Neste momento de fim de ano, já que estou dando uma folga nos textos de automobilismo, fiquem por enquanto com mais uma de minhas antigas colunas. Esta é de abril de 1995, com o primeiro retorno a Ímola, depois do trágico GP de San Marino do ano anterior. Foi difícil encarar o retorno àquela que era uma de minhas pistas favoritas na Europa, e que ficou tragicamente marcada na memória de todos em 1994. Vamos ao texto, e um bom Natal a todos os leitores...
RETORNO A ÍMOLA
Adriano de Avance Moreno
Praticamente um ano depois, a Fórmula 1 retornou à pista que mudou radicalmente a categoria no ano passado. O fim de semana negro vivido por todos no Autódromo Enzo e Dino Ferrari deixou a todos atordoados e sem fala. Na sexta-feira, Rubens Barrichello sofrera um violento acidente com seu Jordan na aproximação à entrada dos boxes: o brasileiro bateu feio e sofreu alguns ferimentos que inviabilizaram sua participação na corrida. Mas o pior estaria por vir no sábado, quando a Simtek de Roland Ratzemberger perdeu parte da asa traseira e seu carro seguiu reto na curva Villeneuve, batendo de forma frontal no muro ali existente, e promovendo mais uma cena de horror no final de semana. A morte do novato austríaco deixou todos com um ar pesado. Até Ayrton Senna começava a ficar mais sério do que o normal, mais compenetrado com outras questões, e visivelmente preocupado. No domingo, um acidente múltiplo logo na largada deixou todo mundo já alvoroçado, e depois, a colisão de Senna na curva Tamburello foi o clímax do fim de semana negro que se tornou o Grande Prêmio de San Marino em 1994.
Acusações sobre o que realmente motivou o acidente, se a corrida deveria ou não ter sido cancelada, se Senna morreu ainda na pista ou não, muita coisa rolou nos dias e semana seguintes. Novas regras de segurança foram implantadas, meio que a torto e a direito. A F-1 conseguiu seguir em frente, mas não sem sofrer alguns sobressaltos. E agora, em 1995, eis que a categoria retornou a esta pista, que para muitos, virou algo maldito. O fim de semana do GP, felizmente, transcorreu sem maiores percalços, mas o clima estava pesado desde o início da chegada de todos ao circuito.
Fãs de várias partes do mundo transformaram a antiga curva Tamburello em uma espécie de santuário, com flores e diversos outros tipos de objetos trazidos para demonstrar o apreço e tristeza pela fatalidade de um ano atrás que ceifou a vida de um dos maiores pilotos de todos os tempos. O próprio circuito sofreu modificações que, para alguns, o descaracterizaram, como se provou em boa parte da corrida: antes um circuito de várias disputas, Ímola se tornou uma pista travada, que inibe as ultrapassagens, e a corrida deste ano, ganha por Damon Hill, foi mais na base da estratégia, sabendo o momento certo de fazer as paradas de Box para trocar pneus e reabastecer, do que por disputas de ultrapassagem na pista.
A velha Tamburello não existe mais: foi feita uma curva, para o lado interno do circuito, que nunca permitirá as mesmas disputas que existiam no traçado antigo. Na curva Villeneuve, outra mudança, com a curva suave transformada em um cotovelo quase a 90° que também inviabiliza as tentativas de ultrapassagem. Outras curvas que foram modificadas foram a Rivazza e a Acqua Mineralle, que se tornaram mais fechadas (a primeira) e mais simples (a última). Tudo em nome da segurança, claro. Mas com a nítida sensação de que algo melhor poderia ter sido feito, se fosse melhor planejado, sem sacrificar o traçado desta pista. Mas os organizadores e torcedores, estes últimos pelo menos desta vez, nada criticaram do que foi feito. O fato da corrida ter transcorrido sem maiores incidentes foi um bálsamo para todos, ainda com as lembranças de 94 frescas na cabeça. Tudo o que não poderia acontecer novamente, felizmente não aconteceu. Algum novo acidente poderia até complicar ainda mais as coisas, ou invés de ajudar.
Damon Hill, vencedor da prova, dedicou a vitória a Senna. Nada mais justo, uma vez que o time também sofreu de maneira considerável a perda de seu piloto em 94. Podem acusar Hill de ser um piloto “comum”, mas talvez ele seja o último “gentleman” da categoria, onde cada vez mais os pilotos e integrantes dos times parecem cada vez menos humanos e mais frios.
Findo o GP de San Marino, ficou pelo menos o alívio de que o fantasma de 94 parece ter sido finalmente exorcizado da mente de muitos. Mas para alguns, ainda irá demorar muito mais para arrefecer...
Nenhum comentário:
Postar um comentário