Hora de mais um texto sobre pistas
que a Fórmula 1 já visitou em seus 70 anos de história. E hoje falarei de
Dallas, cidade que já teve o privilégio de sediar um Grande Prêmio, nos anos
1980. Foi uma corrida cheia de emoções, mas só para o público, uma vez que para
os pilotos, a situação não foi assim tão agradável. Confiram mais detalhes no
texto abaixo, e boa leitura a todos...
DALLAS
Quem vê a
Fórmula 1 hoje toda cheia de frescuras e exigências para correr em determinadas
pistas, muitas vezes justificando a necessidade de segurança, não imagina por
onde a categoria já correu em determinadas ocasiões. Se é verdade que não se
pode renegar as melhores condições de segurança, para se evitar acidentes, ou
pelo menos minimizar suas consequências, não é menos verdade que, por causa
disso, muitas pistas que ofereciam desafio aos pilotos acabaram expurgadas do
calendário, em que peses muitas vezes os motivos terem sido muito mais
econômicos do que de segurança propriamente dita, uma vez que as taxas de
realização de um GP cresceram a níveis astronômicos, ficando muito difícil de
se bancar a brincadeira por simples desejo.
Por outro
lado, por força do dinheiro, não foram poucas vezes onde a categoria máxima do
automobilismo se aventurou em alguns lugares onde os pilotos nunca sentiram
saudades de repetir a dose. E Dallas, certamente, foi um destes lugares. Tanto,
que foi uma corrida única, que esteve presente no calendário de 1984, tendo
sido realizada no dia 8 de julho daquele ano. Curioso que, em um país como os
Estados Unidos, que possuí diversos circuitos permanentes, a F-1 tenha
insistido tanto em algumas pistas de rua que, à exceção de Long Beach, nunca
deixaram os pilotos muito entusiasmados em disputar um GP neste tipo de
circuito. E Dallas, certamente, ganha com louvor o posto de pior pista citadina
que a F-1 já visitou em terras do Tio Sam.
Os
organizadores queriam mostrar a força da cidade de Dallas, como um centro
econômico mundial, e com o aval de Bernie Ecclestone, conseguiram o seu Grande
Prêmio de Fórmula 1 para a temporada de 1984. O local escolhido para abrigar a
pista seria o Fair Park, um complexo destinado, como o nome diz, a feiras, além
de outros eventos recreativos e educacionais localizado ao leste do centro da
metrópole texana. A pista usaria as ruas do local, o que resultou em um traçado
de 3,9 Km de extensão, e 23 curvas, a ser percorrido no sentido anti-horário.
Além das tradicionais curvas em cotovelo, típicas de circuitos de rua, havia
algumas curvas mais rápidas e não tão travadas, além de alguns trechos razoáveis
de retas, que em tese dariam pontos satisfatórios de ultrapassagens. Não
parecia tão ruim, mas não era nenhuma maravilha. Como a corrida tinha sido
organizada com a ajuda de Chris Pook, que era o criador da etapa oeste do GP
dos Estados Unidos, na ensolarada Long Beach, o pessoal dava um voto de
confiança para esta nova prova, que seria a 9ª etapa da competição em 1984,
logo após as provas do Canadá, e a de Detroit, outra pista de rua que não era
nem um pouco apreciada pelos pilotos. Claro que, na teoria, tudo parecia bem razoável,
com a perspectiva de um traçado que era bem mais interessante do que o da
capital do automóvel, mas na prática, o que se viu foi outra coisa.
Quando
chegou o fim de semana da corrida, Dallas estava um inferno, literalmente, com
a temperatura chegando fácil aos 38º C. Os muros de concreto que circundavam a
pista montada praticamente tornavam todas as curvas em raio cego para o nível
da altura dos pilotos. E o pior era o piso, cuja condição era horrorosa, e como
se desgraça pouca fosse bobagem, se deteriorava a olhos vistos. Geralmente, o
que acontece é que, com o uso dos carros, um traçado vai ficando mais
emborrachado, e ganhando mais aderência, ficando melhor para a condução dos
pilotos. Mas no Dallas Fair Park, acontecia o contrário, com o asfalto a se
desintegrar quanto mais os carros andavam. E com a pista mais estreita do que
os pilotos imaginavam, e um trilho bem instável no piso, a pista de Dallas,
segundo alguns, parecia mais um traçado de rali do que de monopostos, com as
condições traiçoeiras prontas para vitimar quem não se precavesse.
Nélson
Piquet teria perguntado o que iria quebrar primeiro naquele calor infernal: a
pista, os pilotos, ou os carros. Na prática, sobrou para todo mundo. Na
verdade, nos treinos mesmo, dois pilotos já ficaram fora de combate: o francês
Phillipe Alliot, da equipe Ram/Hart, terminou seu fim de semana logo no
primeiro treino livre, ao bater seu carro nos muros da pista. Como sua
escuderia não tinha carro reserva, o piloto nem conseguiu participar da
corrida. Já o inglês Martin Brundle, da Tyrrel/Ford, bateu forte no início do
primeiro treino de classificação, fraturando o pé direito e o tornozelo do pé
esquerdo.
O traçado da pista de Dallas no Fair Park (acima). Boa parte das ruas ainda existe ainda hoje no local, como se pode ver em uma visão aérea, com o traçado de onde a pista foi montada (abaixo). |
A dupla da
McLaren, Alain Prost e Niki Lauda, tentaram organizar os pilotos para fazer um
boicote à corrida, devido ao estado calamitoso do pisto, mas não conseguiram
ser bem-sucedidos. E acabou que a prova foi disputada, e apesar dos pesares, por
incrível que pareça, foi uma das mais emocionantes da temporada, e teve alguns
lances bem interessantes. A começar pela primeira pole-position de Nigel
Mansell, com a Lotus/Renault, tendo ao seu lado seu companheiro de equipe Elio
de Angelis, com uma primeira fila toda da equipe fundada por Colin Chapman.
Entre os brasileiros, Ayrton Senna largava numa ótima sexta posição com sua
Toleman/Hart, em sua temporada de estréia na F-1, enquanto Nélson Piquet era
apenas o 12º no grid. A bandeira verde da corrida era dada por Larry Hagman,
ator que fazia o personagem mais famoso da série “Dallas”, o infame J.R. Ewing,
produção que estava entre os grandes sucessos da TV não apenas nos Estados
Unidos, mas em diversos outros países do mundo onde era exibida.
E foi uma
corrida bem disputada, com vários lances emocionantes, e muitos pilotos
infelizmente perdendo para o circuito citadino. Nigel Mansell liderou metade da
corrida, antes de ser superado pelos concorrentes, que já vinham acossando o
inglês há muitas voltas. Keke Rosberg, com a Williams/Honda, foi quem se deu
melhor nesta prova, com uma pilotagem inspirada, garantindo a primeira vitória
para a Honda no seu retorno à F-1 ocorrido no ano anterior. A prova, programada
para 77 voltas, foi encerrada com 67, por ter atingido o tempo limite de uma
corrida de F-1. René Arnoux, com a Ferrari, foi o 2º colocado, enquanto Elio de
Angelis garantia um pódio para a Lotus com o 3º lugar. No finalzinho da
corrida, Nigel Mansell, com o carro já meio judiado depois de alguns toques nos
muros, parou na pista, e o inglês tentou empurrar o seu carro até a linha de
chegada, acabando por desmaiar e cair ao lado de seu carro, devido ao
fortíssimo calor reinante, acabando por se classificar em 6º lugar.
Para os
brasileiros, foi uma corrida para se esquecer. Nélson Piquet teve um acelerador
preso, e acabou atingindo o muro. Já Ayrton Senna também acabou acertando o
muro, após uma manobra, e por incrível que pareça, sentiu que alguma coisa
estava errada. Pat Symonds, que na época era engenheiro da Toleman, foi ver
depois da corrida, e viu que o muro de fato estava numa posição ligeiramente
diferente, coisa de no máximo um centímetro, algo que havia acontecido devido a
um acidente ocorrido no mesmo local momentos antes. Esse detalhe deixou Symonds
impressionado com a capacidade de Senna medir a distância com que fazia as curvas
em uma pista e passar rente aos muros com incrível precisão. Ayrton julgava
estar fazendo a curva no limite, quando acabou acertando o muro, que estava aproximadamente
um centímetro mais para dentro da pista.
Apenas oito
carros foram classificados, e apenas os dois primeiros terminaram na mesma
volta. Felizmente, o bom senso mostrou que a pista do Dallas Fair Park, apesar
de um traçado interessante até, não era adequada para a Fórmula 1, que nunca
mais voltou àquela cidade, sendo este circuito um daqueles vários GPs que
tiveram a honra de sediar apenas um Grande Prêmio, e que na opinião de muitos
que correram naquele dia, já foi até demais. Tanto que o local, que ainda hoje
é um parque onde ocorrem feiras na cidade de Dallas, apesar de ainda possuir a
maioria das ruas que formaram o circuito usado para a F-1, nunca chegou a ser
usado para sediar corridas de outras categorias, mesmo as dos Estados Unidos,
como as categorias Indy, que já correram em muitos locais similares até. Na
prova da F-1, a pole-position de Nigel Mansell foi obtida com o tempo de
1min37s041, à velocidade média de 261,367 Km/h. Já a melhor volta na prova foi
de Niki Lauda, com McLaren/TAG-Porsche, com o tempo de 1min45s353.
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