"Ou sai da frente ou eu passo por cima": ameaça presumida levada às vias de fato...
E eis que Lewis
Hamilton e Max Verstappen se estranharam novamente na pista, e desta vez, com
ambos a ficarem de fora do Grande Prêmio da Itália. E, mais uma vez, vimos as
acaloradas discussões a respeito de quem tem mais culpa no cartório pelo
incidente ocorrido na primeira variante da pista de Monza, local profícuo para
competidores se enroscarem entre si nas disputas de posição. Isso acabou
deixando a situação de ambos os pilotos inalterada no campeonato, com o
holandês mantendo a liderança da competição, por 5 pontos de vantagem sobre o
inglês. Pelo incidente, os comissários aplicaram uma punição a Verstappen, que
perderá 3 posições no grid de largada na próxima corrida, no fim de semana que
vem, na Rússia.
Depois da “crucificação” feita sobre Hamilton pelo ocorrido na Curva Copse na pista de Silverstone, em julho, é engraçado ver o pessoal da Red Bull quietinho agora, aceitando prontamente que foi um “incidente de corrida” entre ambos. Depois de quase exigirem que Hamilton fosse chicoteado em praça pública, e pedirem até seu banimento da F-1, nada explica melhor a atitude da cúpula rubrotaurina do que a fala de Andrew Shovlin, diretor da Mercedes, que afirmou que “Se Christian e Helmut não o acusaram, é porque sabem que Max estava errado, já que tentam culpar Lewis por qualquer coisa em qualquer oportunidade.” E pouco chiaram a respeito da punição recebida pelo holandês, o que deixa tudo ainda mais contundente em se tratando de quem foi o culpado pelo ocorrido. Ou porque a cúpula da Red Bull viu que seria impossível atribuir a culpa novamente ao piloto da Mercedes, como cansaram de estrebuchar após o incidente de Silverstone...
Mais cristalino, impossível. E infelizmente, eles criaram esse problema com Verstappen, quase sempre passando a mão na cabeça dele pelas estripulias na pista. Mas muita gente também fez isso, entre os torcedores, sob a justificativa de elogiar o arrojo e a postura destemida do holandês, como forma de tentar dar algum agito em uma F-1 dominada pela hegemonia da Mercedes nos últimos anos. Não há problema em ser arrojado, mas convenhamos, em alguns momentos, é preciso saber dosar o acelerador.
E é curioso que, neste ponto, Verstappen parece ter sinal verde para fazer o que quiser na pista, enquanto Hamilton, por outro lado, já foi chamado até de “assassino” pelo incidente de Silverstone, acusado de ter premeditado o acidente com o piloto holandês. O que ocorreu domingo passado na Itália, apesar da baixa velocidade, poderia ter tido consequências tão ou até mais sérias do que vimos na Inglaterra, com o Halo a salvar a cabeça de Lewis, de forma literal, como se pode ver nas imagens e fotografias do momento em que a Red Bull se enrosca em cima da Mercedes do heptacampeão. E, claro, ainda tem gente dizendo que a culpa em Monza foi, mais uma vez, de Hamilton, que “não deixa espaço” para Max na pista...
A Variante del Rettifilio, ou a primeira chicane em Monza é palco contado de incidentes entre pilotos. Sempre alguém se estranha com alguém por ali, e neste ano não foi exceção...
Bom, tem gente que
parece cega mesmo. No início da corrida, em disputa roda a roda, Max não deu
espaço para Lewis, que recuou, passou pela área de escape, perdeu uma posição,
e retomou a corrida. E em outras corridas, Hamilton havia também recuado, para
não se envolver em acidente com o holandês. O problema é que não dá para ficar
recuando sempre. Se por um lado, na pista, um piloto tem a obrigação de buscar
aproveitar qualquer oportunidade que se apresente para ganhar uma disputa de
posição numa corrida, por outro lado, quem vai à frente tem o direito de se
defender, dentro de um limite ético e de respeito. Em Monza, Hamilton conseguiu
entrar à frente na chicane, mas Verstappen tentou forçar a ultrapassagem ali
mesmo. E Hamilton não tinha obrigação de dar espaço, ainda mais fazendo o
tangenciamento da curva, que ficou um pouco mais aberto pelo ângulo em que
entrou na variante. Incidente de corrida. Acontece. Como da mesma forma
classifico o ocorrido em Silverstone, para ódio de muitos que defendem outra
coisa, com dentes cerrados.
É engraçado como falam as coisas mais esdrúxulas, como “Hamilton está desesperado, porque está perdendo o duelo”, ou “Hamilton está levando uma surra e está apelando”, entre outras coisas. Estamos vendo um duelo acirrado entre duas estrelas da F-1. Nada mais natural do que o pessoal tomar seu lado neste duelo que é o mais vigoroso da categoria máxima do automobilismo em muitos anos. De um lado, o grande campeão reinante, Hamilton, do alto de seus sete títulos mundiais, do outro, o desafiante e aspirante a novo rei, Verstappen, tido como o piloto mais veloz da F-1 atual. E que vença o melhor, certo? Em teoria, sim. Mas estamos vendo também os ânimos entre os torcedores ficarem inflamados, e com gestos de cada um dos pilotos servindo de argumento para todo tipo de bate-boca, seja físico, seja virtual. Querem um exemplo? Lewis disse que Verstappen nem se preocupou em ver se ele estava bem dentro do carro depois do incidente. O holandês retrucou que se o inglês deu marcha a ré, tentando sair dali, é porque ele estava bem. Não está errado. Se ele não quis verificar, bem, é problema dele. E acusam Hamilton de ter comemorado a vitória em Silverstone depois de ter mandado Verstappen para o hospital, com o incidente na Copse. Mas esquecem que o inglês já tinha perguntando à sua equipe se Max estava bem, portanto, seguiu em frente. E duvido que Verstappen não fizesse o mesmo, de seguir em frente. Se ia perguntar pelo estado do adversário, já são outros quinhentos. Discordar da postura de cada um deles é direito de todo mundo, mas o que não vemos é uma discussão saudável, mas uma queda de braço, onde uma visão obrigatoriamente exclui a outra, e por aí vai. E não precisa ser assim.
Nem Verstappen nem Hamilton são santinhos, e livres de defeitos. Hamilton já teve épocas conturbadas na F-1, e tinha uma postura que incomodava muita gente também, cometendo erros que poderia evitar, e que ajudaria a ter uma melhor imagem perante muitos. Mas, quem não erra? Ele evoluiu, e se é verdade que contar com um carro dominante nos últimos anos ajudou a evitar se envolver em algumas confusões, não se pode ignorar que ele amadureceu. E usa de sua posição de grande astro do esporte para abraçar algumas causas mundo afora que muito precisam de apoio e visibilidade. Isso divide opiniões, obviamente, mas pelo menos, ele toma alguma posição, mesmo que alguns chamem-no de falso e hipócrita. Novamente, querem que ele seja 100% santo ou coerente, e somos apenas humanos. Não somos perfeitos, e nunca seremos. Mas podemos aprender a errar menos. Ficar em cima do muro, querendo agradar a gregos e troianos, é muito pior...
No caso de Verstappen, ele se acostumou a intimidar os outros na pista, nas disputas de posição, jogando o carro em cima, como que dizendo “sai da frente ou eu passo por cima”. Ayrton Senna também fazia isso, e em seus tempos na F-3, apesar de sua campanha vitoriosa na categoria britânica, seu estilo de pilotagem era temerário, e ele se envolveu em alguns acidentes por causa desse estilo, chegando até mesmo a subir no carro de Martin Brundle numa disputa, de forma similar ao ocorrido entre Verstappen e Hamilton. Na F-1, o brasileiro precisou mudar um pouco o seu estilo, e aprender que por vezes, recuar não é demonstrar fraqueza. Ele aprendeu a ser mais tático e cerebral, e isso não o tornou menos veloz. Verstappen, pelo tempo que tem na F-1, já deveria ter aprendido esta lição. Mas parece que não, ou não quer adotar esta postura. E, da mesma forma, não dá espaço para ser ultrapassado, por vezes com agressividade até exagerada, mostrando que não aceita de modo algum ser ultrapassado. OK, ninguém gosta de ser superado, mas não dá para levar isso a extremos também. Fica perigoso se for agressivo demais tanto para ultrapassar, como para impedir de ser ultrapassado. E aceitar ultrapassagem não é querer ser entreguista ou derrotado, como pode parecer.
Extremamente arrojado, o holandês já arrumou encrenca com vários pilotos, especialmente por se “atirar” literalmente em cima dos adversários na hora de brigar por uma posição. Sua postura de “se não recuar nós batemos” precisa ser revista, porque em muitos momentos, os rivais não vão mais aliviar, ou vão preferir bater, porque tudo tem limites. Hamilton, por exemplo, já relevou certas atitudes, preferindo evitar prejuízos. Mas, porque ele tem que ceder sempre? Se ele não quiser mais dar espaço para divididas na pista, desde que não faça isso de maneira desleal, é um direito dele. Mas, quando faz isso, o inglês passa a ser tachado de sujo, desleal, farsante, entre outros adjetivos menos elogiosos. Já Verstappen, quando faz o mesmo, é arrojado, destemido, tem braço, etc. Nada disso. O pessoal vem tratando a situação com dois pesos e duas medidas, e isso é errado. Mas, ou preferem ignorar isso, ou serem parciais mesmo. E isso ocorre tanto com torcedores de Hamilton quanto de Verstappen.
Festa na McLaren: Depois de quase 10 anos de jejum, uma nova vitória da escuderia, e com direito a dobradinha na pista de Monza.
Numa disputa entre
dois talentos natos da competição em alta velocidade, é mais do que natural que
eles se estranhem na pista. Com os carros por vezes tendo desempenhos
similares, ora com uma pequena vantagem da Mercedes, ora com a Red Bull, sempre
vai haver momentos de tensão na pista. O que vemos no momento é Verstappen
arriscar mais do que Hamilton, e criar situações que, estrategicamente, vão
prejudicar mais a ele do que ao rival, caso dê errado. Um duelo não é feito
apenas de ataques, mas também de recuos. Em Monza, ele poderia muito bem ter
deixado Hamilton fazer a chicane sem problemas, e grudar nele para efetuar a
ultrapassagem logo adiante. Havia metade da corrida ainda por acontecer, e
inúmeras oportunidades que poderiam ser aproveitadas. Mas preferiu arriscar
tudo por tudo logo na primeira variante, como se não houvesse amanhã, ao
contrário do que Hamilton fez na primeira metade da corrida, onde evitou
radicalizar na disputa com o próprio Verstappen, saiu da pista, teve prejuízo
ao perder a posição para Lando Norris, mas sabia que haveria oportunidades na
prova ainda a serem exploradas. Um recuo momentâneo para voltar ao ataque logo
depois.
Verstappen parece ver esses recuos como sinal de fraqueza, de derrota para o inimigo, e quem sai perdendo é ele próprio, que parece não aprender que não é assim. Quem não se lembra de quando ele, ao ser superado por Esteban Ocón aqui em Interlagos, anos atrás, quando o francês, mesmo retardatário, tentava recuperar a volta perdida, não aceitou a ultrapassagem, e foi para cima do então piloto da Force India, ocasionando um choque entre os carros, que o fez perder uma vitória praticamente certa? Não havia porque discutir posição daquela maneira com um retardatário, e ele tinha a corrida sobre pleno controle, liderando a prova. Mas, inconformado com o ocorrido, depois da bandeirada, foi até os boxes da equipe de Ocón e por pouco não saiu no braço com o francês, como se ele não tivesse direito a buscar posições na pista. Bem, calor do momento, não se pode negar, afinal, até Nélson Piquet já saiu na porrada com outro piloto em uma corrida na Alemanha em 1982, então... Mas Verstappen, em um ano de disputa pelo título de forma real e efetiva, precisa pensar mais em algumas atitudes, e isso parece não estar acontecendo, com prejuízo dele próprio, acostumado a que os outros “abram passagem” para ele, e perdendo um pouco o rebolado quando vê que os rivais na pista não vão dar mole como ele imagina ser seu direito, e apenas dele.
Como Ross Brawn disse, é preferível vermos a decisão do título na pista, e não pelos comissários. A tocada “tudo ou nada” de Verstappen pode fazer a alegria de muita gente, mas é preciso saber quando não se deve dar tudo por tudo, avaliando o momento, a oportunidade, e seu custo-benefício. Isso não quer dizer deixar de ser arrojado ou veloz. Mas pilotos mais cerebrais tendem a ser muito mais difíceis de serem batidos, mesmo que estejam em desvantagem na pista, por saberem explorar melhor a visão de corrida, e em disputas roda a roda, fazerem o adversário acabar traindo a si próprio. A grosso modo, um exemplo disso foi visto na primeira corrida, no Bahrein, quando Lewis conseguiu induzir Max ao erro na ultrapassagem, passando por fora da pista. E custando suas chances de vitória.
É preciso ir devagar com o andor em certos momentos e atitudes. Isso não quer dizer que precisem dar as mãos e ficarem sorrindo feito bobos para o público e torcida. O clima é de guerra, mas é preciso manter a cabeça fria nos momentos mais complicados, e nesse aspecto, Hamilton leva vantagem, pela experiência que tem, por mais que muitos digam o contrário, tentando alegar que é justamente o inglês que está descontrolado, assim como dizem que a Mercedes está em decadência e tudo o mais, como se ser superada pela Red Bull fosse o apocalipse. Quem mantiver o foco e a calma pode ter maiores chances de levar o campeonato, numa disputa que até o presente momento pode pender tanto para um lado quanto para o outro. O jogo está sendo jogado, e cada competidor está com suas armas à mostra. E ainda podemos esperar novos enroscos entre ambos. Não custa lembrar que o automobilismo é um esporte de risco, e mesmo involuntariamente, e sem querer, tanto Max quanto Lewis poderão sofrer novos incidentes.
É um risco que faz parte do jogo. Esperemos que a disputa consiga ficar mesmo dentro da pista, e não fora dela, porque o campeonato perderia muito de seu brilho de fosse decidido por manobras de fora. Torçamos para que luta se mantenha em alto nível, tanto dentro quanto fora da pista. E que vença o melhor, seja ele quem for...
Muitos criticaram a performance de Lewis Hamilton em Monza, quando o heptacampeão, atrás de Lando Norris, da McLaren, não conseguia ultrapassar o compatriota na pista. Houve as tradicionais críticas de que “sem um carro superior, Hamilton não é nada”, entre outros comentários sugerindo que o piloto da Mercedes é uma farsa como grande talento da F-1. Bem, e o que dizer então de Max Verstappen, que superado por Daniel Ricciardo, também da McLaren, na largada, também não conseguia ultrapassar o australiano na pista, da mesma maneira como ocorria com Hamilton em relação a Norris. E aí, como ficam então na performance de Verstappen nessa disputa, quando até o holandês confessou durante a corrida italiana que superar Ricciardo não estava sendo tão fácil como ele imaginava...? E Valtteri Bottas, que fez uma corrida fenomenal, veio passando vários pilotos que tinham carros com menos performance que o dele, mas o finlandês também empacou atrás de Sergio Pérez, sem conseguir ultrapassar na pista, antes de se acomodar atrás do mexicano, por saber que ele tinha uma punição de 5s por ultrapassar fora dos limites da pista... Algumas coisas não são tão fáceis como parecem...
A Indycar disputa neste domingo sua penúltima corrida na temporada. O palco é o Laguna Seca Raceway, na Califórnia, circuito de difíceis ultrapassagens, e com uma das curvas mais legais da temporada, o Saca-Rolhas, no alto da colina onde se situa a pista. Depois de conseguir uma excelente vitória em Portland, Alex Palou vai tentar consolidar sua vantagem na classificação, que é de 25 pontos para Patricio O’Ward. Já Scott Dixon, companheiro de Palou na Ganassi, precisa reagir imediatamente, se ainda quiser alcançar seu sétimo título na categoria, uma vez que está 49 pontos atrás, e pode deixar a disputa, se o colega de time ampliar a vantagem na pista perto de Monterrey. A TV Cultura transmite a corrida ao vivo a partir das 16 horas deste domingo, pelo horário de Brasília.
A pista de Laguna Seca recebe a Indycar neste final de semana. |
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