Apesar do título meio
jocoso desta coluna, a situação da região da Itália, onde neste fim de semana
se realizaria o Grande Prêmio da Emilia-Romanha de Fórmula 1, infelizmente, não
tem nada de engraçado, muito pelo contrário. Depois de uma forte seca, eis que
chuvas torrenciais atingiram a região, provocando inundações, desabrigados, e
até mortes, num estado de calamidade pública sem precedentes recentes na
história italiana. Diante deste quadro, a direção da F-1 de cancelar o GP,
assim como das outras provas do fim de semana no Circuito Enzo e Dino Ferrari,
em Ímola, é a mais correta possível.
O tempo já estava feio naquela região da Itália desde a semana passada, entrando com força esta semana, com precipitações preocupantes que só tendiam a complicar ainda mais o panorama. O solo, antes seco pela forte estiagem, absorveu com gratidão as primeiras chuvas, porém a intensidade das mesmas logo acabou por encharcar tudo, causando o caos na região. A previsão do tempo, com o qual a direção da F-1 contava para manter a realização da corrida, era de que o tempo amainaria esta semana, de modo que o sol até se faria presente, ainda que de forma tímida. Mesmo para o domingo da corrida, a previsão ainda era de fortes possibilidades de chuva, o que em princípio não seria exatamente um problema.
Mas, por mais recursos que hajam atualmente à disposição, a previsão do tempo segue uma tarefa extremamente inglória, de modo que isso nunca será exatamente preciso. E São Pedro, mostrando seus caprichos, mostrou isso já na terça-feira, quando as chuvas, ao invés de diminuírem, conforme os prognósticos iniciais, aumentaram, e em níveis tremendamente preocupantes. No caso do autódromo, especificamente, houve ordem de evacuação do local já na terça, diante de inundação iminente das áreas baixas do circuito. O Rio Santermo, que passa ao largo da pista, paralelamente ao paddock do circuito, reta dos boxes e trecho que vai até a curva Tamburello, praticamente colado ao terreno do circuito, chegou a subir quase 4 metros, o que provocou o transbordamento de suas águas, afetando as partes baixas do local, inclusive parte do paddock. Equipamentos sensíveis, como geradores, foram movidos para locais mais seguros, visando sua proteção. Felizmente, o nível de inundação nas instalações não foi tão dramático como as fotos podem sugerir, mas claro que isso inviabiliza as atividades de qualquer maneira.
As chuvas começaram enfim a arrefecer, mas a previsão de mais precipitações seguem, e o sol, mesmo aparecendo, não vai significar a normalidade da situação tão já como alguns imaginam. Alguém haveria sugerido que a corrida fosse transferida para Mugello, mas toda a logística da F-1, altamente complexa, não permitiria uma mudança de última hora assim, de modo que a solução foi mesmo cancelar a corrida, até porque a região de Mugello também está fortemente afetada. E não foi pouca coisa: mais de vinte rios transbordaram em toda a região, provocando o desabrigamento de mais de 5 mil pessoas, inclusive com algumas mortes, infelizmente. Desabamentos e desmoronamentos ocorreram em diversos locais, exigindo atenção máxima dos poderes públicos para solucionar os problemas, e prestar atendimento à população atingida. Todos estão trabalhando no limite de suas forças. Mesmo que o tempo realmente se firme, as chuvas cessem, e a pista indicasse condições até de poder realizar a corrida, não haveria como a prova ocorrer, pelo estado geral em que toda a situação se encontra. E a população, neste momento, não tem a F-1 como uma de suas preocupações, tendo sua atenção concentrada em tentar solucionar os problemas causados pelas chuvas intensas, e a atenção governamental, idem.
Como se poderia realizar um GP dessa maneira? Qualquer prova de F-1, mesmo inteiramente coordenada por empresas privadas, dependem de providências dos governos locais onde se realizam as corridas. Segurança, atendimento médico, acesso, entre outros pormenores, são fornecidos através de parcerias com as autoridades, e são atividades essenciais para a realização da prova. Com os esforços públicos neste momento direcionados em sua totalidade para o atendimento das vítimas, e conserto e arrumação dos estragos, não haveria como fornecer o apoio necessário para o GP, e a F-1, muito sensatamente, ao optar pelo cancelamento, leva isso em consideração nas justificativas apresentadas, ao afirmar que não pode sobrecarregar os serviços públicos e seus operativos, cuja demanda neste momento está inteiramente direcionada à situação calamitosa que a região vivencia.
Igualmente, levando em conta que várias estradas estão bloqueadas devido aos alagamentos e desmoronamentos desencadeados pelas chuvas intensas, o tráfego, que já não está bom, ficaria um caos generalizado com o afluxo de torcedores para o autódromo. E, claro, como comemorar as emoções de uma corrida, enquanto a região está padecendo dos transtornos causados pelas interpéries? Não haveria clima para isso, além de fazer parecer uma total insensibilidade para com o sofrimento dos moradores locais diante das tragédias, parecendo viver em um mundo completamente à parte. Apesar de alguma hesitação, a direção da F-1 agiu certo, e de forma até mais incisiva, não demorando tanto para confirmar que não haveria mesmo o GP.
O pessoal que trabalha na F-1 que já tinha chegado a Ímola também estava passando suas dificuldades, pois vários hotéis ficaram ilhados na enchente das cidades. Até Nyck De Vries ficou isolado em seu hotel, assim como a sede da Alpha Tauri, em Faenza. Para ontem, no cronograma de uma prova normal, chegariam os pilotos e os staffs principais das escuderias. Parte do pessoal de imprensa também já estava em Ímola para acompanhar o GP, sendo que parte do paddock onde o pessoal da TV ficaria localizado acabou tomado pela água. O nível do rio Santermo já baixou, felizmente, mas os estragos na região ainda estão sendo contabilizados, e sendo tomadas as medidas destinadas ao conserto. Com a prova cancelada, quem ainda não tinha chegado à região agora tem de remarcar sua viagem para o destino seguinte, e quem já estava por lá tem de fazer as malas e pegar a estrada, da maneira que for possível.
Ontem, o pessoal das escuderias da F-1 recebeu permissão para adentrar novamente o autódromo, ainda parcialmente inundado, para retirada dos materiais e desmonte da estrutura do GP que já tinha ficado pronta no início da semana. E mesmo assim, apenas do pessoal essencial para estes trabalhos. A próxima corrida já é semana que vem, em Mônaco, e o cronograma da categoria máxima do automobilismo já estava apertado, com a saída dos caminhões com seus materiais para a manhã de segunda-feira, rumo a Monte Carlo. São pouco mais de 500 Km de distância entre o circuito italiano e o Principado às margens do Mar Mediterrâneo, em uma viagem de cerca de seis horas e meia, percurso que estará sendo cumprido hoje pela maioria do pessoal e dos caminhões que transportam toda a parafernália da F-1. Não se pode dizer que ganharão muito tempo, pois o trânsito na região da Emilia-Romanha está caótico, com vários trechos bloqueados e/ou interditados, o que deve tornar a viagem bem mais longa.
Fala-se em remarcação da corrida, mas isso é extremamente difícil de ocorrer. A prova só deve voltar mesmo no ano que vem, e a culpa disso é mais da própria F-1 do que do clima. O calendário extremamente extenso e inchado promovido pela categoria nos últimos anos praticamente não abre brechas para imprevistos deste tipo. Todas as datas potenciais já estão praticamente ocupadas, e os poucos finais de semana que poderiam abrigar a corrida dificilmente são compatíveis com a logística de transporte programada para o restante do calendário. Ou realocar a prova no meio das férias de agosto, o que não seria muito bem visto pelo pessoal, extremamente cansado com tantas viagens mundo afora. Vale lembrar que a etapa deste fim de semana seria o início de três finais de semana consecutivos de corridas, já que semana vem é o GP de Mônaco, e logo depois, dia 4 de junho, vem o GP da Espanha. Vai ser uma corrida a menos, mas como boa parte do pessoal já se deslocou para Ímola, tendo montado também boa parte da estrutura de competição nos boxes e os motorhomes de cada escuderia, o alívio pela não realização do GP não é tão sentido assim, já que com a prova cancelada, apenas antecipou a desmontagem da estrutura, e seu transporte para o próximo GP.
Quanto aos torcedores, serão oferecidos reembolso dos ingressos, ou a troca por ingressos equivalentes para a prova de 2024. Para os organizadores, deve ser oferecida a extensão do contrato de realização do GP, previsto para durar até 2025, garantindo sua realização em 2026.
Com relação aos times, as novidades trazidas para Ímola, como por exemplo a nova versão “B” do modelo W14 da Mercedes, deverão fazer sua estréia em Mônaco, a próxima corrida, ainda que o circuito monegasco não seja o lugar mais indicado para a estréia destas mudanças. Mas o time alemão tem pressa em tentar reagir no campeonato dominado pela Red Bull, enquanto os demais times devem esperar para levar as atualizações para a etapa seguinte, em Barcelona, pista mais condizente para se avaliar as novidades nos carros. Se tem algo que o pessoal não está ligando muito de não acontecer, é da experiência que seria realizada na classificação da corrida italiana, com as regras de restrição do uso dos pneus. No Q1, todos os times deveriam usar compostos duros, sendo que no Q2 seriam os compostos médios, e no Q3, os compostos macios. Com o cancelamento do GP, vai por terra a intenção da FIA de experimentar esse sistema, já que Mônaco seguirá as regras tradicionais. E por enquanto, a FIA não deu detalhes de quando irá tentar fazer esta experiência novamente.
O campeonato segue, mesmo com uma corrida a menos. Seriam 24 provas, o maior da história, mas a etapa da China foi cancelada devido às medidas ainda draconianas do governo chinês a respeito da pandemia da Covid-19, que seriam posteriormente revogadas, mas sem que a F-1 revisse sua decisão, nem chegando a anunciar uma corrida substituta. E agora, muito provavelmente ficaremos mesmo “apenas” com 22 provas, o que já é um campeonato bem longo também, mas ninguém irá morrer por causa de uma corrida a menos, ainda mais em um campeonato onde a disputa pelo título já parece morta de antemão para a maioria dos torcedores.
De vez em quando a F-1 faz a coisa certa, para variar. Pena que isso acaba virando a exceção, e não a regra, como gostaríamos que fosse. Mas, Ímola já foi para o brejo, agora vamos para Mônaco, que a temporada segue em frente. E que a região da Emilia-Romanha consiga se recuperar o quanto antes de todos os percalços ocasionados por estas chuvas...
Situações de cancelamento de corridas em cima da hora não são comuns na história da F-1. Em 1985, o GP da Bélgica, marcado inicialmente para o dia 02 de junho, acabou adiado já no meio do fim de semana, com os times na pista, devido ao asfalto do circuito de Spa-Francorchamps ter começado a se desmanchar com a passagem dos carros, devido a um recapeamento feito recentemente que não teve o tempo necessário de curagem. Como os riscos de acidente ficaram realmente sérios, os organizadores não tiveram outra opção se não adiar a realização da corrida, que ocorreria no dia 15 de setembro daquele ano. A última vez que uma prova foi cancelada neste tipo de situação, com o pessoal já pronto para realizar o GP, foi em março de 2020, na Austrália. A Covid-19 havia sido descoberta na China em janeiro, e se espalhava pelo mundo, gerando incerteza, e posterior pânico pela sua disseminação quase descontrolada, e sem tratamento viável naquele momento. Todo o pessoal estava em Melbourne, prestes a realizar os treinos livres da sexta-feira, quando foi tomada a decisão de cancelar o GP, prestes a ter início os treinos livres. O público já estava nos portões, pronto para adentrar o autódromo montado no Albert Park. O surgimento de um integrante da equipe McLaren acometido por Covid-19 desencadeou as incertezas generalizadas se deveria ou não ser realizada a corrida, apesar de ainda haver uma certa normalidade nas condições da cidade australiana. A corrida voltaria apenas em 2022 ao calendário, ficando ausente de 2020 e 2021, diante dos problemas causados pelo coronavírus, que desencadeou uma pandemia mundial que só recentemente teve seu caráter emergencial revogado.
A Indycar realiza neste final de semana os treinos classificatórios para as 500 Milhas de Indianápolis, que serão realizadas no dia 28 de maio. Temos 34 carros inscritos para a prova, de modo que um deles ficará de fora, já que o grid tem apenas 33 vagas. Quem será o “felizardo” que terá de ficar de fora? A categoria iniciou os treinos oficiais para a mais famosa corrida das Américas nesta semana, mas o primeiro dia, a terça-feira, dia 16, foi perdido por conta da chuva que caiu sobre o Indianapolis Motor Speedway, fazendo todos perderem um tempo valioso de testes para se prepararem para a corrida. Hoje teremos a última sessão de treinos livres antes da classificação, com transmissão do sistema de streaming Star+. Amanhã, a partir das 13:00 Hrs., o Star+, assim como o canal pago ESPN4 transmitirão a classificação, que só será encerrada no domingo, com o FastSix, que definirá a pole-position da prova, com esta parte tendo transmissão também da TV Cultura a partir das 18:00 Hrs. O Brasil terá dois pilotos na corrida. Hélio Castro Neves segue em busca de sua 5ª vitória na Brickyard Line, para se tornar o piloto mais vitorioso da história da Indy500. Fica a torcida por Helinho, até porque seu colega na Meyer Shank, Simon Pagenaud, marcou o 3º tempo ontem, apesar do brasileiro ter ficado em 18º, mostrando que há esperança de tentar um novo e inédito triunfo. Quem também quer buscar um novo triunfo é Tony Kanaan, que acertou para correr pela McLaren na famosa corrida.
Tony Kanaan despede-se da Indycar nas 500 Milhas de Indianápolis deste ano. O piloto baiano chegou à antiga F-Indy em 1998, defendendo a equipe Tasman, após ser campeão da Indy Lights, categoria de acesso, pela mesma escuderia em 1997. O time foi absorvido pela Forsythe em 1999, ano em que Tony conseguiu sua primeira e única vitória na categoria. De 2000 a 2002, defendeu a MoNunn Racing. A partir de 2003, Tony mudou-se para a Indy Racing League, defendendo a equipe Andretti-Green, onde conquistou sua primeira vitória ainda naquele ano, e o título da categoria em 2004. Ao fim de 2010, acabou dispensado do time, indo buscar refúgio na KV Racing, por onde correu de 2011 a 2013, tendo seu grande momento ao vencer a Indy500 de 2013, o que lhe valeu convite para defender a Chip Ganassi a partir de 2014, onde ficou até 2017. Em 2018, mudou-se para a Foyt, onde acabou sucumbindo à falta de competitividade da escuderia, tendo feito sua última temporada completa em 2019, e nos anos seguintes, apenas as corridas em ovais em 2020 e 2021. No ano passado, correu apenas a Indy500, e este ano, faz sua última prova também nas 500 Milhas, agora defendendo a McLaren. Boa sorte a Tony em sua última empreitada na competição.
Tony Kanaan conduz seu carro da McLaren nos treinos livres para a Indy500 2023.
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