sexta-feira, 7 de novembro de 2014

O BRASIL SOBREVIVE NA F-1



Felipe Massa perdeu o duelo com Valtteri Bottas na Williams, mas está garantido no time para 2015, e com sorte, fica por lá em 2016. Mas ele vai precisar melhorar bastante no próximo ano se não quiser levar outro baile do companheiro de equipe...

            Chegou a hora do Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1, e a semana já trouxe uma notícia que pode ser considerada boa: Felipe Nasr será piloto titular da categoria na próxima temporada, defendendo a equipe Sauber. E com Felipe Massa garantido na Williams, o Brasil contará com dois representantes no grid em 2015. Para quem imaginava, no ano passado, um futuro nefasto para o Brasil na categoria máxima do automobilismo, quando Massa era dado como carta fora do baralho pela Ferrari, e ainda não tinha acertado com a Williams, podendo haver a possibilidade de não termos mais pilotos na F-1, é algo sem dúvida a ser comemorado.
            Felipe Massa faz uma temporada apenas razoável pela Williams. A estrela do time é Valtteri Bottas, que aproveitou praticamente quase todas as chances que surgiram durante o campeonato, e eclipsou totalmente o brasileiro. Verdade que Felipe teve alguns azares que não podem ser creditados a ele, mas em outros momentos, Massa voltou a lembrar aqueles momentos vividos na Ferrari onde era nítido que ele poderia render mais do que mostrava. O que conta a seu favor é o excelente ambiente na equipe inglesa, muito mais descontraído do que o time italiano, e pelo fato de a escuderia ter vivido em 2013 uma das piores temporadas de toda a sua história, de forma que o que tem apresentado este ano é praticamente uma ressurreição quase milagrosa. Massa e Bottas se entendem, sabem ser rivais apenas na pista, e nos boxes, trabalham em conjunto para ajudar o time a crescer. E esse ambiente tranquilo é um dos fatores que ajuda o time a manter-se em evidência. Felipe é cobrado por melhores resultados, sim, mas o time tem consciência de que seus resultados abaixo do esperado não são apenas culpa do brasileiro.
            Ainda assim, Massa terá de mostrar serviço em 2015. Se este ano tudo o que viesse de melhor seria lucro, para a próxima temporada a tendência é a Williams passar a sonhar mais alto, objetivando voltar a vencer, e quem sabe, disputar o campeonato e voltar a ser campeã. Felipe, então, terá de andar pra valer muito mais do que neste ano. Até porque disso dependerá sua permanência no time em 2016. Se ele fizer um bom serviço, sua manutenção é a escolha natural. O que pode complicar é a boa situação da Williams a colocar na mira de alguns pilotos de alto calibre que queiram um de seus assentos. E aí, podendo escolher quem quer como piloto, poderia haver uma disputa pelos cockpits. De um jeito ou de outro, Massa já deu a entender que o time inglês será sua última casa na F-1, e que não pretende seguir o exemplo de Rubens Barrichello, que correu por mais de 300 GPs e ainda teria tido mais corridas se não fosse dispensado pela própria Williams no início de 2012.
            Isso deixa o Brasil com a perspectiva de contar com Massa nas pistas por pelo menos dois, talvez três anos. Ou quatro, quem sabe. Ele precisará voltar a mostrar a excelente forma exibida em 2008 para fazer o torcedor grudar novamente os olhos na TV, e de preferência disputar um título. Se a Williams mantiver seu crescimento, e dependendo de como a concorrência se apresentar, talvez isso seja possível em 2015, ou 2016. Mas, mais do que dispor de um excelente carro, Felipe não terá vida fácil, pois a concorrência será duríssima, e ele precisará de uma regularidade ímpar para fazer frente a quem quer que seja seu companheiro de equipe. Bottas não é invencível, como Felipe mostrou em Austin, domingo passado, quando andou a corrida inteira na frente do finlandês, mas precisará fazer do que mostrou no Texas a constante de suas performances, e não a exceção, como foi durante este ano. Não se trata de vencer, mas de bater o companheiro de equipe com frequência, é o que a torcida brasileira deseja, e exige, acima de tudo. E, infelizmente, ainda tem a TV Globo ajudando por vezes a complicar a situação, sempre ainda se mantendo na sua batida e já desgastada fórmula ufanista de exaltar nossos pilotos como se fossem os melhores de todos. Este ano, a emissora pareceu ter tirado a sorte grande quando o novo time de Massa se mostrou a bela surpresa da temporada, sendo em várias etapas os melhores carros na pista depois dos imbatíveis Mercedes. Mas, ao lidar com os fracos números de audiência dos treinos de classificação, reduziu-os apenas ao Q3 na transmissão, mostrando que a situação de audiência da categoria em nosso país já não é mais a mesma...
            Não que a queda de audiência seja um problema apenas do Brasil, mas certamente a emissora do Jardim Botânico teria talvez índices melhores não fosse sua maneira particular de tratar a categoria apenas pelo que os brasileiros podem render nela, e não tentar criar uma cultura de automobilismo mais acessível ao grande público. Mas, querer que a Globo mude de postura parece a mesma coisa que querer que os políticos virem santos...milagres deste tipo não acontecem.
            E, a julgar pela forma como Felipe Nasr foi anunciado, tudo já aponta que ele é a nova "aposta" da Globo para tentar alavancar novamente a F-1 perante o grande público. Resta saber o quanto isso poderá queimar o filme de Nasr. A emissora já vem mantendo o foco no piloto nos últimos meses, sempre o entrevistando nos GPs, e em Austin, ele foi comentarista convidado da transmissão do SporTV. É uma tentativa, válida, de divulgar o piloto, torná-lo conhecido do público. Até aí, nada demais, o problema será o que virá depois, se começar a insistir na tese de bons resultados, mesmo que não tenha carro para tanto. Já vimos isso antes, com Rubens Barrichello, mostrado pela emissora como "sucessor" de Ayrton Senna, e de como Rubens infelizmente aceitou um papel para o qual nunca estaria à altura. Nasr tem de tomar cuidado para não ser a próxima vítima deste tipo de "promoção", de ser vendido como esperança da redenção brasileira na F-1. Isso ainda está longe de acontecer, e no momento, Nasr tem mais é que ser deixado em paz, para que possa desenvolver o seu trabalho com calma, e só for realmente cobrado quando tiver um carro capaz de vencer corridas. Antes disso, não se pode exigir nada dele. É um bom piloto, capaz de vencer e disputar um título, se estiver no local certo, e com o carro certo. Se vai ser um gênio da velocidade, como foram Émerson Fittipaldi, Nélson Piquet, e Ayrton Senna, ainda é cedo para dizer.
            Nasr terá muito trabalho para provar que merece estar na F-1. Em primeiro lugar, um ponto positivo é o mais novo brasileiro ter acertado um contrato de dois anos com a escuderia de Peter Sauber. Isso deve lhe dar a estabilidade necessária para crescer e demarcar terreno na categoria, onde gente gabaritada como Lucas Di Grassi não teve sorte, sendo rifado depois de apenas uma temporada. E Nasr chegará como piloto titular já com alguma experiência, graças aos treinos livres de sexta que vem fazendo pela Williams nesta temporada, dois quais ainda terá a chance de guiar hoje, aqui em Interlagos.
            Nasr vem colhendo bons adjetivos dos engenheiros pelo seu feedback e capacidade de pilotagem, fornecendo boas referências para os pilotos titulares, e será um importante trunfo para ajudar a Sauber a encontrar seu melhor caminho em 2015, que ainda não inspira muita confiança. Tanto que o time não teve vergonha de admitir que sua dupla de pilotos é mais pautada pela necessidade financeira do que por qualquer outra coisa. O time confirmou há poucos dias o sueco Marcus Ericson como um de seus pilotos para o próximo ano. Tanto Ericson quanto Nasr chegam respaldados por importantes patrocínios, que serão vitais para tentar dar a guarida financeira de que o time suíço necessitará para competir em 2015. Como já mencionei, pilotos pagantes sempre existiram na F-1, mas antigamente os times dependiam menos deles do que hoje, onde a equação talento-patrocínio se inverteu completamente, dando-se mais preferência ao lado financeiro do que qualquer outra coisa.
            Felizmente, alguns pilotos não chegam apenas com patrocínio, como é o caso de Ericson, que este ano como piloto da Caterham não fez absolutamente nada, mas trazem também algum talento, que é o caso de Nasr. Felipe tem plena consciência de que sua temporada de estréia pode ser extremamente complicada: a Sauber este ano vem tendo sua pior temporada, e o time centra forças em conseguir construir um carro melhor para o próximo ano. Como o motor da Ferrari também deverá ter melhorias para a próxima temporada, e o corpo técnico da escuderia parece saber onde foram os pontos equivocados do modelo deste ano, tudo parece indicar que 2015 será de fato um ano de melhores possibilidades. Resta saber quanto melhor poderá ser. Uma meta modesta será pontuar com regularidade. O time, que já conquistou alguns pódios em 2012, pode até surpreender e tentar resultado semelhante, mas é preciso manter os pés no chão. E o grande público nacional também precisará saber dosar seu apoio ao novo brasileiro na categoria, ficando consciente de suas limitações de equipamento, não exigindo dele algo que não pode dar, por agora.
            Independente dos resultados potenciais, Nasr terá a missão obrigatória de se impôr sobre Ericson, o que não teve ser difícil, em tese. O sueco passou literalmente em branco pela GP2, enquanto o brasileiro teve chance de vencer corridas e disputar o título. É verdade que o brasileiro despontou apenas este ano na GP2, já em sua terceira temporada na categoria, e se não comoveu como se esperava, pelo menos conseguiu brilhar um pouco, ao contrário do piloto sueco. Diferenças de escuderia à parte, Marcus não conseguiu efetuar nenhuma atuação de destaque, garantindo-se apenas pelo seu aporte financeiro do que pelo talento. A se mantiver o retrospecto, Ericson deve levar um banho de Felipe durante a temporada. E isso irá contar muito para o currículo do brasileiro, na luta por melhores lugares, quem sabe já a partir de 2016 mesmo. Se conseguir fazer uma boa temporada, nada o impediria de ser disputado por um time melhor, onde a Sauber, se precisar de mais caixa, poderia repassá-lo a alguma escuderia interessada que pague por tanto.
            Em tese, o Brasil garante presença na F-1 pelo menos por mais duas temporadas. Mas, e depois? Quem virá em seguida? Pietro Fittipaldi é em tese o nome mais provável de chegar à categoria em breve. Outro nome de potencial é Pedro Piquet, campeão da F-3 Brasil deste ano, que deve ir competir na Europa em 2015. Com a categoria máxima passando por dificuldades financeiras, que neste momento tiraram 2 escuderias e reduziram o número de cockpits a 18, a luta para chegarem F-1 será mais difícil do que nunca. Os anos de ausência de disputa de títulos reduziram o interesse por nossos representantes, que antes sempre eram vistos com destaque de bons pilotos. O Brasil está conseguindo sobreviver na F-1, mas as condições estão ficando mais complicadas: audiência despencando, falta de empresas patrocinadoras, maior disputa de pilotos de outras nacionalidades, os desafios de se chegar na F-1 sempre foram grandes e complicados, mas ultimamente os desafios tem se tornado mais e mais difíceis de serem superados.
            Para tudo melhorar, teríamos que ver um de nossos representantes voltar a disputar o título da categoria. Mas, a curto prazo, não vejo isso como possível. Felipe Massa pode até voltar a vencer uma corrida, mas receio que só o conseguirá fazer ocasionalmente, e diferente de Barrichello, ele não parece comover os brasileiros tanto quanto o conterrâneo, quando consegue um resultado de destaque. E Felipe Nasr, por agora, ainda terá um longo caminho a percorrer até estar em posição de lutar por um título. Mas dá para ter algum otimismo: para uma perspectiva de pouco tempo atrás onde não teríamos mais pilotos na F-1, contarmos com dois nomes em 2015 é um sinal de que pode haver esperança e possibilidade de redenção. Não por títulos ou vitórias frequentes, mas de pelo menos estabilizarmos melhor nossa participação. Talvez voltemos a nos preocupar para 2017, mas por agora, ainda seguimos firmes no "circo". Não é muito, mas é o que temos para comemorar por agora.
            Boa sorte à nossa dupla de Felipes em 2015. E seja bem-vindo finalmente à F-1 como titular, Felipe Nasr.
Vice-campeão da GP2 este ano, em sua terceira temporada na categoria, Nasr terá dias potencialmente complicados em sua estréia na F-1 pela Sauber em 2015.


O Brasil não sobrevive na F-1 apenas por seus pilotos, mas também por nosso GP, que de 1972 para cá se tornou um dos mais tradicionais de todo o calendário da categoria. E Interlagos passou por boas e importantes reformas para receber a F-1 este ano, com destaque para o recapeamento do traçado, a área de escape no "S" do Senna, e a nova entrada de box, muito mais segura, e que dará aos pilotos uma noção mais exata de por onde adentrar no pit line, uma vez que a entrada antiga estava situada bem no ponto de tangência da curva para entrar na reta dos boxes. Mas melhor mesmo foi a decisão de, para 2015, reformar todo o paddock já existente, ampliando-o e modernizando-o, para adequá-lo às novas exigências da categoria, e descartar a idéia de se construir toda uma nova estrutura na reta oposta, mudando para ali os boxes e a largada. Além de mais cara, de certa forma iria descaracterizar o circuito, mudando toda a sistemática de largada, para um local que não daria as mesmas condições que o já tradicional ponto na reta dos boxes. Só é uma pena que não se tenha aventado a restauração do antigo traçado, que poderia ser aproveitado para corridas de outras categorias, como a endurance, uma vez que traçado atual é pequeno para este tipo de prova. Mas Interlagos segue firme na F-1, e todo mundo adora vir correr aqui. Só é uma pena que a paisagem tradicional de São Paulo nas beiradas desta pista nunca seja das melhores, com algumas favelas ainda existindo aqui ao lado que há muito já deveriam ter sido melhor urbanizadas e integradas à cidade. Para não falar da falta de segurança nas imediações, que deixa todo mundo com o pé atrás na hora de chegar e sair do autódromo. Nesses pontos, nosso país continua devendo, e muito, aos demais locais onde a F-1 se apresenta em seu longo campeonato...

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