E terminou o campeonato da Fórmula 1 de 2022. Uma temporada que inaugurou uma nova era de carros, visando mais disputas e mais equilíbrio na categoria máxima do automobilismo. Podemos dizer que, pelas promessas feitas, nem tudo se concretizou conforme o esperado. Na verdade, em termos de disputa pelo título, a temporada deste ano ficou aquém da de 2021. Se o resultado da temporada do ano passado ainda é motivo de dúvidas e discussões acaloradas, pela maneira como ocorreu nas voltas finais da etapa de Abu Dhabi, que acabou coroando Max Verstappen campeão mundial, não há o que discutir com relação aos méritos do holandês este ano, onde Max nadou de braçada rumo ao título, e ainda se tornou o novo recordista de vitórias em uma mesma temporada, com 15 triunfos, deixando para trás a antiga marca alcançada por Michael Schumacher e Sebastian Vettel, com 13 vitórias em um mesmo ano. O holandês é o mais novo bicampeão da história da F-1, e tem pretensões de manter o seu domínio no próximo ano, onde todos esperam que a história seja bem diferente de 2022.
De início, pensávamos que teríamos mesmo mais disputas. Se a Red Bull vinha forte, a Ferrari mostrava vir ainda mais forte, e com relação à Mercedes, sempre ficava a expectativa do time alemão fazer um teatrinho na pré-temporada para não assustar os rivais antes da hora. E, claro, esperava-se que os demais times soubessem aproveitar o novo regulamento técnico para incrementar sua performance, descobrindo como interpretar melhor o novo regulamento para chegar mais à frente, e engrossar a competição. É bem verdade que os resultados da pré-temporada já indicavam que nem tudo seria assim, mas como teste é teste, e corrida é corrida, era preciso esperar pelos primeiros GPs para vermos o que de fato aconteceria.
E, quando o campeonato começou, vimos que teríamos de fato briga pelo título, mas não como se esperava. Se a Ferrari confirmou sua grande forma dos testes, a Red Bull vinha como principal desafiante, calcada no talento de seu novo campeão mundial, que podia fazer a diferença na pista. Apesar da quebra nas primeiras provas, ninguém duvidava que o time dos energéticos viria para lutar a sério, pois a escuderia tem um histórico de saber desenvolver bem o seu carro durante a temporada, mesmo largando um pouco atrás. Já a Mercedes, bem... O time alemão, depois de oito campeonatos de construtores e sete de pilotos consecutivos, errou a mão do seu novo projeto, e até uma reviravolta inesperada, estava condenador ao papel de coadjuvante na competição deste ano, sem condições de disputar a vitória, ou mesmo o título, ainda que alguns pódios indicassem que a situação não era assim tão ruim. Só que isso deixava as brigas por vitórias e pelo título entre Ferrari e Red Bull, somente dois times, assim como tínhamos visto em 2021. Podia ser melhor, mas também podia ser pior.
No que tange aos times do segundo pelotão, infelizmente todos eles desperdiçaram suas oportunidades de saberem interpretar melhor o regulamento novo para aprimorarem seus desempenhos. Se é verdade que Haas, que foi o pior time do ano passado, e até Alfa Romeo, melhoraram seus desempenhos, por outro lado, vários outros times decaíram, ou simplesmente estagnaram em termos de desempenho. Isso provocou boas brigas no pelotão de trás, já que ninguém parecia conseguir exibir um desempenho constante, tornando as disputas por ali bem imprevisíveis. Por outro lado, contudo, estes times não conseguiram se aproximar dos carros mais rápidos, muito pelo contrário. Red Bull e Ferrari dispararam na frente, e durante algum tempo, até mesmo a Mercedes se viu mais para trás, tendo de duelar com times do pelotão intermediário.
O jeito era torcer para que o binômio Ferrari/Red Bull ao menos nos proporcionasse o mesmo duelo renhido que tínhamos visto em 2021, entre Red Bull/Mercedes. Motivos para isso não faltavam, já que a escuderia italiana tinha se resignado a um papel secundário no ano passado para centrar esforços e vir com tudo para este ano visando voltar a vencer e a lutar pelo título. E, nas primeiras corridas, mostrava que a decisão tinha sido bem avaliada e aproveitada. Era um duelo que prometia, afinal, Verstappen defendia seu título, ao lado de um Sergio Pérez bem mais à vontade com o novo carro da Red Bull que, se não fosse tão bom quanto o companheiro de time holandês, pelo menos poderia vencer corridas e também duelar contra a dupla da equipe de Maranello, que por sua vez, estava em sua melhor posição em muitos anos para mostrarem do que eram capazes. Tendo Charles LeClerc como grande nome para desafiar Verstappen na pista, e Carlos Sainz Jr. Mostrando competência para conseguir resultados, a Ferrari queria encerrar o seu jejum de títulos que já vem desde 2007. As primeiras corridas mostraram um carro Ferrari muito rápido e eficaz, enquanto a Red Bull não poderia ser subestimada, ainda que a fiabilidade pudesse comprometer resultados potenciais. Ao restante, Mercedes, inclusive, só restava assistir de camarote, e cuidarem de seus próprios problemas na pista, em duelos entre si mesmos.
Mas aí, tudo pareceu se inverter. A Ferrari começou a apresentar problemas, justamente de fiabilidade, enquanto a Red Bull não apenas resolveu os seus, e mostrava uma velocidade absurda, com um Verstappen afiado ao máximo. Ainda havia como o time de Maranello se manter firme na briga, mas como desgraça pouca é bobagem, eis que seus pilotos também começaram a cometer erros, e num duelo contra o time dos energéticos, qualquer falha seria fatal, e estes percalços fizeram o favoritismo não apenas se inverter, mas deixando a Ferrari não como desafiante, mas como até azarão da temporada. Verstappen começou a enfileirar vitórias, sendo que algumas pareceram muito fáceis, para desgosto dos tiffosi, que viram seu time favorito começar a se perder sozinho conforme a temporada avançava, onde seus esforços para evoluir o carro hora davam resultados insuficientes, ou inconstantes, hora seus pilotos se atrapalhavam, sozinhos, ou por conta de estratégias equivocadas do time, jogando resultados plenamente alcançáveis ficarem a ver navios. Max Verstappen, que ficara muitos pontos atrás de LeClerc no início da temporada, agora abria vantagem cada vez maior, tornando uma recuperação do monegasco, e da própria Ferrari, cada vez mais complicada.
As férias de agosto poderiam mudar o panorama, mas o que se viu depois foi uma Red Bull, pelo menos no carro de Verstappen, cada vez mais rápida, com o atual campeão mundial deitando e rolando em vários GPs, enquanto a dupla Ferrarista lutava para não perder o rival de vista, que ia ficando cada vez mais distante, com a Red Bull também se distanciando bastante no campeonato de construtores. Ficaria a Ferrari novamente a morrer na praia, depois de começar o ano com tão boa forma, e ter mais um ano de jejum? Corrida a corrida, infelizmente, a resposta era cada vez mais desalentadora. Alguns espasmos de recuperação até surgiram, mas foram insuficientes para reverter a maré que se desenhava, de que o bicampeonato de Verstappen não era apenas possibilidade, mas de quando o holandês encerraria a fatura, o que ocorreu na etapa do Japão, oferecendo à Honda, ainda a fornecedora das unidades de potência do time austríaco, um momento sublime de comemoração de uma conquista do título vista pela última vez em 1991, com Ayrton Senna e a McLaren, na mesma pista de Suzuka, que voltava ao mundial depois de dois anos de ausência, em virtude da pandemia da Covid-19.
Para se ter uma idéia da situação em que a Ferrari se viu, até mesmo sua posição de vice-líder na competição chegou a ficar em risco. A Mercedes, depois de uma primeira metade de ano complicada, se aprumou, e se isolou como terceira força, conseguindo pódios, aproveitando os azares dos rivais, especialmente dos pilotos do time italiano, e encostando em sua dupla na pontuação. George Russell confirmava seu grande talento, e Lewis Hamilton, depois de um início claudicante, retomavava sua melhor forma. O desempenho do modelo W13 da Mercedes, contudo, limitava as chances de vôos mais altos, mas alguns brilhos, aqui e ali, de sua dupla de pilotos, mostrava que se a Ferrari não se aprumasse, poderia até ser superada pelo time alemão. Para o time de Brackley, seria um grande prêmio de compensação em um ano complicado, mas para os italianos, seria uma derrota humilhante, de favoritos na competição para terminarem em 3º lugar. É verdade que a escuderia italiana deu algumas vaciladas, e a Mercedes até conseguiu sua primeira vitória no ano, aqui em Interlagos, com direito a dobradinha de seus pilotos. Será que a Ferrari iria descambar assim?
Para sorte dos ferraristas, o desempenho inconstante do carro da Mercedes ainda limitou que o time alemão concretizasse o feito, de modo que LeClerc, apesar dos pesares, conquistou o vice-campeonato, enquanto Sergio Pérez fracassou neste intento, no que seria o primeiro 1-2 da Red Bull na F-1. O mexicano, contudo, foi ficando para trás, conforme o desenvolvimento do modelo RB18 ficava cada vez mais ao gosto de pilotagem de Verstappen, com Pérez voltando a ter desempenhos não tão inspirados como os do início do ano. Para a Red Bull, pouco importou, já que foram novamente campeões, e graças aos desmandos da Ferrari e seus pilotos, o time conquistou também o título de construtores, o que não fazia desde 2013. Se é verdade que Sergio ficou devendo em algumas corridas, por outro lado ele não teve o apoio do time para chegar ao vice-campeonato como deveria, inclusive com Max recusando-se até expressamente a ajudar seu companheiro de time, atitude que só ajudou a inflamar as críticas o comportamento do novo bicampeão mundial, que já tinha fechado a disputa pelo título com sobras. Mesmo assim, Pérez terminou o ano em 3º lugar, o que não é exatamente pouco.
Na Mercedes, George Russell teve uma temporada extremamente positiva, terminando o ano em 4º lugar, enquanto Lewis Hamilton foi apenas o 6º, em uma temporada onde o heptacampeão teve alguns azares além da conta, mas também deixou a desejar em algumas provas, quando não conseguiu domar seu problemático carro como deveria. Entre eles, Carlos Sainz foi o 5º colocado, posição que se não é ruim, poderia ter sido melhor, se não tivesse incorrido em alguns erros e azares que o distanciaram de LeClerc no campeonato, e facilitaram a derrota da Ferrari para a Red Bull.
Na disputa pelo “melhor do resto”, tivemos um duelo entre a Alpine e McLaren, com o time francês ficando com a 4ª posição no campeonato, depois de um renhido duelo com o time de Woking durante boa parte do ano. Se nos últimos anos a McLaren vinha crescendo de produção, terminando no TOP-3, e ano passado, sendo superada no finalzinho pela Ferrari, era de se esperar que a escuderia desse o salto definitivo para voltar a ser protagonista na competição. Mas, o carro de 2022 não correspondeu às expectativas, e o time, ao invés de se aproximar dos ponteiros, na verdade caiu para trás. Já a Alpine, por sua vez, pouco melhorou em relação a 2021, tendo terminado à frente da McLaren mais por queda do time inglês do que propriamente por uma evolução de sua performance, que de fato melhorou, mas apresentou uma confiabilidade questionável durante boa parte do ano.
Aliás, é preciso mencionar que os dois times praticamente tiveram uma performance desigual em termos de sua dupla de pilotos. Na McLaren, Lando Norris tirou leite de pedra do complicado modelo MCL36, conquistando a imensa maioria dos pontos do time, terminando o ano em uma honrosa 7ª colocação com 122 pontos, enquanto Daniel Ricciardo foi uma grande decepção, com o australiano fechando o ano com um pífio 11º lugar, e meros 37 pontos. Foi demais para a McLaren, que preferiu romper amigavelmente o contrato de Daniel para colocar Oscar Piastri, nova promessa da Austrália, em seu lugar para 2023. A falta de resultados de Ricciardo foi fatal para a derrota da McLaren frente a Alpine no mundial de Construtores, mas o time francês também teve sua cota de falta de resultados. Daniel, até recentemente visto como piloto campeão em potencial, teve um declínio inexplicável em Woking, e perdeu sua posição no grid. Restou-lhe retornar à Red Bull, onde ocupará a posição de piloto reserva e de desenvolvimento em 2023, esperando por uma oportunidade de voltar ao grid em 2024.
Fernando Alonso teve excelentes performances com a Alpine durante o ano, mas em várias corridas o esforço do espanhol foi por água abaixo por quebras e azares diversos.
Na Alpine, Esteban
Ocón foi o 8º classificado, com 82 pontos, imediatamente à frente de seu
companheiro Fernando Alonso, em 9º, com 81 pontos. Foi um bom ano do piloto
francês, sem sombra de dúvidas, mas quem teve as melhores performances na
escuderia francesa foi o espanhol, que infelizmente acabou vitimado por
inúmeras quebras em seu carro, quando não sofreu por conta de azares alheios a
seu controle. Foram oito provas onde o asturiano ficou a ver navios, sendo que
em algumas delas ele vinha para resultados bem significativos, que poderiam ter
deixado o duelo com a McLaren muito mais fácil, e terminado bem mais à frente
de Ocón, que chegou a se desentender com o espanhol na pista em disputa de
posições, com direito a bronca da direção do time em sua dupla de pilotos.
A Alpine, aliás, mostrou vários erros na temporada, não apenas na pista, onde errou sua estratégia de corrida em várias provas, mas também fora dela, como demonstrou no caro de Oscar Piastri, quando acabou perdendo o seu piloto para a McLaren por não ter sabido aproveitá-lo melhor quando tinha a oportunidade. O time também tratou Alonso com certo descaso com relação à renovação do contrato do bicampeão, mesmo sabendo do empenho e das performances que o espanhol, mesmo sendo o piloto mais velho do grid, ainda é capaz de oferecer, como vimos ao longo do ano. O time francês perdeu nas duas frentes: viu Piastri se mandar para a McLaren, e perdeu também Alonso, que se mudou de mala e cuia para a Aston Martin. Restou-lhes a consolação de contratar Pierre Gasly, que foi o único a ganhar algo neste rolo todo.
Termino por aqui a primeira parte de minha avaliação da temporada. Na coluna da semana que vem, falarei dos demais times, e de como a categoria máxima do automobilismo se portou neste ano, onde tivemos algumas coisas a comemorar, mas também muitas a lamentar. Até lá...
Dispensado pela McLaren, onde nunca conseguiu se encontrar direito nestes últimos dois anos, para surpresa geral de todos, Daniel Ricciardo acabou tomando o destino mais inusitado: retornar à Red Bull, onde será o piloto reserva e de desenvolvimento do time, tendo sido saudado o seu retorno à escuderia, de onde saiu ao fim de 2018, descontente com as preferências cada vez mais descaradas do time para com Max Verstappen. O australiano dava luta ao holandês, sendo um piloto muito mais cerebral e menos encrenqueiro na pista, o que equilibrava a disputa entre os dois pilotos, enquanto Verstappen era velocidade e arrojo puro, mas arrumando confusão aqui e ali, chegando inclusive a bater no próprio companheiro de time em algumas provas. O australiano fez um trabalho bem satisfatório na Renault nas temporadas de 2019 e 2020, e tudo indicava que estava em uma aposta certeira com a McLaren para os anos seguintes. Não deu certo, e agora, para muitos, Daniel volta com o rabo entre as pernas ao time onde brilhou, esperando por uma nova oportunidade. Será que vai conseguir? Só o futuro dirá...
Daniel Ricciardo (acima) despencou na temporada 2022, sendo dispensado da McLaren, enquanto Lando Norris (abaixo) fez milagres com o carro de Woking.
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