. Não digo que a adoção de mais fabricantes de chassis na competição seja a salvação da Indy, mas seria um ponto de reforço a mais dos fãs pela competição, que gostam mesmo é do duelo de marcas, além do dos pilotos na pista.
            Com todos defendendo a mesma marca, é claro que o interesse não atinge todo o seu potencial. Mas espero que as novas propostas da Indycar sinalizem para um futuro melhor e mais interessante para a categoria, que vem tentando se esforçar para achar seu melhor rumo nos últimos tempos. E isso é melhor do que ficarem parados, sem fazerem nada a respeito.
Novos kits aerodinâmicos devem deixar os carros mais "limpos" e elegantes. 

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