O ano de 2019 nem
havia terminado, mas o mundo da F-1 teve uma notícia impressionante, que veio
literalmente como um grande presente de natal para seu protagonista. Sim,
Charles LeClerc deve ter tido uma grande felicidade ao ver a Ferrari renovar o
seu contrato para nada menos do que 5 anos. Não é qualquer time que faz um
contrato tão longo assim. Garantido em um time de ponta por tal período, o
monegasco certamente deve ter feito uma comemoração daquelas. Não por
coincidência, Papai Noel, que veste vermelho, tem a mesma cor dos carros de
Maranello.
E, no início deste
ano, foi a Red Bull que resolveu fazer quase o mesmo, renovando o contrato de
Max Verstappen por quatro anos. Não chega a ser tanto quanto o de LeClerc, mas
também não pode ser menosprezado. Quem perde com a renovação antecipada de
ambos os pilotos, tidos como os nomes mais promissores da nova geração de
talentos da F-1, obviamente, são os jornalistas, que contavam com uma silly
season quente no que se refere ao mercado de pilotos este ano, quando os
contratos de vários nomes importantes e de destaque, LeClerc e Verstappen
incluídos, se encerrava, o que prenunciava uma disputa de vagas que poderia ser
muito interessante para 2021. Com estes dois nomes garantidos em suas
respectivas posições por vários anos, sobra apenas Lewis Hamilton como grande
nome a ser especulado para 2021, mas na prática, significa também que o inglês
hexacampeão ficará onde já está, na prática, enterrando outra possibilidade de
especulações que os jornalistas adorariam desenvolver para prender a atenção do
público leitor.
Ora, é fácil imaginar
que, ao renovar com LeClerc por tal período, a Ferrari simplesmente admite
abertamente que o monegasco é sua aposta para voltar a ser campeã. E olha que
nem mesmo Michael Schumacher teve um contrato assim tão longo quando correu em
Maranello. O time rosso viu o potencial de Charles, e tratou de garanti-lo. E
LeClerc, obviamente, seria maluco se recusasse tal oferta. Pelo mesmo motivo,
Verstappen, o novo ídolo do time rubrotaurino (e já não é de hoje), também teve
o seu contrato renovado, e com certeza, em bases muito mais generosas do que o
contrato atual. O holandês era especulado como grande nome numa possível
transação com a Mercedes, ou até mesmo a Ferrari, algum tempo atrás.
Mas o entusiasmo pelo
holandês, depois que este fez algumas críticas ao time italiano, esfriou em
Maranello, e ao renovar com LeClerc, que já se tornou praticamente o rival mais
direto do monegasco, pelo que andaram se estranhando em 2019, a direção da
Ferrari simplesmente dá o recado de que ele dificilmente irá para lá um dia.
LeClerc e Verstappen seriam uma dupla explosiva em um mesmo time, e um
certamente tentaria detonar o outro. Não daria certo, pelo menos, não em um
time que não consegue ter a mão firme sobre seus pilotos.
Com LeClerc garantido
por mais cinco anos em Maranello, a pergunta que todos fazem é o que acontece
com Sebastian Vettel. O tetracampeão foi superado pelo monegasco na temporada
do ano passado, prolongando o calvário do piloto alemão, que já não vinha em
boa fase desde meados de 2018. Se naquele ano Vettel sucumbiu aos próprios
erros e à pressão no duelo contra Lewis Hamilton, agora o enguiço é muito
maior, pois terá de superar Charles, na pista e no box. Caso contrário, sua
permanência na F-1 para 2021 já começará a ser posta em dúvida. E como desgraça
pouca é bobagem, o alemão terá o dilema de praticamente não ter para onde ir.
Pelo menos, um lugar onde poderá correr tranquilo, como se acostumou nos anos
mais recentes. E, pelo retrospecto de 2018/2019, muita gente já aposta até que
Vettel pode encerrar a carreira. Já está realizado profissionalmente, e com sua
segurança financeira garantida. E, tendo se tornado pai de família, por mais
que muitos possam criticá-lo se resolver pendurar o capacete, ele tem todo o
direito de fazer isso, se sentir que é o melhor para si.
Esportivamente
falando, seria admitir o fracasso de suas últimas temporadas, quando perdeu
para si próprio também. E ainda há quem lembre que, no primeiro ano em que
dividiu a Red Bull com Daniel Ricciardo, e perdeu o duelo para o australiano,
Vettel se mandou para a Ferrari, no que muitos chamaram de covardia por pular
do barco do time dos energéticos na primeira temporada onde passou aperto do
companheiro de equipe. Não é uma boa lembrança para o currículo esportivo, e
pelo que já conquistou na F-1, Vettel poderia passar sem outra comparação
dessas. Se perder novamente o duelo para LeClerc este ano, e resolver sair, muitos
irão repetir as críticas de sua transferência da Red Bull para a Ferrari,
quando o chamaram de covarde por correr da briga com Ricciardo. Mas na F-1,
você é somente bom quanto seu último bom resultado na categoria, e a imagem de
Vettel já vem sofrendo um forte desgaste desde 2018. Resta saber o quanto ele
se incomodaria de carregar estas críticas para sua aposentadoria como piloto...
LeClerc surpreendeu em
2019, ao correr não apenas no ritmo de Vettel, como até superando-o com certa
facilidade. Estilo de comportamento do carro, que seria mais afável a Charles
do que a Vettel, a verdade é que o monegasco poderia ter feito mais do que
demonstrou na temporada passada, não fosse o comportamento esdrúxulo da direção
da Ferrari sobre sua dupla de pilotos. Tentando ainda manter o esquema de
hierarquia de primeiro e segundo piloto, em várias corridas a direção do time
acabou prejudicando tanto Vettel quanto LeClerc, a princípio tentando proteger
o alemão, mas depois errando mais por não impor limites de comportamento quando
às disputas roda a roda que ambos acabaram travando na pista, no que resultou
em alguns incidentes que poderiam ser evitados sem precisar apelar para
ridículas ordens de equipe.
Mas foi o primeiro ano
de Charles em um time de ponta, e o monegasco, sem pressão, pode mostrar do que
é capaz. Mas agora, essa capacidade será cobrada com mais afinco, e alguns dos
erros cometidos por LeClerc em 2019, caso a Ferrari tenha um carro capaz de
lutar pelo título, poderão não ser mais tolerados, dependendo de suas atitudes
na pista. Charles já mostrou que não tem medo de dividir curvas com os
adversários, é arrojado, e extremamente agressivo. Será que conseguirá dosar
estas características quando for necessário? Por mais que seja necessário lutar
em vários momentos, haverá outros em que precisará saber também garantir
resultados, saber interpretar o panorama de corrida, e calcular como conservar
o carro, sem deixar de ser veloz. E numa disputa, quanto mais parelha for, não
se pode cometer o mínimo erro. É bem mais fácil ser veloz sem ter pressão por
resultados, do que correr tendo de mostrar estes resultados. Não que o
monegasco não tenha tido pressão em 2019, mas com as atenções teoricamente
concentradas em Sebastian Vettel, o grande nome do time, Charles pode correr um
pouco mais solto. Veremos se conseguirá manter sua excelência de performance
estando desde já na mira de todos. O grande presente ganho pelo monegasco vai
exigir dele mais dedicação e atenção do que nunca. E ainda torcer para que a
Ferrari apresente um carro competitivo, e com potencial para disputar o título.
Red Bull confia na evolução da Honda para poder voltar a lutar pelo título com Max Verstappen. E os japoneses deixaram para trás a imagem catastrófica de sua recente parceria com a McLaren. |
Neste ponto temos
talvez o único risco para a carreira de Charles: se a Ferrari se perder na
criação e desenvolvimento de seus monopostos, LeClerc ficará “preso” ao time.
Não que isso seja totalmente ruim, mas vamos ver como ficarão as ambições do
piloto. Vamos lembrar que Fernando Alonso e Sebastian Vettel também chegaram ao
time rosso como as grandes apostas para voltarem a ser campeões, e vimos que
ambos não conseguiram realizar seus intentos. Alonso saiu brigado com a cúpula
ferrarista, frustrado por não ter sido campeão pela escuderia, que acabou
sucumbindo ao domínio da Red Bull entre 2010 e 2013, e depois ao domínio da
Mercedes em 2014. E Vettel, por sua vez, também sucumbiu junto com o time ao
domínio do time alemão nestes últimos anos, vendo Lewis Hamilton enfileirar
títulos desde então, e com Sebastian caminhando para uma possível despedida
inglória dos carros vermelhos, a exemplo do asturiano. Ainda é cedo para
afirmar que a Ferrari vai se complicar novamente assim, mas e se acontecer? Não
é impossível. E aí, LeClerc também precisará aprender a manter a cabeça no
lugar, e não perder o rumo e ter chiliques como Fernando e Sebastian, o que só
serviu para atrapalhá-los.
Mas LeClerc não é o
único que corre esse risco. Max Verstappen, ao aceitar a renovação da Red Bull,
está dando um tremendo voto de confiança ao time, mas de certo modo, o
holandês, por mais cortejado que estivesse sendo, não tinha lá muitas
alternativas. Com LeClerc confirmado em Maranello, Lewis Hamilton deve se
manter na Mercedes, pois não iria se dar a ter que disputar atenção com o
monegasco no time italiano. E com o inglês permanecendo em Brackley,
dificilmente a Mercedes iria ter Verstappen junto. E com as portas de Maranello
fechadas no momento para Max, pelas declarações feitas pelo holandês, e também
pela presença do novo desafeto LeClerc, só sobrou mesmo a Red Bull. E isso
apesar de algumas indiretas feitas por Jos, pai de Max, de que a Red Bull
poderia “travar” a carreira do filho, dando indiretas de que o time dos
energéticos não teria como ser competitivo para voltar a ser campeão do mundo.
A Red Bull também
ficou sem opções. Com Daniel Ricciardo tendo ido embora para a Renault, o time
de Dietrich Mateschitz não poderia correr o risco de perder o holandês, pela
capacidade que ele possui. Felizmente, Max amadureceu em 2019, tendo que
liderar o time austríaco na pista, e embora tenha se metido em uma confusão ou
outra, se mostrou muito eficiente, cometendo menos erros de pilotagem, e sendo
rápido como de costume. E sem uma alternativa à altura, perder Verstappen seria
comprometer todas as chances de a Red Bull poder disputar novamente o título,
visto que todos os outros que correram ao seu lado, à exceção de Ricciardo, não
se mostraram à sua altura. Por isso, o time teve de agir, e fez um contrato com
o holandês como nunca havia feito antes com outro de seus pilotos.
A aposta da Red Bull
não é apenas no holandês, que em alguns momentos até já se mostrou impaciente
quando se via em momento pouco competitivo frente a Mercedes e Ferrari, mas
também, e principalmente na Honda, que teve um primeiro ano muito produtivo com
o time dos energéticos em 2019. Se é verdade que as unidades nipônicas ainda
deveram para Mercedes e Ferrari, por outro lado, e com o excelente chassi de
Adrian Newey, que foi sendo desenvolvido com competência ao longo do ano, a Red
Bull conseguiu destronar os italianos em vários momentos. E com a Honda tendo
agora tranquilidade para trabalhar e desenvolver seu equipamento, eles tem um
bom potencial para ser desenvolvido, tanto que os prognósticos mais otimistas
afirmam que 2020 deverá ser o melhor ano da Red Bull desde 2013, justamente o
último ano em que foram campeões. E oferecer um equipamento competitivo é
crucial para manterem Verstappen satisfeito em sua garagem, a fim de garantir
sua permanência na escuderia.
Falta, claro, acertar
tudo com os concorrentes. Por mais otimista que a Red Bull e os japoneses
possam estar, precisaremos ver o campeonato começar para descobrir como será a
relação de forças, neste que será o último ano da F-1 sob as atuais regras
técnicas. E este é um detalhe interessante que reforça o argumento de que tanto
Red Bull quanto Ferrari também jogaram pelo seguro, ao garantir seus melhores
homens no grid em seus times, sob as novas regras técnicas, para terem
parâmetros de comparação dos desempenhos, e em tese, ajudar a identificar
pontos fortes e/ou fracos em seus projetos. Tanto Verstappen quanto LeClerc
deverão ter importância crucial para ambos os times. Vettel, e Alex Albon,
companheiro de Verstappen na Red Bull, que se virem para acompanhar seus
parceiros de time.
E então, chegamos a
Lewis Hamilton, cujo contrato com a Mercedes termina no final desta temporada,
e oficialmente, ainda não foi renovado. Depois destes movimentos de Ferrari e
Red Bull, tudo indica o caminho mais óbvio de todos, com o atual hexacampeão ficando
onde está, e tendo de confiar que seu time, que domina a F-1 desde 2014, vai se
manter competitivo em 2021 e além, sob as novas regras técnicas da categoria
máxima do automobilismo. Aos 35 anos, Lewis tem tudo para se tornar o maior
campeão da história da F-1, superando as marcas do alemão Michael Schumacher, a
quem deverá deixar para trás em número de vitórias, e igualar em número de
títulos, ao fim deste ano. Mas, e em 2021? Muito se falou sobre a possibilidade
do inglês ir para a Ferrari, com Vettel não estando mais lá, mas a presença de
LeClerc, que já demonstrou não ter respeito por seu colega de time tetracampeão,
não deixaria de entrar em atrito com o inglês, para defender seu espaço, e
portanto, torna-se um indicativo de que o time rosso desistiu de ter o inglês
em suas fileiras. Assim como também esfriam as possibilidades de Toto Wolf
desligar-se da Mercedes, e assumir as rédeas da Ferrari, na mesma posição que
desfruta hoje no time prateado.
Lewis Hamilton, hexacampeão mundial, ainda não renovou seu contrato com a Mercedes para 2021, mas deve ficar onde está, e não tem motivos para reclamar disso. |
Por mais que pairem
dúvidas a respeito da continuidade da Mercedes como time completo na F-1, ainda
mais por sua entrada na F-E, e a volta da McLaren como time impulsionado pelas
unidades de potência alemãs, a escuderia tem tudo para se manter na categoria,
e continuar forte e competitivo. A Mercedes já demonstrou que não domina a F-1
apenas por causa das atuais regras técnicas, mas por sua competência e sinergia
únicas, mostrando uma eficiência e capacidade como um time coeso e engrenado,
tendo conseguido reagir e reassumir a dianteira mesmo quando pressionado nos
últimos dois anos, enquanto os rivais acabaram se perdendo entre eles mesmos. A
direção firme de Toto Wolf na Mercedes é uma destas razões para a escuderia
seguir azeitada e focada em seus objetivos. E, apesar das perspectivas de que
possamos ter este ano a temporada mais difícil para a Mercedes ser novamente
campeã, lembremo-nos do que vimos na pré-temporada de 2019, quando a Ferrari
assustou os rivais nos testes, e depois vimos a Mercedes, que não havia sido
tão dominante, ou não parecia tão competitiva quanto em anos anteriores,
arrasar com os concorrentes na pista, os quais só foram se encontrar na segunda
metade do ano, quando a Mercedes, e principalmente Hamilton, já haviam aberto
larga vantagem, difícil de ser recuperada. Alguém aí pode garantir que isso não
se repetirá este ano?
Afinal, sempre se fala
das melhorias que Ferrari e Red Bull estão prometendo para disputarem o melhor
ano de sempre, mas todos parecem esquecer que os prateados não estão parados,
curtindo o inverno europeu que tinge de branco boa parte do Velho Continente.
Os trabalhos seguem firmes tanto na Inglaterra quanto na Alemanha, com o
projeto não apenas do novo chassi 2020, mas também das unidades de potência,
que embora não sejam tão mais potentes quanto as concorrentes atualmente, ainda
são as mais eficientes da F-1, e uma peça elaborada à perfeição no complexo
projeto técnico que permitiu à marca germânica apresentar o maior período de
domínio de um mesmo time na história da categoria máxima do automobilismo até
hoje. E isso deve garantir a permanência de Lewis Hamilton, outra peça
essencial nesse projeto de domínio, por alguns bons anos em Brackley, sendo a
grande aposta do time.
E assim, não deveremos
ver as mudanças de pilotos que muitos gostariam de ver respirarem novos ares em
2021. Se isso vai ser ruim ou pior para a F-1, só saberemos quando campeonato
começar. E estamos a um mês dos testes da pré-temporada, e a dois meses da
primeira corrida. Façam suas apostas...
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