Silverstone: 13 de maio de 1950: Largada para a primeira corrida da Fórmula 1. |
A Fórmula 1 está
atingindo um número solene neste final de semana. A categoria máxima do
automobilismo disputará neste domingo seu milésimo Grande Prêmio, com a
realização da prova da China, no belo circuito de Shanghai. Sim, praticamente
68 anos, 10 meses e 25 dias depois da realização da primeira prova, em 13 de
maio de 1950, a F-1 alcançará a marca de mil provas. Algo a ser comemorado,
realmente. Quando o campeonato foi criado à época, reunindo em uma só disputa
os vários “Grand Prix” que eram realizados no Velho Continente, duvido muito
que qualquer um dos participantes de 1950 imaginasse que a então nascente
Formula 1 iria durar tanto. Mas, os anos e temporadas foram passando, as provas
acontecendo, e enfim chegamos à marca histórica, cujos primeiros treinos livres
ocorrem nesta sexta-feira, dando início às atividades oficiais do milésimo GP
da história.
O único ponto negativo
em que muitos concordam, é que o palco da milésima corrida da F-1 ocorra em um
lugar onde a categoria simplesmente não empolga o público, nem tampouco tem a
tradição histórica entre os fãs do automobilismo. Apesar de ser disputado desde
2004, a F-1 até hoje não decolou exatamente na China. Apesar do belo traçado do
circuito de Shanghai, e de sua impressionante estrutura, os chineses não
criaram identidade com a categoria até hoje. O público presente nas corridas
não tem sido ruim, mas também não é de encher as arquibancadas do autódromo,
que possui alguns lances de arquibancadas que foram transformadas em outdoors
gigantes há anos, por sempre estarem vazias.
Muitos gostariam que o
milésimo GP fosse no continente onde a categoria nasceu, a Europa, e é difícil
não concordar. Afinal, qualquer corrida no Velho Continente arrasta sempre fãs
ardorosos e apaixonados pela F-1, em maior ou menor grau, e seria mais do que
justo que tal data pudesse ser comemorada por lá. Mas Bernie Ecclestone, em sua
busca incessante por novos e muito mais lucrativos acordos para realização de
GPs, tornou a Europa palco minoritário do calendário, com pouco mais da metade
das corridas ocorrendo mundo afora. Então, as chances só não ficaram mais
equilibradas pela disposição do calendário, fora a pouca vontade de se mudar a
data de alguma corrida para realização deste momento comemorativo.
Contando com poucas
corridas em sua primeira década de existência, a F-1 só foi atingir a marca de
100 Gps em 1961, tendo como palco o Nordscheleife, o célebre traçado de mais de
20 Km de extensão de Nurburgring, na Alemanha, mais conhecido como “Inferno
Verde”, pela sua extensão e suas intermináveis curvas, algo impensável para os
dias de hoje, e que marcou a última vitória de Stirling Moss na F-1. Moss, o
campeão que nunca foi, tendo sido 4 vezes vice-campeão. Teria sido uma
compensação do destino por nunca chegar ao título da categoria?
Uma década mais tarde,
e a F-1 chegaria à sua 200ª corrida, e no palco mais charmoso de todos, Monte
Carlo. E coube a um dos maiores talentos da época, Jackie Stewart, a honra de
vencer a corrida bicentenária da categoria. A partir dos anos 1970, o
campeonato da F-1 passou a ter mais corridas disputadas, e por isso, antes
mesmo do fim da década, chegaria ao seu 300º GP, que acabou por ser o Grande
Prêmio da África do Sul, em Kyalami. Com uma prova disputada, que teve cinco
líderes, o triunfo acabou nas mãos de Ronnie Petterson, o “sueco voador”, que
infelizmente perderia a vida alguns meses depois, em consequência de um
acidente sofrido na largada do GP da Itália, em um ano que glória e tragédia
para a Lotus.
A Europa viu sua
última corrida centenária da F-1 no já distante ano de 1984, quando a categoria
disputou seu 400º GP, tendo como palco a prova da Áustria, em Zeltweg. E no ano
em que se consagrou tricampeão, coube a Niki Lauda fazer as honras da casa, e
rechear o seu já vitorioso currículo com o triunfo em casa na veloz pista, em
um ano onde a McLaren não deu chances à concorrência, restringindo a luta pelo
título à sua dupla de pilotos. E nesta corrida, Lauda fez valer não apenas o
seu equipamento, mas também o seu talento, pois mesmo tendo problemas
enfrentados no câmbio de seu carro, conseguiu manter a corrida sob controle,
para chegar mais de 20s à frente de Nélson Piquet.
Em 1990, Nélson Piquet venceu a 500ª prova da F-1 com um duelo eletrizante com Nigel Mansell nas voltas finais da corrida. |
O piloto brasileiro,
aliás, teve sua oportunidade de entrar para a lista de vencedores centenários
alguns anos mais tarde, quando a F-1 chegou a seu 500º, justamente na etapa que
encerrava a temporada de 1990, no GP da Austrália, na cidade de Adelaide. O GP
histórico motivou a FIA a fazer festividades para comemorar a data, inclusive
com a presença de vários ex-campeões, como Jack Brabham, James Hunt, e Juan
Manuel Fangio. Ayrton Senna tinha tudo para vencer a corrida, largando na pole,
e comandando a corrida com folga, até ter problemas de freio e bater, deixando
a corrida. Piquet, que vinha em 2º lugar, assumiu a liderança, e ainda teve um
duelo épico nas voltas finais com seu velho rival Nigel Mansell para receber a
bandeirada da 500ª prova com um show de pilotagem merecido de seu talento como
tricampeão.
A 600º e a 700º
corridas da F-1 acabaram ocorrendo em terras sul-americanas. Em 1997, a
Argentina recebeu a 600º prova, que acabou vencida pelo canadense Jacques
Villeneuve, no ano em que conquistou o seu único título na F-1, e o último da
história da Williams. Já a prova centenária seguinte teve como palco o GP
Brasil de 2003, numa corrida das mais tumultuadas, graças à chuva, e a um
violento acidente nas voltas finais, de Mark Webber, da Jaguar, cujo carro
ainda acabou sendo atingido pelo de Fernando Alonso, então na Renault. A
corrida, já em sua parte final, acabou recebendo bandeira vermelha, e por uma
confusão na interpretação das regras, a vitória acabou sendo dada a Kimi
Raikkonen, da McLaren, antes que tudo fosse analisado adequadamente, e se
confirmasse que o triunfo na verdade foi de Giancarlo Fisichella, da Jordan. O
italiano recebeu o troféu algumas semanas mais tarde, na etapa seguinte, em San
Marino.
Mas este não seria o
único GP centenário com confusão. A prova seguinte, o 800º GP, acabou sendo a
etapa de Cingapura, em 2008, prova vencida por Fernando Alonso, então na
Renault, que se aproveitou de um pit stop feito pouco antes de Nelsinho Piquet,
seu companheiro de equipe, bater e provocar um Safety Car. O problema é que,
como acabou sendo revelado no ano seguinte, a batida foi premeditada, a mando
de Flavio Briatore e Pat Symonds, da Renault, para justamente permitir a
vitória do espanhol. O que deveria ter sido uma etapa festiva para uma corrida
centenária, acabou virando palco de um escândalo.
Anos depois, pelo menos o 900º transcorreu
sem problemas, no GP do Bahrein de 2014, e ainda vimos um duelo titânico entre
a dupla da Mercedes, Nico Rosberg e Lewis Hamilton, pela vitória na corrida,
que acabou vencida pelo inglês, que chegaria ao bicampeonato ao final do ano,
iniciando o período de dominação da Mercedes na F-1 que até hoje não se
encerrou.
Vencedor do GP Nº 900, Lewis Hamilton pode ser o primeiro piloto a vencer duas provas centenárias da Fórmula 1. |
Curiosamente, Hamilton tem a oportunidade,
neste final de semana, de se tornar o único piloto a vencer mais de um GP
centenário. A Mercedes ainda é uma força na competição, e apesar da forte
oposição da Ferrari, que tem um carro aparentemente mais forte, mas menos
confiável, como se viu nas duas etapas anteriores, as chances de Lewis triunfar
ainda são bastante altas. Até hoje nenhum piloto conseguiu obter mais de dois
triunfos em corridas centenárias.
De início, o motivo era até bem óbvio: com
quase uma década separando uma prova da outra, dificilmente quem vencia uma
corrida ainda estaria na competição na época da prova seguinte. As carreiras
duravam menos tempo naquela época, até pelas condições de segurança muito mais
precárias que nos dias de hoje. Com o aumento de Gps por temporada, este
intervalo diminuiu, de modo que alguns pilotos tiveram oportunidade de disputar
mais de uma destas corridas. Mas vencer já era outro problema. Atualmente, com
cada temporada tendo até mais de 20 provas, tornou-se ainda mais fácil os
pilotos terem chance de competirem em mais de um GP centenário, já que a
diferença passou a ser de apenas 5 anos entre uma corrida e outra, algo que não
era tão fácil antigamente. E, ironicamente, alguns dos maiores nomes da
história da categoria máxima do automobilismo passaram por suas carreiras sem
conseguirem, ou terem a chance de vencer uma destas provas.
Michael Schumacher acabou abandonando as
duas provas centenárias que disputou, na Argentina/1997, e no Brasil/2003. Em
2008, ele estava aposentado, e quando retornou para as temporadas 2010 a 2012,
não teve chance de alinhar em nenhuma corrida centenária. Ayrton Senna
caminhava para vencer a corrida 500, mas também abandonou, vítima de problemas
de freios, perdendo sua única chance real, já que em 1984 o paulista estreou na
F-1, competindo pela modesta Toleman, sem chances reais de vencer corridas em
condições normais. Alain Prost correu nas provas 400 e 500, mas o francês
abandonou na prova 400, no ano de domínio da McLaren, e na corrida 500, teve
uma performance abaixo da habitual, apesar de ter subido ao pódio em 3º lugar.
Jim Clark, o grande nome da década de 1960, foi 4º colocado na corrida 100, não
tendo vivido para ver a corrida 200. Outro grande nome dos anos 1960, Jack
Brabham, correu apenas nesta 100ª prova, onde acabou abandonando. E Juan Manuel
Fangio, um dos maiores nomes da F-1 em toda a sua história, correu apenas na
primeira década de existência da F-1, antes que a categoria chegasse à sua 100ª
corrida.
Ayrton Senna, Alain Prost e Michael Schumacher: os três grandes campeões nunca conseguiram vencer uma prova centenária da F-1. |
Em compensação, três
provas foram vencidas por tricampeões mundiais: Jackie Stewart (200ª prova);
Niki Lauda (400ª prova), e Nélson Piquet (500ª corrida). Giancarlo Fisichella
foi o único piloto não-campeão da F-1, ao lado de Stirling Moss, a vencer uma
prova centenária, e o piloto de menor currículo neste sentido, ao passo que o
inglês averbou 4 vice-títulos; além de Ronnie Peterson, que ainda foi
vice-campeão no ano em que venceu a 300ª prova, mesmo tendo falecido antes do
final da temporada. Dos campeões, Jacques Villeneuve foi o único a ser campeão
apenas uma vez, Fernando Alonso foi bicampeão mundial, e Lewis Hamilton é
atualmente pentacampeão, ainda em atividade, e com chances de se tornar o maior
vencedor da história da categoria.
Por provas, a Lotus
foi quem mais venceu, com 2 triunfos, obtidos por Moss em 1961, e Peterson, em
1978. Todas as outras corridas foram vencidas por equipes que não conseguiram
repetir o feito: A Tyrrel venceu em 1971; a McLaren triunfou em 1984; a
Benetton venceu em 1990; a Williams faturou em 1997; a Jordan deu sorte em
2003; e a Renault conseguiu seu triunfo em 2008. A Mercedes, vencedora da prova
900, tem chance de igualar a marca da Lotus neste domingo, caso um de seus
pilotos vença a corrida. Único time remanescente dos primórdios da F-1, a
Ferrari jamais venceu uma corrida centenária em todos estes anos. No seu maior
período de domínio, entre 2000 e 2004, Michael Schumacher abandonou a corrida
700, como já mencionei, e Rubens Barrichello, que tinha boas chances de vencer
a corrida, e tornar-se o segundo piloto tupiniquim a vencer uma destas provas,
abandonou com uma bizarra pane seca sobre a qual até hoje pairam dúvidas sobre
o erro cometido pelo time no box, dada a competência da escuderia italiana
naqueles tempos. Há quem afirme que, se vencesse a corrida, Barrichello ficaria
à frente de Schumacher no campeonato, e isso poderia mexer com os brios do
alemão, que não gostava de ser desafiado por seus companheiros de equipe, e por
isso, o “erro” que teria acometido o piloto brasileiro, uma vez que Michael
havia rodado e batido com o carro na pista molhada naquele dia. Segredos de
bastidores que provavelmente nunca saberemos a verdade...
Mas o time rosso, a
manter a boa forma exibida em Sakhir há duas semanas, tem boas chances de
finalmente sair da fila, e inscrever o nome da mais tradicional escuderia da
F-1 no rol das vencedoras de corridas centenárias da categoria. Seria merecido,
pela história da equipe italiana na competição. Afinal, se o destino premiou
até mesmo a modesta Jordan com um triunfo, ainda que oriundo de um resultado
obtido em uma corrida maluca, por que não o time de Maranello? E, sem
desmerecer o time de Eddie Jordan, todos as escuderias que venceram GPs
centenários fizeram por merecê-lo, além de serem grandes forças da F-1 em suas
melhores épocas. A Lotus, até quebrar em 1994, era a grande adversária da
Ferrari nas estatísticas de sucesso da F-1, posto que seria ocupado por Williams,
e depois pela McLaren. A Renault tinha enorme tradição, e já tinha tido seu
período de domínio como fornecedora de motores, e a Mercedes, antes de vencer a
última prova centenária, já havia sido campeã nos anos 1950, e nos anos 1990 e
2000 como fornecedora de motores para a McLaren e a Brawn GP. E muitos podem
nem lembrar mais da Tyrrel, mas a escuderia, em seus primeiros anos, foi uma
força respeitada na F-1...
A pista de Shanghai, na China, será o palco do milésimo GP. |
Independente de quem
vença a corrida, a torcida de todos é por uma grande prova, com muitos duelos,
brigas por posições, e um grande show, como já foram outras provas centenárias.
A pista é boa, e no Bahrein as novas regras técnicas ajudaram os pilotos a
batalharem com mais facilidade pelas posições na pista, sem sofrerem tanta
turbulência aerodinâmica quanto nos últimos anos. Com um pelotão intermediário
onde as brigas prometem correr soltas, uma Ferrari que pinta como possível
grande favorita, mas com a Mercedes pronta para aproveitar as oportunidades que
surgirem, além de uma Red Bull procurando chegar mais perto, temos boas chances
de vermos uma corrida de entusiasmar. Que as expectativas possam se confirmar,
e a F-1 comemore dignamente a sua milésima corrida.
E, a partir daí,
começa a contagem regressiva rumo ao 2.000º GP...
A F-E chega à Europa para dar
seguimento ao seu campeonato, e a primeira parada é Roma, a capital da Itália.
O canal pago FoxSports 2 começa a transmissão da etapa a partir das 9:45 Hrs.
da manhã deste sábado, com um apanhado geral dos treinos livres e da classificação,
para depois entrar com a corrida ao vivo. A competição segue sem um favorito
destacado, e o português Antonio Félix da Costa, da BMW Andretti, defende a
liderança da competição com 62 pontos, apenas 1 a mais que o belga Jerôme
D’Ambrosio, da Mahindra. Um pouco mais atrás, mas com os líderes em sua alça de
mira, estão o francês Jean-Éric Vergne, da Techeetah, o atual campeão da
categoria; o inglês Sam Bird, da Virgin; e o brasileiro Lucas Di Grassi, da
Audi ABT. Até agora, nenhum piloto conseguiu vencer mais de uma corrida na
temporada. Será que a escrita será quebrada em Roma? Ou será que poderemos ter
mais um vencedor na temporada? Pelo que se viu até agora, tudo pode acontecer
na pista, e quanto mais gente disputando as primeiras colocações, melhor.
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