Esse era um assunto para debater na coluna da semana passada, mas frente à possibilidade de definição do título do campeonato da Fórmula 1 em Cingapura, resolvi postergar para esta semana, na possibilidade de o campeonato continuar em aberto, o que na prática é algo quase irreal, dado o que Sebastian Vettel precisa para liquidar de vez a fatura de 2011. Mas na semana retrasada, houve a etapa do Japão, válida pelo campeonato da Indy Racing League, que fez a sua despedida oficial de sua etapa japonesa, que não mais estará presente no calendário da categoria a partir do próximo ano. Aliás, a etapa de despedida do Japão das categorias Indy foi diferente das demais: em virtude do terremoto que assolou o Japão há meses atrás, parte do circuito oval do complexo de Motegi, onde foi disputada a prova, ficou danificado, e a corrida da IRL, então, usou pela primeira e última vez o circuito misto, onde é tradicionalmente feita a etapa da MotoGP, que aliás inicia hoje os treinos oficiais para a prova japonesa, que será disputada neste domingo. Scott Dixon venceu a última prova da IRL, que foi uma corrida até meio monótona, dada a natureza do traçado misto do complexo, e encerrou a participação de Motegi, que se despede então dos campeonatos mundiais de automobilismo pelos próximos anos, ficando apenas restrito à MotoGP como única categoria internacional a manter corridas no complexo.
Concebido em meados da década de 1990, o Twin Ring Motegi começou a ser construído em 1996, ficando pronto no ano seguinte, e tendo sua inauguração oficial ocorrida em 1998. A Honda, que já detinha a propriedade do mais famoso circuito japonês, Suzuka, decidiu investir fundo em seus projetos para a área automobilística: depois de dominar a F-1 de 1987 a 1991, a fábrica japonesa havia saído da categoria ao fim de 1992, mas nunca deixou de participar totalmente, mantendo seus velhos propulsores ainda em fornecimento para os times, sendo desenvolvidos pela Mugen, uma de suas subsidiárias, a exemplo do que a Renault fez com a Mecachrome, quando também deixou a F-1, mas manteve seus motores na categoria de forma extra-oficial. A Honda pretendia retornar em grande estilo à F-1, em um momento em que a categoria máxima do automobilismo estava virando uma disputa de fabricantes, e uma das maiores rivais da Honda no mercado automobilístico, a Toyota, já ensaiava sua entrada na F-1, e iniciava também sua entrada na F-Indy, onde a Honda começava a dominar. O moderno complexo, erguido em meio às montanhas Hakko, ocupa um vale no meio da cordilheira, e custou cerca de meio bilhão de dólares na época, uma quantia assombrosa. Dotado das mais modernas técnicas de projeto e arquitetura, os japoneses orgulham-se de a pista apresentar grande harmonia com a natureza ao redor do complexo, tendo sido empregados ao máximo recursos para compatibilizar as estruturas do complexo sem agredir o meio-ambiente. E se orgulham disso até hoje.
Twin Ring é um complexo com várias pistas, sendo que os destaques são o traçado oval, e o circuito misto, onde foram disputadas as provas da MotoGP e das categorias Indy. Os demais traçados são variações da pista mista, além de pistas de terra para off-road. O circuito recebe as principais categorias do automobilismo japonês, que correm principalmente no circuito misto. O traçado oval ter extensão de 2,493 Km , enquanto o traçado misto tem 5,083 Km .
A pista recebeu, em seu ano de inauguração, uma corrida de exibição da categoria principal da Nascar, a Winston Cup. A prova, chamada de “Coca Cola 500” , foi vencida por Mike Skinner, no que se tornou a primeira corrida em oval disputada em solo japonês, ainda que fosse uma etapa extra-campeonato. No mesmo ano, o circuito recebeu sua primeira competição internacional oficial, a F-Indy, com a realização da “Budweiser 500” , prova que acabou vencida pelo mexicano Adrian Fernandez. A corrida foi um sucesso de público, e ao lado das etapas do Brasil e da Austrália, a F-Indy ensaiava sua internacionalização, chegando a rivalizar com a F-1, ainda que de forma limitada. Com a Honda engajada plenamente no certame da categoria, onde havia conquistado seu primeiro campeonato em 1996, equipando os carros da equipe Chip Ganassi, com Jimmy Vasser, a fábrica japonesa viu um bom retorno publicitário em sua nova pista. A prova permaneceu no campeonato da F-Indy (então chamada de F-CART ou Fórmula Mundial na TV brasileira) até 2002, tendo o brasileiro Bruno Junqueira como o seu último vencedor.
A partir de 2003, a corrida passou para a liga rival da F-CART, a Indy Racing League, uma vez que a esta altura a Honda tinha saído da categoria original e passado a fornecer motores aspirados para o outro campeonato. Nesta fase, o primeiro vencedor foi Scott Sharp. Mantendo o circuito oval como palco da prova, agora chamada de “Indy Japan 300” , a corrida sempre se mostrou bem disputada, ao ponto de até hoje só haver vencedores com no máximo dois triunfos na pista japonesa: Adrian Fernandez (CART, em 1998 e 1999); Hélio Castro Neves (IRL, em 2006 e 2010); Dan Wheldon (IRL, em 2004 e 2005); e Scott Dixon (IRL, em 2009, e agora, em 2011, mas na pista mista). O circuito também foi palco da única vitória feminina da IRL, em 2008, com Danica Patrick, que assumiu a liderança no finalzinho da corrida superando Hélio Castro Neves (que ficara sem combustível). Tony Kanaan também conseguiu vencer em Motegi, faturando a edição de 2007, sua única vitória na pista japonesa até hoje.
A corrida final do circuito na IRL, inclusive, mereceu até menção disso em seu nome oficial, que este ano foi “Indy Japan: The Final”, anunciando a despedida do circuito da categoria. A IRL, por medida de contenção de custos, e procurando maximizar as etapas com maior potencial de audiência e exposição de patrocinadores, rifou a etapa japonesa, que era bancada praticamente pela Honda, que nos últimos anos, como fornecedora única de motores da categoria, exigia a presença da etapa no calendário. Como em 2012, a IRL voltará a ter mais de um fornecedor de motor, com a volta da Chevrolet, e a entrada da Lótus Cars, chegou a hora da etapa japonesa sair do calendário, mesmo que a Honda ainda continue como uma das fornecedoras de motores.
Houve até idéia de levar a F-1 para o complexo de Motegi, aproveitando o circuito misto para a disputa da corrida. Mas a idéia, felizmente, nunca foi adiante. Por melhores que sejam as instalações e infra-estrutura do complexo automobilístico, a pista de Suzuka tem um traçado muito mais interessante e desafiador para pilotos e equipes, sendo até hoje o circuito preferido da categoria. Nem mesmo quando correu por dois anos em Fuji recentemente, circuito que já havia sido usado pela F-1 na década de 1970, e que foi completamente reformado pela Toyota, a F-1 deixou de sentir saudade de Suzuka, pista que, aliás, também pertence à Honda. A decisão se mostrou ainda mais acertada, de a F-1 não vir para Motegi, pelo que se viu na prova da IRL este ano no circuito misto: uma corrida apenas mediana, com poucas disputas a fundo, apesar do equilíbrio maior que a categoria americana tem em relação ao que se vê na F-1. O circuito misto, apesar de seu traçado interessante, é meio travado, e sem muito charme, algo que não falta em Suzuka, pista que exige um bom acerto, e desafia os pilotos com suas curvas velozes e trechos de alta velocidade. E pistas como Suzuka, diga-se de passagem, não podem ficar de fora numa F-1 que atualmente anda empesteada de “tilkódromos”
Motegi pode ter ficado para trás nos planos da IRL ou desconsiderado pela F-1, mas isso não quer dizer que este complexo não tenha mais atrativos para o fã de corridas. Quem curte o esporte a motor continuará tendo bons motivos para conhecer Motegi, e o melhor deles é o Honda Collection Hall, museu da fábrica japonesa onde estão expostos nada menos do que 23 carros de F-1 utilizados pelos mais famosos pilotos da categoria, como Jack Brabham, Nélson Piquet, Ayrton Senna, Alain Prost, entre outros. E não há apenas carros de F-1, mas também inúmeros outros carros de corrida, impecavelmente expostos, tornando o museu de Motegi um dos santuários de exposição da história do automobilismo, que vale muito a pena ser visitado.
Mas o tempo não pára, e hoje mesmo, os pilotos mais velozes do motociclismo mundial entram na pista para a disputa da etapa japonesa. E que os japoneses possam continuar curtindo mais um show do esporte a motor mundial. Depois do que passaram este ano – e para muitos, ainda, o dilema ainda não terminou, eles bem que merecem ter algo para apreciar do melhor das competições mundiais.
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