Voltando a trazer mais um texto
sobre as pistas que sediaram provas da Fórmula 1, hoje falarei um pouco de
Detroit, cidade que teve o privilégio de assistir a sete edições de um Grande Prêmio
de F-1, nos anos 1980. Recebida com certa expectativa quando estreou na
competição, logo pilotos e equipes viram que a prova na “capital” mundial do
automóvel não seria exatamente o evento mais esperado do calendário da
categoria máxima do automobilismo. Confiram no texto abaixo, e boa leitura a
todos...
DETROIT
Nação mais
rica do mundo, fica difícil de entender porque os Estados Unidos tiveram tantas
dificuldades em certas épocas de se manterem no calendário da F-1. Um imenso
mercado que, em várias temporadas, não esteve presente no calendário da categoria
máxima do automobilismo. Mas, com um automobilismo nacional pujante, quem
precisava da F-1, afinal? Campeonatos como a Nascar e a própria F-Indy já davam
conta de entreter o público ianque, e assim por muitos anos, desde que a F-1
saiu de Watkins Glen, os Estados Unidos marcaram presença ainda por vários anos
em pistas que ficaram marcadas pela ojeriza e raiva dos pilotos. Afinal, em um
país que contava com excelentes pistas como a já citada Watkins Glen, e
circuitos como Elkhart Lake, a teimosia da F-1 em continuar se aventurando em
pistas de rua era meio incompreensível. Talvez o charme e sucesso da corrida
disputada nas ruas de Long Beach, balneário ao sul de Los Angeles, tenha
deixado a turma achando que bom mesmo era correr nas ruas das cidades norte-americanas.
Bom, Long Beach até tinha seu charme, mas ficou por aí. Outras pistas, como Las
Vegas e Dallas, foram um horror, e quem teve chance de correr nelas nunca
morreu de saudade quando as mesmas deixaram de fazer parte do mundial.
E olhe que a F-1 até que foi
bem condescendente com as pistas norte-americanas de rua na década de 1980, a
ponto de incluir Detroit, a capital mundial do automóvel, no calendário do
campeonato de 1982, fazendo com que os Estados Unidos sediassem naquele ano
nada menos do que três corridas: além da nova pista de Detroit, tínhamos também
a já mencionada Long Beach, e a prova de Las Vegas. A corrida em Detroit foi
uma jogada para melhorar a imagem da cidade, cuja fama de capital mundial do
automóvel já começava a decair, com consequências bem mais nefastas que viriam
a se consolidar anos mais tarde.
O circuito
foi montado no centro de Detroit, para variar, mais uma pista de rua,
localizada ao lado do Renaissance Center, ao lado do Rio Detroit. Com uma
extensão de 4,168 Km, e cerca de 20 curvas, a maioria em 90º, o traçado até foi
recebido com certa moderação pelos pilotos, mas não demorou para o circuito
definitivamente não agradar aos pilotos. Além do piso irregular, para não
mencionar nos afamados bueiros que as ruas possuíam, o traçado era estreito, e
tal qual Mônaco, os guard-rails não perdoavam erros dos pilotos, nas curvas
apertadas e às vezes cegas do traçado. Isso para não mencionar as já conhecidas
dificuldades de ultrapassagem que uma pista destas apresentava, uma vez que
seus trechos de reta eram curtos, e quem quisesse ganhar posição tinha que ir
na raça e no risco, torcendo para o piloto da frente não complicar a situação. Logo
Detroit se tornou a pista mais extenuante e complicada do calendário, pois além
das dificuldades impostas pelo traçado, o forte calor na época de disputa do GP
tornava a prova ainda mais desafiadora, com os carros a serem levados ao limite
de suas resistências mecânicas, isso quando os pilotos não erravam as freadas e
carimbavam seus bólidos nos muros. Ou quando tentativas de ultrapassagem não
eram bem sucedidas, e os pilotos acabavam se enroscando uns nos outros,
oferecendo a seus mecânicos motivos para também detestarem a pista. Mas, Mônaco
era também desafiadora a tal ponto. Qual o problema de Detroit? Talvez o fato
de não ter nem um décimo do charme de Monte Carlo. Na verdade, não tinha charme
algum, na opinião de muitos. Mas a F-1 correndo na “capital” mundial do
automóvel era uma boa ferramenta de marketing, não? Portanto, lá iam os pilotos
e seus times para correr no fim de semana.
Pelas
dificuldades que o circuito impunha a carros e pilotos, por vezes algumas
surpresas apareciam. Na primeira corrida, disputada em 1982, a vitória ficou
com John Watson, com McLaren/Ford, após ter largado em 17º. A pole-position
tinha sido de Alain Prost, com Renault, com o tempo de 1min48s537, com o
francês também marcando a volta mais rápida da corrida, com a marca de 1min50s438.
A corrida de 1982, contudo, foi a única disputada na configuração original do
circuito. Para 1983, visando deixar a pista mais rápida e menos travada, uma
chicane foi abolida, criando um trecho mais “reto” no que virou a nova curva 5
do traçado, que passou a ter 18 curvas no total, e uma extensão um pouco menor,
de 4,023 Km.
Com a nova
configuração, a pista ficou de fato mais veloz (ou menos lenta, como
preferirem). A pole em 1983 foi de René Arnoux, com Ferrari, com o tempo de
1min44s734, quase 4s mais rápido do que no ano anterior. A nova melhor volta
foi de John Watson, com o tempo de 1min47s668. O que não deu foi tornar a pista
mais agradável a equipes e pilotos, que continuaram não gostando do local. Até
1984, o circuito abrigou o GP dos Estados Unidos-Leste, uma vez que até 1983, a
prova em Long Beach era chamada de GP dos Estados Unidos-Oeste. Em 1984, a
prova de Dallas levou o nome de Grande Prêmio dos Estados Unidos, nome que
passou a ser do GP em Detroit a partir de 1985. E assim foi até 1988, quando
Detroit sediou pela última vez seu GP de F-1. A FIA exigia melhorias no
circuito, além de estruturas permanentes de boxes, o que a cidade
definitivamente não tinha interesse em providenciar, de modo que o circuito
citadino à beira do Rio Detroit nunca mais viu os carros da categoria máxima do
automobilismo.
Tentou-se fazer um
acordo para transferir o local da prova para uma pista que seria montada no
Belle Isle Park, em uma ilha no meio do Rio Detroit, mas as conversas não
chegaram a um acordo. Curiosamente, assim como ocorrera com a prova de Long
Beach, a pista de Detroit também passou a sediar corridas da antiga F-Indy,
utilizando praticamente o mesmo traçado da F-1, com exceção da chicane do meio
da reta dos boxes, que providenciou uma excelente reta que poderia ter agradado
ao pessoal da F-1 quando de suas provas. Mas mesmo a turma da F-Indy não curtiu
por muito tempo a pista no centro da cidade, e no início da década de 1990, as
corridas passaram a ser realizadas na Belle Isle, em um acordo que finalmente
permitiu a realização de corridas no local, mas com a F-Indy. Hoje, o traçado
montado na Belle Isle ainda está presente no calendário da atual Indycar.
Quando à
F-1, esta deixou Detroit para nunca mais retornar, e foi se aventurar em outra
pista de rua (mais uma) que também não deixaria saudades em ninguém na
categoria, montada nas ruas da cidade de Phoenix, no Estado do Arizona, que
também durou muito pouco tempo, e falarei dela em outro momento. Em relação à
pista de Detroit, os brasileiros tiveram seus momentos nela. Nélson Piquet,
apesar de detestar aquela pista, conseguiu uma bela vitória com a Brabham/BMW
em 1984, numa corrida que “demoliu” a maior parte dos concorrentes, com apenas
cinco carros a cruzarem a linha de chegada. Já Ayrton Senna foi o vencedor das
últimas três edições da corrida, de 1986 a 1988, primeiro com a Lotus/Renault,
e depois com Lotus/Honda, e por fim, com McLaren/Honda. O recorde da
pole-position é de Senna, com a marca de 1min38s301, obtido em 1986. Já o
recorde da melhor volta em corrida também pertence ao brasileiro, com o tempo
de 1min40s464, obtido em 1987. O fato das marcas mais velozes não terem sido
obtidas na última corrida tem a ver com o estado do piso do traçado, que em
1988 estava muito, muito ruim, tendo recebido várias críticas dos pilotos, e este
foi outro dos motivos pelos quais a corrida não foi mais realizada na cidade.
No ano em
que venceu a prova, Nélson Piquet também largou na pole-position. Já Ayrton
Senna marcou a pole em três oportunidades, em 1985, 1986, e 1988. Em 1985, a
vitória acabou com Keke Rosberg, da Williams/Honda. Em 1983, outra surpresa na
corrida de Detroit foi a vitória de Michele Alboreto, no que foi a última
vitória da história da equipe Tyrrel, e por algum tempo a última vitória do
clássico motor Ford Cosworth na F-1.
Nenhum comentário:
Postar um comentário